domingo, 30 de abril de 2017

NO CAMINHO PARA EMAÚS

Páginas do Evangelho - Terceiro Domingo da Páscoa


No caminho para Emaús, cidadezinha distante pouco mais de 10km de Jerusalém, Jesus vai manifestar, mais uma vez, a glória da Ressurreição aos seus discípulos. Como que por acaso, Jesus os toma para Si na longa caminhada, numa contemplação aparente de um mero convívio humano, nascido das circunstâncias de três peregrinos na mesma direção: 'quando eles iam conversando e discorrendo entre si, aproximou-Se deles o próprio Jesus e caminhou com eles' (Lc 24, 15). Não há nada de circunstancial ou de mera rotina neste encontro sobrenatural: tal grande manifestação da graça de Deus faz dele um evento singular e extraordinário.

E, de algum modo absolutamente sobrenatural, os discípulos não reconhecem Jesus, a exemplo daqueles que O encontraram às margens do mar de Tiberíades e também não O reconheceram a princípio (Jo 21,4). Movidos pelas emoções humanas, retratam a Paixão e Morte do Senhor àquele 'único peregrino em Jerusalém que não sabe o que lá aconteceu nestes últimos dias' (Lc 24, 18). Eles se referiram ao Senhor como um profeta poderoso, muito provavelmente ciente dos riscos de serem denunciados e presos por proclamarem a um desconhecido a condição de serem discípulos dAquele que deveria libertar Israel, de acordo com as suas próprias motivações e perspectivas.

No caminho para Emaús, os dois discípulos expressam, num turbilhão de emoções, os sentimentos de angústia, tristeza, decepção, perturbação e esperança. E é esta esperança que vai torná-los testemunhas do amor. Jesus os repreende pela perturbação que se levanta como o pó da estrada; Jesus os orienta, por meio dos textos bíblicos, no caminho da santificação plena e no entendimento de toda Verdade de Deus. Jesus ilumina para sempre os seus corações, na tarde ensolarada que declina.

E, ficando com eles, o Senhor se vai, manifestando, mais uma vez, o mistério concreto da Santa Eucaristia como a permanência de Deus Vivo entre os homens: 'Quando se sentou à mesa com eles, tomou o pão, abençoou-o, partiu-o e lhes distribuía. Nisso os olhos dos discípulos se abriram e eles reconheceram Jesus. Jesus, porém, desapareceu da frente deles' (Lc 24, 30 - 31). Como os dois discípulos de Emaús, na Santa Eucaristia, nós reconhecemos e, mais do que reconhecer, nós ficamos com Jesus, na poeira das estradas do mundo, na certeza da caminhada rumo à eternidade com Deus. 

sábado, 29 de abril de 2017

29 DE ABRIL - SANTA CATARINA DE SENA


Santa Catarina de Sena nasceu Caterina di Giacomo di Benincasa na cidade de Sena / Itália, em 25 de março de 1347, de família humilde e numerosa. Desde tenra idade foi cumulada pela Providência Divina de visões místicas e dons sobrenaturais, que incluíram mais tarde a manifestação de estigmas semelhantes aos de Nosso Senhor. Ofereceu-se a Deus desde a infância e, ainda muito jovem, já havia recebido o hábito de penitente da Ordem Terceira de São Domingos.

Reclusa em sua cela, em orações e jejuns constantes, Catarina passou por inúmeras experiências sobrenaturais, que culminaram com a celebração de suas núpcias místicas com o Senhor, na cela de sua reclusão, nas vésperas da Quarta-Feira de Cinzas do ano de 1367. Acostumada a uma vida de rígida abstinência, a comunhão era, muitas vezes, o seu único alimento por vários dias. Mas, segundo o seu confessor e primeiro biógrafo, Raimundo de Cápua, Jesus vai demandá-la a abandonar a vida reclusa e a dedicar-se totalmente a uma missão pública em favor da Igreja.

A Europa à época de Santa Catarina estava marcada pela peste, pela violência e por uma grave crise da Igreja. O papado estava recolhido na cidade francesa de Avignon, sob influência política de diversos reinos e ducados. Catarina tornou-se, então, a servidora humilde de todos, cuidou dos doentes, pregou um apostolado intensivo e lutou incessantemente pelo restabelecimento da paz, mediante visitas pessoais ou envio de cartas a diferentes políticos e governantes, conclamando o próprio papa - Gregório XI - a retomar o seu pontificado a partir de Roma. 

E o retorno do papa a Roma ocorreu em janeiro de 1377. Neste período, tem início os primeiros registros das conversações entre a sua alma e Deus, mais tarde transcritas na obra hoje conhecida como 'Diálogo'. Mas a paz na Igreja não seria longa, sendo marcada por novas revoltas e a morte em seguida de Gregório XI. Em Roma, os cardeais elegem Urbano VI; em Avignon, alguns cardeais franceses dão origem ao Grande Cisma do Ocidente, não aceitando o novo papa de Roma e elegendo o antipapa Clemente VII. 

A angústia e aflição diante destes fatos e da incerteza sobre o futuro da Igreja a acompanhariam até à sua morte prematura, ocorrida em 29 de abril de 1380, aos 33 anos de idade. Sua cabeça foi separada do corpo e é venerada na Basílica de San Domenico em Siena e o corpo encontra-se na Igreja de Santa Maria Sopra Minerva, em Roma. Catarina foi canonizada em 1461 pelo papa Pio II e declarada 'doutora da Igreja' pelo papa Paulo VI em 1970, apenas alguns dias depois da concessão da primeira e igual honraria dada à Santa Teresa de Ávila.

(cabeça preservada e túmulo de Santa Catarina de Sena)

sexta-feira, 28 de abril de 2017

28 DE ABRIL - SÃO LUÍS DE MONTFORT

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Missionário do Espírito Santo e da Virgem Santíssima, São Luís Maria Grignion de Montfort foi o portador da graça divina de uma mensagem de transcendência extraordinária: a necessidade de uma devoção ardente à Mãe de Deus e do conhecimento da missão ímpar de Nossa Senhora no Segundo Advento do seu Filho.

Nasceu em 31 de janeiro de 1637 em Montfort (França), sendo ordenado sacerdote em 1700. Em 1706, foi recebido pelo Papa Clemente XI que, confirmando a sua vocação missionária, outorgou-lhe o título de 'Missionário Apostólico'. Nesta missão, combateu duramente a doutrina jansenista na França, que, crendo na predestinação, apresentava um Deus tirânico e sem misericórdia. 

Fundou três instituições religiosas: a Companhia de Maria (congregação de sacerdotes missionários), as Filhas da Sabedoria (freiras dedicadas à assistência aos doentes nos hospitais e à instrução de meninas pobres) e os Irmãos de São Gabriel (congregação de leigos voltados para o ensino). Escreveu várias obras, dentre ela o 'Tratado da Verdadeira Devoção à Santíssima Virgem', referência básica da mariologia cristã. Morreu em 28 de abril de 1716, aos 43 anos e apenas 16 anos como sacerdote, em Saint-Laurent-sur-Sèvre (França). Foi beatificado em 1888 e canonizado em 1947, pelo Papa Pio XII.

quarta-feira, 26 de abril de 2017

VERSUS: MALDIÇÃO X LOUVOR

Dois caminhos: qual você vai seguir?

