quarta-feira, 29 de novembro de 2023

ORAÇÃO: AVE VERUM CORPUS NATUM

Ave Verum Corpus Natum é um pequeno hino eucarístico que data do século XIV, cuja autoria é comumente atribuída ao Papa Inocêncio VI (pontificado de 1484 a 1492), de uso bastante frequente no passado durante a bênção do Santíssimo Sacramento. O hino possui algumas pequenas variantes, mas o texto mais comum é aquele apresentado e traduzido abaixo.

Ave verum Corpus natum
De Maria Virgine:
Vere passum, immolatum
In cruce pro homine:
Cujus latus perforatum
Fluxit aqua et sanguine:
Esto nobis praegustatum
Mortis in examine.
O Jesu dulcis!
O Jesu pie!
O Jesu fili Mariae!


Salve, ó verdadeiro Corpo,
nascido da Virgem Maria,
que verdadeiramente padeceu 
e foi imolado na cruz pelos homens,
e de cujo lado transpassado
jorraram sangue e água;
sede para nós refrigério
na dura provação da morte.
Ó doce Jesus,
ó Jesus piedoso, 
ó bom Jesus, filho de Maria!

DOUTORES DA IGREJA (XXXII)

  32Santa Catarina de Sena, Virgem (†1380)

Doutora Mística

(1347 - 1380)

Concessão do título: 1970 - Papa Paulo VI
Celebração: 29 de abril (Memória Obrigatória)

 Obras e Escritos 
  • O Diálogo (O Diálogo da Providência Divina)
  • Cartas
  • Orações

terça-feira, 28 de novembro de 2023

POEMAS PARA REZAR (LI)


UM CAMINHO DE PEDRAS

O caminho da vida eterna é acanhado,
cheio de pedras aqui e ali entulhadas:
há duas formas de percorrer este caminho
e são dois os frutos distintos das jornadas

Há uns que percorrem tal caminho estreito
querendo ganhar tempo em longas passadas
perscrutam o horizonte a cada novo passo
e simplesmente desviam das pedras encontradas

Há outros que seguem pela via estreita
menos escravos dos tempos e dos passos
parando e recolhendo as pedras espalhadas,
empilham pedras e abrem mais espaços

Estas pedras são nossas dores mais doídas,
que tanto atropelo causam na caminhada:
é lícito que as deixemos como lastros perdidos
para que não sejam como fardos na jornada

Mas quem delas desfaz sem bem algum
torna-se senhor de obra não consumada
não torna mais limpo o caminho que percorre
nem é guia para quem se junta na jornada

O caminho estreito é cada vez mais longo
e desviar de tanta pedra pode dar trabalhos
e, quem descansou para seguir caminho,
tende a cansar de vez e buscar atalhos

Por isso, que cada um que percorra essa jornada
o faça movido sempre por inteira confiança:
é preciso abrir caminhos através de nossas obras
porque o bom exemplo é nossa melhor herança

Há que se cair para para se obter mais tempo
de parar e juntar tanta pedra desarrumada
e, ao empilhá-las, deixar guias pelo caminho
e tornar mais fácil percorrer a longa estrada

E livres, guias de uns, por outros guiados,
mesmo cheios de sombras e de muitas quedas,
possamos chegar um dia diante a Porta Estreita
com muitas mãos que empilharam pedras...

(Arcos de Pilares)

segunda-feira, 27 de novembro de 2023

TESOURO DE EXEMPLOS (271/275)

 

271. DEU-LHE A LIBERDADE

Serapião, o dionita, fez-se escravo de um pagão, para convertê-lo e o conseguiu de fato. Seu amo deu-lhe a liberdade e presenteou-o com vestes, uma túnica e um Livro dos Evangelhos. Serapião deu as vestes para o primeiro pobre que encontrou e, pouco depois, a túnica a outro e, depois, mostrando o Evangelho, dizia: 'Eis aqui o que me despojou de tudo'. E, oportunamente, vendeu também o livro para socorrer a uma viúva.

272. SÃO TOMÁS MORO

Este grande chanceler da corte da Inglaterra, sendo já casado e em idade avançada, nunca saía de casa sem pedir de joelhos a bênção ao seu velho pai, a quem demonstrava a maior veneração e respeito.

273. CASTIGO DE UM MAU FILHO

A 19 de outubro de 1914, próximo de Turim, um rapaz discutiu com sua mãe por questão de interesses menores, chegando a espancá-la brutalmente, quebrando-lhe o braço e causando-lhe ferimentos graves. A mãe teve de ser hospitalizada e o filho foi preso. Quando o levaram à estação para conduzi-lo ao tribunal de Turim, o rapaz tentou atirar-se debaixo do trem que se aproximava.

Caindo, porém, ao lado, o trem cortou-lhe somente as duas mãos com que maltratara a mãe e, assim, teve de apresentar-se no tribunal.

274. QUERO IR COM MINHA MÃE

Enquanto se torturava a mártir Santa Julieta, Ciro, seu filhinho de três anos, ao ver que sua mãe derramava sangue, começou a gritar de maneira enternecedora. O governador tomou-o nos braços para acalmá-lo, mas o menino o repeliu, gritando: 'Sou cristão e quero ir com minha mãe'. E para escapar-se, arranhou o rosto do governador. Furioso, o governador tomou-o pelo pé e partiu-lhe a cabeça contra as grades do tribunal. A mãe deu graças a Deus e, em seguida, a sua cabeça foi cortada.

275. SANTA MACRINA

Era irmã de São Gregório Nazianzeno. Esta santa mulher nunca perdeu de vista sua mãe. Concentrou nela todos os seus cuidados e afetos e jamais permitiu que os criados a servissem, reservando-se a honra de preparar-lhe a comida e de servi-la. Quando a mãe enviuvou, Macrina dedicou-se inteiramente a ajudá-la na educação dos quatro filhos e das cinco filhas que lhe restavam.

(Excertos da obra 'Tesouro de Exemplos', do Pe. Francisco Alves, 1958; com adaptações)


domingo, 26 de novembro de 2023

INDULGÊNCIA PLENÁRIA DO DOMINGO DE CRISTO REI

 

Neste domingo, dia da solenidade de Cristo Rei, recebe Indulgência Plenária todo fiel* que recitar, publicamente e com piedosa devoção, o ato de consagração do gênero humano a Jesus Cristo Rei.

