sexta-feira, 31 de julho de 2015

UMA VOZ ALÉM DA MORTE


Clelia Barbieri nasceu em Le Budrie, perto de Bologna, na Itália, em 13 de fevereiro de 1847 e morreu aos 23 anos em 13 de julho de 1870. Sua curta vida foi marcada por uma intensa vida apostólica (foi a fundadora de mais tenra idade de uma comunidade religiosa na história da Igreja Católica - a Congregação das Irmãs Mínimas de Nossa Senhora das Dores) e por prodígios maravilhosos.

Clelia tinha apenas 20 anos quando, já tendo feito os votos privados de pobreza, de castidade e de obediência, inspirou uma pequena comunidade de jovens mulheres devotas a uma vida de apostolado, caridade e assistência aos mais pobres. A primeira casa religiosa foi inaugurada em Le Budrie em primeiro de maio de 1868; as mulheres dedicavam-se à oração, leitura espiritual e trabalho, que consistia de costura, fiação e tecelagem. E diversos fatos sobrenaturais como curas, premonições e donativos que chegavam nas horas mais precisas, marcaram o início da pequena comunidade. Clélia prenunciou ainda o desenvolvimento da congregação e sua morte para breve. 

Com efeito, doente de tuberculose, morreu em 13 de julho de 1870, com apenas 23 anos de idade, quando a comunidade tinha somente cerca de uma dezena de jovens mulheres. Suas últimas palavras foram proféticas: 'Sede corajosas porque eu estou indo para o Paraíso; mas vou permanecer sempre convosco e nunca vos abandonarei'! Seus restos mortais repousam na capela da igreja da ordem em Le Boudrie (que foi elevada a santuário em 1993). A congregação recebeu posteriormente a denominação e a aprovação formal pelo Vaticano e atualmente compreende trinta e cinco instituições na Itália, e casas da ordem foram abertas na Índia e na Tanzânia, fundamentadas nas regras de vida de sua santa e jovem fundadora. Mas o seu maior prodígio estaria além da morte.

Exatamente um ano após a morte de Clelia, as irmãs estavam reunidas em oração na capela, quando começaram a entoar um coro. Neste momento, ocorreu um fato espantoso: o som claríssimo de uma voz aguda, harmoniosa e celestial começou a acompanhá-las no coro; uma voz extraordinária - a voz de Clelia - que podia ser ouvida e sentida como um fluxo de ar entre as irmãs. Tomadas de espanto, mas também de um júbilo especial, as irmãs encerraram o coro. Em seguida, resolveram passar a noite em adoração ao Santíssimo Sacramento, em uma igreja próxima (porque não disponível na capela). E o fato extraordinário se reproduziu: a mesma voz as acompanhou durante todas as orações e por toda a noite! E, desde aquele dia, tem sido uma companhia constante às casas da ordem, nos mais diversos ambientes e condições.

Há quase 150 anos, desde a sua morte, a voz celestial de Clelia tem sido periodicamente ouvida nas casas da ordem, acompanhando as irmãs em seus hinos, orações e leituras religiosas; acompanhando o sacerdote durante a celebração da Santa Missa na comunidade; em italiano em Le Budrie, na língua suaíli na missão da Tanzânia, na língua malayalam na missão na Índia e em latim, quando as irmãs rezam nesta língua. A escuta da voz de Clelia tem sido confirmada por centenas de testemunhas, que confirmam ouvi-la de forma claríssima como uma voz celestial, tão doce e tão harmoniosa, que não se compara a nada que possa existir neste mundo. Dezenas destes testemunhos, sob juramento perante tribunais eclesiásticos que investigaram o prodígio, levaram à beatificação solene de Clelia Barbieri em 27 de outubro de 1968 e à sua canonização pelo Papa João Paulo II, em 9 de abril de 1989. No ano seguinte, foi outorgada a ela o título de 'padroeira das catequistas'.

quinta-feira, 30 de julho de 2015

CATECISMO DA IGREJA: OS MISTÉRIOS DE MARIA

MARIA NO MISTÉRIO DE CRISTO

488 − «Deus enviou o seu Filho» (GI 4, 4). Mas, para Lhe «formar um corpo» (129), quis a livre cooperação duma criatura. Para isso, desde toda a eternidade, Deus escolheu, para ser a Mãe do seu Filho, uma filha de Israel, uma jovem judia de Nazaré, na Galileia, «virgem que era noiva de um homem da casa de David, chamado José. O nome da virgem era Maria» (Lc1, 26-27).

492 − Este esplendor de uma «santidade de todo singular», com que foi «enriquecida desde o primeiro instante da sua conceição» (141), vem-lhe totalmente de Cristo: foi «remida dum modo mais sublime, em atenção aos méritos de seu Filho» (142). Mais que toda e qualquer outra pessoa criada, o Pai a «encheu de toda a espécie de bênçãos espirituais, nos céus, em Cristo» (Ef 1, 3). «N'Ele a escolheu antes da criação do mundo, para ser, na caridade, santa e irrepreensível na sua presença» (Ef 1, 4).

501 − Jesus é o filho único de Maria. Mas a maternidade espiritual de Maria (169) estende-se a todos os homens que Ele veio salvar: «Ela deu à luz um Filho que Deus estabeleceu como "primogênito de muitos irmãos" (Rm 8, 29), isto é, dos fiéis para cuja geração e educação Ela coopera com amor de mãe» (170)

506 − Maria é virgem, porque a virgindade é nela o sinal da sua fé, «sem a mais leve sombra de dúvida» (177) e da sua entrega sem reservas à vontade de Deus (178). É graças à sua fé que ela vem a ser a Mãe do Salvador: «Beatior est Maria percipiendo fïdem Christi quam concipiendo carnem Christi – Maria é mais feliz por receber a fé de Cristo do que por conceber a carne de Cristo» (179).

507 − Maria é, ao mesmo tempo, virgem e mãe, porque é a figura e a mais perfeita realização da Igreja (180): «Por sua vez, a Igreja, que contempla a sua santidade misteriosa e imita a sua caridade, cumprindo fielmente a vontade do Pai, torna-se também, ela própria, mãe, pela fiel recepção da Palavra de Deus: efetivamente, pela pregação e pelo Batismo, gera, para uma vida nova e imortal, os filhos concebidos por ação do Espírito Santo e nascidos de Deus. E também ela é virgem, pois guarda fidelidade total e pura ao seu esposo» (181).

MARIA NO MISTÉRIO DA IGREJA

964 − O papel de Maria em relação à Igreja é inseparável da sua união com Cristo e decorre dela diretamente. «Esta associação de Maria com o Filho na obra da salvação, manifesta-se desde a concepção virginal de Cristo até à sua morte» (527). Mas é particularmente manifesta na hora da sua paixão.

967 − Pela sua plena adesão à vontade do Pai, à obra redentora do Filho e a todas as moções do Espírito Santo, a Virgem Maria é para a Igreja o modelo da fé e da caridade. Por isso, ela é «membro eminente e inteiramente singular da Igreja» (533) e constitui mesmo «a realização exemplar»,o typus, da Igreja (534).

968 − Mas o seu papel em relação à Igreja e a toda a humanidade vai ainda mais longe. Ela «cooperou de modo inteiramente singular, com a sua fé, a sua esperança e a sua ardente caridade, na obra do Salvador, para restaurar nas almas a vida sobrenatural. É, por essa razão, nossa Mãe, na ordem da graça» (535).

971 − «Todas as gerações me hão-de proclamar ditosa» (Lc 1, 48): «a piedade da Igreja para com a santíssima Virgem pertence à própria natureza do culto cristão» (539). A santíssima Virgem «é com razão venerada pela Igreja com um culto especial. E, na verdade, a santíssima Virgem é, desde os tempos mais antigos, honrada com o título de "Mãe de Deus", e sob a sua proteção se acolhem os fiéis implorando-a em todos os perigos e necessidades [...]. Este culto [...], embora inteiramente singular, difere essencialmente do culto de adoração que se presta por igual ao Verbo Encarnado, ao Pai e ao Espírito Santo, e favorece-o poderosamente» (540). Encontra a sua expressão nas festas litúrgicas dedicadas à Mãe de Deus (541) e na oração mariana, como o santo rosário, «resumo de todo o Evangelho» (542).

