1. O MILAGRE EUCARÍSTICO DE MORALEJA
Moraleja de Enmedio é uma pequena localidade de menos de 5000 habitantes, situada ao sul de Madrid, na Espanha. E foi nessa pequena localidade espanhola que aconteceu um dos mais extraordinários milagres eucarísticos dos tempos recentes.
Em 1935, o pároco local, Pe. Roberto Gracía Trejo, de grande santidade, manifestou com grande alegria, pouco antes de falecer, que 'via um milagre na igreja do lugar e muitos peregrinos vindo ver este milagre'. E o milagre realmente ocorreu, cerca de um ano depois, em 16 de julho de 1936, dois dias antes de explodir a Guerra Civil Espanhola. O então pároco local, Pe. Clemente Díaz Arévalo, sucessor do Pe. Gracía Trejo, celebrou uma missa à Virgem do Carmo nesta data, consagrando cerca de uma centena de hóstias, distribuídas aos fiéis. As poucas hóstias restantes foram colocadas no sacrário da igreja.
Temendo profanações e sacrilégios, e até pela própria vida, diante a chegada iminente dos milicianos, o pároco recolheu rapidamente o pequeno cibório, banhado em prata, contendo as hóstias consagradas. O cibório foi, então, escondido inicialmente em uma das casas da vila, depois enterrado por 70 dias no porão e posteriormente escondido num vão de uma viga de telhado de uma segunda casa, tendo que ser abandonado em seguida sob a ordem de evacuação do povoado.
Com a chegada das tropas nacionais àquela região, os moradores puderam retornar às suas casas e, mais do que isso, recuperaram o cibório escondido no mesmo local. Embora o cibório estivesse todo oxidado e o pano que o cobria totalmente deteriorado, as hóstias permaneceram absolutamente intactas, mesmo em condições de umidade extrema e mesmo sendo o cibório não hermeticamente fechado. Com a chegada de dois sacerdotes à vila, estes contaram o número de hóstias consagradas: 24. Comungaram com duas delas e manifestaram o espanto de que elas pareciam novas. Levaram uma outra com eles, restando, portanto, 21 hóstias.
Desde a reconstrução do templo, estas hóstias, transferidas para um novo cibório maior, têm sido mantidas no sacrário da nova igreja, apresentando sempre o mesmo estado de 'hóstias novas'. Cinco delas foram usadas em cerimônias especiais na igreja ao longo dos anos e, assim, restam hoje 16 hóstias prontas para a comunhão e que, no entanto, foram consagradas em julho de 1936!Os habitantes de Moraleja associam este fato extraordinário a uma proteção especial dos Céus ao povoado durante os tempos sangrentos da Guerra Civil Espanhola. Eles protegeram o Senhor e o Senhor os protegeu. Com efeito, nenhum habitante de Moraleja morreu por causa da guerra (1936 - 1939) que ceifou cerca de 300.000 vidas. Nenhum bombardeio aéreo afetou o povoado, embora muitas bombas tenham explodido em suas vizinhanças. Durante a evacuação, as bombas lançadas contra os habitantes em retirada não explodiram. A igreja é extremamente cuidadosa nas confirmações de milagres mas, certamente, a profecia do Pe García Trejo se realizou no estupendo milagre eucarístico de Moraleja...
2. O MILAGRE EUCARÍSTICO DE LANCIANO
'...Tomai e comei, isto é meu corpo...' (Mt 26,26)
Por volta dos anos 700, os Monges de São Basílio viviam no mosteiro de São Legonciano, na cidade italiana de Lanciano. Entre eles, havia um que se atormentava particularmente com a realidade sobrenatural do sacramento eucarístico: a hóstia consagrada seria mesmo o verdadeiro Corpo de Cristo e o vinho consagrado seria mesmo o Seu verdadeiro Sangue? Atormentado pela dúvida e vacilante na fé, pôs-se em oração fervorosa, suplicando a graça de Deus para afastar tal incerteza de sua alma.