Dulcíssimo Jesus, Redentor do gênero humano, lançai sobre nós que humildemente estamos prostrados na vossa presença, os vossos olhares. Nós somos e queremos ser vossos; e, a fim de podermos viver mais intimamente unidos a vós, cada um de nós se consagra, espontaneamente, neste dia, ao vosso sacratíssimo Coração. 

Muitos há que nunca vos conheceram; muitos, desprezando os vossos mandamentos, vos renegaram. Benigníssimo Jesus, tende piedade de uns e de outros e trazei-os todos ao vosso Sagrado Coração.

Senhor, sede rei não somente dos fiéis, que nunca de vós se afastaram, mas também dos filhos pródigos, que vos abandonaram; fazei que estes tornem, quanto antes, à casa paterna, para não perecerem de miséria e de fome. Sede rei dos que vivem iludidos no erro, ou separados de vós pela discórdia; trazei-os ao porto da verdade e à unidade da fé, a fim de que, em breve, haja um só rebanho e um só pastor.

Senhor, conservai incólume a vossa Igreja, e dai-lhe uma liberdade segura e sem peias; concedei ordem e paz a todos os povos; fazei que, de um polo a outro do mundo, ressoe uma só voz: louvado seja o coração divino, que nos trouxe a salvação; honra e glória a ele, por todos os séculos. Amém.

* Para que alguém seja capaz de lucrar indulgências, deve ser batizado, não estar excomungado e encontrar-se em estado de graça, pelo menos no fim das obras prescritas. O fiel deve também ter intenção, ao menos geral, de ganhar a indulgência e cumprir as ações prescritas, no tempo determinado e no modo devido, segundo o teor da concessão. A indulgência plenária só se pode ganhar uma vez ao dia.

EVANGELHO DO DOMINGO

 

'O Senhor é o pastor que me conduz; não me falta coisa alguma' (Sl 22)

Primeira Leitura (Ez 34,11-12.15-17) - Segunda Leitura (1Cor 15,20-26.28)  -  Evangelho (Mt 25,31-46)

 26/11/2023 - Solenidade de Cristo Rei 

53. JESUS CRISTO, REI DO UNIVERSO


Jesus Cristo é o Rei do Universo. Como Filho Unigênito de Deus, Ele é o herdeiro universal de toda a criação, senhor supremo e absoluto de toda criatura e de toda a existência de qualquer criatura, no céu, na terra e abaixo da terra. A realeza de Cristo abrange, portanto, a totalidade do gênero humano, como expresso nas palavras do Papa Leão XIII: 'Seu império não abrange tão só as nações católicas ou os cristãos batizados, que juridicamente pertencem à Igreja, ainda quando dela separados por opiniões errôneas ou pelo cisma: estende-se igualmente e sem exceções aos homens todos, mesmo alheios à fé cristã, de modo que o império de Cristo Jesus abarca, em todo rigor da verdade, o gênero humano inteiro' (Encíclica Annum Sacrum, 1899).

E, neste sentido, o domínio do seu reinado é universal e sua autoridade é suprem e absoluta. Cristo é, pois, a fonte única de salvação tanto para as nações como para todos os indivíduos. 'Não há salvação em nenhum outro; porque abaixo do Céu nenhum outro nome foi dado aos homens, pelo qual nós devamos ser salvos' (At 4, 12). O livre-arbítrio permite ao ser humano optar pela rebeldia e soberba de elevar a criatura sobre o Criador, mas os frutos de tal loucura é a condenação eterna.

A realeza de Cristo é, entretanto, principalmente interna e de natureza espiritual. Provam-no com toda evidência as palavras da Escritura acima referidas, e, em muitas circunstâncias, o proceder do próprio Salvador. Quando os judeus, e até os Apóstolos, erradamente imaginavam que o Messias libertaria seu povo para restaurar o reino de Israel, Jesus desfez o erro e dissipou a ilusória esperança. Quando, tomada de entusiasmo, a turba, que O cerca O quer proclamar rei, com a fuga furta-se o Senhor a estas honras, e oculta-se. Mais tarde, perante o governador romano, declara que seu reino 'não é deste mundo'. Neste reino, tal como no-lo descreve o Evangelho, é pela penitência que devem os homens entrar. Ninguém, com efeito, pode nele ser admitido sem a fé e o batismo; mas o batismo, conquanto seja um rito exterior, figura e realiza uma regeneração interna. Este reino opõe-se ao reino de Satanás e ao poder das trevas; de seus adeptos exige o desprendimento não só das riquezas e dos bens terrestres, como ainda a mansidão, a fome e sede da justiça, a abnegação de si mesmo, para carregar com a cruz. Foi para adquirir a Igreja que Cristo, enquanto 'Redentor', verteu o seu sangue; para isto é, que, enquanto 'Sacerdote', se ofereceu e de contínuo se oferece como vítima. Quem não vê, em consequência, que sua realeza deve ser de índole toda espiritual? (Encíclica Quas Primas de Pio XI, 1925).

Cristo Rei se manifesta por inteiro pela Sua Santa Igreja e, por meio dela, e por sua paixão, morte e ressurreição, atrai para Si a humanidade inteira, libertada do pecado e da morte, que será o último adversário a ser vencido. E quando voltar, há de separar o joio do trigo, as ovelhas e o cabritos, uns para a glória eterna, outros para a danação eterna: 'Quando o Filho do Homem vier em sua glória, acompanhado de todos os anjos, então se assentará em seu trono glorioso. Todos os povos da terra serão reunidos diante dele, e ele separará uns dos outros, assim como o pastor separa as ovelhas dos cabritos. E colocará as ovelhas à sua direita e os cabritos à sua esquerda... estes irão para o castigo eterno, enquanto os justos irão para a vida eterna' (Mt 25, 31 - 33.46).

quinta-feira, 23 de novembro de 2023

FRASES DE SENDARIUM (XVI)

 
'Nosso coração nunca se farta, porque o bem infinito não tem limites' 

(São Gregório de Nissa)


'Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei de mim que sou manso e humilde de coração, e vós encontrareis descanso, pois o meu jugo é suave e o meu fardo é leve' (Mt 11,29)

quarta-feira, 22 de novembro de 2023

SOBRE AS OBRAS FEITAS POR CARIDADE



1. Por nenhuma coisa do mundo, nem por amor de pessoa alguma, se deve praticar qualquer mal; mas, em prol de algum necessitado, pode-se, às vezes, omitir uma boa obra, ou trocá-la por outra melhor. Desta sorte, a boa obra não se perde, mas se converte em outra melhor. Sem a caridade, nada vale a obra exterior; tudo, porém, que da caridade procede, por insignificante e desprezível que seja, produz abundantes frutos, porque Deus não atende tanto à obra, como à intenção com que a fazemos.