Contempla qual será a eterna ocupação do réprobo no inferno. Continuamente odiará e amaldiçoará a Deus, e, amaldiçoando a Deus, amaldiçoará também os benefícios que d’Ele recebeu: a criação, a redenção, os sacramentos, em particular, o batismo e a penitência. Sobretudo amaldiçoará o Santíssimo Sacramento do altar, que ele profanou tantas vezes e recebeu talvez sacrilegamente. O desgraçado odiará todos os Anjos e Santos, especialmente o Anjo da guarda e os seus santos Padroeiros, e mais que todos, a divina Mãe, odiará as três Pessoas divinas e, em particular, o Filho de Deus, morto para o salvar, amaldiçoando-Lhe as chagas, o sangue, os sofrimentos e a morte: O pecador verá e se indignará; rangerá os dentes, e se consumirá; o desejo dos pecadores perecerá.



Ah, meu doce Redentor Jesus! Ah, minha amadíssima Corredentora, Maria! Se jamais meu coração se sentiu enternecido e compungido à vista de suas culpas, eis que agora Vô-lo demonstram as lágrimas que derramo aos vossos pés. Misericórdia! Meu Jesus, misericórdia! Quem me dera nunca Vos ter ofendido! No futuro, quero antes perder mil vezes a vida do que tornar a ofender-Vos. Não é o temor do inferno que me faz falar assim, mas o temor de ter que blasfemar contra Vós nesse abismo.

Ó Meu Deus, se por desgraça me condenar, terei de Vos amaldiçoar eternamente? Os meus lábios que agora Vos bendizem e exortam os outros a vosso louvor, estes lábios terão de sempre Vos amaldiçoar? Ó Senhor, não o consintais! Antes se me seque a garganta, antes se me corte a língua, seja eu antes reduzido a cinza pelo raio de vossa ira; mas protesto que nunca Vos quero amaldiçoar. Desejo ao contrário, ir ao céu para Vos louvar e bendizer, juntamente com Maria Santíssima, com os Anjos e os Santos, por toda a eternidade. Mas deveis ajudar-me com a vossa graça. Ó meu Jesus, fazei-o pelos merecimentos de vossa Paixão e pelas dores de vossa querida Mãe. 

(Excertos da obra 'Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano', de Santo Afonso de Ligório)

terça-feira, 25 de abril de 2017

SANTIDADE SALESIANA

A santidade da família salesiana contempla atualmente 167 membros já glorificados ou com processos em andamento, incluindo 9 santos, 117 bem-aventurados, 13 veneráveis e 28 servos de Deus.


Santos (9)

São João Bosco, sacerdote (canonizado em 10 de Abril de 1934)
São José Cafasso, sacerdote (22 de junho de 1947)
Santa Maria D. Mazzarello, virgem (24 de junho de 1951)
São Domingos Sávio, adolescente (12 de junho de 1954)
São Leonardo Murialdo, sacerdote (3 de maio de 1970)
São Luiz Versiglia, bispo, mártir (10 de outubro de 2000)
São Callisto Caravario, sacerdote, mártir (10 de outubro de 2000)
São Luiz Orione, sacerdote (16 de maio de 2004)
São Luiz Guanella, sacerdote (23 de outubro de 2011)

Beatos ou Bem-aventurados (117, lista incompleta)

Beato Michele Rua, sacerdote (beatificado em 29 de outubro de 1972)
Beata Laura Vicuňa, adolescente (3 de setembro de 1988)
Beato Felipe Rinaldi, sacerdote (29 de abril de 1990)
Beata Maddalena Morano, virgem (5 novembro de 1994)
Beato Giuseppe Kowalski, sacerdote, mártir (13 de junho de 1999)
Beato Francesco Kęsy, laico, e 4 companheiros mártires (13 de junho de 1999)
Beato Pio IX, papa (3 de setembro de 2000)
Beato Giuseppe Calasanz, sacerdote, e 31 companheiros mártires (11 de março de 2001)
Beato Luigi Variara, sacerdote (14 de abril de 2002)
Beato Artemide Zatti, religioso (14 de abril de 2002)
Beata Maria Romero Meneses, virgem (14 de abril de 2002)
Beato Augusto Czartoryski, sacerdote (25 de abril de 2004)
Beata Eusébia Palomino, virgem (25 de abril de 2004)
Beata Alexandrina Maria da Costa, laica (25 de abril de 2004)
Beato Alberto Marvelli, laico (5 de setembro de 2004)
Beato Bronislao Markiewicz, sacerdote (19 de junho de 2005)
Beato Enrico Saiz Aparicio, sacerdote, e 62 companheiros mártires (28 de outubro de 2007)
Beato Zeffirino Namuncurà, laico (11 novembro de 2007)
Beata Maria Troncatti, virgem (24 novembro de 2012)
Beato Stéfano Sándor, laico, mártir (19 de outubro de 2013)

Veneráveis (13)

Ven. Andrea Beltrami, sacerdote (decreto de 5 de Dezembro de 1966)
Ven. Teresa Valsè Pantellini, virgem (12 de Julho de 1982)
Ven. Dorotea Chopitea, laica (9 de Junho de 1983)
Ven. Vicenzo Cimatti, sacerdote (21 de Dezembro de 1991)
Ven. Simone Srugi, religioso (2 de Abril de 1993)
Ven. Rodolfo Komorek, sacerdote (6 de Abril de 1995)
Ven. Luigi Olivares, bispo (20 de Dezembro de 2004)
Ven. Margueritha Occhiena, laica (23 de Outubro de 2006)
Ven. Giuseppe Quadrio, sacerdote (19 de Dezembro de 2009)
Ven. Laura Meozzi (Polônia), virgem (27 de Junho de 2011)
Ven. Atillio Giordani (Italia), laico (9 de Outubro de 2013)
Ven. Giusppe Augusto Arribat (França), sacerdote (8 de Julho de 2014)
Ven. Stefano Ferrando (Itália - Índia), bispo (3 de março de 2016)

Servos de Deus (28, lista incompleta)

Francesco Convertini, sacerdote (Índia)
Ottavio Ortiz Arrieta, bispo (Peru)
Giuseppe Vandor, sacerdote (Cuba)
Tito Zeman, sacerdote, mártir (Eslováquia)
Augusto Hlond, cardeal (Polônia)
Elia Comini, sacerdote (Itália)
Giuseppe Guarino, cardeal (Itália)
Ignacio Stuchly, sacerdote (República Checa)
Antônio Lustosa de Almeida, bispo (Brasil)
Carlo Crespi Croci, sacerdote (Equador)
Costantino Vendrame, sacerdote (Índia)
Giovanni Świerc, sacerdote e 8 companheiros mártires (Polônia)
Oreste Marengo, bispo (Itália - Índia)
Ana Maria Lozano Díaz, religiosa (Colômbia)
Carlos Della Torre, sacerdote (Tailândia).
Matilde Salem, laica (Síria)
Andrea Majcen, sacerdote (Eslovênia)
Carlo Braga, sacerdote (Filipinas)
Antonino Baglieri, laico, (Itália)
Antonietta Böhm, religiosa (México)

segunda-feira, 24 de abril de 2017

SERMÃO SOBRE O CONHECIMENTO E A IGNORÂNCIA

I - O conhecimento das letras é bom para a instrução, mas o conhecimento da própria fraqueza é mais útil para a salvação. Aqui estou para cumprir o que vos prometi; aqui estou para satisfazer vosso desejo; aqui estou, também, obrigado pela dívida que tenho para com Deus, a quem sirvo. Como vedes, três são as razões que me impelem a pregar: o compromisso assumido, o amor fraterno e o temor a Deus.