972 − Depois de termos falado da Igreja, da sua origem, missão e destino, não poderíamos terminar melhor do que voltando a olhar para Maria, a fim de contemplar nela o que a Igreja é no seu mistério, na sua «peregrinação da fé», e o que será na pátria ao terminar a sua caminhada, onde a espera, na «glória da santíssima e indivisa Trindade» e «na comunhão de todos os santos» (543), Aquela que a mesma Igreja venera como Mãe do seu Senhor e como sua própria Mãe: «Assim como, glorificada já em corpo e alma, a Mãe de Jesus é imagem e início da igreja que se há-de consumar no século futuro, assim também, brilha na terra como sinal de esperança segura e de consolação, para o povo de Deus ainda peregrino» (544).

MARIA NO MISTÉRIO DA ORAÇÃO

2675 − Foi a partir desta singular cooperação de Maria com a ação do Espírito Santo que as Igrejas cultivaram a oração à santa Mãe de Deus, centrando-a na pessoa de Cristo manifestada nos seus mistérios. Nos inúmeros hinos e antífonas em que esta oração se exprime, alternam habitualmente dois movimentos: um «magnifica» o Senhor pelas «maravilhas» que fez pela sua humilde serva e, através d'Ela, por todos os seres humanos (23); o outro confia à Mãe de Jesus as súplicas e louvores dos filhos de Deus, pois Ela agora conhece a humanidade que n'Ela foi desposada pelo Filho de Deus.

2679 − Maria é a orante perfeita, figura da Igreja. Quando Lhe oramos, aderimos com Ela ao desígnio do Pai, que envia o seu Filho para salvar todos os homens. Como o discípulo amado, nós acolhemos em nossa casa (28) a Mãe de Jesus que se tornou Mãe de todos os viventes. Podemos orar com Ela e orar-Lhe a Ela. A oração da Igreja é como que sustentada pela oração de Maria. Está-lhe unida na esperança (29).

quarta-feira, 29 de julho de 2015

SERMÕES DO CURA D'ARS (IV)

SOBRE A PUREZA


Nós lemos no Evangelho, que Jesus Cristo, querendo ensinar ao povo que vinha em massa, aprender dele o que era preciso fazer para ter a vida eterna, sentou-se e lhes disse: 'Bem-aventurados os puros de coração, porque eles verão a Deus'. Se nós tivéssemos um grande desejo de ver a Deus, meus irmãos, só estas palavras não seriam acaso suficientes para nos fazer compreender quanto a pureza nos torna agradáveis a Ele, e quanto ele nos é necessária? Pois, segundo Jesus Cristo, sem ela, nós não o veremos jamais! 

'Bem-aventurados', nos diz Jesus Cristo, 'os puros de coração, porque eles verão o bom Deus'. Pode-se acaso esperar maior recompensa que a que Jesus Cristo liga a esta bela e amável virtude, a saber, a posse das Três Pessoas da Santíssima Trindade, por toda a eternidade? São Paulo, que conhecia bem o preço desta virtude, escrevendo aos coríntios, lhes diz: 'Glorificai a Deus, pois vós o levais em vossos corpos; e sede fiéis em conservá-los em grande pureza. Lembrai-vos bem, meus filhos, de que vossos membros são membros de Jesus Cristo, e que vossos corações são templos do Espírito Santo. Tomai cuidado de não os manchar pelo pecado, que é o adultério, a fornicação, e tudo aquilo que pode desonrar vossos corpo e vosso coração aos olhos de Deus' (I Cor, 6, 15-20).

Ó meus irmãos, como esta virtude é bela e preciosa, não somente aos olhos dos homens e dos anjos, mas aos olhos do próprio Deus. Ele faz tanto caso dela que não cessa de a louvar naqueles que são tão felizes de a conservar. Também, esta virtude inestimável constitui o mais belo adorno da Igreja, e, por conseguinte, deveria ser a mais querida dos cristãos. Nós, meus irmãos, que no Santo Batismo fomos aspergidos com o sangue adorável de Jesus Cristo, que é a própria pureza; neste sangue adorável que gerou tantas virgens de um e outro sexo; nós, a quem Jesus Cristo fez participantes de sua pureza, tornando-nos seus membros, seu templo!

Mas, ai! meus irmãos, neste infeliz século de corrupção em que vivemos, não se conhece mais esta virtude, esta celeste virtude que nos torna semelhantes aos anjos! Sim, meus irmãos, a pureza é uma virtude que nos é necessária a todos, pois que, sem ela, ninguém verá o Bom Deus. Eu queria fazer-vos conceber desta virtude uma ideia digna de Deus, e vos mostrar quanto ela nos torna agradáveis a seus olhos, dando um novo grau de santidade a todas as nossas ações, e o que nós devemos fazer para conservá-la.

I – Quanto a pureza nos torna agradáveis a Deus

Seria preciso, meus irmãos, para vos fazer compreender bem a estima que devemos ter desta incomparável virtude, para vos fazer a descrição de sua beleza, e vos fazer apreciar bem seu valor junto de Deus, seria preciso, não um homem mortal, mas um anjo do céu. Ouvindo-o, vós diríeis com admiração: como todos os homens não estão dispostos a sacrificar tudo antes que perder uma virtude que nos une de uma maneira íntima com Deus? Procuremos, contudo, conceber dela alguma coisa, considerando que dita virtude vem do céu, que ela faz descer Jesus Cristo sobre a terra, e que eleva o homem até o céu, pela semelhança que ela dá com os anjos, e com o próprio Jesus Cristo. 

Dizei-me, meus irmãos, de acordo com isto, acaso não merece ela o título de preciosa virtude? Não é ela digna de toda nossa estima e de todos os sacrifícios necessários para conservá-la? Nos dizemos que a pureza vem do céu, porque só havia o próprio Jesus Cristo que fosse capaz de no-la ensinar e nos fazer sentir todo o seu valor. Ele nos deixou o exemplo prodigioso da estima que teve desta virtude. Tendo resolvido na grandeza de sua misericórdia, resgatar o mundo, Ele tomou um corpo mortal como o nosso; mas Ele quis escolher uma Virgem por Mãe. 

Quem foi esta incomparável criatura, meus irmãos? Foi Maria, a mais pura entre todas e por uma graça que não foi concedida a ninguém mais, foi isenta do pecado original. Ela consagrou sua virgindade ao Bom Deus desde a idade de três anos, e oferecendo-lhe seu corpo, sua alma, ela lhe fez o sacrifício mais santo, o mais puro e o mais agradável que Deus jamais recebeu de uma criatura sobre a terra. Ela manteve este sacrifício por uma fidelidade inviolável em guardar sua pureza e em evitar tudo aquilo que pudesse mesmo de leve empanar seu brilho. 

Nós vemos que a Virgem Santa fazia tanto caso desta virtude, que Ela não queria consentir em ser Mãe de Deus antes que o anjo lhe tivesse assegurado que Ela não a perderia. Mas, tendo-lhe dito o anjo que, tornando-se Mãe de Deus, bem longe de perder ou empanar sua pureza de que Ela fazia tanta estima, Ela seria ainda mais pura e mais agradável a Deus, consentiu então de bom grado, a fim de dar um novo brilho a esta pureza virginal. Nós vemos ainda que Jesus Cristo escolhe um pai nutrício que era pobre, é verdade; mas ele quis que sua pureza estivesse por sobre a de todas as outras criaturas, exceto a Virgem Santa. Dentre seus discípulos, Ele distingue um, a quem Ele testemunhou uma amizade e uma confiança singulares, a quem Ele fez participante de seus maiores segredos, mas Ele toma o mais puro de todos, e que estava consagrado a Deus desde sua juventude.