2. Muito faz aquele que muito ama. Muito faz quem bem faz o que faz. Bem faz quem serve mais ao bem comum que à sua própria vontade. Muitas vezes parece caridade o que é mero amor-próprio, porque raras vezes nos deixa a inclinação natural, a própria vontade, a esperança da recompensa, o nosso interesse.

3. Aquele que tem verdadeira e perfeita caridade em nada se busca a si mesmo, mas deseja que tudo se faça para a glória de Deus. De ninguém tem inveja, porque não deseja proveito algum pessoal, nem busca sua felicidade em si, mas procura sobre todas as coisas ter alegria e felicidade em Deus. Não atribui bem algum à criatura, mas refere tudo a Deus, como à fonte de que tudo procede, e em que, como em fim último, acham todos os santos o deleitoso repousar. Ó quem tivera só uma centelha de verdadeira caridade logo compreenderia a vaidade de todas as coisas terrenas!

(Da Imitação de Cristo, de Thomas de Kempis)

terça-feira, 21 de novembro de 2023

O DOGMA DO PURGATÓRIO (LXIX)

 

Capítulo LXIX

Alívio às Santas Almas pelas Indulgências - Orações e Jaculatórias

Há certas indulgências que são fáceis de obter e que se aplicam também aos mortos. Esperamos ajudar ao leitor indicando as principais [a obra original é de 1888; acessar aqui o atual Manual de Indulgências da Igreja Católica]:

(i) Oração 'Eis-me aqui, ó bom e dulcíssimo Jesus' - indulgência plenária para quem, depois de se ter confessado e comungado, recitar esta oração diante de uma imagem de Cristo crucificado, acrescentando alguma outra oração em intenção do Soberano Pontífice [e da Igreja].

(ii)  Santo Rosário - muitas e grandes indulgências estão associadas à recitação do Santo Rosário, se fizermos uso de contas indulgenciadas pelo nosso Santo Padre, o Papa, ou por um sacerdote que tenha recebido tais faculdades.

(iii) A Via Sacra - como já dissemos, à Via Sacra estão associadas várias indulgências plenárias e um grande número de indulgências parciais. Estas indulgências não exigem a confissão e a comunhão; basta estar em estado de graça e ter uma dor sincera de todos os nossos pecados. 

Quanto ao exercício propriamente dito da Via-Sacra, não se requer senão duas condições: (i) visitar as quatorze estações, passando de uma para outra, tanto quanto as circunstâncias o permitam; (ii) meditar ao mesmo tempo na Paixão de Jesus Cristo; as pessoas que não souberem fazer uma meditação conexa com a Via sacra podem contentar-se em pensar afetuosamente em alguma circunstância da Paixão que esteja de acordo com a sua capacidade; exortamo-las, contudo, impor como uma obrigação recitar sempre um Pai Nosso e uma Ave Maria em cada estação, e a fazer um ato de contrição pelos seus pecados.

(iv) Atos de Fé, Esperança e Caridade - Indulgência de sete anos e sete quarentenas de cada vez que forem recitados.

(v) Ladainha da Santíssima Virgem - trezentos dias de indulgência por vez.

(vi) Sinal da Cruz - cinquenta dias cada vez; mediante uso de água benta, indulgência de cem dias.

(vii) Jaculatórias como 'Meu Jesus, misericórdia!' - cem dias cada vez; 'Jesus, manso e humilde de coração, fazei o meu coração semelhante ao Vosso' - Trezentos dias, uma vez ao dia; 'Doce Coração de Maria, sede a minha salvação' - trezentos dias por vez'.

(viii) Oração 'Louvado seja Nosso Senhor Jesus Cristo; para sempre seja louvado! Amém. - cinquenta dias cada vez que duas pessoas se saúdam com estas palavras.

(ix) Oração do Ângelus - indulgência de cem dias cada vez que for recitado, seja de manhã, ao meio-dia ou à noite, ao som de um sino, de joelhos e com o coração contrito.

Tradução da obra: 'Le Dogme du Purgatoire illustré par des Faits et des Révélations Particulières', do teólogo francês François-Xavier Schouppe, sj (1823-1904), 342 p., tradução pelo autor do blog.

segunda-feira, 20 de novembro de 2023

FRASES DE SENDARIUM (XV)

'Quando nascemos, somos filhos de nossos pais; quando morremos, somos filhos de nossas obras' 

(Pe. Antônio Vieira)

AÇÃOAbrir Caminhos Através de Obras, eis o legado cristão: AÇÃO conformada por meio do nosso próprio exemplo e da nossa própria santificação pessoal.

domingo, 19 de novembro de 2023

EVANGELHO DO DOMINGO

   

'Felizes os que temem o Senhor e trilham seus caminhos!' (Sl 127)

Primeira Leitura (Pr 31,10-13.19-20.30-31) - Segunda Leitura (1Ts 5,1-6)  -  Evangelho (Mt 25,14-30)

 19/11/2023 - Trigésimo Terceiro Domingo do Tempo Comum

52. A PARÁBOLA DOS TALENTOS


Como herdeiros das alegrias eternas, somos administradores e não proprietários dos bens recebidos nesta vida. Tudo vem de Deus e tudo há de voltar para Deus na medida em que cada um de nós deverá prestar as devidas contas da infinitude das graças recebidas por Deus para se cumprir o seu plano de nossa salvação. Como nada nos pertence, nem nosso corpo, nem os nossos pensamentos, viver a santidade consiste em fazer em tudo e por todos a Santa Vontade de Deus, colocando todos os nossos dons e talentos a serviço do Reino.

O 'homem (que) ia viajar para o estrangeiro' (Mt 25, 14) não é outro senão Jesus que subiu ao Céu e que, chamando os seus empregados, 'lhes entregou seus bens' (ainda Mt 25, 14). Bens, portanto, que pertencem a Deus e que são distribuídos aos homens de forma diversa, por meio de um, de dois, de cinco talentos, de acordo com os desígnios da Providência e na medida certa para levar a todos ao cumprimento ideal da sua missão salvífica. Desta forma, a glória de Deus é fruto não da graça de se ter mais ou menos talentos, mas da resposta de cada um de nós, pela própria vocação, de cumprir santamente a Vontade de Deus na administração coerente dos bens recebidos em benefício próprio e dos nossos irmãos.