E Deus atendeu as suas orações, por meio de um dos mais extraordinários milagres eucarísticos da Igreja. Ao celebrar a Santa Missa, certa manhã, após proferir as palavras da Consagração, ele viu diante de si a hóstia converter-se em Carne viva e o vinho em Sangue vivo. Em êxtase profundo e tomado de temor e alegria, deu a conhecer aos fieis presentes o fato ocorrido: 'Eis aqui a Carne e o Sangue do nosso Cristo muito amado!' A notícia se espalhou rapidamente por toda a cidade, transformando o monge num novo Tomé.

A Hóstia-Carne apresentava, como ainda hoje se pode observar, uma coloração ligeiramente escura, tornando-se rósea, quando iluminada pelo lado oposto, tendo uma aparência fibrosa; o Sangue era de cor terrosa (entre amarelo e ocre), coagulado em cinco fragmentos de forma e tamanho diferentes. As relíquias eucarísticas foram, então, guardadas previamente num tabernáculo de marfim e, a partir de 1713 e até hoje, a Carne passou a ser conservada numa custódia de prata e o Sangue num cálice de cristal.
Adicionalmente ao reconhecimento eclesiástico do Milagre, a Igreja confiou a dois renomados médicos o parecer da ciência moderna sobre as relíquias. Dr. Odoardo Linoli (foto), então chefe do Laboratório de Anatomia Patológica do Hospital de Arezzo e livre docente de Anatomia e Histologia Patológica, de Química e Microscopia Clínica e Prof. Ruggero Bertelli, professor emérito de Anatomia Humana Normal na Universidade de Siena, foram os responsáveis pelos exames e análises laboratoriais, cujos resultados foram apresentados em um relatório final, publicado em 4 de março de 1971.
As principais conclusões dos estudos foram as seguintes:
- A Carne é verdadeira carne.
- O Sangue é verdadeiro sangue.
- A Carne é do tecido muscular do coração (miocárdio, endocárdio e nervo vago).
- A Carne e o Sangue são do mesmo tipo sanguíneo (AB) e pertencem à espécie humana.
- É o mesmo tipo de Sangue (AB) encontrado no Santo Sudário de Turim.
- Não existem vestígios de quaisquer substâncias conservantes nas relíquias.
- No sangue foram encontrados, além das proteínas normais, os seguintes minerais: cloretos, fósforo, magnésio, potássio, sódio e cálcio.
- Não se tratam de substâncias retiradas de um cadáver. Trata-se da carne e do sangue de uma Pessoa Viva, que estivesse vivendo atualmente, pois o sangue é o mesmo daquele que seria retirado, no mesmo dia, de um ser vivo.
Antes mesmo da elaboração do relatório final, os cientistas expressaram a sua posição, em telegrama aos Frades Menores Conventuais, sob cuja guarda encontra-se Igreja do Milagre (desde 1252, chamada de São Francisco): 'E o Verbo se fez Carne!'
Em 1973, o conselho superior da Organização Mundial da Saúde (OMS) nomeou uma comissão científica para verificar as conclusões deste trabalho. Os estudos se prolongaram por 15 meses e as conclusões de todas as investigações confirmaram por completo os resultados previamente publicados na Itália.
3. O MILAGRE EUCARÍSTICO DE LEGNICY
Durante a comunhão eucarística da Missa de Natal de 2013, que estava sendo realizada no santuário de San Jacek (São Jacinto), em Legnicy, na Polônia, uma hóstia consagrada caiu no chão. Recolhida imediatamente, foi colocada em um recipiente com água ('vasculum') para dissolução natural, consoante as boas normas canônicas. Entretanto, uma parte da hóstia, em vez de se consumir de acordo com os padrões físicos maturais, assumiu de imediato uma textura avermelhada e adiposa, similar ao tecido muscular humano.
Instituída uma comissão especial para avaliação do fenômeno, procedeu-se, mediante a remoção de um pequeno fragmento da parte ensanguentada da hóstia, a exames e testes especializados por dois institutos poloneses diferentes, concluindo-se pela presença no mesmo de tecidos estriados do músculo cardíaco humano, com sinais característicos de exposição a uma agonia extrema. Em janeiro de 2016, o bispo diocesano, Zbigniew Kiernikowski, encaminhou os pareceres dos especialistas à consideração teológica da Congregação para a Doutrina da Fé no Vaticano que, não apenas reconheceu a veracidade do milagre, como manifestou-se pela aprovação à exposição pública da hóstia ensanguentada.