Santo Ambrósio nos diz que a pureza nos eleva até o céu e nos faz deixar a terra, enquanto é possível a uma criatura deixá-la. Ela nos eleva por sobre a criatura corrompida e, por seus sentimentos e seus desejos, ela nos faz viver da mesma vida dos anjos. Segundo São João Crisóstomo, a castidade duma alma é de um preço aos olhos de Deus maior que a dos anjos, pois que os cristãos só podem adquirir esta virtude pelos combates, enquanto que os anjos a têm por natureza. Os anjos não têm nada a combater para conservá-la, enquanto que um cristão é obrigado a fazer uma guerra contínua a si mesmo. São Cipriano acrescenta que, não somente a castidade nos torna semelhantes aos anjos, mas nos dá ainda um caráter de semelhança com o próprio Jesus Cristo. Sim, nos diz este grande santo, uma alma casta é uma imagem viva de Deus sobre a terra.

Quanto mais uma alma se desapega de si mesma pela resistência às suas paixões, mais ela se une a Deus; e, por um feliz retorno, mais o bom Deus se une a ela; Ele a olha, Ele a considera como sua esposa, como sua bem-amada; faz dela o objeto de suas mais caras complacências, e fixa nela sua morada para sempre. 'Bem-aventurados', nos diz o Salvador, 'os puros de coração, porque eles verão ao bom Deus'. Segundo São Basílio, se encontramos a castidade numa alma, encontramos aí todas as outras virtudes cristãs, ela as praticará com uma grande facilidade, 'porque' – nos diz ele – 'para ser casto é preciso se impor muitos sacrifícios e fazer-se uma grande violência. Mas uma vez que alcançou tais vitórias sobre o demônio, a carne e o sangue, todo o resto lhe custa muito pouco, pois uma alma que subjuga com autoridade a este corpo sensual, vence facilmente todos os obstáculos que encontra no caminho da virtude'. 

Vemos também, meus irmãos, que os cristãos castos são os mais perfeitos. Nós os vemos reservados em suas palavras, modestos em todos os seus passos, sóbrios em suas refeições, respeitosos no lugar santo e edificantes em toda sua conduta. Santo Agostinho compara aqueles que têm a grande alegria de conservar seu coração puro aos lírios que se elevam diretamente ao céu e que difundem em seu redor um odor muito agradável; só a vista deles nos faz pensar naquela preciosa virtude. Assim a Virgem Santa inspirava a pureza a todos aqueles que a olhavam. Bem-aventurada virtude, meus irmãos, que nos põe entre os anjos, que parece mesmo elevar-nos por sobre eles!

II - O amor que os santos tinham por esta virtude

Todos os santos fizeram o maior caso dela e preferiram perder seus bens, sua reputação e sua própria vida a descorar esta virtude. Nós temos um belo exemplo disto na pessoa de Santa Inês. Sua formosura e suas riquezas fizeram com que, à idade de doze anos, ela fosse procurada pelo filho do prefeito da cidade de Roma. Ela lhe fez saber que estava consagrada ao bom Deus. Ela foi presa sob o pretexto de que era cristã, mas em realidade para que consentisse nos desejos do rapaz. Ela estava de tal modo unida a Deus que nem as promessas, nem as ameaças, nem a vista dos carrascos e dos instrumentos expostos diante de si para amedrontá-la, não a fizeram mudar de sentimentos. 

Não tendo conseguido nada dela, seus perseguidores a colocaram em cadeias, e quiseram colocar uma argola e anéis em seu pescoço e em sua mãos; eles não puderam fazê-lo, tão débeis eram suas pequenas mãos inocentes. Ela permaneceu firme em sua resolução, no meios destes lobos enraivecidos, ela ofereceu seu corpinho aos tormentos com uma coragem que espantou aos carrascos. Arrastam-na aos pés dos ídolos; mas ela confessa bem alto que só reconhece por Deus a Jesus Cristo, e que os ídolos deles não são mais que demônios. O juiz, cruel e bárbaro, vendo que não consegue nada, crê que ela será mais sensível diante da perda daquela pureza que ela estimava tanto. Ele ameaça expô-la num lugar infame; mas ela responde com firmeza; 'Vós podeis fazer-me morrer, mas não podereis jamais fazer-me perder este tesouro: o próprio Jesus Cristo é zeloso deste tesouro'. 

O juiz, morrendo de raiva, manda conduzi-la ao lugar das torpezas infernais. Mas Jesus Cristo, que velava por ela duma maneira particular, inspira um tão grande respeito aos guardas, que eles só a olhavam com uma espécie de pavor, e manda aos seus anjos que a protejam. Os jovens que entram naquele quarto, inflamados de um fogo impuro, vendo um anjo ao lado dela, mais belo que o sol, saem dali abrasados do amor divino. Mas o filho do prefeito, mais perverso e mais corrompido que os outros, penetra no quarto onde estava Santa Inês. Sem ter consideração por todas aquelas maravilhas, ele se aproxima dela na esperança de contentar seus desejos impuros; mas o anjo que guarda a jovem mártir fere o libertino que cai morto a seus pés. 

Rapidamente se espalha em Roma o boato de que o filho do prefeito tinha sido morto por Inês. O pai, enfurecido, vem encontrar a santa e se entrega a tudo o que seu desespero lhe pode inspirar. Ele a chama de fúria do inferno, monstro nascido para a desolação de sua vida, pois tinha feito morrer seu filho. Santa Inês lhe responde tranquilamente: 'É que ele quis fazer-me violência, então o meu anjo lhe deu a morte'. O prefeito, um pouco acalmado, lhe diz: 'pois bem, pede a teu Deus para ressuscitá-lo, para que não se diga que foste tu que o mataste'. –'Sem dúvida', diz-lhe a Santa,' vós não mereceis esta graça; mas para que saibais que os cristãos nunca se vingam, mas, pelo contrário, eles pagam o mal com o bem, saí daqui, e eu vou pedir ao bom Deus por ele'. 

Então Inês se pôs de joelhos, prostrada com a face em terra. Enquanto ela rezava, seu anjo lhe apareceu e lhe disse: 'Tenha coragem'. No mesmo instante o corpo inanimado retoma a vida. O jovem ressuscitado pelas orações da santa, se retira da casa, corre pelas ruas de Roma gritando: 'Não, não, meus amigos, não há outro Deus que o dos cristãos, todos os deuses que nós adoramos não são mais que demônios que nos enganam e nos arrastam ao inferno'. 

Entretanto, apesar de um tão grande milagre, não deixaram de a condenar. Então o tenente do prefeito manda que se acenda um grande fogo, e faz lançá-la nele. Mas as chamas entreabrindo-se, não lhe fazem nenhum mal e queimam os idólatras que acudiram para serem espectadores de seus combates. O tenente, vendo que o fogo a respeitava e não lhe fazia nenhum mal, ordena que a firam com um golpe de espada na garganta, a fim de lhe tirar a vida; mas o carrasco treme como se ele mesmo estivesse condenado à morte. Como os pais de Santa Inês chorassem a morte de sua filha, ela lhes aparece dizendo-lhes: 'Não choreis minha morte, pelo contrário, alegrai-vos de eu Ter adquirido uma tão grande glória no Céu'.

Estais vendo, meus irmãos, o que esta santa sofreu para não perder a sua virgindade? Formai agora ideia da estima em que deveis ter à pureza, e como o Bom Deus se compraz em fazer milagres para se mostrar-se seu protetor e guardião. Como este exemplo confundirá um dia estes jovens que fazem tão pouco caso desta bela virtude! Eles jamais conheceram o seu preço. O Espírito Santo tem, portanto, razão de exclamar: 'Ó, como é bela esta geração casta; sua memória é eterna, e sua glória brilha diante dos homens e dos anjos!' É certo, meus irmãos, que cada um ama seus semelhantes; também os anjos, que são espíritos puros, amam e protegem duma maneira particular as almas que imitam sua pureza.

Nós lemos na Sagrada Escritura que o anjo Rafael, que acompanhou o jovem Tobias, prestou-lhe mil serviços. Preservou-o de ser devorado por um peixe, de ser estrangulado pelo demônio. Se este jovem não tivesse sido casto, é certíssimo que o anjo não o teria acompanhado, nem lhe teria prestado tantos serviços. Com que gozo não se alegra o anjo da guarda que conduz uma alma pura!

