domingo, 29 de novembro de 2015

'FICAI ATENTOS PARA FICARDES DE PÉ'

Páginas do Evangelho - Primeiro Domingo do Advento


Hoje começa um novo ano litúrgico da Santa Igreja com o Tempo do Advento, período que os cristãos são conclamados a viver em plenitude as graças da expectativa, da conversão e da esperança, à espera do Senhor Que Vem. O Ano Litúrgico 2015-2016 é o Ano C, no qual os exemplos e ensinamentos de Jesus Cristo são proclamados a cada domingo pelas leituras do Evangelho de São Lucas. 

O Tempo do Advento compõe-se de um período de quatro semanas, representando os séculos de espera da humanidade pela vinda do Redentor. A primeira semana é dedicada aos Novíssimos do homem e à segunda vinda de Nosso Senhor. A segunda e a terceira semanas são dedicadas ao Precursor João Batista e a quarta semana, à preparação para o nascimento já próximo do Salvador (no Natal). Nesse período, a liturgia se reveste de austeridade, utilizando-se de paramentos roxos, retirando as flores de ornamentação das igrejas e omitindo-se o canto do Glória durante a Santa Missa.

Assim, o novo ano litúrgico começa com o anúncio por Jesus de sua Segunda Vinda gloriosa aos homens dos tempos finais: 'eles verão o Filho do Homem, vindo numa nuvem com grande poder e glória' (Lc 21, 27), manifestação que será precedida por eventos portentosos: 'Haverá sinais no sol, na lua e nas estrelas. Na terra, as nações ficarão angustiadas, com pavor do barulho do mar e das ondas. Os homens vão desmaiar de medo, só em pensar no que vai acontecer ao mundo, porque as forças do céu serão abaladas' (Lc 21, 25 - 26). Jesus exorta, então, a todos  os seus discípulos (os Apóstolos e os homens em geral) sobre a necessidade da estrita vigilância, na oração constante e na confiança de uma vida de plenitude cristã, diante das coisas do mundo, que passam e repassam no cotidiano de nossas vidas, mas que não têm valores de eternidade: 'Tomai cuidado para que vossos corações não fiquem insensíveis por causa da gula, da embriaguez e das preocupações da vida, e esse dia não caia de repente sobre vós; pois esse dia cairá como uma armadilha sobre todos os habitantes de toda a terra' (Lc 21, 34 - 35).

Vigiar significa essencialmente não pecar, não ofender a Santidade de Deus com as misérias e as fragilidades humanas, não conspurcar a Infinita Pureza da alma que nos foi legada um dia com a lama dos prazeres, frivolidades e maldades de uma vida profanada pelos valores do mundo. Porque haverá o dia do juízo, no qual os homens serão levados ou deixados para trás: ''ficai atentos e orai a todo momento, a fim de terdes força para escapar de tudo o que deve acontecer e para ficardes em pé diante do Filho do Homem' (Lc 21, 36). Vigiar é viver na confiança absoluta aos ditames de Divina Providência: 'levantai-vos e erguei a cabeça, porque a vossa libertação está próxima' (Lc 21, 28). Vigiar é estar preparado para que sejam santos todos os dias de nossa vida para que Deus escolha, dentre eles, o mais belo, para receber de volta as almas vigilantes que Ele próprio desenhou para a eternidade.

ANO LITÚRGICO 2015 - 2016

O Ano Litúrgico 2015-2016, de acordo com o rito católico romano, vai desde o primeiro domingo do Advento (29/11/2015) até a última semana do Tempo Comum (03/12/2016), durante o qual a Igreja celebra todo o mistério de Cristo, desde o nascimento até a sua segunda vinda. 

O ano litúrgico compreende dois tempos distintos: os chamados tempos fortes que incluem Advento, Natal, Quaresma e Páscoa, durante os quais certos mistérios particulares da obra redentora e salvífica de Cristo são celebrados e o chamado Tempo Comum no qual celebramos o Mistério de Cristo em sua totalidade, ou seja, encarnação, vida, morte, ressurreição e ascensão do Senhor. 