São Jacinto (1185 - 1257) é mundialmente cultuado pela sua devoção e adoração ao Santíssimo Sacramento e pela sua proteção extrema da Sagrada Eucaristia contra atos de vandalismo, profanação ou sacrilégio. Em 1240, encontrando-se em Kiev, atual capital da Ucrânia, temendo o sacrilégio das espécies sagradas pelo cerco e iminente ataque de hordas de bárbaros mongóis, fugiu da cidade, passando pelo Rio Dnieper e pelo acampamento dos bárbaros sem ser visto, levando consigo o cibório com as hóstias consagradas, uma estátua de Nossa Senhora e a companhia de outros religiosos. O mais recente milagre eucarístico proclamado pela Igreja aconteceu no santuário a ele consagrado, na sua Polônia natal, tendo sido reconhecido formalmente em 17 de abril de 2016, aniversário da canonização de São Jacinto (proclamada em 17 de abril de 1594, pelo Papa Clemente VIII).
São Jacinto fugindo de Kiev em chamas com a Eucaristia e a imagem de Nossa Senhora.
Leandro Bassano (1557-1622), igreja de São João e São Paulo / Veneza
4. O MILAGRE EUCARÍSTICO DE BOLSENA
(Bolsena / Itália - 1263)
No retorno de uma peregrinação a Roma, um sacerdote oriundo de Praga (de nome Pedro, segundo a tradição) parou na localidade de Bolsena, tradicional ponto de parada ao longo da Via Cassia (uma das mais antigas estradas romanas). Ali, celebrou uma Santa Missa na Igreja de Santa Cristina, que guarda os restos mortais da mártir e padroeira da cidade. Durante as palavras da consagração, o sangue começou a fluir de repente da hóstia consagrada, a escorrer pelas mãos do sacerdote e a respingar sobre as pedras de mármore do altar.
(Igreja de Santa Cristina, em Bolsena)
Deslocando-se até Orvieto, cidade situada a menos de 20km de Bolsena, comunicou o milagre ao papa Papa Urbano IV, que estava ali em residência temporária. E fez uma confissão e um pedido de perdão: ele, mesmo sendo sacerdote, muitas vezes havia duvidado da real presença de Cristo nas hóstias consagradas. O papa, sabendo tratar-se de um sacerdote justo e piedoso, embora incrédulo, o absolveu, procedeu a uma investigação particular dos fatos junto à diocese local e, posteriormente, fez conduzir a hóstia e o corporal utilizado na Missa - pequeno pano quadrangular de linho sobre o qual se coloca o cálice para o ato de consagração - manchado de sangue, para imposição no altar da catedral de Orvieto.
(Catedral de Orvieto)
(Corporal do milagre de Bolsena - altar da Catedral de Orvieto)
(Manchas de sangue no corporal do milagre de Bolsena)
Motivado por este milagre eucarístico, o papa Urbano IV encarregou São Tomás de Aquino a compor o Próprio para uma Missa e um Ofício honrando a Sagrada Eucaristia e o Corpo e o Sangue de Cristo. Em agosto de 1264, pouco mais de um ano após o milagre, o Papa Urbano IV instituiu na Igreja a festa de Corpus Christi (bula papal Transiturus de Hoc Mundo). Em agosto de 1964, no 700º aniversário da instituição da festa de Corpus Christi, o Papa Paulo VI celebrou a Santa Missa diretamente do altar da Catedral de Orvieto, que guarda as relíquias do milagre eucarístico de Bolsena.
5. O MILAGRE EUCARÍSTICO DE SIENA
Nas vésperas da festa da Assunção de Nossa Senhora, os sacerdotes de Siena estavam reunidos em vigília na catedral da cidade, na noite de 14 de agosto de 1730. Muitas hóstias haviam sido consagradas naqueles dias e estavam guardadas nas igrejas para o atendimento do grande número previsto de comunhões. E esse contexto serviu de oportunidade para alguns ladrões invadirem a basílica de São Francisco e roubarem uma âmbula de ouro contendo centenas de hóstias consagradas.