Não há outra virtude para conservação da qual Deus faça milagres tão numerosos como os que ele prodiga em favor duma pessoa que conhece o preço da pureza e que se esforça por salvaguardá-la. Vede o que Ele fez por Santa Cecília. Nascida em Roma, de pais muito ricos, ela era muito instruída na religião cristã, e seguindo a inspiração de Deus, ela lhe consagrou a sua virgindade. Seus pais, que não o sabiam, prometeram-na em casamento a Valeriano, filho de um senador da Cidade. Era, segundo o mundo, um partido bem considerado. Ela pediu a seus pais um tempo para pensar. 

Ela passou este tempo no jejum, na oração e nas lágrimas, para obter de Deus a graça de não perder a flor daquela virtude que ela estimava mais do que a sua vida. O Bom Deus lhe respondeu que não temesse nada e que obedecesse aos seus pais; pois, não somente não perderia esta virtude, mas ainda obteria maiores. Consentiu, pois, no matrimônio. No dia das núpcias, quando Valeriano se apresentou, ela lhe disse: 'Meu caro Valeriano, eu tenho um segredo a lhe comunicar'” Ele lhe respondeu: 'Qual é este segredo?' – 'Eu consagrei a minha virgindade a Deus e jamais homem algum me tocará, pois eu tenho um anjo que vela por minha pureza; se você atentar contra isto, você será ferido de morte'. 

Valeriano ficou muito surpreso com esta linguagem, porque sendo pagão, não compreendia nada de tudo isto. Ele respondeu: 'Mostre-me este anjo que a guarda'. A santa replicou: 'Você não pode vê-lo porque você é pagão. Vá ter com o Papa Urbano, e peça-lhe o batismo; você em seguida verá o meu anjo'. Imediatamente ele partiu e, depois de ter sido batizado pelo papa, voltou a encontrar a sua esposa. Entrando no seu quarto, vê o anjo velando com Santa Cecília. Ele o acha tão bonito, tão brilhante de glória, que fica encantado e tocado por sua formosura. Não somente permite à sua esposa permanecer consagrada a Deus, mas ele mesmo faz voto de virgindade. Em breve eles tiveram a alegria de morrerem mártires. Estais vendo como o Bom Deus toma cuidado de uma pessoa que ama esta incomparável virtude e trabalha por conservá-la?

Nós lemos na vida de Santo Edmundo que, estudando em Paris, ele se encontrou com algumas pessoas que diziam tolices; ele as deixou imediatamente. Esta ação foi tão agradável a Deus, que Ele lhe apareceu sob a forma de um belo menino e o saudou com um ar muito gracioso, dizendo-lhe que com satisfação o tinha visto deixar seus companheiros que mantinham conversas licenciosas; e, para recompensá-lo, prometia que estaria sempre com ele. Além disto, Santo Edmundo teve a grande alegria de conservar sua inocência até a morte. 

Quando Santa Luzia foi ao túmulo de Santa Águeda para pedir ao Bom Deus, por sua intercessão, a cura de sua mãe, Santa Águeda lhe apareceu e lhe disse que ela podia obter, por si mesma, o que ela pedia, pois que, por sua pureza, ela tinha preparado em seu coração uma habitação muito agradável ao seu Criador. Isto nos mostra que o Bom Deus não pode recusar nada a quem tem a alegria de conservar puros o seu corpo e a sua alma.

Escutai a narração do que aconteceu a Santa Pontamiena que viveu no tempo da perseguição de Maximiano. Esta jovem era escrava de um homem dissoluto e libertino, que não cessava de a solicitar para o mal. Ela preferiu sofrer todas as sortes de crueldades e de suplícios a consentir nas solicitações de seu senhor infame. Este, vendo que não podia conseguir nada, em seu furor, entregou-a como cristã nas mãos do governador, a quem prometeu uma grande recompensa se a pudesse conquistar. 

O juiz mandou que a conduzissem diante o seu tribunal, e vendo que todas as ameaças não a faziam mudar de sentimentos, fez a santa sofrer tudo o que a raiva pôde lhe inspirar. Mas o Bom Deus concedeu à jovem mártir tanta força que ela parecia ser insensível a todos os tormentos. Aquele juiz iníquo, não podendo vencer a sua resistência, fez colocar sobre um fogo bem ardente uma caldeira cheia de breu e lhe disse: 'Veja o que lhe preparam se você não obedece ao seu senhor'. 

A jovem santa respondeu sem se perturbar: 'Eu prefiro sofrer tudo o que vosso furor puder vos inspirar a obedecer aos infames desejos de meu senhor; aliás, eu jamais teria acreditado que um juiz fosse tão injusto de me fazer obedecer aos planos de um senhor dissoluto'. O tirano, irritado por esta resposta, mandou que a lançassem na caldeira. 'Ao menos mandai', disse-lhe ela, 'que eu seja lançada vestida. Vós vereis a força que o Deus que nós adoramos dá aos que sofrem por Ele'. Depois de três horas de suplício, Pontamiena entregou a sua bela alma ao seu Criador, e assim alcançou a dupla palma do martírio e da virgindade.

III - Como esta virtude é pouco conhecida e apreciada no mundo

Ai, meus irmãos, como esta virtude é pouco conhecida no mundo, quão pouco nós a estimamos, quão pouco cuidado nós colcamos em conservá-la, quão pouco zelo temos em pedi-la a Deus, pois que não a podemos ter de nós mesmos. Não, nós não conhecemos esta bela e amável virtude que ganha tão facilmente o coração de Deus, que dá um tão belo brilho a todas as nossas outras boas obras, que nos eleva acima de nós mesmos, que nos faz viver sobre a terra como os anjos no céu!

Não, meus irmãos, ela não é conhecida por este velhos infames impudicos que se arrastam, se atolam e se submergem na lama de suas torpezas, cujo coração é semelhante àqueles... sobre o alto das montanhas... queimados e abrasados por estes fogos impuros. Ai! Bem longe de procurar extingui-lo, eles não cessam de acendê-lo e abrasá-lo por seus olhares, por seus pensamentos, seus desejos e suas ações. Em que estado estará esta alma, quando aparecer diante de Deus, a própria Pureza? 

Não, meus irmãos, esta bela virtude não é conhecida por esta pessoa, cujos lábios não são mais que uma abertura e um tubo de que o inferno se serve para vomitar suas impurezas sobre a terra, e que se alimenta disto como de um pão cotidiano. Ai! A alma deles não é mais que um objeto de horror para o céu e para a terra! Não, meus irmãos, esta bela virtude não é conhecida por estes jovens cujos olhos e mãos estão profanados por estes olhares e... ó Deus, quantas almas este pecado arrasta para o inferno!

Não, meus irmãos, esta bela virtude não é conhecida por estas moças mundanas e corrompidas que tomam tantas precauções e cuidados para atraírem sobre si os olhos do mundo; que, por seus enfeites exagerados e indecentes, anunciam publicamente que são infames instrumentos de que o inferno se serve para perder as almas; estas almas que custaram tantos trabalhos, lágrimas e tormentos a Jesus Cristo! Vede estas infelizes, e vós vereis que mil demônios circundam sua cabeça e o seu coração. 

Ó meu Deus, como a terra pode suportar tais sequazes do inferno? Coisa mais espantosa ainda, como mães as suportam num estado indigno de uma mãe cristã! Se eu não temesse ir longe demais, eu diria a estas mães que elas valem o mesmo que as suas filhas. Ai, este infeliz coração e estes olhos impuros não são mais que uma fonte envenenada que dá a morte a qualquer um que os olha e os escuta. Como tais monstros ousam se apresentar diante de um Deus santo e tão inimigo da impureza! Ai! A vida deles não é mais que uma acumulação de óleo que eles estão juntando para inflamar o fogo do inferno por toda a eternidade. Mas, meus irmãos, deixemos uma matéria tão desagradável e tão revoltante para um cristão, cuja pureza deve imitar à do próprio Jesus Cristo; e voltemos à nossa bela virtude da pureza que nos eleva até o céu, que nos abre o coração adorável de Jesus Cristo e nos atrai todas as bênçãos espirituais e temporais.

domingo, 26 de julho de 2015

O MILAGRE DA PARTILHA: CINCO PÃES E DOIS PEIXES

Páginas do Evangelho - Décimo Sétimo Domingo do Tempo Comum



Depois da morte do Precursor João Batista, 'Jesus subiu ao monte e sentou-se aí, com os seus discípulos' (Jo 6, 3) para um momento de recolhimento e oração. Mas eis que uma grande multidão, uma esplêndida multidão, saiu das cidades e veio ao seu encontro. Tomado de amor e compaixão, Jesus abandona o seu intento inicial e passa a atender com zelo extremado aquela gente durante todo o dia. E, ao final do dia, famintos de Deus, a multidão agora está faminta de pão. 