O Tempo Comum é subdividido em duas partes. A primeira parte começa no dia seguinte à festa do Batismo de Jesus e vai até a terça-feira antes da Quarta-feira de Cinzas, quando tem início a Quaresma. A segunda parte do Tempo Comum recomeça na segunda-feira depois de Pentecostes e se estende até o sábado que antecede o primeiro domingo do Advento, quando tem início um novo Ano Litúrgico, compreendendo sempre um período de 33 ou 34 semanas.



Ver Animação em Calendário 2015-2016

sábado, 28 de novembro de 2015

28 DE NOVEMBRO - SANTA CATARINA LABOURÉ

Hoje, 28 de novembro, a Igreja celebra a santidade de Catarina Labouré, a vidente das aparições de Nossa Senhora da Medalha Milagrosa (Paris, 1830). Sínteses da vida dessa santa, dos carismas recebidos e das aparições de Nossa Senhora a ela são apresentadas nos slides abaixo.





sexta-feira, 27 de novembro de 2015

DAS CONFISSÕES MAL FEITAS


Discípulo: Diga-me, Padre; qual será o primeiro “por quê” de tantas confissões mal feitas? 
Mestre: Os “por quês” podem ser diversos, mas o principal é sem dúvida 'o medo', ou seja a maldita vergonha pela qual o demônio fecha a boca de muitos, fazendo-os calar ou confessar mal certos pecados ou o número deles. Você sabe como é que o demônio age quando quer induzir alguém ao pecado? Cerca o infeliz de mil maneiras, vai-lhe sugerindo: 'Ora, cometa à vontade esse pecado... Afinal não é assim tão grave. Deus é bom... Ele não o quer castigar... Depois, com uma confissão Ele o perdoa e esta tudo acabado..' E assim, batendo hoje, batendo amanhã, e sempre na mesma tecla, o demônio acaba triunfando, ou seja fazendo-o cometer e talvez até repetir os pecados. Depois, então, quando o coitado, roído pelo remorso, resolve confessar-se, o demônio muda de tática. Novamente trata de impedir que Deus tome conta dessa alma, dizendo: 'Como ousas confessar esse pecado? O confessor ficará surpreendido, há de ralhar contigo, levá-lo-á a mal e é provável que te negue a absolvição. Ora, vamos, não temas, confessar-te-ás depois... Há tempo de sobra... Há sempre tempo para isso'. E assim o mais das vezes fecha a boca de quem estaria quase resolvido a falar e induz os pobres infelizes a se calarem e a cometerem sacrilégios.: 'Como ousas confessar esse pecado?'

Discípulo: É esta mesmo a tática do demônio? 
Mestre: Certamente! Ele mesmo o confessou a Santo Antonino, arcebispo de Florença. Um dia, tendo o santo visto o demônio junto do confessionário, perguntou-lhe: 'O que fazes aí?' — 'Estou esperando para fazer a restituição' — 'Qual restituição? Fala, ou ai de ti' — 'Venho restituir aos pecadores a vergonha e o medo que lhes roubei quando os fiz cometer os pecados'. 