Se me abstivesse de falar, pela minha boca condenar-me-ia. Mas o que acontece se eu falar? Também neste caso, corro o mesmo risco, o de ser condenado pela minha própria boca: por pregar e não praticar o que prego. Ajudai-me, pois, com vossas orações, para que eu possa sempre falar o que é necessário e, com minha conduta, praticar o que prego. Tinha vos anunciado o tema do sermão de hoje: a ignorância, ou melhor, as ignorâncias, porque, como lembrais, há duas ignorâncias: a de nós próprios e a de Deus. E vos aconselhava a evitar uma e outra, pois ambas são perdição.

Hoje procuraremos esclarecer melhor esse assunto. Antes, porém, discutiremos se toda ignorância é condenável. Parece-me que não, pois nem toda ignorância produz perdição: há muitas e mesmo inúmeras coisas que se podem ignorar sem problema algum para a salvação. Se alguém, por exemplo, desconhece artes mecânicas, como a carpintaria, a arte de edificação e outras que são exercidas para a utilidade da vida neste mundo, acaso tal ignorância constitui obstáculo para a salvação?

Também são muitos os que se salvaram e agradaram a Deus pela sua conduta e com seus atos sem as artes liberais (e, certamente, são úteis e moralmente bons esses estudos). Quantos não enumeram a Epístola aos Hebreus (cap. XI), que se tornaram agradáveis a Deus não com erudição, 'mas com consciência pura e fé sincera' (I Tim 1,5). E agradaram a Deus com os méritos de sua vida e não com os de seu saber. Cristo não foi buscar Pedro, André, os filhos de Zebedeu e todos os outros discípulos, entre filósofos; nem em escola de retórica e, no entanto, valeu-se deles para realizar a salvação na terra.

Não é porque fossem mais sábios do que todos os homens - como diz de si mesmo o Eclesiastes (1, 16) -, mas, por causa de sua fé e de sua benignidade, o Senhor os salvou e fez deles santos e mestres. Pois os Apóstolos mostraram ao mundo o caminho da vida, não com sublimidade de discurso, nem com palavras eloquentes de sabedoria humana, mas pelo modo como aprouve a Deus: pela estultícia de sua pregação, aprouve a Deus salvar os que creem, porquanto o mundo com sua sabedoria não O conheceu (I Cor 2, 1; 1, 17-21).

II - Posso estar dando a impressão de querer lançar em descrédito o saber, de repreender os doutos, de proibir o estudo das letras. Longe de mim tal atitude! Conheço muito bem o inestimável serviço que os homens doutos têm prestado à Igreja: seja refutando os adversários dela, seja na instrução dos simples. Com efeito, o que li na Sagrada Escritura foi: 'Como rejeitaste o saber, também Eu te rejeitarei, para que não exerças o meu sacerdócio' (Os 4, 6). E mais: 'Os doutos resplandecerão com o brilho do firmamento, e os que tiverem ensinado a muitos a justiça, brilharão como estrelas em perpétuo resplendor' (Dn 12, 3). Mas, por outro lado, li também: 'O saber incha' (I Cor 8, 1). E, finalmente: 'No acúmulo de saber, acumula-se a dor' (Ecl 1, 18).

Vede que há saberes e saberes: há um saber que produz o inchaço e há um saber que contrista. Quero que sejais capazes de distinguir qual deles é útil e necessário para a salvação: o que incha ou o que dói? E não duvido que prefiras o que aflige ao que incha, porque, se a saúde pela inchação é aparentada, pela aflição é procurada. Ora, quem procura, acaba encontrando, pois 'quem pede, recebe' (Lc 11,10). E é certo que Aquele que cura os que têm o coração contrito abomina o inchaço dos orgulhosos, pois a Sabedoria diz: 'Deus resiste aos soberbos e dá a sua graça aos humildes' (Tg 4,6). E o Apóstolo diz: 'Exorto-vos, em virtude do ministério que pela graça me foi dado, a não pretender saber mais do que convém, mas saber com sobriedade' (Rom 12,3).

O Apóstolo não proíbe saber, mas sim saber mais do que convém. E o que é saber com sobriedade? É cuidar de aplicar-se prioritariamente ao que mais interessa saber, pois o tempo é breve. Ora, ainda que todo saber, desde que submetido à verdade, seja bom, tu, que buscas com temor e tremor a salvação e a buscas apressadamente, dada a brevidade do tempo, deves aplicar-te a saber, antes e acima de tudo, o que conduz mais diretamente à salvação. Acaso não dizem os médicos do corpo que parte da medicina é precisamente determinar a ordem dos alimentos: qual deve ser ingerido antes, qual depois e o modo de os ingerir? Ora, mesmo sendo bons os alimentos que Deus criou, tu os tornas nocivos se não observas o modo e a ordem ao ingeri-los. Aplica, pois, aos saberes, o que dissemos dos alimentos.

III - Mas o melhor é encaminhar-vos ao Mestre. Não é nossa esta sentença, mas dEle; ou antes, é nossa porque a aprendemos dAquele que é a Verdade. E diz: 'Se alguém pensa que sabe alguma coisa, ainda não sabe como deveria saber' (I Cor 8,2). Vede como não é aprovado o saber muitas coisas se se ignora o modo de saber. Vede como o fruto e a utilidade do saber consiste no modo de saber. Mas o que é este modo de saber? O que, senão saber segundo a ordem, o amor e o fim devidos?

Segundo a ordem, isto é, priorizando o que é mais necessário para a salvação; segundo o amor, isto é, voltando-nos mais ardentemente para o que mais nos impele a amar; segundo o fim: não por vaidade ou curiosidade ou objetivos semelhantes, mas somente pela tua própria edificação e pela de teu próximo. Há quem busque o saber por si mesmo, conhecer por conhecer: é uma indigna curiosidade. Há quem busque o saber só para poder exibir-se: é uma indigna vaidade. Estes não escapam à mordaz sátira que diz: 'Teu saber nada é, se não há outro que saiba que sabes' (Persius, Satyra 1, 27). Há quem busque o saber para vendê-lo por dinheiro ou por honras: é um indigno tráfico. Mas há quem busque o saber para edificar, e isto é amor. E há quem busque o saber para se edificar, e isto é prudência.