Jesus pergunta, então, a Filipe: 'Onde vamos comprar pão para que eles possam comer?' (Jo 6, 5). Sabendo em princípio que tal resposta era insondável, o Mestre coloca o seu discípulo à prova. No meio de um campo aberto e relvado, afastado das cidades, uma enorme multidão, cansada e faminta, veio ficar perto de Deus. Não havia condições de alimentação ali e nem perto dali, porque eram centenas de centenas e 'nem duzentas moedas de prata bastariam para dar um pedaço de pão a cada um' (Jo 6, 7). Mas para Deus não existe nada que seja impossível. Movido pela compaixão, Jesus vai realizar ali, diante de todos, um dos seus mais portentosos milagres. E o Cordeiro de Deus há de saciar a todos com o pão da existência e prepará-los também para lhes dar alimento de vida eterna, na Santa Eucaristia.

Pois Deus não nos abandona nunca; não nos cria perspectivas de vida eterna pela insensibilidade de nossas necessidades humanas. Jesus vai dizer em outro momento que 'nem só de pão vive o homem'. Não só de pão, mas também de pão. E, para a incredulidade dos seus discípulos, ordena então: 'Fazei sentar as pessoas' (Jo 6, 10). E, como em tudo o mais, Deus faz uso da graça como fruto da contrapartida humana; Jesus toma o que os homens têm ali a oferecer: cinco pães e dois peixes. Diante de oferta tão singela, vai realizar a partilha do pouco (que é tudo em Deus) entre muitos (que é nada sem Deus), configurando, assim, o prenúncio da partilha do seu Corpo e Sangue na Sagrada Eucaristia.

'Jesus tomou os pães, deu graças e distribuiu-os aos que estavam sentados, tanto quanto queriam. E fez o mesmo com os peixes (Jo 6, 11). E os poucos pães e os poucos peixes se multiplicaram em muitos pães e em muitos peixes, que alimentaram com fartura a multidão, a ponto de serem recolhidos ainda doze cestos cheios (símbolo da partilha universal da graça divina) no final, pois Deus usa sempre da superabundância da graça para pagar o tributo da oferta sincera do homem. Este prodígio extraordinário é o prenúncio de outro milagre ainda maior que subsiste pelos tempos, a cada Santa Missa: na multiplicação das hóstias, o mesmo Deus é entregue aos homens na plenitude da graça, hoje, ontem e até a consumação dos séculos.

26 DE JULHO - SÃO JOAQUIM E SANTA ANA

Sagrada Família com São Joaquim e Santa Ana (Nicolás Juarez, 1699)

De acordo com a Tradição Católica e documentos apócrifos antigos, os pais de Maria foram São Joaquim e Santa Ana. Ana, em hebraico Hannah, significa 'Graça' e Joaquim equivale a 'Javé prepara ou fortalece'. Ambos os nomes indicam, portanto, a  missão divina de realização das promessas messiânicas, com o nascimento da Mãe do Salvador. Segundo a mesma Tradição, os pais de Maria teriam nascido na Galileia, transferindo-se depois para jerusalém, onde Maria nasceu e onde ambos morreram e foram enterrados.

O culto aos pais de Maria Santíssima é antiquíssimo na Igreja Oriental (como revelados nos escritos de São Gregório de Nissa e Santo Epifânio, em hinos gregos e em homilias dos Santos Padres). Os túmulos de São Joaquim e Santa Ana em Jerusalém foram honrados até o final do Século IX, numa igreja construída no local onde viveram. No Ocidente, o culto de Santa Ana é muito mais recente, com sua festa litúrgica tendo início na Idade Média, sendo formalizada no Missal Romano apenas em 1584, no tempo de Gregório XIII. A devoção a São Joaquim foi ainda mais tardia no Ocidente.

Como pais de Nossa Senhora, São Joaquim e Santa Ana são nossos avós espirituais e o calendário litúrgico instituiu a festa conjunta destes dois santos em 26 de julho, que ficou também conhecida como 'dia dos avós'. Eles são também os santos protetores da Ordem dos Carmelos Descalços (fundada no Século XVI por Santa Teresa de Ávila). No dia dos avós, o blog presenteia os nossos irmãos mais velhos com estas duas orações.

Oração a Santa Ana

Santa Ana, mãe da Santíssima Virgem, pela intercessão da Vossa Filha e do Meu Salvador, dai-me obter a graça que Vos peço, o perdão dos meus pecados, a força para cumprir fielmente os meus deveres de cristão e a perseverança eterna no amor de Jesus e de Maria. Amém.

Oração a São Joaquim

Senhor! Pela intercessão de São Joaquim, pai da Santíssima Virgem, velai pelos Vossos filhos idosos, especialmente... (nomes) que, tendo cumprido na Terra uma vida longa, possa(m) merecer de Vós a Vida Eterna no Céu. Senhor, dai-lhes o conforto de uma idade avançada, saúde do corpo e da alma, a sabedoria de envelhecer e um coração inquieto enquanto não repousar em Vós. Amém.  

sábado, 25 de julho de 2015

25 DE JULHO - SÃO TIAGO MAIOR


São Tiago nasceu na Galileia e era filho de Zebedeu e Salomé e irmão de João Evangelista, conforme as Sagradas Escrituras. É comumente referendado como São Tiago Maior para se distinguir de outro apóstolo homônimo, São Tiago Menor, filho de Alfeu. É claramente citado nas Escrituras como um dos apóstolos prediletos de Jesus, Junto com Pedro e João, personagem constante de grandes eventos da vida pública de Jesus, como nos casos da cura da sogra de Pedro, da ressurreição da filha de Jairo e dos episódios da transfiguração do Senhor e da sua agonia no Horto das Oliveiras.

Após a morte e ressurreição de Jesus, Tiago rumou para a Espanha, com a missão de proclamar a fé cristã aos povos da região. Com grande zelo entregou-se à missão, a qual se mostrou, entretanto, extremamente difícil e penosa. Desencorajado pelo insucesso de sua pregação, estava prestes a retornar à Palestina quando recebeu, em pessoa, a visita da própria Virgem Maria, em 2 de janeiro do ano 40, consolando-o e conclamando-o a perseverar na sua pregação. Com ânimo redobrado, o apóstolo se dedicou à missão que acabaria por levar o triunfo da Igreja nas terras ibéricas.

Quando mais tarde, este trabalho de evangelização foi retomado por Tiago em Jerusalém, com um grande número de conversões, o apóstolo foi preso e condenado à morte imediata pelo rei Herodes Antipas, pelo suposto crime de sublevação. São Tiago Maior foi  flagelado e depois decapitado, durante as festas pascais no ano 42, tornando-se, assim, o primeiro dos apóstolos a derramar o seu sangue pela fé em Jesus Cristo.

No século VIII, quando a Palestina foi dominada pelos muçulmanos, os restos mortais do apóstolo foram transferidos para a cidade espanhola de Iria. De acordo com a tradição, os bárbaros foram expulsos das terras ibéricas por meio da ajuda invisível do apóstolo, cujo túmulo foi encontrado nesta época por meio de uma estrela iluminando um campo. No local da aparição da estrela, o rei Afonso II mandou construir uma igreja e um mosteiro, dedicados a São Tiago Maior e a cidade de Iria passou a chamar-se Santiago de Compostela, ou seja, do campo da estrela, que se tornou, então, um dos mais celebrados santuários de peregrinação do mundo inteiro.

sexta-feira, 24 de julho de 2015

A APARIÇÃO DE RIANJO

Em agosto de 1931, por motivo de doença, Irmã Lúcia estava passando uma temporada numa casa amiga em Rianjo/Espanha, uma pequena cidade marítima perto de Pontevedra, para descansar e se recuperar. Foi ali, na capela do lugar, que a Mensageira de Fátima veio a receber, uma vez mais, uma comunicação do Céu.