(Basílica de São Francisco - Siena / Itália)
Constatado o sacrilégio na manhã seguinte, o roubo foi confirmado pelo achado da parte superior da âmbula perdida na rua, sem quaisquer resquícios da âmbula e das hóstias consagradas. Tristeza, e muitas orações de desagravo e na intenção da recuperação do tesouro eucarístico roubado. E eis que, três dias depois, uma pessoa notou alguma coisa branca destacando-se numa caixa de coleta numa igreja próxima à basílica de São Francisco e - surpresa! - ali se encontravam exatamente e na sua totalidade as 351 hóstias que haviam sido roubadas!
Embora sujas e envoltas por teias de aranha, as 351 hóstias foram resgatadas uma a uma, recolocadas em outra âmbula e reconduzidas à basílica de São Francisco, onde foram objeto de maciças orações de desagravo e adoração, até que se deteriorassem por inteiro. Mas isto nunca aconteceu. As hóstias permaneceram e permanecem intactas até hoje, com o mesma aparência e frescor de hóstias recém-preparadas, como examinadas com todo o rigor em diversas ocasiões depois destes fatos. Embora muitas delas tenham sido consumidas ao longo do tempo, conservam-se atualmente na basílica de São Francisco em Siena 223 hóstias frescas que foram elaboradas e consagradas há quase 300 anos!
6. O MILAGRE EUCARÍSTICO DE SEEFELD
Seefeld, uma pequena localidade situada na região do Tirol (Áustria) foi palco de um dos eventos sobrenaturais mais extraordinários do século XIV. Este evento ocorreu na Quinta Feira Santa de 1384, na pequena igreja de Saint Oswald (São Oswaldo), erigida originalmente como uma pequena capela em 1306.
Durante a missa local, Oswald Milser, nobre e senhor de Schlossberg, aproximou-se do altar para receber a Eucaristia. Era uma pessoa muito poderosa na comunidade à época e reconhecidamente uma figura de má conduta e completamente alheia à religião católica. Ainda assim, não só adiantou-se para receber a comunhão aos pés do altar, como exigiu que o sacerdote a fizesse não com a hóstia comum oferecida aos comungantes, mas por meio da grande hóstia reservada apenas ao sacerdote celebrante. O sacerdote, refém do respeito e do temor humano, fez como lhe havia sido ordenado e compartilhou com o senhor de Schlossberg a sacrílega comunhão.
Assim que recebeu a Sagrada Hóstia, o piso de pedra começou a afundar sob os pés do homem, como se não tivesse resistência alguma. Ao mesmo tempo, a Hóstia começou a diluir-se em sangue na boca do ímpio comungante, e não podia ser consumida. Com a boca aberta e fluindo sangue, o infeliz tentou ainda agarrar-se à borda do altar no desespero da situação e, nesse momento, o sacerdote conseguiu recuperar a hóstia ensanguentada. Imediatamente, o piso retornou à sua condição estável natural e o nobre pôde recompor-se de pé, saindo do buraco do chão.
A igreja tornou-se, então, um grande centro de peregrinação religiosa na Áustria e foi ampliada entre 1423 e 1431. Em 1574, foi construída uma capela dedicada exclusivamente à relíquia eucarística - chamada Capela do Sangue - que abriga atualmente a Hóstia milagrosa, e diversas pinturas que reproduzem o milagre.
E essa Hóstia ensanguentada permanece incólume mesmo 640 anos após esse evento, encapsulada num ostensório guardado perto do altar da capela. Ainda hoje é possível também ver o grande buraco que se abriu no piso de pedra quando Oswald Milser afundou no chão, hoje recoberto por uma grade por questões de segurança.
Quanto ao homem destes fatos extraordinários, sua vida mudou radicalmente. Convertido e profundamente abalado pelos eventos, o senhor de Schlossberg abandonou a vida mundana e ingressou imediatamente no mosteiro de Stams onde, após dois anos de severas penitências, morreu de causas naturais.
7. O MILAGRE EUCARÍSTICO DE CASCIA
Em 1330, na região de Cascia (Itália), um sacerdote foi chamado às pressas para ministrar a Sagrada Eucaristia a um homem doente em estado terminal. Atendendo rapidamente ao pedido, o sacerdote resolveu, de forma inesperada e totalmente irreverente, levar a hóstia consagrada destinada ao doente guardada entre as páginas do seu breviário. Na casa do doente, ao abrir o breviário para ministrar ao doente a comunhão, descobriu estupefato que a hóstia não apenas se transformara num coágulo único, mas se desmanchava em grandes manchas de sangue em ambas as páginas do breviário entre as quais havia sido mantida.