Discípulo: Se não me engano, parece-me que li que Dom Bosco também viu o demônio em circunstâncias análogas. 
Mestre: Justamente! E ouça como foi: Certa noite, estava o santo confessando no coro da Igreja de São Francisco de Sales em Turim; era grande o número de jovens ali reunidos, esperando que chegasse a sua vez. Pelo confessionário passam dez, passam vinte, e chega finalmente um que, tendo já feito uma parte da confissão, pára de repente. 'Continue', diz-lhe Dom Bosco, que por inspiração divina lia na consciência dos seus filhos. 'Continue! E o resto?' — 'Não há mais nada, Padre, mais nada!' — 'Não temas, meu filho' continua o Santo, 'o Confessor não ralha, não castiga, perdoa sempre, perdoa sempre, perdoa tudo em nome de Deus; tem coragem...confessa-te bem'. — 'Não há mais nada! Nada mais!' — 'Mas por que, meu filho, queres, com uma confissão sacrílega, dar prazer ao demônio... causar tristeza a Jesus, fazê-lo chorar?' — 'Garanto-lhe Padre, que não tenho mais nada a dizer!' Dom Bosco que vê o perigo que o infeliz jovem corre, inspirado por Deus, abandona a luta inútil e diz: 'Pois bem, olha quem está atrás de ti!' O rapaz vira-se de repente, solta um grito agudo e, agarrando-se ao pescoço de Dom Bosco exclama: 'Sim Padre, eu tenho mais este pecado'. E conta o pecado que não ousava confessar. Os companheiros que estavam na igreja ouviram o grito; assim que saíram, cercaram o rapaz, e, curiosos, queriam saber o que tinha acontecido. E ele lhes respondeu, apesar de estar ainda um tanto assustado: 'Se vocês soubessem... Eu tinha cometido uma falta que não ousava confessar. Dom Bosco leu meu coração e eu vi o demônio que, sob a figura de um gorila de olhos de fogo e garras afiadas, estava pronto para me agarrar!' 

Discípulo: Dom Bosco era um santo! Que sorte confessar com um santo; não é, Padre? 
Mestre: Todos os confessores representam Jesus Cristo e Jesus Cristo é sempre santo; Ele tudo sabe, Ele vê tudo, tem pena de todos, perdoa tudo! 

Discípulo: Mas mesmo assim o demônio procura enganar e trair nas confissões? 
Mestre: Justamente; em todas as ocasiões. Assim como o lobo agarra as ovelhas pela garganta para que não gritem, e as carrega e as devora, assim também faz o demônio com certas almas; agarra-as pela garganta afim de que não confessem os pecados e as arrasta miseravelmente para o inferno. 

Discípulo: Que espertalhão malvado! Mas haverá quem, depois de enganado uma vez, se deixe levar por esse impostor? 
Mestre: Há muitos, muitíssimos, infelizmente! Ai daquele que começa a seguir por esse caminho! São geralmente os que cometem pecados contra a pureza que enveredam por tal caminho! Geralmente não há dificuldade em confessar os pecados contra a fé, os pecados de blasfêmias, os de profanação dos dias festivos, os de desobediência, de vingança e mesmo os de furto; mas quando se trata de acusar pecados de impureza, ou ter que acrescentar certas circunstâncias que os acompanharam, ou ainda quando se trata de dizer o número bastante considerável dessas faltas, então uma maldita vergonha surge e fecha sacrilegamente a boca do penitente. De mais a mais, a confissão sacrílega geralmente não fica sozinha. Depois de uma vem outras e assim essas almas infelizes continuam durante anos e anos, e além disso acrescentam a essas confissões mal feitas outras tantas comunhões sacrílegas. E não raro, acontece que aqueles que, tendo começado a esconder pecados graves desde as primeiras confissões, chegam a uma idade avançada sem nunca fazerem uma boa confissão e sem nunca repararem a desordem de suas almas. É inacreditável, nota o Padre da Bérgamo, é inacreditável como o medo e a vergonha são comuns principalmente entre os moços. Daí vem o hábito de continuar a calar os pecados para não sofrer a humilhação, o sacrifício de confessá-los. São Leonardo afirma ter tido a seus pés pessoas que, mesmo em perigo de morte não puderam vencer a vergonha que lhes fechava a boca. Santo Afonso recomenda aos padres que falem frequentemente nos seus sermões com calor, com insistência, sobre esse perigo da vergonha que faz calar e insiste para que façam ver ao povo como as confissões mal feitas arruínam as almas, porque essa praga das confissões sacrílegas reina por toda a parte, principalmente nos lugarejos. E, como é comum que fatos e exemplos impressionem o povo, sugere aos padres que contem muitos exemplos de almas que se perderam por causa de pecados não confessados. 

