quarta-feira, 26 de setembro de 2012

VERSUS: FALSAS APARIÇÕES X APARIÇÕES AUTÊNTICAS

No acervo enorme das aparições de Nossa Senhora nos últimos tempos, há que se considerar sempre o aspecto da autenticidade de tais eventos. Acreditar ou não em uma determinada aparição?  O problema, na verdade, não é este. O antigo Código Canônico (cânones 1399 e 2318) proibia a edição e a divulgação de manifestações e revelações de natureza particular, mas ambos foram suprimidos pela Sagrada Congregação para a Doutrina da Fé, no pontificado de Paulo VI. Neste novo cenário, estas mensagens podem ser publicadas e divulgadas publicamente, ainda que sem a licença formal de uma autoridade eclesiástica, desde que estejam em plena conformidade com os ensinamentos da moral cristã, expressa pelas mensagens bíblicas e pela tradição da Santa Igreja. Assim, é tão razoável acreditar quanto não acreditar. 

Por outro lado, as ações do demônio são, substancialmente, as de atacar e violentar as práticas cristãs mais autênticas, particularmente as que trazem mais frutos de graças para a salvação eterna do homem. Os inimigos mortais do demônio são sobejamente conhecidos: o Santo Rosário, a Santa Missa, os Santos Sacramentos, a Vida de Santidade. E, evidentemente, as autênticas manifestações de Maria a alguns de seus filhos muitíssimo privilegiados. Tais ações nunca parecem intrinsecamente más e têm sempre impactos diretos e imediatos no comportamento humano dos crentes em geral, particularmente sobre aspectos emotivos e dos sentimentos mais superficiais, gerando, quase que automaticamente, percepções de 'energia interior', euforia, pseudo-êxtases, palpitações, crises de choro ou de ansiedade, arrebatamentos místicos e outros tantos sinais de 'enlevo espiritual'. Deus nunca age assim: nas revelações sobrenaturais, a natureza humana mantém-se íntegra e a essência da aparição encontra-se nas mensagens. A certos videntes, em caráter muito especial, Deus faz experimentar arrebatamentos e êxtases que extrapolam em muito os limites da natureza humana dos meros sentidos.   

Os sinais mais evidentes das falsas aparições estão, entretanto, associadas a mensagens heréticas (o demônio pode macaquear, mas não reproduzir plenamente os desígnios divinos), entranhadas em mensagens bucólicas e com aparência de douta doutrina católica. Não se pode olvidar a essência diabólica do pai da mentira: a aberração vem edulcorada em mimos religiosos, o vômito perpassa em nuances desapercebidas em mensagens de paz, a manipulação da verdade meandra-se de forma ambígua nos próprios contrafortes da verdade. Aqui, não há exceção, e as evidências não demandam provas: a pasteurização doutrinária ditada por uma única heresia conforma a heresia do todo e bastaria conspurcar o monturo para exalar tantas outras pseudo-revelações.

De uma maneira geral, podem ser sistematizados alguns elementos que podem nortear a caracterização de falsas aparições:
 - centralização do ambiente na figura do vidente ou videntes, com ampla divulgação da ação pessoal (as aparições autênticas geram, ao contrário, uma profunda inflexão na vida do vidente, caracterizadas por um grau elevado de despojamento aos interesses mundanos e valorização extremada da vida de oração);
- mensagens tipicamente centradas em premissas do racionalismo, com direcionamento a uma explicitação  recorrente dos mistérios de Deus em modos de interpretação essencialmente humanos (conceitos genéricos de paz universal, fraternidade, respeito humano, etc);
- aparições repetitivas, contínuas e de longa duração, levando a uma banalização do mistério e a uma perda cabal do foco das mensagens (cada um escolhe a mensagem mais relevante dentre centenas, num processo de livre arbítrio, muito similar ao das seitas protestantes em relação à interpretação dos preceitos bíblicos);
- mensagens específicas em relação a fatos ou lugares em especial, desfocadas de um caráter histórico ou de uma amplitude universal (como o caso da Consagração à Rússia nas mensagens de Fátima), com abordagem detalhada e sistêmica de tais eventos; 
- presença de linguagem estranha à fala nativa do vidente;
- mensagens com forte cunho profético, caracteristicamente apocalíptico ou mediante a condenação explícita de  cunho pessoal (papas, por exemplo); as mensagens autênticas referem-se particularmente à humanidade, a determinados povos, a determinados processos históricos, a determinados pecados vinculados a uma dada classe de homens ou aos homens em geral);
- mensagens de origens e naturezas diversas (as aparições realmente autênticas provêm quase que exclusivamente de Nossa Senhora, feita preanunciadora por excelência da graça divina, como atestado pelos eventos de La Salette, Lourdes e Fátima). 
  
Não é fácil convencer um católico, crente de uma determinada aparição, que tal aparição é falsa: a reação será sempre agressiva e quase sempre sem efeito prático nenhum (um protestante apresenta a mesma reação diante de uma objeção à 'verdade' em que ele tanto acredita). Em geral, os argumentos mais utilizados na defesa de pseudo-revelações são aqueles em que o indivíduo manifesta-se em termos do que ele próprio 'sentiu' e dos possíveis 'frutos de devoção' que ele vê. Péssimo sinal. Se há uma coisa clara, claríssima, na ação do demônio, é o poder de manipular os sentidos e os sentimentos  humanos (definitivamente, somos apenas tolos na escala da inteligência maligna). As aparições autênticas são reduzidas e emblemáticas, e devem apenas ser olhadas e meditadas com os olhos da fé e da alma da maturidade cristã. Sem isso, corre-se apenas os riscos de se transformar ceifadores em semeadores do joio no meio do trigo.