IV - De todos estes que buscam o conhecimento, só os dois últimos não incorrem em abuso do saber, já que o buscam para praticar o bem. Deles é que fala o salmo: 'O saber é bom para quem o põe em prática' (Sl 111, 10). Os demais devem ouvir a Escritura: 'Quem conhece o bem e não o pratica, comete pecado' (Tg 4, 17). É como se, numa comparação, disséssemos: tomar alimento e não digeri-lo faz mal. Um alimento indigesto, mal cozinhado, produz maus humores e, em vez de nutrir o corpo, corrompe-o. Assim também pode dar-se o caso de o estômago da alma, que é a memória, ingerir muitos conhecimentos que não foram cozinhados pelo fogo do amor e nem passaram para ser elaborados pelo aparelho digestivo da alma (no caso, os atos e costumes), a fim de que a alma se torne boa pelo bom conhecimento (o que pode ser atestado pela vida e pelos costumes). E acaso um tal saber indigesto não deve ser considerado pecado, tal como um alimento que se transforma em humores maus e nocivos? E os maus humores do corpo não equivalem aos maus costumes da alma? E não virá a sofrer de inchaços e cólicas de consciência quem conhece o bem e não o pratica?

Acaso não se lhe aplicará a sentença de morte e condenação, toda vez que lhe vier à mente a palavra de Deus: 'O servo, que conhece a vontade de seu senhor e não a pratica, torna-se digno de muitos açoites' (Lc 12,47)? E não será em nome desta alma, o pranto do profeta (Jer 4,19): 'Doem-me as entranhas, doem-me as entranhas'? Gemidos geminados que - salvo outra interpretação - apontam para o que dizíamos: o profeta fala de si mesmo, pois estava pleno de saber, inflamado de amor e, desejando intensamente transmitir esse saber, não encontrou quem se interessasse por ouvir e teve de arcar sozinho com o peso de um saber que não pôde comunicar. Chorou, pois, o zeloso doutor da Igreja, tanto por aqueles que menosprezam a busca do saber que dirige o bem viver, como pelos que, embora sabendo, no entanto, vivem mal. E, por isso, o profeta repete o seu lamento.

V - Compreendes agora quão verdadeira é a sentença do Apóstolo: 'O saber incha'? Por isso, convém que a alma antes se conheça a si mesma, coisa que é requerida pela ordem e pela utilidade. Pela ordem, porque, para nós, o primeiro conhecimento deve ser o do que somos; pela utilidade, porque tal conhecimento não incha, mas humilha e serve de fundação para a edificação. Pois o edifício espiritual que não tem seu fundamento na humildade, não se aguenta em pé. E para aprender a humildade, a alma não encontra nada mais convincente do que descobrir-se a si mesma na verdade. Deve-se, portanto, evitar a dissimulação, o auto-engano doloso, deve o homem encarar-se de frente, evitando fugir de si mesmo.

Pois, defrontando-se a alma com a límpida luz da verdade, encontrar-se-á muito diferente do que julgava ser e, suspirando em sua miséria - uma miséria que já não pode esconder porque é verdadeira e manifesta - clamará com o salmista ao Senhor: 'Em Tua verdade me humilhaste' (Sl 119, 75). Como não se humilhará neste verdadeiro conhecimento de si, ao dar-se conta da carga de seus pecados, sob o peso deste corpo mortal, ao ver-se imersa em preocupações terrenas, infectada pelos desejos carnais, cega, curvada, fraca, envolta em mil pavores, angustiada ante mil dificuldades, sufocada ante mil dúvidas, indigente de mil necessidades, inclinada ao vício, impotente para as virtudes?

Onde está agora o olhar arrogante? Onde, a cabeça orgulhosamente erguida? Não será ela ainda mais arremessada em sua desolação, trespassada por espinhos? (Sl 32, 4). Que ela - diz o salmista - derrame lágrimas, que chore e gema, que se volte para o Senhor e clame em sua humildade: 'Cura, Senhor, minha alma, pois pequei contra Ti' (Sl 41,5). Se ela se voltar para o Senhor, encontrará consolo, pois Ele é o Pai das misericórdias e o Deus de toda consolação.

VI - Eu, quando olho para mim mesmo, fico imerso em amargura; logo, porém, que alço a vista para o auxílio da misericórdia divina, suaviza-se meu amargor com a alegria da visão de Deus e lhe digo: 'Minha alma está conturbada interiormente, por isso me lembro de Ti' (Sl 42,7). Basta um pouco de conhecimento de Deus para experimentar que Ele é piedoso e solícito, pois, na verdade, Ele é um Deus de bondade e misericórdia, que perdoa a maldade (Joel 2,13). Sua natureza é a bondade e é próprio dEle perdoar e ter misericórdia sempre.

Deus se dá a conhecer nesta experiência e desta maneira salutar, a partir do momento em que o homem se reconheça indigente e clame ao Senhor; e Ele o ouvirá e dir-lhe-á: 'Eu te libertarei e tu Me glorificarás' (Sl 50,15). Assim, o conhecimento próprio é um passo para o conhecimento de Deus. Vê-lo-ás em sua imagem, que em ti se forma, na medida em que tu, desarmado pela humildade, com confiança, irás refletindo a glória do Senhor e, levado pelo Espírito de Deus, de claridade em claridade, irás te transformando nessa imagem.

VII - Reparai, pois, como ambos os conhecimentos são necessários para a salvação, de tal modo que não pode faltar nenhum dos dois. Pois, se desconheces a ti mesmo, não terás temor de Deus em ti, nem humildade. Por acaso pensas que podes alcançar a salvação sem temor de Deus e sem humildade? [Neste momento, o auditório murmura: 'Não, não!']. Fizestes bem de indicar-me o 'não' absoluto de vosso juízo, ou antes, que não estais desprovidos de juízo. Nem vale a pena continuar falando sobre o óbvio. Mas, prestai atenção a um outro ponto...

Ou será melhor parar, por causa dos que já estão pestanejando? Eu pretendia, em um só sermão, dar conta do que tinha prometido: falar da dupla ignorância, e fá-lo-ia se não me parecesse que este discurso já está demasiadamente longo para os que o acham cansativo. E vejo alguns bocejando e outros dormitando. E não é de admirar, pois a longuíssima vigília de oração que tivemos hoje os desculpa. O que direi, porém, daqueles que dormem agora, mas dormiram também enquanto rezávamos os ofícios? Não quero, porém, levar isto adiante e envergonhá-los, basta ter mencionado o fato. Penso que de hoje em diante cuidarão de estar atentos, advertidos que foram pela nossa correção.

Com esta esperança e em atenção a eles, em vez de continuar, partamos, suspendendo por clemência o discurso, e demos-lhe fim, embora não tenha atingido seu fim. Eles, por sua vez, tendo sido objeto de nossa compreensão, associem-se a nós em glorificar o Esposo da Igreja, Nosso Senhor Jesus Cristo, que está acima de todas as coisas, Deus bendito pelos séculos. Amém.

(São Bernardo de Claraval)

domingo, 23 de abril de 2017

'MEU SENHOR E MEU DEUS!'