Discípulo: Conte alguns, Padre! 
Mestre: Com muito prazer! Conta-se que uma menina de sete anos tinha tido a infelicidade de cometer certos atos impuros. Envergonhada, não ousou confessá-los na ocasião e nem mais tarde. Tendo adoecido gravemente, chamou o confessor, recebeu o Santo Viático, a Extrema-Unção e morreu! Todos, mãe, irmãs, e amigas lamentaram a sua perda, mas era para elas um conforto julgá-la salva e santa. Porém, três dias depois do enterro, quando o sacerdote se aproximava do altar para celebrar em sufrágio de sua alma, sentiu que o seguravam pelo braço, e uma voz triste e comovente lhe dizia baixinho: 'Padre, não reze por mim porque eu estou condenada! Condenada por certos pecados que ocultei na confissão desde os sete anos'. 

Uma outra menina de 13 anos na ocasião da Páscoa tinha comungado junto com as companheiras: mas eis que, logo depois de recebida a santa partícula tem um estremecimento, contorce-se e cai por terra. Os presentes acodem assustados e a carregam para uma casa vizinha. Acabada a função, o Vigário se apressa a correr à cabeceira da menina que continua a delirar e debater-se; chama-a pelo nome e diz-lhe: 'Coragem, confia tudo a Jesus, àquele Jesus que recebeste na Comunhão!' Ouvindo essas palavras, ela arregala os olhos e, horrorizada exclama: 'A Jesus?! A Jesus?! Ah não! Eu o recebi mal, eu cometi um sacrilégio escondendo certos pecados na confissão'. E, continuando a debater-se, expira pouco depois diante dos presentes comovidos e penalizados. O que me diz desses exemplos? 

Discípulo: Digo que são terríveis e bastante para demonstrar como é grande o mal das confissões mal feitas. 
Mestre: Não estranhe, portanto a nossa insistência sobre a sinceridade requerida para as confissões. Eu, que, desde os primeiros anos de sacerdócio, por graça de Deus, tive a sorte de começar a catequizar e a pregar para jovens e adultos e continuo ainda hoje a exercitar-me nesta obra consoladora e frutuosíssima, nunca perdi o hábito de falar frequentemente sobre a necessidade da confissão sincera e posso dizer que nunca me arrependi. Ah! quantos jovens e adultos eu consolei, reconduzi ao bom caminho; quantos eu salvei nos Exercícios Espirituais, nas Missões e mesmo nas simples conferências e palestras! 

Discípulo: Tem razão, Padre; de fato, nenhum sermão é ouvido de tão boa vontade como os que versam sobre a confissão... Padre, se é assim tão fácil encontrar quem se deixe enganar pelo demônio e se cala, renovando o sacrilégio na confissão, por que os sacerdotes e os confessores não indagam, não interrogam os penitentes para impedir as confissões mal feitas? 
Mestre: Coitados dos sacerdotes e dos confessores! Infelizmente eles sabem e vêm que algumas almas deixam muito a desejar mas, em geral, receiam ser indiscretos interrogando e esclarecendo certas coisas. Até pelo contrário, com certas pessoas, não ousamos parece-nos imprudência interrogar. Um pai ou uma mãe gostam de fazer sempre bom juízo dos seus filhos, e ficam penalizados quando têm que duvidar da sua conduta, da sua sinceridade, da sua inocência. Do mesmo modo sente o pobre sacerdote, no que diz respeito aos próprios filhos espirituais e penitentes. 

Discípulo: E então? 
Mestre: E então, continua-se em tal vida até que Deus intervenha com a sua mão providencial. Eis porque por ocasião dos Exercícios Espirituais, das Missões, da Páscoa e de outras tantas festividades do mesmo gênero, encontram-se muitas almas, as quais, tendo tido a desgraça enorme de calar uma vez certos pecados na confissão e continuaram depois com sacrilégios durante anos e anos até o dia em que, tocados por graça especial, podem finalmente abrir os olhos e tranquilizar a consciência por tanto tempo torturada pelo remorso. 