Mérito que tiveram os empregados que receberam cinco e dois talentos: bens que renderam outros bens, na medida do amor de ambos: 'servo bom e fiel' (Mt 25, 21.23); talentos que se multiplicaram e que se distribuíram fartamente, pela medida expressa por um rendimento em dobro: 'Senhor, tu me entregaste cinco talentos. Aqui estão mais cinco, que lucrei' (Mt 25, 20) e 'Senhor, tu me entregaste dois talentos. Aqui estão mais dois que lucrei' (Mt 25, 22). Quem se mostra fiel na administração dos bens recebidos, será merecedor de bens ainda maiores e herdeiro das alegrias eternas: 'Vem participar da minha alegria!’ (Mt 25, 21.23).

Glória que será tirada dos servos infiéis, dos empregados maus e preguiçosos que, diante os dons e talentos recebidos, os enterram nos buracos de sua insensatez, do egoísmo e da busca desenfreada por posses e bens materiais, aviltando a graça de Deus e se consumindo nos próprios interesses e mesquinhez. Ao prestar contas de sua má administração, o servo infiel busca em vão refúgio na tentativa de culpar o patrão, mediante a concepção desvairada de um Deus injusto e severo, para apenas se condenar pelas próprias palavras e pelos pecados de negligência e omissão. E, condenado, perde até o pouco que porventura tenha feito em favor de outros e ganha a perdição eterna: 'Porque a todo aquele que tem será dado mais, e terá em abundância, mas daquele que não tem, até o que tem lhe será tirado. Quanto a este servo inútil, jogai-o lá fora, na escuridão. Aí haverá choro e ranger de dentes!’ (Mt 25, 29 - 30).

sexta-feira, 17 de novembro de 2023

SOBRE OS MALES DOS ESCRÚPULOS

O escrúpulo, diz Santo Afonso de Ligório, não passa de um vão temor de pe­car causado por apreensões que não têm motivo algum. Por sua vez, Bergier diz que o escrú­pulo é uma pena de espírito, uma an­siedade de alma que faz que a pessoa creia ofender a Deus em todas as suas ações e nunca se quitar dos seus deveres assaz perfeitamente. Enfim, o escrúpulo, dizem os autores da ciência do confessor, é uma dúvida que não é fundada, ou que só o é muito ligei­ramente, e que perturba a consciência e a enche de inquietações. É um vão ter­ror, um receio extremado de achar pecado onde realmente não existe, nascendo daí na alma uma angústia que a torna irresoluta e inquieta.

Ora, esse temor de pecar ou de haver pecado em tudo e a toda hora, esse con­tínuo pavor que só repousa nos mais fra­cos indícios, enche entretanto o coração de angústias e de perplexidades, falseia o juízo, destrói a paz interior, gera a des­confiança e a tristeza, afasta dos sacra­mentos, altera a saúde do espírito e até mesmo a do corpo. Nada é mais nocivo, diz ainda Santo Afonso de Ligório, naquele que tende à perfeição e que se deu a Deus, do que os escrúpulos. 'Essas almas são loucas' - dizia Santa Tereza - 'pois, com os seus escrúpulos, acabarão por não mais ousar dar um passo na trilha da perfei­ção'.

Todavia, não se deve confundir a dúvida com o escrúpulo, nem o escrúpulo com a consciência timorata. Na dúvida, a alma, por prudência, julga dever ficar indecisa entre dois partidos, atendendo às razões de ambas as partes que lhe parecem con­trabalançar-se. O mesmo já não se dá com o escrúpulo. Se o temor não dominasse o escrupuloso, ele acharia bastantes luzes em si mesmo para se resolver e para jul­gar que o oposto do escrúpulo é mais pro­vável. Aliás, a dúvida propriamente dita não inquieta nem aflige o espírito, ao pas­so que o escrúpulo se torna o tormento incessante do escrupuloso. A razão desta diferença é, aliás, fácil de apreender: é que a dúvida tem um fundamento ao menos aparente, e o escrúpulo não o tem; o que faz os teólogos dizerem que nunca é lícito agir contra a consciência duvidosa, e que, ao contrário, se pode e se deve agir contra o escrúpulo, como se verá mais adiante.

Pessoas há que, confundindo o escrúpulo com a delicadeza de consciência, conside­ram-no como uma virtude, enganam-se estranhamente; porquanto, longe de ser uma virtude, ele é um defeito, e dos mais perigosos. O sábio e piedoso Gerson não receava dizer que, muitas vezes, uma consciência escrupulosa prejudica mais a alma do que uma consciência de­masiado fácil e por demais relaxada.

Também se confunde amiúde a cons­ciência timorata com a consciência escru­pulosa; a diferença é, entretanto, bem de­finida. A consciência timorata evita os menores pecados, com juízo e tranquili­dade; a escrupulosa, ao contrário, age sem fundamento, com perturbação e inquieta­ção; o que faz que esteja sempre agitada e transtornada.

Eis aqui os sinais ou sintomas pelos quais se conhecem as almas escrupulosas:

1. recear incessantemente, nas suas confissões, não ter demonstrado uma verdadeira dor; 
2. recear pecar nas menores coisas, como, por exemplo, fazer um juízo temerário, faltar à caridade ou ceder aos maus pensamen­tos; 
3. ser inconstante nas suas dúvi­das, mudar incessantemente de sentimen­to sob a mais leve aparência, julgando uma mesma ação ora lícita, ora ilícita; 
4. fartar-se frequentemente de reflexões minuciosas, e mesmo extravagantes, sobre as mais ligeiras circunstâncias das suas ações; 
5. não se ater, sobre isso, ao pa­recer do seu confessor, e mostrar muito apego ao próprio senso; consultar várias pessoas, pesar-lhes as razões, e só se ater a si mesmo; 
6. agir com ansiedade, com certa perturbação que tira a atenção e o discernimento, que embaraça a liberdade e retém a alma cativa. 

Tais são os princi­pais sintomas das consciências escrupulo­sas. Mas a quem é que pertence pronun­ciar-se em semelhante matéria? Ao con­fessor; porquanto o escrupuloso nunca acredita que o é; acredita sempre que os seus escrúpulos são verdadeiros pecados. Está na sombra, não vê a sua consciência: só o juiz espiritual é que pode vê-la; e é por isto que o penitente deve seguir-lhe os conselhos, e, se for reconhecido como escrupuloso, deixar-se tratar como aco­metido desta moléstia. Pelo contrário, se quiser decidir por si mesmo, quanto mais quiser tranquilizar-se tanto mais se perturbará e se colocará em risco de perder-se.