Nosso Senhor se queixou à Irmã Lúcia em relação aos seus ministros, que postergavam a consagração da Rússia ao Imaculado Coração de Maria, conforme pedido de Nossa Senhora de Fátima feito em 13 de junho de 1929, dois anos e dois meses antes. A Irmã Lúcia relatou ao seu bispo a importante revelação:

'Senhor Bispo, meu confessor me manda que eu informe a V. Excia o que há pouco se deu entre mim e o Nosso Bom Deus; pedindo a conversão da Rússia, da Espanha e de Portugal, me revelou a Divina Majestade:

'Me consolas muito ao pedir a conversão para estas pobres nações. Pede isso também à Minha Mãe, dizendo muitas vezes: 'Doce Coração de Maria, sede a salvação da Rússia, da Espanha e de Portugal, da Europa e do mundo inteiro'. E em outras vezes: 'Por vossa Pura e Imaculada Conceição, ó Maria, concedei-nos a conversão da Rússia, da Espanha, de Portugal, da Europa e do mundo inteiro'. Manifesta aos meus ministros que, uma vez que seguem o exemplo do rei da França, postergando a execução do meu mandato, também haverão de segui-lo na aflição. Nunca é tarde demais para se recorrer a Jesus e à Maria'.

Em outro texto, ela escreveu: 'Mais tarde, por meio de uma comunicação íntima, Nosso Senhor me disse, reclamando: 'Não quiseram atender o meu pedido... Como o Rei da França, eles se arrependerão e a cumprirão, mas será tarde. A Rússia já terá espalhado os seus erros pelo mundo, provocando guerras e perseguições à Igreja. O Santo Padre terá muito que sofrer!'

Nosso Senhor estava fazendo aqui uma referência explícita aos pedidos que o Sagrado Coração fez em 17 de junho de 1689 ao rei da França, por meio de Santa Margarida Maria de Alacoque. Como resultado da rejeição do rei Luís XIV - e da mesma rejeição de seu filho e do seu neto, Luís XV e Luís XVI  - de consagrar publicamente a França ao Sagrado Coração de Jesus, como havia sido pedido pelo Céu por meio de um reconhecido santo francês daquela época, os filhos da Anti-Igreja, protestantes e maçônicos, promoveram a grande revolta por meio da Revolução Francesa.

Em 17 de junho de 1789 (Festa do Sagrado Coração), exatamente cem anos depois do dia em que Santa Margarida Maria tinha escrito o grande desígnio do Céu para o Rei, impôs-e na França o Terceiro Estado e se proclamou uma Assembleia Nacional, despojando o rei Luís XVI do poder. Em 21 de janeiro de 1793, a França, ingrata e rebelde contra o seu Deus, atreveu-se a decapitar o seu rei cristão como se fôra um criminoso. 

Em Rianjo, Jesus nos adverte que este obscuro capítulo da história vai se repetir e, desta vez, os ministros de sua Igreja - os bispos e talvez até o próprio Papa - serão as infelizes vítimas. A propósito, parece que o sacrifício do papa - 'o bispo vestido de branco' - junto com outros bispos, sacerdotes, religiosos e leigos, tratados como se fossem criminosos, constitui o foco da visão de Fátima revelada em 26 de junho de 2000.

('La Aparición en Rianjo', do site www.fatima.org, tradução do autor do blog)

quinta-feira, 23 de julho de 2015

PALAVRAS DE SALVAÇÃO




'Retira o peixe da água e dali a pouco ele estará morto. Retira-te ou afasta-te da oração, e a tua alma vai morrer para Deus e para a graça. Para que o peixe viva, precisa de estar na água; para que a tua alma viva em graça, precisa de estar em oração. Se o peixe tivesse fé e razão, haveria de compreender que tinha o dever rigoroso de não sair da água para não perder a vida; o cristão tem o dever rigoroso de não deixar a oração para não perder a vida da eterna bem-aventurança'.

(São João Crisóstomo)

quarta-feira, 22 de julho de 2015

OUTRAS HISTÓRIAS MEDIEVAIS

'LEVEM OS MEUS OLHOS!'

O Rei Ricardo da Inglaterra, indo ao convento de Santo Emblay, enamorou-se de uma monja. Enviou-lhe muitos presentes e jóias, com a pretensão de vencer sua vontade. Mas como ela não se submetia, mandou avisar a abadessa que a entregasse, sob pena de destruir o convento.

Enviou então uns homens, para que a trouxessem à força. Quando os homens chegaram ao mosteiro, ela lhes perguntou por que o príncipe se havia enamorado dela mais do que das outras monjas. Eles lhe responderam que era por causa da grande beleza de seus olhos. Ela então, com decisão, arrancou os próprios olhos, dizendo aos homens:

'Soldados, levem os meus olhos, já que por eles o rei se enamorou. E deixem a mim, pois amo menos os meus olhos do que minha alma'. E em uma caixinha ela os mandou ao Rei. 

Envergonhado, este dirigiu-se ao mosteiro, para pedir perdão. Pôs a caixa com os olhos sobre o altar da Virgem, dizendo-lhe que não se iria embora até que os restituísse à santa monja. O milagre se fez, e a Virgem restituiu à monja os olhos mais formosos do que antes, fazendo-se o rei devoto de Maria e protetor do mosteiro.

A ESPADA DE SÃO MARTINHO

O Conde de Besalu era um valente que derrotou os mouros em muitas batalhas. Onde havia perigo, lá estava ele com seu exército, e não tardava em dar boa conta das turbas infiéis. Um dia, estando em seu castelo, veio um de seus guardas dizer-lhe que sabia de boa fonte que os mouros subiam de Bañolas em direção a Santa Pau. Imediatamente o Conde reuniu os seus leais, e saiu para enfrentar os mouros e impedir-lhes o avanço.

Quando os encontrou, no mesmo instante, arremeteu-se contra eles com o ímpeto que lhe era peculiar. Mas em pleno combate sua espada se quebrou. Não era o conde homem que se conformasse vendo pelejar seus soldados, mas não lhe era possível seguir lutando desarmado. Recordou-se então de que, muito perto daquele lugar, encontrava-se uma ermida dedicada a São Martinho. Abandonou o combate uns momentos, para dirigir-se a esse lugar. Uma vez ali, ajoelhou-se aos pés do santo e lhe pediu, com todo o fervor, que ele o livrasse do apuro em que se encontrava.

Estava de joelhos, absorto na oração ao santo, quando viu que a imagem deste se movia, e São Martinho, sacando sua espada, ofereceu-a ao conde. Levantou-se o cavaleiro, todo jubiloso, e para certificar-se do que seus olhos estavam vendo, esticou a mão para pegar a espada. Com firmeza a tomou, e depois de dar graças a Deus de todo o coração, saiu depressa em auxílio de seus homens, que estavam perdendo terreno.

Começou a distribuir golpes com sua espada à direita e à esquerda. Seus homens recobraram o valor que haviam perdido momentaneamente, e redobraram seus esforços. Em poucas horas jaziam mortos todos os mouros que haviam iniciado o combate contra a Santa Fé. 

Os cristãos subiram então até Besalu. Quando chegaram a Colsatrapa, sentaram-se para descansar, enquanto contemplavam o panorama de Mirana y Mor. Os soldados elogiavam o conde pelo seu valor. Ele, porém, contestou, dizendo que São Martinho lhe emprestara a espada. Seus homens duvidaram, e ele, para provar a força da espada, deu um forte golpe numa pedra que havia ali, partindo-a em duas. Essa pedra ainda existe e é conhecida como 'Pedra Cortada'.