Pregavam-se os Exercícios em uma paróquia do Piemonte. Havia já alguns dias que tinham começado as confissões e, desde o princípio, eu notara uma pessoa de aspecto triste e indizivelmente constrangida que rondava o confessionário. Não fazia, porém, muito caso disso, quando eis que uma noite ela caiu aos meus pés e disse: 'Padre, ajudai-me; eu sou uma infeliz. Há quinze anos que eu me confesso mal; só fui capaz de cometer sacrilégios... e desatou em pranto' — 'Pois bem, cria coragem' eu respondi, Deus será misericordioso; para a senhora também Jesus será infinitamente bom. Diga-me: quantos anos tem? Como é que enveredou por esse caminho?' — 'Tenho vinte e sete anos; quando tinha doze apenas, por causa de uma curiosidade ilícita eu cometi um pecado que não ousei confessar. Com tal sacrilégio, aproximei-me da mesa da Comunhão e, desde aquele dia até hoje os pecados e sacrilégios sucederam-se uns aos outros. Rezei muito, chorei muito, fiz romarias mas tudo em vão! Confessava-me todos os meses e até com mais frequência por ocasião dos Exercícios Espirituais; repetia as confissões gerais mas esses pecados eu sempre os escondi, por pura vergonha' — 'E a senhora estava satisfeita com as suas confissões: comungava tranquilamente?' — 'Oh, Padre! se soubésseis como os remorsos amargos atormentavam o meu coração, cravando-se nele como espinhos agudos!' — 'Mas então por que continuava sempre do mesmo modo?' — 'Porque fui uma tola, eis tudo... Um medo indizível das reprimendas do confessor fechava-me a boca e um exagerado respeito humano das minhas companheiras arrastava-me para o comunhão nesse estado' — 'Há quanto tempo confessou-se pela ultima vez?' — 'Ah! Padre! confessei-me já três vezes durante esta Missão, com três confessores diferentes, sempre com o firme propósito de acabar com isto de uma vez por todas e dizer tudo. Mas, chegando ao ponto terrível, sentia um nó cruel que me apertava a garganta e assim calava-me' — 'E agora, como conseguiu manifestar-se?' — 'Padre, o vosso sermão de hoje sobre a necessidade absoluta da confissão bem feita, aquelas palavras tantas vezes repetidas 'experimentem e verão o quanto Jesus é bom', comoveram-me e foi então que decidi falar, custasse o que custasse. Ajudada pelo confessor, ela fez uma confissão geral das mais consoladoras, tendo recebido a absolvição, não parava de repetir: — 'Agora chega, Padre, chega de pecados e sacrilégios. Direi a todos que experimentei e que vi como Jesus é bom!'

Discípulo: São fatos que consolam, não é Padre? E ainda bem que reconhecem suas faltas! 
Mestre: Mas quantos não as reconhecem mesmo em ponto de morte! É uma coisa muito triste, mas infelizmente verdadeira; não raro há moribundos que, às portas da morte, teimam em esconder os pecados não confessados ou mal confessados desde a juventude, nesse estado deplorável passam para a eternidade. 

Discípulo: Coitados! 
Mestre: Pode chamá-los desgraçados! ai de quem começa...
 
Discípulo: Mas a misericórdia infinita de Deus não vem em auxílio? 
Mestre: Você pode supor que Deus queira sempre, na hora da morte, usar de misericórdia com quem durante toda a vida, abusando dessa misericórdia, injuriou-o com sacrilégios? E além disso, na maioria dos casos, nem invocam essa misericórdia; pelo contrário, muitas vezes a desprezam. Aqui também quero persuadi-lo com fatos. 