(Excertos da obra 'Tratado dos Escrúpulos da Consciência', Abade Grimes, 1854)

DOUTORES DA IGREJA (XXXI)

  31Santa Teresa de Ávila, Virgem (†1582)

Doutora da Espiritualidade

(1515 - 1582)

Concessão do título: 1970 - Papa Paulo VI
Celebração: 15 de outubro (Memória Obrigatória)

 Obras e Escritos 

  • Autobiografia (Livro da Vida)
  • O Caminho da Perfeição
  • Meditações sobre o Cântico dos Cânticos
  • O Castelo Interior
  • Relações (complemento da sua Autobiografia)
  • Conceitos de Amor
  • Exclamações
  • Cartas
  • Poemas

quinta-feira, 16 de novembro de 2023

OS FUNDAMENTOS DA REGRA ECLESIÁSTICA: FAZER O QUE SE PREGA!

Somos todos fracos, confesso, mas o Senhor Deus nos entregou meios com os quais, se quisermos, poderemos ser fortalecidos com facilidade. Tal sacerdote desejaria possuir uma vida íntegra, que dele é exigida, ser continente e ter um comportamento angélico, como convém, mas como se não se resolve a empregar estes meios: jejuar, orar, fugir das más conversas e de nocivas e perigosas familiaridades.

Queixa-se de que, ao entrar no coro para a salmodia, ao dirigir-se para celebrar a missa, logo mil pensamentos lhe assaltam a mente e o distraem de Deus. Mas, antes de ir ao coro ou à missa, que fez na sacristia, como se preparou, que meios escolheu e empregou para fixar a atenção?

Queres que te ensine a caminhar de virtude em virtude e como seres mais atento ao ofício, ficando assim teu louvor mais aceito de Deus? Escuta o que digo. Se ao menos uma fagulha do amor divino já se acendeu em ti, não a mostres logo, não a exponhas ao vento! Mantém encoberta a lâmpada, para não se esfriar e perder o calor; isto é, foge, tanto quanto possível, das distrações; fica recolhido junto de Deus, evita as conversas vãs.

Tua missão é pregar e ensinar? Estuda e entrega-te ao necessário para bem exerceres este encargo. Faze, primeiro, por pregar com a vida e o comportamento. Não aconteça que, vendo-te dizer uma coisa e fazer outra, zombem de tuas palavras, abanando a cabeça.

Exerces a cura de almas? Não negligencies por isso o cuidado de ti mesmo, nem dês com tanta liberalidade aos outros que nada sobre para ti. Com efeito, é preciso te lembrares das almas que diriges, sem que isto te faça esquecer da tua.

Entendei, irmãos, nada mais necessário aos eclesiásticos do que a oração mental que precede, acompanha e segue todos os nossos atos: 'Salmodiarei, diz o Profeta, e entenderei' (cf Sl 100). Se administras os sacramentos, ó irmão, medita no que fazes; se celebras a missa, medita no que ofereces; se salmodias no coro, medita a quem e no que falas; se diriges as almas, medita no sangue que as lavou e, assim, tudo o que é vosso se faça na caridade (1Cor 16,14). Deste modo, as dificuldades que encontramos todos os dias, inúmeras e necessárias, serão vencidas com facilidade. Teremos, assim, a força de gerar Cristo em nós e nos outros.

(São Carlos Borromeu)

quarta-feira, 15 de novembro de 2023

TESOURO DE EXEMPLOS (266/270)

 

266. OITO HORAS POR DIA

São Alfredo Magno, rei da Inglaterra, consagrava todos os dias oito horas à oração ou à leitura de livros piedosos. Outras oito horas aos negócios do Estado e oito horas ao descanso e às demais necessidades e ocupações. Levantava-se muito cedo e ia à capela, onde, prostrado por terra, fazia a sua oração.

267. UM PROTESTANTE

Um protestante teve a curiosidade de entrar numa igreja durante a missa em um domingo e pôs-se a observar os fiéis. Ao sair disse: 'Os católicos dizem que Jesus Cristo está presente na Eucaristia; mas muitos deles não creem nisso; do contrário, procederiam com mais respeito durante a missa'.

268. EM QUE TE OCUPAS?

Queixava-se um jovem ao seu confessor, dizendo-lhe que ouvia mal a missa.
➖ Que fazes durante a missa? Em que te ocupas?
➖ Não faço outra coisa senão chorar os meus pecados.
➖ Continue assim, meu amigo; desse modo ouves muito bem a missa.

269. AQUELE É MEU PAI

O imperador da Áustria, José II, ordenara que os presidiários fossem empregados em trabalhos públicos. Alguns deles varriam a praça de Santo Estevão, em Viena. Um ministro observou que um moço bem trajado se aproximava de um daqueles varredores e beijava-lhe a mão. Um dia mandou chamar o moço e disse-lhe que aquele modo de agir não lhe convinha.

'Senhor' - disse o jovem - 'esse condenado é meu pai'. Comovido, o ministro referiu o fato ao imperador, o qual pôs o preso em liberdade, dizendo: 'Quem sabe educar seus filhos desta maneira não pode ser um malfeitor'.

270. GUARDÁ-LO-EI COMO LEMBRANÇA

Um inglês visitava a cidade de Viena. Entrou em uma loja de cabeleireiro no momento em que uma jovem oferecia sua formosa cabeleira pelo preço de dez coroas. Já se dispunha o cabeleireiro a cortá-la, quando o visitante quis saber por que a jovem ia sacrificar seus cabelos.

➖ Senhor - disse a jovem - meu pai foi negociante opulento; mas as coisas foram mal; agora ele é velho e desamparado; minha mãe está enferma e, como não encontro outra solução melhor, vejo-me obrigada a vender a minha cabeleira.
➖ A senhora não venda seus cabelos tão barato. Eu o pagarei melhor. E, entregando-lhe cem libras esterlinas, tomou a tesoura e disse:
➖ Permita-me que lhe corte um só fio do seu cabelo que guardarei como lembrança do seu amor filial.
Aquelas cem libras serviram de base para eles, em pouco tempo, reconstituírem a fortuna perdida.