Sob forte comoção e arrependimento, o sacerdote dirigiu-se imediatamente para um mosteiro agostiniano próximo de Siena, ao encontro do Frei Simone Fidati, sacerdote de piedade e santidade reconhecidas, para narrar os fatos e pedir a sua confissão. O breviário foi então recolhido e as duas páginas, manchadas de sangue e com dimensões de 52mm x 44mm, foram preservadas e destinadas à veneração interna no mosteiro.
Em 1389, o papa Bonifácio IX confirmou a autenticidade do milagre, concedendo indulgência especial ao culto da relíquia em 1401. Ao longo dos anos, um outro evento extraordinário transcorreu com as manchas de sangue diluídas nas páginas do breviário: elas passaram a conformar a figura de um rosto humano, reproduzindo a imagem de um homem com barba. A relíquia foi transferida do mosteiro agostiniano para a capela inferior da Basílica de Santa Rita em Cascia em 1930, onde se encontra atualmente, mantidas em um tabernáculo de cristal ladeado por dois painéis de mármore, que simulam as páginas do breviário contendo as imagens formadas do rosto humano.
8. O MILAGRE EUCARÍSTICO DE AVIGNON
Avignon, cidade situada na região sul da França e cortada pelo rio Ródano, é a única cidade que recebeu oficialmente o papado fora de Roma em toda história. Disputas pelo poder envolvendo o rei francês Filipe IV, levaram o papado para a França. O período histórico de 1309 a 1377 ganhou o nome de Papado de Avignon e esta permanência dos papas na região provençal constitui um dos períodos mais conturbados da história da Igreja. Foram sete papas franceses em um período de 68 anos.
Desde o século XII, a região do sul da França era cenário do desenvolvimento intenso de um dos maiores movimentos heréticos da Idade Média, o chamado catarismo ou heresia albigense, que negava a existência de um único Deus e a presença real de Cristo na sagrada eucaristia, propagando a salvação fundamentada apaenas no conhecimento direto de Deus.
Para celebrar a vitória da Igreja contra a heresia albigense, o então rei Luís VIII fez construir a Capela de Santa Cruz, em honra ao Santíssimo Sacramento. Mais ainda, promoveu e participou ativamente de uma procissão ao Santíssimo Sacramento que percorreu várias ruas da cidade e foi encerrada na capela recém-construída, durante a Festa da Exaltação da Santa Cruz em 14 de setembro de 1226. Desde então, teve início a adoração perpétua do Santíssimo Sacramento nesta igreja e, para a salvaguarda dessa devoção, foi instituída a chamada Confraria Real dos Penitentes Cinzentos de Avignon.
Cerca de duzentos anos depois, no final de novembro de 1433, a região foi assolada por chuvas torrenciais que produziram cheias históricas do rio Ródano e a inundação completa das áreas ao seu redor. As águas subiam sem parar e os penitentes da confraria, responsáveis pela devoção eucarística na Capela de Santa Cruz, temeram fortemente pela inundação da igreja. Dois membros da confraria decidiram, então, acessar a igreja por barco e resgatar a custódia contendo o Santíssimo Sacramento antes do pior. Diante deles, entretanto, a situação era bem mais crítica, pois uma muralha de água de quase 1,8m de altura já submergia o local e a própria porta frontal do templo.
Ao adentrarem na igreja, porém, os dois religiosos foram tomados por um estupor sem tamanho: à semelhança da partição das águas do Mar Vermelho, as águas da enchente conformavam dois paredões laterais próximos às paredes internas do templo, mantendo irretocavelmente seco o espaço central da igreja situado desde a porta frontal até o altar, conservando-se intacta, assim, a custódia contendo as hóstias consagradas da ação da enchente.