(Excertos da obra 'Antologia de Leyendas de la Literatura Universal', V. Garcia de Diego, 1953)

22 DE JULHO - SANTA MARIA MADALENA







'Junto à cruz de Jesus, estavam de pé sua mãe e a irmã de sua mãe, Maria de Cleofas, e Maria Madalena' (Jo 19,25).

terça-feira, 21 de julho de 2015

O TRIUNFO DA CRUZ


I. É a Cruz, sobre a terra, mistério profundíssimo, que não se conhece sem muitas luzes. Para compreendê-lo, é necessário um espírito elevado. Entretanto, é preciso entendê-la para que nos possamos salvar.

II. A natureza a abomina, a razão a combate; o sábio a ignora e o demônio a aniquila. Muitas vezes o próprio devoto não a tem no coração e, embora diga que a ama, no fundo é um mentiroso.

III. A cruz é necessária. É preciso sofrer sempre: ou subir o Calvário ou perecer eternamente. E Santo Agostinho exclama que somos réprobos se Deus não nos castiga e nos prova.

IV. Vai-se para a Pátria pelo caminho das cruzes, que é o caminho da vida e o caminho dos reis; toda pedra é talhada proporcionalmente para ser colocada na Santa Sião.

V. De que servirá a vitória ao maior conquistador, se não tiver a glória de vencer-se sofrendo, se não tiver por modelo Jesus morto na Cruz, se, como um infiel, o lenho repelir?

VI. Jesus Cristo por ela acorrentou o inferno, aniquilou o rebelde e conquistou o universo; e Ele a dá como arma aos seus bons servidores; ela encanta ou desarma as mãos e os corações.

VII. 'Por este sinal vencerás', disse Ele a Constantino. Toda vitória insigne se encontra nela. Lede, na história,seus efeitos maravilhosos, suas vitórias estupendas na terra e nos céus.

VIII. Embora contra os sentidos e a natureza, a política e a razão, a verdade nos assegura que a cruz é um grande dom. É nesta princesa que encontramos, em verdade, graça, sabedoria e divindade.

IX. Deus não pôde defender-se contra sua rara beleza. A Cruz o fez baixar à nossa humanidade. Ao vir ao mundo, Ele disse: 'Sim, quero-a, Senhor. Boa Cruz, coloco-vos bem dentro do coração'.

X. Pareceu-lhe tão bela que nela pôs a sua honra, tornando-a a sua eterna companheira e a esposa de seu Coração. Desde a mais terna infância, seu Coração suspirava unicamente pela presença da cruz que amava.

XI. Desde a juventude, ansioso a procurou. De ternura e de amor, em seus braços morreu. 'Desejo um batismo', exclamou Ele um dia: 'a Cruz querida que amo, o objeto de meu amor!'

XII. Chamou a São Pedro Satanás escandaloso, quando ele tentou desviar seus olhos da Cruz aqui na terra. Sua Cruz é fruto de adoração, sua mãe não o é. Ó grandeza inefável, que a terra desconhece!

XIII. Esta cruz, dispersa por tantos lugares da terra, será ressuscitada e transportada para os Céus. A cruz, sobre uma nuvem cheia de brilho rutilante, julgará, por sua visão, os vivos e os mortos.

XIV. Clamará vingança contra seus inimigos, alegria e indulgência para todos os seus amigos. Dará glória a todos os bem-aventurados e cantará vitória na terra e nos céus.

XV. Durante sua vida, os santos só procuraram a cruz, seu grande desejo e sua escolha única. E, não contentes de ter as cruzes que lhes dava o céu; a outras, inteiramente novas, cada um se condenava.

XVI. Para São Pedro, as cadeias constituíam honra maior do que ser o vigário de Cristo na terra. 'Ó boa Cruz', exclamava, cheio de fé, Santo André: 'Que eu morra em ti, para que me dês a vida!'

XVII. E vede, São Paulo esquecia seu grande êxtase para se glorificar tão somente na cruz. Sentia-se mais honrado em seus cárceres horrendos que no êxtase admirável que o arrebatou aos céus.

XVIII. Sem a cruz, a alma se torna lenta, mole, covarde e sem coração. A cruz a torna fervorosa e cheia de vigor. Permanecemos na ignorância quando nada sofremos. Temos inteligência quando sofremos bem.

XIX. Uma alma sem provações não tem grande valor. É a alma nova ainda, que nada aprendeu. Ah! que doçura suprema goza o aflito que se rejubila com sua pena e dela não é aliviado!

XX. É pela Cruz que se dá a bênção, é por ela que Deus nos perdoa e nos concede remissão. Ele quer que todas as coisas tragam este selo, sem o qual nada lhe parece belo.

XXI. Colocada a cruz em algum lugar, torna-se sagrado o profano e desaparecem as manchas, porque Deus delas se apodera. Ele quer a Cruz em nossa fronte e em nosso coração, antes de todos os atos, para que sejamos vencedores.

XXII. Ela é nossa proteção, segurança, perfeição e única esperança. É tão preciosa que uma alma que já está no céu voltaria alegremente à terra para sofrer.

XXIII. Tem este sinal tantos encantos que, no altar, o sacerdote não se vale de outras armas para atrair Deus lá do céu. Faz sobre a hóstia vários sinais da Cruz e, por esses sinais de vida, dita-lhe suas leis.

XXIV. Por este sinal adorável, prepara-se um perfume cujo odor agradável nada tem de comum; é o incenso que se dá a Ele uma vez consagrado, e é com esta coroa que Ele desejaria ser ornado.

XXV. A Eterna Sabedoria procura, ainda hoje, um coração bem fiel e digno deste presente. Quer um verdadeiro sábio, que goste apenas de sofrer e, com coragem, leve a sua cruz até morrer.

XXVI. Devo calar-me, ó Cruz, rebaixo-te ao falar. Sou um temerário e um insolente; já que te recebi de coração constrangido e não te conheci, perdoa meu pecado!

XXVII. Ó Cruz querida, já que nesta hora te conheço, faze de mim tua morada e dita-me tuas leis. Cumula-me, ó princesa minha, com teus castos amores, e faze que eu conheça os teus mais secretos encantos!

XXVIII. Ao ver-te tão bela, bem queria possuir-te, mas meu coração infiel me prende ao meu dever; se queres, Senhora minha, animar meu langor e sustentar minha fraqueza, dou-te o meu coração.

XXIX. Tomo-te para minha vida, meu prazer e minha honra, minha única ventura. Imprime-te, eu te rogo, em meu coração e no meu braço, na minha fronte e na minha face. Não me envergonharei de ti!

XXX. Tomo, para minha riqueza, tua rica pobreza, e, por ternura, tuas doces austeridades. Que tua prudente loucura e tua santa desonra sejam toda a glória e grandeza de minha vida!

XXXI. Minha vitória estará em ser derrotado por tua virtude e para tua maior glória. Não sou, porém, digno de morrer sob teus golpes, nem de ser contrariado por todos.

(Excertos da obra 'Carta aos Amigos da Cruz', de São Luís Grignion de Montfort)

segunda-feira, 20 de julho de 2015

FOTO DA SEMANA

DOS GRAUS DE EXCELÊNCIA DA ORAÇÃO

1. A Oração Dominical, entre todas, é a oração por excelência, pois possui as cinco qualidades requeridas para qualquer oração. A oração deve ser: confiante, reta, ordenada, devota e humilde.

2. A oração deve ser confiante, como São Paulo escreve aos Hebreus (4, 16): 'Aproximemo-nos com confiança do trono da graça, a fim de alcançar a misericórdia e achar a graça para sermos socorridos no tempo oportuno'. A oração deve ser feita com fé e sem hesitação, segundo São Tiago (1,6): 'Se algum de vós necessita de sabedoria, peça-a a Deus... Mas peça-a com fé e sem hesitação'.

Por diversas razões, o Pai Nosso é a mais segura e confiante das orações. A Oração Dominical é obra de nosso advogado, do mais sábio dos pedintes, do possuidor de todos os tesouros de sabedoria (Cl 2, 3), daquele de quem diz São João (I: 2,1): 'Temos um advogado junto ao pai: Jesus Cristo, o Justo'. São Cipriano escreveu em seu Tratado da oração dominical: 'Já que temos o Cristo como advogado junto ao Pai, por nossos pecados, em nossos pedidos de perdão, por nossas faltas, apresentemos em nosso favor, as palavras de nosso advogado'.