(Excertos da obra 'Tesouro de Exemplos', do Pe. Francisco Alves, 1958; com adaptações)


terça-feira, 14 de novembro de 2023

O DOM DA PIEDADE

O dom do temor de Deus destina-se a curar em nós a chaga do orgulho; o dom da piedade é derramado em nossas almas pelo Espírito Santo para combater o egoísmo, que é uma das paixões más do homem decaído por causa do pecado original, e o segundo obstáculo à sua união com Deus. O coração do cristão não deve ser nem frio nem indiferente; é preciso que seja terno e devotado; do contrário não poderá se elevar à via para a qual Deus, que é amor, dignou-se chamá-lo. 

Assim o Espírito Santo produz no homem o dom da piedade, inspirando-lhe um retorno filial para seu Criador. 'Vós recebestes o Espírito de adoção' - nos diz o Apóstolo - 'e é por este Espírito que gritamos para Deus: Pai! Pai!'. Essa disposição torna a alma sensível a tudo o que toca a honra de Deus. Faz o homem alimentar em si mesmo a compunção dos seus pecados, tendo em vista a infinita Bondade que se dignou suportá-lo e perdoá-lo e o pensamento dos sofrimentos e da morte do Redentor. A alma iniciada no dom de piedade deseja constantemente a glória de Deus e quer por todos os homens aos seus pés; e os ultrajes que Ele recebe lhe são particularmente sensíveis. 

Sua alegria é ver o progresso das almas no amor e as devoções que este amor lhes inspira por Aquele que é o soberano Bem. Cheia de submissão filial para com o Pai universal que está nos céus, essa alma está pronta para todas as suas vontades. Resigna-se de coração com todas as disposições da Providência. Sua fé é simples e viva. Mantém-se amorosamente submissa à Igreja, sempre pronta a renunciar às suas próprias ideias e àquelas mais caras, se estas afastam-se de alguma forma de seu ensinamento ou de sua prática, tendo um horror instintivo da novidade e da independência. Essa devoção para com Deus que o dom de piedade inspira, unindo a alma a seu Criador pela afeição filial, a une, também, com uma afeição fraternal, a todas as criaturas, já que estas são obra do poder de Deus.

Em primeiro lugar, nas afeições do cristão animado pelo dom de piedade, estão as criaturas glorificadas, das quais, Deus goza eternamente e as quais se deleitam dEle para sempre. Ama ternamente a Santíssima Virgem Maria e é zeloso de sua honra; venera com amor os santos e os atos heroicos de virtude realizados pelos amigos de Deus; delicia-se com seus milagres, honra religiosamente suas relíquias sagradas. Mas sua afeição não é apenas pelas criaturas coroadas no céu; aquelas que ainda estão aqui embaixo ocupam um lugar importante em seu coração. O dom de piedade faz com que ele encontre nelas o próprio Jesus. Sua boa vontade para com seus irmãos é universal. Seu coração está inclinado ao perdão das injúrias, a suportar as imperfeições do outro, a desculpar as imperfeições do próximo. É compassivo para com o pobre, solícito aos pés do doente. Uma doçura afetuosa revela o fundo do seu coração e em suas relações com os irmãos da terra, o vemos sempre disposto a chorar com os que choram, a se alegrar com os que se alegram. 

Tal é, ó Divino Espírito, a disposição daqueles que cultivam o dom de piedade que derramais em suas almas. Por esse inefável benefício, neutralizais o triste egoísmo que afloraria em seus corações, livrando-os de uma frieza odiosa que torna o homem indiferente aos seus irmãos e fechais suas almas à inveja e ao ódio. Para isso, só foi preciso esta piedade filial para com o Criador; que enterneceu seus corações, fundindo-os com uma viva afeição por tudo o que sai das mãos de Deus. Fazei frutificar em nós este dom tão precioso, ó Divino Espírito! Não permitais que ele seja abafado pelo amor de nós mesmos. Jesus nos encorajou dizendo-nos que seu Pai Celeste 'faz o sol nascer sobre os bons e os maus'; não permitais, Divino Paráclito, que uma tão paternal indulgência seja um exemplo perdido para nós e dignai-vos desenvolver em nossas almas o germe de devoção, da benevolência e da compaixão que vos dignastes infundir no momento em que de nós tomastes possessão pelo santo batismo.

(Excertos da obra 'Os Dons do Espírito Santo', de Dom P. Gueranger)

domingo, 12 de novembro de 2023

EVANGELHO DO DOMINGO

  

'A minh'alma tem sede de vós e vos deseja, ó Senhor!' (Sl 62)

Primeira Leitura (Sb 6,12-16) - Segunda Leitura (1Ts 4,13-18)  -  Evangelho (Mt 25,1-13)

 12/11/2023 - Trigésimo Segundo Domingo do Tempo Comum

51. A PARÁBOLA DAS DEZ VIRGENS


No Evangelho deste domingo, Jesus nos exorta a praticar a vigilância constante em relação à hora da nossa morte pois ela há de vir na hora mais inesperada: 'ficai vigiando, pois não sabeis qual será o dia nem a hora' (Mt 25, 13). No fim da nossa vida, não haverá mais tempo para prover-nos tributos de salvação e então, no Juízo Particular, Deus vai nos pedir contas da nossa vigilância à Sua Santa Vontade, do cumprimento de nossas ações cristãs e do acervo das graças recebidas e dos talentos aproveitados ou não. Neste momento tremendo de nossa existência, seremos julgados previdentes ou imprevidentes pelo Pai e merecedores ou não do Reino dos Céus.

São palavras de salvação, porque a única coisa realmente importante para o homem é a salvação eterna de sua alma, expressas sob a forma da parábola das dez virgens (Mt 25, 1 - 13) que esperam a chegada do noivo, que tarda a chegar. O ingresso no Reino de Deus se assemelha às núpcias das festas de casamento daquele tempo em que a entrada da esposa na casa do esposo era um evento singular, marcado pela condução ritual da noiva por um certo número de virgens auxiliares.

Na narração evangélica, estas virgens são dez ao todo, cinco delas previdentes e outras cinco imprevidentes. As primeiras, prevendo uma eventual demora do noivo (o Senhor), guardaram uma provisão de óleo para manterem acesas as suas lâmpadas qualquer que fosse a hora que o noivo chegasse; ao contrário, as virgens imprudentes, não tendo o mesmo cuidado, viam angustiadas o óleo ser consumido e as suas lâmpadas prestes a se apagarem. E então recorrem desesperadamente às primeiras para que estas lhes forneçam o óleo necessário, o que lhes é negado peremptoriamente. Na morte, na nossa morte, não teremos tempo nem acesso a 'óleos' alheios, a provisão dos nossos méritos será fruto tão somente daquilo que efetivamente levarmos desta vida.