Páginas do Evangelho - Segundo Domingo da Páscoa


O segundo domingo do tempo pascal é consagrado como sendo o 'Domingo da Divina Misericórdia', com base no decreto promulgado pelo Papa João Paulo II na Páscoa do ano 2000. No Domingo da Divina Misericórdia daquele ano, o Santo Padre canonizou Santa Maria Faustina Kowalska , instrumento pelo qual Nosso Senhor Jesus Cristo fez conhecer aos homens Seu amor misericordioso: 'Causam-me prazer as almas que recorrem à Minha misericórdia. A estas almas concedo graças que excedem os seus pedidos. Não posso castigar, mesmo o maior dos pecadores, se ele recorre à Minha compaixão, mas justifico-o na Minha insondável e inescrutável misericórdia'.

No Evangelho deste domingo, Jesus já havia se revelado às santas mulheres, a Pedro e aos discípulos de Emaús. Agora, apresenta-Se diante os Apóstolos reunidos em local fechado e, uma vez 'estando fechadas as portas' (Jo 20, 19), manifesta, assim, a glória de Sua ressurreição aos discípulos amados. 'A paz esteja convosco' (Jo 20, 19) foi a saudação inicial do Mestre aos apóstolos mergulhados em tristeza e desamparo profundos. 'A paz esteja convosco' (Jo 20, 21) vai dizer ainda uma segunda vez e, em seguida, infunde sobre eles o dom do Espírito Santo para o perdão dos pecados: 'Recebei o Espírito Santo. A quem perdoardes os pecados, eles lhes serão perdoados; a quem os não perdoardes, eles lhes serão retidos' (Jo 20, 22-23), manifestação preceptora da infusão dos demais dons do Espírito Santo por ocasião de Pentecostes. A paz de Cristo e o Sacramento da Reconciliação são reflexos incomensuráveis do amor e da misericórdia de Deus. 

E eis que se manifesta, então, o apóstolo da incredulidade, Tomé, tomado pela obstinação à graça: 'Se eu não vir a marca dos pregos em suas mãos, se eu não puser o dedo nas marcas dos pregos e não puser a mão no seu lado, não acreditarei' (Jo 20, 25). E o Deus de Infinita Misericórdia se submete à presunção do apóstolo incrédulo ao lhe oferecer as chagas e o lado, numa segunda aparição oito dias depois, quando estão todos novamente reunidos, agora com a presença de Tomé, chamado Dídimo. 'Meu Senhor e meu Deus!' (Jo 20, 28) é a confissão extremada de fé do apóstolo arrependido, expressando, nesta curta expressão, todo o tesouro teológico das duas naturezas - humana e divina - imanentes na pessoa do Cristo.

'Bem-aventurados os que creram sem terem visto!' (Jo 20, 29) é a exclamação final de Jesus Ressuscitado pronunciada neste Evangelho. Benditos somos nós, que cremos sem termos vistos, que colocamos toda a nossa vida nas mãos do Pai, que nos consolamos no tesouro de graças da Santa Igreja. E bem aventurados somos nós que podemos chegar ao Cristo Ressuscitado com Maria, espelho da eternidade de Deus na consumação infinita da Misericórdia do Pai. 

sábado, 22 de abril de 2017

10 MANEIRAS DE EVITAR O PECADO

1. Rezar. Rezar de qualquer forma e de todas as maneiras possíveis, isso irá nos manter longe do pecado. Durante todo o dia, tentemos atirar flechas de comunicação com Deus, não importa se estivermos trabalhando, comendo, dirigindo, sentados, ajoelhados ou falando. É uma tentativa constante para manter tudo o que fazemos em união com Deus. Nós também precisamos desenvolver o hábito da oração que automaticamente entra em ação assim que estamos sendo tentados.

2. Mortificar o corpo. Em vez de sempre dar ao corpo o que ele quer, como alimentação, descanso, conforto, música, doces, prazer, precisamos fazer, através de pequenas maneiras, alguma mortificação no que ele exige todos os dias. O jejum e a abstinência são disciplinas importantes que formam a vontade para dizer não ao corpo e sim a Deus.

3. Aproveitar a graça de Deus por meio de confissões frequentes e a Santa Comunhão, que fornecem graças e força de vontade para as almas enfraquecidas. Na confissão, buscar ser muito humilde, contrito e honesto quanto à gravidade de seus pecados, mesmo que sejam embaraçosos para dizer. Nunca retenha nada com você.

4. Ter devoção à Virgem Maria. Maria é a medianeira de todas as graças que vêm de Deus. Se recorremos a ela em momentos de tentação, 'nunca se ouviu dizer que alguém tenha sido desamparado' (São Bernardo). Ela é a pureza virginal e quer ajudar-nos a permanecermos puros. Rezar Ave Marias até que as fortes tentações passem. Isso pode literalmente levar a centenas de Ave Marias por dia, mas vale a pena.

5. Evitar a ocasião de pecado. O que sempre leva ao pecado deve ser evitado como a peste. Todo tempo, toda maneira e todo lugar devem ser cautelosamente considerados e evitados se eles nos levam a pecar. Qualquer um que fale sobre o pecado, mostre o pecado ou incentive ao pecado é seu inimigo, e não seu amigo. São Jerônimo disse: 'Lembre-se de que uma mulher (Eva) expulsou os habitantes do paraíso, e que você não é mais santo do que Davi, mais forte do que Sansão, ou mais sábio do que Salomão, e todos caíram pelo intercurso do mal'.

6. Guardar os olhos. O piedoso Jó fez um pacto com os seus olhos que ele não olharia sequer para uma virgem. Nossos olhos levam a pensamentos que, em seguida, podem levar a ações. Olhe para longe de tudo que cause luxúria.

7. Manter-se ocupado. Muitos santos fizeram votos de nunca viver na ociosidade. Isso é uma grande ideia e permite fazer grandes coisas com a própria vida: 'mãos ociosas são a oficina do diabo'.

8. Lembrar-se das consequências dos pecados passados e a possibilidade de ser condenado para sempre por estes pecados. Meditar sobre a realidade da morte, julgamento, céu ou inferno. Rever em detalhes as torturas do inferno em relação aos prazeres instantâneos obtidos através do pecado.

9. Evitar a depressão. Lembre-se de como é triste a ideia de separação de Deus que se sente depois de pecar. Lembre-se da culpa, da vergonha e da tristeza causadas por esses pecados. Você gostaria que o mundo todo estivesse olhando para o seu pecado? Deus, Maria, seu anjo da guarda estão assistindo cada detalhe. E na segunda vinda de Jesus, tudo será tornado público.

10. Ajudar outras pessoas a parar de pecar. Assim como tentamos salvar nossas almas com a ajuda de Deus, também devemos viver para salvar outras almas. Fica mais fácil viver uma vida boa, se estamos ajudando os outros a viverem vidas santas. Sermos profetas hoje para dizer às pessoas que o pecado ainda é pecado e que ofende e crucifica Nosso Senhor.