Após prostarem-se em oração e jubilosos com tal milagre, recolheram o Santíssimo e o conduziram a uma outra igreja em terreno mais elevado e protegido da inundação. A notícia do milagre espalhou-se rapidamente e centenas de pessoas foram testemunhas dele. A confraria franciscana instituiu a celebração do milagre desde então na capela, todos os anos, no dia de Santo André Apóstolo, 30 de novembro. Neste dia, antes da bênção do Santíssimo Sacramento, canta-se ali o Cântico que Moisés teria composto após a travessia do Mar Vermelho (Ex 15, 1-18):
'Cantarei ao Senhor, porque ele manifestou sua glória. Precipitou no mar cavalos e cavaleiros. O Senhor é a minha força e o objeto do meu cântico; foi ele quem me salvou. Ele é o meu Deus – eu o celebrarei; o Deus de meu pai – eu o exaltarei. O Senhor é o herói dos combates, seu nome é Javé. Lançou no mar os carros do faraó e o seu exército; a elite de seus combatentes afogou-se no mar Vermelho; o abismo os cobriu; afundaram-se nas águas como pedra. A vossa (mão) direita, ó Senhor, manifestou sua força. Vossa direita aniquilou o inimigo. Por vossa soberana majestade derrotais vossos adversários; desencadeais vossa cólera, e ela os consome como palha. Ao sopro de vosso furor amontoaram-se as águas; levantaram-se as ondas como muralha, solidificaram-se as vagas no coração do mar. Dizia o inimigo: perseguirei, alcançarei, repartirei o despojo, satisfarei meu desejo de vingança, desembainharei a espada, minha mão os destruirá. Ao sopro de vosso hálito o mar os sepultou; submergiram como chumbo na vastidão das águas. Quem entre os deuses é semelhante a vós, Senhor? Quem é semelhante a vós, glorioso por vossa santidade, temível por vossos feitos dignos de louvor, e que operais prodígios? Apenas estendestes a mão, e a terra os tragou. Conduzistes com bondade esse povo, que libertastes; e com vosso poder o guiastes à vossa morada santa. Ao ouvir isso, estremeceram os povos. Um pavor imenso apoderou-se dos filisteus; os chefes de Edom ficaram aterrados; a angústia tomou conta dos valentes de Moab; tremeram de medo todos os habitantes de Canaã. Caíram sobre eles o terror e a angústia, o poder do vosso braço os petrificou, até que tivesse passado o vosso povo, Senhor, até que tivesse passado o povo que adquiristes para vós. Vós o conduzireis e o plantareis na montanha que vos pertence, no lugar que preparastes para vossa habitação, Senhor, no santuário, Senhor, que vossas mãos fundaram. O Senhor é rei para sempre, sem fim!'.
9. O MILAGRE EUCARÍSTICO DE AMSTERDÃ - I
Amstelredam (Amsterdã) surgiu a partir de uma barragem construída no século XIII na foz do rio Amstel. O milagre eucarístico de Amsterdã ocorreu em 13 de março de 1345, quando a atual capital da Holanda não passava ainda de uma vila simplória conformada por um canal que contornava umas poucas ruas, casas e becos, alinhadas com cabanas de pescadores, uma igreja e um mosteiro. Numa casa simples às margens do canal, um pescador chamado Ysbrant Dommer, em seu leito de morte, fez chamar um sacerdote para receber os últimos sacramentos da Igreja. Após ouvir a confissão do homem, o padre o abençoou com os óleos da Extrema Unção e lhe deu a Comunhão.
Assim que o padre se foi, o pobre homem começou a tossir violentamente e, incapaz de qualquer contenção, acabou por vomitar a Hóstia recebida com todo o alimento do estômago. A Hóstia vomitada e ainda intacta foi lançada então em uma lareira acesa, desaparecendo em meio às chamas intensas, de acordo com o rito litúrgico medieval de se tratar a Eucaristia quando esta era expelida ou impossibilitada de ser consumida reverentemente.