Diante de Deus, cada um de nós deverá responder por si, como resultado de um julgamento pessoal e intransferível. Ou apresentamos as lâmpadas acesas da graça, providas pelo óleo abundante da fé, para merecermos entrar no Reino de Deus ou ficaremos às escuras diante da porta fechada e da terrível sentença do juiz eterno: 'Não vos conheço!' (Mt 25, 12): 'Não vos conheço, porque não seguistes os meus mandamentos, não vivestes segundo os meus princípios e leis, não vos tornastes na terra herdeiros dos Céus!'

sábado, 11 de novembro de 2023

SERMÕES DO CURA D'ARS (XIV)

 SOBRE OS MANDAMENTOS DE DEUS

'Amarás o Senhor, teu Deus, com todo o teu coração, com toda a tua alma e com todas as tuas forças' (Dt 6,5)

O Senhor nos deu o mandamento de o amarmos como Ele nos ama, com todo o nosso coração, com toda a nossa alma e com todas as nossas forças; e, assim, nos promete a recompensa eterna se cumprirmos fielmente o mandamento e nos ameaça com o castigo eterno se não o cumprirmos. Se somos assolados por tantos problemas neste mundo, é porque negligenciamos os mandamentos de Deus; pois Ele mesmo disse: 'Se guardardes fielmente os meus mandamentos, abençoar-vos-ei de muitas maneiras; se, porém, os transgredirdes, sereis amaldiçoados em tudo o que fizerdes'. Se, pois, meus caros irmãos, quisermos ser felizes neste mundo, na medida do possível, não temos outro meio para isso senão guardar fielmente os mandamentos de Deus; veremos que, se nos desviarmos do caminho que nos é indicado pelos mandamentos de Deus, a alma e o corpo serão infelizes, tanto neste como no outro mundo. A nossa bem aventurança eterna depende da nossa fiel observância aos mandamentos que o bom Deus nos deu, mas Deus recompensa já nesta vida aqueles que lhe são fiéis e eu vou mostrardes isso hoje.

A felicidade dos que obedecem aos mandamentos de Deus e a infelicidade dos que não os cumprem

Se, meus caros irmãos, abrirmos as Escrituras, encontraremos que todos aqueles que se empenharam em observar corretamente os mandamentos de Deus foram sempre felizes, porque Deus nunca abandona aqueles que se empenham em fazer aquilo que lhes ordena. Adão é um bom exemplo disso. Enquanto observou fielmente os mandamentos do Senhor, encontrava-se num estado de felicidade em todos os aspectos; seu corpo, sua alma, sua mente e todos os seus sentidos estavam voltados somente para Deus e até os anjos desceram do céu para lhe fazer companhia. A felicidade dos nossos primeiros pais teria permanecido a mesma para sempre, se tivessem continuado fiéis aos seus deveres; mas esse estado feliz não durou muito. O espírito maligno, invejoso de tal felicidade, mergulhou-os na ruína e roubou-lhes todos os seus bens, dos quais deveriam ter desfrutado por toda a eternidade. Assim que tiveram a infelicidade de transgredir os mandamentos do Senhor, tudo deu errado para com eles; problemas e preocupações, doenças, medo da morte, do julgamento e da punição na outra vida tomaram o lugar de sua felicidade anterior; sua vida agora não era nada além de um estado permanente de lágrimas e sofrimentos.

O Senhor disse a Moisés: 'Diz ao meu povo que, se observarem fielmente os meus mandamentos, enchê-los-ei de toda a espécie de bênçãos; mas se ousarem transgredi-los, castigá-los-ei com toda a espécie de sofrimentos'. Deus disse a Abraão: 'Porque guardaste fielmente os meus mandamentos, abençoar-te-ei em tudo. Abençoarei todos os que te abençoarem, amaldiçoarei todos os que te amaldiçoarem; da tua raça nascerá o Redentor do mundo'. Ele deu a conhecer ao povo de Abraão, quando chegou o momento de entrarem na terra prometida: 'Os povos que habitavam nesta terra cometeram grandes pecados; por isso, eu os expulsarei e colocar-vos-ei no seu lugar. Mas não transgridais os meus mandamentos. Se os guardares fielmente, eu abençoar-te-ei em tudo e sobre tudo. Quando estiverdes nos campos ou nas vossas casas, abençoarei os vossos filhos, que vos amarão, respeitarão e obedecerão, e vos darão toda a espécie de consolação. Ordenarei aos céus que vos deem chuva no momento oportuno, tanto quanto for necessário para regar os vossos campos e os vossos prados; tudo prosperará convosco'. Em outro lugar das Escrituras, Deus diz: 'Se guardardes fielmente os meus mandamentos, velarei incessantemente pela vossa conservação; podereis estar sem medo nas vossas casas; impedirei que as feras vos façam mal; podereis dormir em paz; nada vos perturbará. Estarei sempre convosco. Caminharei convosco. Eu sou o vosso Deus, e vós sereis o meu povo'. E ainda falou a Moisés: 'Dizei ao meu povo que, se guardarem os meus mandamentos, livrá-los-ei de todos os males que os oprimem'. E o Espírito Santo diz que 'aquele que guarda os mandamentos do Senhor é mais feliz do que se possuísse toda a riqueza da Terra'.

Ora, já pensastes que Deus dá tanta importância à observância dos seus mandamentos e que promete tão grandes benefícios em troca da sua fiel observância? Concordareis então comigo que toda a nossa felicidade consiste em guardar fielmente os mandamentos. Para vos provar, caros irmãos que, desde que transgridamos os mandamentos, só podemos ser infelizes, deixemos que Davi nos sirva de exemplo. Enquanto trilhou o caminho que os mandamentos lhe prescreveram, tudo lhe correu bem: era amado, estimado e obedecido pelos seus vizinhos. Mas, no exato momento em que deixou de observar os mandamentos, a sua felicidade terminou e toda a espécie de problemas o assaltou. A ansiedade e o remorso de consciência tomaram o lugar da paz e do contentamento que até então desfrutara. Lágrimas e sofrimentos eram o seu pão de cada dia. Um dia, enquanto lamentava os seus pecados, foi informado de que o seu filho Amon tinha sido trespassado com uma espada pelo seu irmão Absalão, num acesso de embriaguez. Absalão tentou destituir o pai, intentando até a sua morte, para poder reinar em seu lugar; Davi foi obrigado a esconder-se em um bosque para escapar à morte. Além disso, a peste matou um grande número de súditos de Davi.