('10 Traditional Catholic Practices To Get Out Of Habitual Sin Especially Of The Flesh', Pe. Peter Carota, in memoriam, publicado originalmente em Traditional Catholic Priest, tradução Sensus fidei)

sexta-feira, 21 de abril de 2017

LUZ NAS TREVAS DA HERESIA PROTESTANTE (XI)

Sétima Objeção* do crente: apresentar um texto das Sagradas Escrituras que prove que os padres podem perdoar os pecados.

Em sétimo lugar, o crente pede um texto, que prove que os padres podem perdoar os pecados. Pois não; seguem-se aqui os textos; porém espero que o amigo crente há de citar-me também um texto que prove que os padres não podem perdoar os pecados, um só... É pouca exigência, não é? Certo de que o tal texto nunca será apresentado, eu vou já satisfazer o meu crente, e até além de seu pedido.

I. O que é a confissão

O que é a confissão? É um sacramento instituído por Jesus Cristo no qual o sacerdote, em nome de Deus, perdoa os pecados cometidos depois do batismo. Qualquer criança de catecismo sabe isso de cor. Eis a asserção; escute agora as provas. Diga lá: Os homens precisam ou não precisam de perdão?Isto é: os homens pecam ou não pecam? O Espírito Santo responde por todos, até pelos biblistas. 'O justo cai sete vezes por dia' (Pv 24,16). E se o próprio justo cai sete vezes, que será do pobre que não é justo? 

'Não há homem que não peque' (Ecle 7,21). 'E aquele que diz que não tem pecado', diz São João, 'faz Deus mentiroso' (I Jo 1,10). Ora, se todo homem é pecador, e se o pecado não pode entrar no céu, deve haver um meio de alcançar perdão deste pecado, visto o homem ser destinado ao céu. 'Nesta porta do Senhor, só o justo pode entrar' (Sl 117,20). 'Não sabeis que os pecadores não possuirão o reino de Deus?' (I Cor 6,9).

II. Sua necessidade

E qual é este meio? É a confissão, nos diz São João. 'Se confessarmos os nossos pecados', diz o apóstolo, 'ele é fiel e justo para nos perdoar os pecados e purificar-nos de toda injustiça' (I Jo 1,8). Examine isso, amigo crente, se o texto figura em sua Bíblia. O Espírito Santo o tinha dito já muito antes do Apóstolo: 'Aquele que esconde seus crimes não será purificado; aquele, ao contrário, que se confessar e deixar seus crimes, alcançará a misericórdia' (Pv 28,13). 'Não vos demoreis no erro dos ímpios', diz ainda o Espírito Santo, 'mas confessai-vos antes de morrer' (Ecli 17,26).

Eis a necessidade de confissão para todos os homens, antes de Jesus Cristo, como depois. De fato mostrarei que a confissão não é propriamente uma criação nova feita por Jesus Cristo, mas, que existindo já no Antigo Testamento, foi por ele elevada à dignidade de sacramento. Modificou-a, sem dúvida, porém já havia entre os judeus uma coisa que muito se lhe assemelhava. Jesus Cristo, conhecendo a fraqueza humana e querendo salvar seus filhos, instituiu este grande sacramento de misericórdia.

Escute bem, caro crente, e além dos textos do bom senso, verifique bem os textos das Escrituras, que são claros e positivos. Vou provar-lhe aqui duas coisas: (i) que Cristo podia perdoar os pecados; (ii) que Ele comunicou este mesmo poder aos apóstolos, que eram os primeiros padres.

III. Cristo pode perdoar pecados

Diz São Mateus (9, 2-7): 'Jesus curou um homem paralítico e lhe disse: tem confiança – os teus pecados te são perdoados'. Dizem os Judeus: 'Este blasfema'. Jesus responde que faz este milagre para que saibam que: 'O Filho do Homem tem, na terra, o poder de perdoar os pecados' (Mt 9,6). E a multidão, vendo isto, maravilhou-se e glorificou a Deus que dava tal poder aos homens (Mt 9,8). Que quer dizer isto, amigo biblista?

Agora um pouco de reflexão sobre o texto inspirado no Evangelho. Jesus Cristo faz aqui um milagre para provar que, como homem, pode perdoar os pecados, por isso ele diz: 'O Filho do homem tem, na terra, o poder de perdoar os pecados' (Mt 9,6). E o povo glorifica a Deus, que deu tal poder aos homens (Mt 9,8). Eis uma prova de que Jesus Cristo, mesmo como homem, havia recebido este poder de seu Pai.

IV. Comunicou este poder

E como comunicou ele este poder aos seus apóstolos? Escute bem, porque aqui está a força do argumento católico e a ruína da negação protestante. No dia da sua ressurreição, como para significar que a confissão é uma espécie de ressurreição espiritual do pecador, apareceu no meio dos apóstolos e, mostrando-lhes as suas mãos e seu lado, lhes disse: 'A paz seja convosco. Assim como meu Pai me enviou, eu vos envio a vós' (Jo 21,21).

Ora, Jesus Cristo, como homem, tinha, como acabo de mostrá-lo, recebido de seu Pai o poder de perdoar os pecados; logo, ele deu este poder aos seus apóstolos. Nota bem cada palavra deste texto, pois Cristo sabia falar e compreendia a significação de cada palavra. Ele diz: 'Assim como meu Pai me enviou', isto é, com o poder de perdoar os pecados, 'assim eu vos envio a vós', isso é, eu vos envio dotados do mesmo poder, fazendo o que fiz, perdoando os pecados, como eu os perdoei. Pode ser mais claro e mais positivo?

E, para dissipar a última possibilidade de dúvida ou de sofisma, Cristo continua, soprando sobre eles (Jo 21, 22): 'Recebei o Espírito Santo' como se dissesse: 'Recebei um poder divino: só Deus pode perdoar pecados; pois bem recebei este poder divino' (Jo 21,22). 'Àquele a quem perdoares os pecados, ser-lhes-ão perdoados, e àqueles a quem os retiverdes, ser-lhes-ão retidos' (Jo 21,23). Pode isso ser mais claro? Impossível! Veja o mesmo texto em São Mateus (18,18).

A conclusão é rigorosa: Cristo podia perdoar os pecados. Ele comunicou este poder aos apóstolos e, por eles, aos sucessores dos apóstolos; pois a Igreja é uma sociedade que deve durar até ao fim do mundo (Mt 28,20). Se Cristo deu aos sacerdotes o poder de perdoar os pecados, impôs aos fiéis o dever de confessar estes pecados, porque poder e dever são correlativos. Todo poder impõe um dever, e não pode haver poder numa pessoa sem que exista um dever numa outra pessoa. Eis a instituição divina da confissão provada por muitos textos e com uma lógica irrefutável.

Só um cego para não ver e protestante obcecado para não compreender. Para que serve então a bíblia, se os textos mais claros não são compreendidos: só sendo castigo de Deus! 'Têm olhos e não enxergam', diz o salmista: 'têm ouvidos e não ouvem' (Sl 113, 5-6).