A Oração Dominical parece-nos também que deve ser a mais ouvida porque aquele que, com o Pai, a escuta é o mesmo que no-la ensinou; como afirma o Salmo 90 (15): 'Ele clamará por mim e eu o escutarei. 'É rezar uma prece amiga, familiar e piedosa ao se dirigir ao Senhor com suas próprias palavras' diz São Cipriano. Nunca se deixa de tirar algum fruto desta oração que, segundo santo Agostinho, apaga os pecados veniais.

3. Nossa oração deve, em segundo lugar, ser reta, quer dizer, devemos pedir a Deus os bens que nos sejam convenientes.: 'A oração', diz São João Damasceno, 'é o pedido a Deus dos dons que convém pedir'. Muitas vezes, a oração não é ouvida por termos implorado bens que verdadeiramente não nos convêm. 'Pediste e não recebeste, porque pediste mal', diz São Tiago (Tg 4,3).

É tão difícil saber com certeza o que devemos pedir, como saber o que devemos desejar... O Apóstolo reconhece, quando escreve aos Romanos (8, 26): 'Não sabemos pedir como convém, mas o próprio Espírito intercede por nós com gemidos inefáveis'. Mas não é o Cristo que é nosso doutor? Não foi ele que nos ensinou o que devemos pedir, quando seus discípulos disseram: 'Senhor, ensinai-nos a rezar?' (Lc 11, 1). Os bens que ele nos ensina a pedir, na oração, são os mais convenientes. 'Se rezamos de maneira conveniente e justa', diz Santo Agostinho, 'quaisquer que sejam os termos que empregamos, não diremos nada mais do que o que está contido na Oração Dominical'.

4. — Em terceiro lugar, a oração deve ser ordenada, como o próprio desejo que a prece interpreta. A ordem conveniente consiste em preferirmos, em nossos desejos e preces, os bens espirituais aos bens materiais, as realidades celestes às realidades terrenas, de acordo com a recomendação do Senhor (Mt 6,33): 'Procurai primeiro o reino de Deus e sua justiça e o resto — o comer, o beber e o vestir — ser-vos-á dado por acréscimo'. Na Oração Dominical, o Senhor nos ensina a observar esta ordem: primeiro pedimos as realidades celestes e, em seguida, os bens terrestres.

5. Em quarto lugar, a oração deve ser devota. A excelência da devoção torna o sacrifício da oração agradável a Deus. 'Em vosso nome, Senhor, elevarei minhas mãos', diz o Salmista, 'e minha alma é saciada como de fino manjar'. A prolixidade da oração, no mais das vezes, enfraquece a devoção; também o Senhor nos ensina a evitar essa prolixidade supérflua: 'Em vossas orações não multipliqueis as palavras; como fazem os pagãos' (Mt 6,7). Santo Agostinho recomenda, escrevendo a Proba: 'Tirai da oração a abundância de palavras; no entanto não deixeis de suplicar, se vossa atenção continua fervorosa'. Esta é a razão pela qual o Senhor instituiu a breve oração do Pai Nosso.

6. A devoção provém da caridade, que é o amor de Deus e do próximo. O Pai Nosso é uma manifestação destes dois amores. Para mostrar nosso amor a Deus, o chamamos 'Pai' e para mostrar nosso amor ao próximo, pedimos por todos os homens justos, dizendo: 'Pai nosso', e empurrados pelo mesmo amor, acrescentamos: 'perdoai as nossas dívidas'.

7. Em quinto lugar, nossa oração deve ser humilde, segundo o que diz o Salmista (Sl 101, 18): 'Deus olhou para a prece dos humildes'. Uma oração humilde é uma oração que certamente será ouvida, como nos mostra o Senhor, no evangelho do Fariseu e do Publicano (Lc 18, 9-15) e Judite, rogando ao Senhor, dizia: 'Vós sempre tivestes por agradável a súplica dos humildes e dos mansos'. Esta humildade está presente na Oração Dominical, pois a verdadeira humildade está naquele que não confia em suas próprias forças, mas tudo espera do poder divino.

(Dos Sermões de São Tomás de Aquino)

sexta-feira, 17 de julho de 2015

DAS GRAÇAS EXCELSAS DE MARIA (III)

O SORRISO DE MARIA

Esta lembrança de Maria não pode deixar de nos cativar os corações e elevá-los ao céu. Mas, para tornar ainda mais doce e atraente esta lembrança, imaginemos a Virgem a esboçar este suave sorriso, que afasta toda timidez e nos dá a impressão de estarmos tratando com uma mãe, com a mais amorosa das mães. A este respeito, recordamos aqui um episódio das aparições de Lourdes. Trata-se do sr. Conde de Bruissard, convertido pelo sorriso da Virgem. Deixemo-lo narrar o fato (A grinalda de Maria):

'Estava eu em Cauterets, conta-nos ele, no momento em que se falava tanto das aparições. Não acreditava mais nestas aparições do que na existência de Deus. Era um libertino e, mais do que isto, era um ateu. Tendo lido em um dos nossos jornais que Bernadete tivera uma aparição, no dia 16 de julho, e que a Virgem lhe sorria, resolvi ir a Lourdes, por curiosidade, e tomar a menina em uma flagrante mentira.

Dirigi-me à casa dos Soubirous, e lá encontrei Bernadete no limiar da habitação, consertando um par de meias pretas. A mim Bernadete pareceu bastante vulgar. Entretanto, o seu aspecto sofredor tinha uma certa doçura. A meu pedido ela me contou as suas aparições com uma simplicidade e segurança que me impressionaram. Enfim, disse-lhe eu, como é que esta bela senhora sorria?

A jovem pastora olhou-me com certo espanto e, após um momento de silêncio, assim falou: 'Ó senhor, para reproduzir esse sorriso, seria preciso ir até ao Céu' - 'E não poderíeis vós reproduzi-lo para mim? Sou um incrédulo, e não creio em vossas aparições'. O semblante da jovem anuviou-se, e tomou uma expressão severa: 'Então, o sr. julga-me uma mentirosa?' Senti-me desarmado. Não, Bernadete não era mentirosa, e quase que me pus de joelhos a perdir-lhe perdão. 'Já que sois um pecador', respondeu ela, 'eis qual foi o sorriso da Virgem'.

Lentamente, a jovem elevou-se, juntou as mãos e esboçou um sorriso celestial que jamais eu vi em lábios mortais. Sua fisionomia iluminara-se de um reflexo perturbador. Ela ainda sorria, com os olhos elevados ao céu, e eu estava de joelhos aos seus pés, certo de ter admirado no semblante da vidente o sorriso da Santíssima Virgem. Desde então conservo comigo, no íntimo da alma, esta lembrança divina que me enxugou muitas lágrimas. Perdi minha mulher e minhas duas filhas, e me parece não estar só no mundo: Vivo com o sorriso da Virgem'.

'Viver com o sorriso da Virgem!' Talvez nunca tenhas pensado nesta prática, piedoso filho de nossa Mãe! E, entretanto, que fonte de pensamentos sublimes e luminosos! Muitas vezes, sentimo-nos inclinados à tristeza; nossos ombros curvam-se quase sempre ao peso do acabrunhamento ou do desgosto. Contemplai então o sorriso da Virgem!

Este sorriso é a confiança, é o abandono, é o amor, irradiando sobre a nossa alma e envolvendo-a como que em uma atmosfera de paz e de tranquilidade. Ó terna Mãe, doravante o vosso sorriso ilumine a minha vida e presida as minhas alegrias como as minhas lágrimas, santificando as primeiras e enxugando as segundas. Possa ele, ainda, preservar-me do mal, excitar-me à virtude, guiar-me durante a vida e tranquilizar-me na hora da morte, pois é, sob este sorriso suave, que eu quero viver e morrer.

(Excertos da obra 'Por que amo Maria', pelo Pe. Júlio Maria)