No dia seguinte, porém, revolvendo-se as brasas e cinzas do fogo anterior, a Hóstia foi encontrada ainda perfeitamente intacta, sem quaisquer sinais de queima ou mudanças de forma ou de cor, mas tão somente branca, clara e brilhante como saída das mãos do sacerdote da comunhão. A Hóstia foi então recolhida cuidadosamente com um pano limpo e guardada em uma pequena arca, dando-se ciência então dos fatos ao sacerdote do dia anterior. Pedindo discrição a todos, o padre levou a Hóstia para a igreja paroquial de São Nicolau, colocando-a num píxide guardado no sacrário. Por espantoso que pareça, no dia seguinte, a Hóstia desapareceu do sacrário e foi reencontrada na pequena arca onde havia sido guardada originalmente. Levada novamente à Igreja, repetiu-se pela segunda vez o seu reaparecimento no local original onde fôra guardada.
A terceira vez que a Hóstia foi levada à igreja local ocorreu em meio a uma solene procissão e adoração eucarística, depois de ampla divulgação pública destes extraodinários eventos. As investigações oficiais, com amplo relato de testemunhas, foram conduzidas e atestadas pelo Bispo de Utrecht. Em carta pastoral, o bispo ratificou oficialmente como autêntico o milagre eucarístico ocorrido na pequena vila de Amsterdã, autorizando em seguida a exposição e a veneração pública da Hóstia. A casa do pescador - que recuperou a saúde - tornou-se local de peregrinação e, mais tarde, em 1347, foi transformada em capela (Heilige Stede ou 'Lugar Santo').
Com o grande afluxo de peregrinos, decidiu-se erguer um templo maior em local próximo, chamado Nieuwezijds Kapel (em tradução livre, Capela da Cidade Nova), construído entre 1347 e 1351, no então bairro do chamado 'lado novo' de Amsterdã, que passou a guardar a Hóstia Milagrosa em um baú-relicário, convertendo-se, assim, no santuário oficial do Milagre Eucarístico de Amsterdã. Deste modo, antes de Amsterdã ser conhecida internacionalmente como porto e cidade comercial, ela tornou-se um famoso local de peregrinação na Idade Média, graças a este milagre eucarístico.
10. O MILAGRE EUCARÍSTICO DE AMSTERDÃ - II
Em 24 de maio de 1452, a então já bastante desenvolvida cidade de Amsterdã foi praticamente devastada por um incêndio de grandes proporções, facilitado em larga escala pelas suas construções tipicamente de madeira com telhados de palha. O fogo destruiu não apenas moradias, mas também prédios públicos, igrejas e edifícios de maneira geral, causando enormes prejuízos e uma quase completa ruína da cidade.
Quando o incêndio atingiu a capela construída no local do milagre eucarístico de 1345 (Nieuwezijds Kapel ou 'Capela da Cidade Nova'), muitos moradores tentaram salvar a Hóstia Milagrosa da destruição pelo fogo, sem êxito, devido à rápida propagação das chamas. Toda a igreja desabou e foi reduzida a cinzas. Mas um segundo milagre iria envolver a Hóstia Milagrosa, mais de 100 anos depois. No dia seguinte, em meio aos destroços do incêndio, o baú-relicário que continha a Hóstia foi encontrado completamente intacto, contra todas as expectativas possíveis. A hóstia havia sido preservada do fogo uma segunda vez.
A renovação extraordinária do Milagre Eucarístico de Amsterdã elevou a cidade a centro de peregrinação religiosa de toda a Europa a partir de então e uma nova capela foi construída no local, substituindo a capela original. Durante o século XVI, porém, Amsterdã passou pela Reforma Protestante e, como consequência, muitas igrejas foram profanadas e muitos símbolos católicos foram roubados e destruídos, incluindo a própria Hóstia Milagrosa, furtada e nunca mais recuperada. Em 1578, a Nieuwezijds Kapel foi confiscada pelo governo protestante e o culto católico foi proibido. A capela foi readaptada para diferentes fins ao longo dos tempos, sendo completamente demolida em 1908.
(baú-relicário da Hóstia Milagrosa)
Os únicos objetos remanescentes do segundo milagre são o baú-relicário que continha a Sagrada Hóstia e documentos oficiais que atestam o milagre. Ainda hoje e todos os anos, a comunidade católica refaz a procissão solene em honra do milagre (a chamada Stille Omgang ou Procissão Silenciosa) que percorre em silêncio o mesmo trajeto original da procissão medieval, na véspera do Domingo de Ramos.

