V. No Antigo Testamento

Sendo este assunto de inigualável importância e sendo contra ele que os protestantes costumam dirigir suas baterias de ódio, não será inútil entrar em mais alguns pormenores deste grande sacramento da misericórdia divina. Quero mostrar-lhe, caro crente, que o senhor nem sabe ler sua Bíblia, nem compreender os seus ensinamentos. Não somente a confissão existe como sacramento, instituído por Jesus Cristo, mas já existia uma espécie de confissão no Antigo Testamento, de que a Bíblia fala em muitos lugares. Escute bem, sim? E verifique os textos.

Eis um texto dos Números I (5, 6-7): 'Quando um homem ou uma mulher tiver cometido um dos pecados mais comuns à humanidade, ou por negligência tiver violado os mandamentos do Senhor, confessará os pecados, restituirá àquele contra quem pecou a justa indenização do mal que lhe tiver causado, juntando-lhe a quinta parte'. Aí está não só a confissão, mas ainda a penitência e a restituição, absolutamente como faz a Igreja Católica. 

Este Moisés era bem pouco protestante, não acha, amigo crente? Já prescrevia a confissão, antes da vinda de Cristo; é por isso que Jesus disse que não vinha destruir a lei, mas cumpri-la, e que São Mateus diz que os profetas e a lei, até João, profetizaram (Mt 11,13). Eis, pois, a profecia da nossa confissão e a resposta, ou condenação antecipada da negação protestante. Há muitos outros textos deste gênero, porém seria fastidioso prolongá-los (por exemplo: Pv 28,13; Ecli 6,24).

No tempo da vinda de Jesus existia essa prática da confissão, como se pode ver na pregação de João Batista, onde é dito que todos vinham ter com ele, da região da Judéia e de Jerusalém, confessavam os seus pecados e ele os batizava no rio Jordão (Mt 3, 5-6). Que bomba para os batistas, que imitam tão pouco seu modelo! Vê-se que São João Batista não tinha nada de protestante, nem de batista! Não somente São Mateus (3,6) e São Marcos (1,5) mostram a confissão usada entre os judeus, mas o livro dos Atos refere que quem se convertia vinha fazer a confissão das suas culpas (At 19,18). Daquela época até hoje, a história atesta que sempre a confissão foi praticada pelos cristãos: imperadores, reis, bispos, sacerdotes, assim como pelos simples fiéis dos quais citam os confessores.

VI. Confessar-se a Deus

E não objetem os cegos protestantes, no afã inglório de fabricar objeções, que tal confissão consistia em confessar os pecados a Deus. É preciso ser cego para não ver o absurdo de tal subterfúgio. Pensariam eles que um criminoso prestes a ser executado faria realmente uma confissão, se se contentasse de confessar os seus pecados a Deus, no coração? Não. Cada execução que se tem efetuado, tem provado justamente o contrário.

A confissão é a revelação do pecado a um homem. Para que confessar seus pecados a Deus? Deus conhece todas as coisas e não tem que fazer com tal confissão. Além disso, vê-se no texto dos Números que a confissão devia ser feita a um homem, como a restituição da coisa tomada. Aliás, São Tiago é explícito a esse respeito: 'Confessai os vossos pecados uns aos outros', diz ele, 'e orai uns pelos outros, a fim de que sejais salvos' (Tg 5,16). Uns aos outros! Isto é: confessai os vossos pecados a um homem, que tenha recebido o poder de perdoá-los.

São Tiago fala aqui na confissão dos pecados, pública ou particular, porque tanto uma como outra é suficiente, e da confissão feita aos sacerdotes, que são os únicos que tem o poder de absolver. De que serviria, com efeito, confessar pecados íntimos ao público, que não os pode absolver, e ficaria escandalizado? Além disto, quem quereria confessar os seus pecados àqueles que poderiam divulgá-los e fazer perder a boa reputação? Os protestantes gritam contra a confissão auricular, isto é, particular, feita na intimidade. Sendo só isso, fiquem sossegados, pois, se a confissão auricular é suficiente, não é exigida e é permitido fazer a confissão pública, até na praça pública, se quiserem: basta o sacerdote estar presente para absolver. Deus não exige isso, pois em parte alguma figura a palavra confissão pública; porém, querendo fazer mais do que a lei ordena, é permitido.

VII. A declaração dos pecados

Agora mais um pequeno raciocínio sobre os muitos textos já citados, meu caro crente. Está, pois, bem provado que o padre pode perdoar os pecados; nada mais claro: 'Aquele a quem perdoardes os pecados, serão perdoados' (Jo 20,13). Convém notar que ninguém pode perdoar sem saber o que perdoa. Não é assim? O sacerdote é um juiz que deve decidir quais são os pecados que devem ser absolvidos. Ora, um juiz não pode pronunciar uma decisão sem ter conhecimento da causa. É, pois, necessário o pecador declarar seus pecados ao sacerdote. A conclusão é inevitável.

E não dizer – como certos crentes fazem – que o padre não é juiz, mas declara apenas que os pecados são perdoados. Não! O poder, que Jesus Cristo deu aos apóstolos, é o poder de ligar e de desligar e não o poder de declarar que o penitente está ligado ou desligado. Cristo disse, antes de comunicar este poder: 'Eu vos darei as chaves do reino do céu' (Mt 16,19). Ora, as chaves são dadas para abrir e fechar a porta, e não para declarar que a porta está aberta ou fechada. Santo Agostinho diz muito a propósito: 'Peço diante de Deus, que conhece o meu coração e me perdoará. Jesus Cristo teria dito, então, sem razão: o que desligardes na terra será desligado no céu? Foram então as chaves dadas à Igreja, sem algum fim?' (Rm 10,49 t. 10).

VIII. Conclusão

Eis, caros protestantes, provado pelo bom senso e pela Bíblia que a confissão não é invenção dos padres, mas uma instituição verdadeiramente divina. Instituição figurada e praticada no Antigo Testamento, e elevada por Jesus Cristo à dignidade de sacramento, da nova lei. O Antigo Testamento era figura da realidade instituída por Cristo. Examinai pois as escrituras, amigos, e sabereis compreender o que elas ensinam e prescrevem: 'A letra mata, o espírito vivifica' (2 Cor 3,6). É preciso não somente ler, mas compreender a Bíblia, do contrário, não passam de simples papagaios ou araras. A Igreja Católica não receia a luz, nem o estudo, só receia a ignorância.

* Esta 'objeção' foi proposta por 'um crente' como um desafio público ao Pe. Júlio Maria e que foi tornado público durante as festas marianas de 1928 em Manhumirim, o que levou às refutações imediatas do sacerdote, e mais tarde, mediante a inclusão de respostas mais abrangentes e detalhadas, na publicação da obra 'Luz nas Trevas - Respostas Irrefutáveis às Objeções Protestantes', ora republicada em partes neste blog.