Salomão nos dá outro exemplo. Enquanto guardou fielmente os mandamentos, teve a admiração do mundo; a sua fama chegou até aos confins da terra; a rainha de Sabá chegou mesmo a vir de longe para testemunhar as maravilhas que o Senhor tinha operado nele; mas, assim que teve a infelicidade de deixar de observar os mandamentos, tudo lhe correu mal. Ao ouvir esses exemplos, mesmo que sejam tirados do Antigo Testamento, concordareis comigo, queridos irmãos, que todos os nossos problemas decorrem do fato de não observarmos fielmente os mandamentos de Deus, e que, se esperamos felicidade e paz, tanto quanto podemos esperar possuir neste mundo, neste vale de sofrimento e tristeza, então, eu digo, o único meio de garantir esses benefícios é fazer tudo o que estiver ao nosso alcance para agradar a Deus - tudo, portanto, que Ele nos pede para seguir os seus mandamentos.

Mas, se passarmos ao Novo Testamento, descobrimos que Cristo Nosso Senhor nos exorta constantemente a observar os mandamentos e nos promete uma grande recompensa. Jesus Cristo nos promete o céu, porque nada nesta terra é capaz de satisfazer o coração do homem, que foi criado unicamente para Deus, e que o homem não pode encontrar a felicidade senão em Deus. Jesus Cristo exorta-nos urgentemente a preocuparmo-nos pouco com as coisas deste mundo e a procurarmos as bênçãos do Céu, que nunca terão fim. Lemos no Evangelho que Jesus Cristo, estando certa vez entre certas pessoas que pareciam pensar apenas nas suas necessidades corporais, disse-lhes: 'Não vos preocupeis tanto com o que haveis de comer, nem com o que haveis de vestir'. E, querendo fazer-lhes compreender que tudo o que diz respeito ao corpo é de pouca importância, disse-lhes: 'Considerai os lírios do campo, que não trabalham nem fiam, e eis que vosso Pai celeste os veste; pois eu vos digo que nem mesmo Salomão, em toda a sua glória, se vestiu como um deles. Observai as aves do céu: elas não semeiam nem ceifam, nem ajuntam em celeiros, mas vede como o vosso Pai celestial cuida delas. Ó vós, de pouca fé, não sois mais importantes do que elas? Buscai primeiro o Reino dos Céus, isto é, guardai fielmente os meus mandamentos, e todas as outras coisas vos serão acrescentadas, para além delas'. O que é que devemos deduzir destas palavras, caros irmãos? Apenas isto, que um cristão que procura, em primeiro lugar, agradar a Deus e salvar a sua alma, nunca passará falta em suas necessidades corporais.

Mas, dirás, talvez, se não tivermos nada, ninguém nos dará nada! Responder-vos-ei que tudo o que temos vem da beneficência de Deus e não de nós próprios. Se quereis, meus caros irmãos, experimentar a grandeza da bondade de Deus, fazei o dever de observar exatamente o que os mandamentos vos ordenam, e vereis com espanto como Deus cuida daqueles que se esforçam por agradá-lo. Se quiserdes ver uma prova disso, voltai-vos para as páginas da Sagrada Escritura, e lá encontrareis plena confirmação disso. Lemos, por exemplo, na Sagrada Escritura que o profeta Elias se escondeu num bosque para escapar às perseguições da rainha Jezabel. Ali, privado de todo auxílio humano, pensais que o Senhor o deixou morrer de fome? Não, caros amigos, certamente que não. O Senhor não perdeu de vista o seu servo fiel. Enviou imediatamente um anjo do céu para o consolar e lhe trazer tudo o que era necessário para a sua subsistência. Vede também como o Senhor se preocupou com a viúva de Sarepta. Ele disse aos seus profetas: 'Procurai esta boa viúva, que tão fielmente me serve e guarda os meus mandamentos; aumentai-lhe a provisão de alimentos, para que não tenha fome'. Outro exemplo é a sua ordem a um dos profetas, Habacuc, para levar comida a Daniel na cova dos leões em Babilônia. 

Todos esses exemplos são tirados do Antigo Testamento mas, no Novo Testamento, os milagres que Deus opera em favor daqueles que observam seus mandamentos não são menos grandiosos ou numerosos. Vede como Deus, com cinco pequenos pães e dois peixes, alimentou milhares de pessoas que, seguindo Jesus Cristo, procuravam o reino dos Céus e a santificação das suas almas. Vede como, durante quarenta anos, Ele proveu o sustento do santo eremita Paulo por meio de um corvo; prova inequívoca de que Deus nunca perde de vista aqueles que o amam, e que lhes fornece tudo o que é necessário. Ó meu Deus, como é grande o vosso amor por aqueles que vos amam! Que cuidado tendes para que não lhes falte nada! Dizei-me, caríssimos irmãos, quem deixou que as provisões de cada dia fossem levadas por um cão a São Roque no deserto? Não foi Deus, meus caros irmãos? E por que é que Deus cuidou tanto do sustento de todos os santos, se não foi senão porque eles observaram fielmente os mandamentos que Ele nos deu?

Sim, queridos irmãos, podemos dizer com segurança que os santos encontravam toda a sua felicidade em guardar os mandamentos e que preferiam sofrer o martírio a transgredi-los; e os mártires não sofreram torturas e morte apenas porque não ousaram transgredir os mandamentos de Deus? Que vergonha para nós, queridos irmãos, quando, no dia do juízo, nos defrontarmos com esses mártires; nós que tantas vezes somos levados a agir pelo simples pensamento 'daquilo que nos pode dizer o mundo' ?Sim, queridos irmãos, se quisermos alcançar a verdadeira felicidade, as próprias palavras de Deus e a história, tanto da antiga como da nova lei, ensinam que é necessária a exata observância dos mandamentos. E uma vez que Deus, em sua misericórdia, nos ajuda com a sua graça a observá-los, por que deveríamos recuar e ser tão temerosos?

Que a nossa firme resolução desta manhã seja obedecer fielmente os mandamentos de Deus e não deixar que qualquer consideração de ganho ou perda terrena, de medo ou favor, nos induza a transgredi-los, para que no fim dos nossos dias possamos ter a grande sorte de olhar para trás e ver uma vida temente a Deus e fiel, que nos abrirá as portas de uma recompensa eterna, o que desejo a todos vós. Amém.