(Excertos da obra 'Luz nas Trevas - Respostas Irrefutáveis às Objeções Protestantes', do Pe. Júlio Maria de Lombaerde)

quinta-feira, 20 de abril de 2017

PALAVRAS DE SALVAÇÃO


A sabedoria deste mundo está em esconder as maquinações do coração, velar o sentido das palavras, mostrar como o verdadeiro é falso, demonstrar ser errado aquilo que é verdadeiro. Pelo contrário, a sabedoria dos justos consiste em nada fingir por ostentação; declarar o sentido das palavras; amar as coisas verdadeiras como são; evitar as falsas; fazer o bem gratuitamente; preferir tolerar de bom grado o mal a fazê-lo; não procurar vingança contra a injúria; reputar lucro a afronta em bem da verdade. Zomba-se, porém, desta simplicidade dos justos porque para os prudentes deste mundo a virtude da pureza de coração é tida por loucura. Tudo quanto se faz com inocência, eles reputam tolice e aquilo que a verdade aprova nas ações, soa falso à sabedoria humana.

(São Gregório Magno)

quarta-feira, 19 de abril de 2017

CAMPANHAS DA FRATERNIDADE NO BRASIL (III)

TERCEIRA FASE: 1985 - 1999

A partir de 1985, o foco, o temário e os objetivos das Campanhas da Fraternidade deixam de ter caráter abrangente e se voltam para questões e problemas sociais mais específicos à realidade do Brasil: a educação, a fome, o desemprego, a moradia, a questão da terra, a situação da mulher, dos negros e dos encarcerados. A sistemática da campanha adota os mesmos princípios da fase anterior, fundamentada na proposição de um texto-base comum que subsidia todas as ações e iniciativas no âmbito da respectiva Campanha da Fraternidade. Embora essa perspectiva seja ainda bem atual, a fixação do limite desta fase em 1999 tem a ver com a transposição do milênio e porque exatamente no ano 2000, tiveram início as chamadas Campanhas da Fraternidade Ecumênicas no Brasil.

22. CAMPANHA DA FRATERNIDADE DE 1985


Tema: Fraternidade e fome

Lema: Pão para quem tem fome

Objetivo Geral: Contribuir para motivar a comunidade cristã a assumir sua responsabilidade ante a situação de fome que existe no Brasil.




23. CAMPANHA DA FRATERNIDADE DE 1986


Tema: Fraternidade e terra

Lema: Terra de Deus, Terra de Irmãos

Objetivo Geral: A CF convoca-nos para uma ação conjunta de preces, reflexões e mobilização sobre o gravíssimo problema da questão da terra no Brasil a ser solucionado, ou seja, dentro da justiça e da fraternidade.



24. CAMPANHA DA FRATERNIDADE DE 1987

Tema: A Fraternidade e o menor

Lema: Quem acolhe o menor, a mim acolhe

Objetivo Geral: Um dos importantes caminhos que se apresentam é buscar a transformação evangélica da pessoa e da sociedade, a partir da questão do menor, colocando-o, portanto, no centro de nossas comunidades e de nossos projetos.



25. CAMPANHA DA FRATERNIDADE DE 1988


Tema: A Fraternidade e o negro

Lema: Ouvi o clamor deste povo

Objetivo Geral: Nossa adesão a Jesus Cristo, renovando o compromisso de viver em fraternidade, porque este é o sinal mais autêntico do seguimento do Senhor: 'Nisto saberão todos que sois meus discípulos, se vos amardes uns aos outros' (Jo 13, 34-35).


26. CAMPANHA DA FRATERNIDADE DE 1989

Tema: A Fraternidade e a comunicação

Lema: Comunicação para a verdade e a paz

Objetivo Geral: Despertar a consciência crítica do receptor no uso da mídia, como atitude interior necessária para a comunicação da verdade e da paz; quer também conscientizar os receptores sobre seu papel de agentes de influência na orientação de programas nos meios de comunicação.


27. CAMPANHA DA FRATERNIDADE DE 1990


Tema: A Fraternidade e a mulher

Lema: Mulher e Homem: Imagem de Deus

Objetivo Geral: Conscientizar que mulher e homem juntos são imagem de Deus e que Deus entregou a criação a todos. Ajudar a ver como, na realidade, a mulher não é reconhecida e tratada como igual ao homem.



28. CAMPANHA DA FRATERNIDADE DE 1991

Tema: A Fraternidade e o mundo do trabalho

Lema: Solidários na dignidade do trabalho

Objetivo Geral: Que a Igreja e as pessoas de boa vontade assumam a realidade do trabalho e do mundo do trabalho, com todas as suas dimensões de criação, progresso, conflito, divisões e solidariedade, como lugar teológico para a evangelização, o anúncio da Boa Nova no mundo de hoje.



29. CAMPANHA DA FRATERNIDADE DE 1992

Tema:Fraternidade e juventude

Lema: Juventude - Caminho Aberto

Objetivo Geral: Que a Igreja e as pessoas de boa vontade se comprometam com a juventude, como agentes de uma nova evangelização e como força transformadora da Igreja e da sociedade.



30. CAMPANHA DA FRATERNIDADE DE 1993


Tema: Fraternidade e moradia

Lema: Onde Moras?

Objetivo Geral: Afirmar o direito à terra e à moradia como condição básica para o desenvolvimento de vida plena do indivíduo, da família, da fraternidade, e do exercício da cidadania.



31. CAMPANHA DA FRATERNIDADE DE 1994


Tema: A Fraternidade e a família

Lema: A Família, como vai?

Objetivo Geral: Redescobrir os valores da família: lugar de encontro, espaço de vivência humana, ponto de partida de um mundo mais humano e de acordo com o Plano de Deus.



32. CAMPANHA DA FRATERNIDADE DE 1995

Tema: A Fraternidade e os excluídos

Lema: 'Eras Tu, Senhor?!'

Objetivo Geral: Quer contemplar aqueles que seriam os mais abandonados, os que se sentem esquecidos, negados na sua humanidade. E não se refere só aos excluídos pela situação econômica.



33. CAMPANHA DA FRATERNIDADE DE 1996


Tema: Fraternidade e Política

Lema: Justiça e Paz se abraçarão

Objetivo Geral: Contribuir para a formação política dos cristãos para que exerçam sua cidadania sendo sujeitos da construção de uma sociedade justa e solidária.




34. CAMPANHA DA FRATERNIDADE DE 1997


Tema: A Fraternidade e os Encarcerados

Lema: Cristo liberta de todas as prisões

Objetivo Geral: Despertar a sensibilidade e solidariedade dos cristãos, e de todos os homens e mulheres de boa vontade, para com as vítimas e para com os encarcerados, ajudando-os a perceber a realidade carcerária do Brasil.



35. CAMPANHA DA FRATERNIDADE DE 1998


Tema: Fraternidade e Educação

Lema: A Serviço da Vida e da Esperança

Objetivo Geral: Colaborar com as pessoas na sua busca de realização; favorecer a criação e o fortalecimento de comunidades onde todos participem e se apoiem fraternalmente; estimular o exercício da cidadania, em favor de uma sociedade justa e solidária.


36. CAMPANHA DA FRATERNIDADE DE 1999


Tema: A Fraternidade e os Desempregados

Lema: Sem trabalho… Por quê?

Objetivo Geral: Contribuir para que a comunidade eclesial e a sociedade se sensibilizem com a grave situação dos desempregados, conheçam as causas e as articulações que a geram e as consequências que dela decorrem.