O Padre Del Rio conta que uma jovem empregada se confessava frequentemente, pois que a patroa exigia, mas por vergonha e teimosia calava os pecados desonestos. Uma ocasião ela caiu gravemente enferma; sempre por causa da solicitude da patroa, confessou-se, e mais de uma vez, sacrilegamente. Depois que a curaram com muitos cuidados, chegava até a caçoar com as amigas pondo em ridículo o zelo da patroa e do confessor para induzi-la a fazer uma boa confissão. Tendo adoecido pela segunda vez e mais gravemente do que da primeira, a patroa tornou a chamar o sacerdote, o qual acudiu com presteza. Com toda a piedade e paciência que Deus concede em casos análogos, o padre procurou induzir a infeliz a uma sincera e dolorosa confissão. Mas tudo em vão! Sempre teimosa, perseverou durante a longa agonia no propósito de se esquivar e de se calar, recusando-se até a repetir a jaculatória e as invocações sugeridas pelo confessor; mostrava-se aborrecida com tudo aquilo e com a presença do Padre. E, quando por fim vendo que chegava o momento da morte, o sacerdote lhe pediu que beijasse o crucifixo, ela com um esforço supremo o afastou com maus modos e olhando-o com desprezo disse: 'Tirem da minha frente este Cristo, não preciso dele!' E voltou-se para o outro lado e, assim, com um suspiro horrível, expirou aquela alma impenitente e sacrílega. Ai daquele que começa...

O Padre Agostinho de Fusignano conta-nos um fato análogo, que se deu na sua presença. Uma mulher infeliz escondia na confissão os pecados mais graves. Apesar dos sermões ouvidos contra essa vergonha sacrílega, apesar das mais amorosas exortações, apesar do mais agudo remorso da consciência, ela não soube aproveitá-los. Cansada a misericórdia de Deus de esperar, feriu-a com uma doença violenta que a pôs em ponto de morte. O confessor foi chamado prontamente, mas a infeliz assim que o viu, exclamou: 'Padre, chegastes a tempo para ver uma mentirosa penitente ir para o inferno. Eu me confessava com frequência, mas deixava sempre os pecados mais graves' — 'Pois bem, confesse-os agora, respondeu o confessor' — 'Não posso, não posso' gritou desesperada a infeliz. O tempo da misericórdia já passou; é chegado o momento da justiça! E, delirando e contorcendo-se raivosamente, expirou, deixando em todos os presentes a mais triste e horrível impressão. Aqui também não será demais repetir: Ai daquele que começa...

Santo Afonso conta o caso de um senhor cuja conduta era aparentemente boa; fazia, porém, más confissões. Tendo adoecido gravemente, foi visitado pelo vigário, o qual suplicou-lhe que recebesse os sacramentos pois estava em perigo de vida. Mas o enfermo recusava-se a confessar. 'E por que, meu caro senhor, não quer confessar-se?' — 'Ah!' respondeu o doente, 'é porque estou condenado! E Deus, para castigar os meus sacrilégios, tira-me a vontade e a força de repará-los'. Dito isto, começou a morder a língua, a debater-se desesperadamente, gritando: 'Maldita língua, maldito silêncio, malditos sacrilégios'. Não foi possível convencê-lo, até que miseravelmente morreu. 

Discípulo: Chega Padre! São coisas que arrepiam a gente. Eu por mim não quero cometer sacrilégios.
Mestre: Mantenha essa santa resolução. Por que deixar-se dominar pelo demônio mudo, pisar o Sangue de Jesus Cristo, mudar o remédio em veneno e obrigá-lo a nos condenar, quando pelo contrário, Ele quer a nossa salvação?

(Excertos da obra 'Confessai-vos Bem', do Pe Luiz Chiavarino, 1939)

PALAVRAS DE SALVAÇÃO

'Ó Trindade eterna! És um mar insondável em que, quanto mais me aprofundo, mais te encontro e quanto mais te encontro, mais te procuro ainda. De ti jamais se pode dizer: 'Basta!' A alma que se sacia em tuas profundezas, deseja-te sem cessar, porque sempre está faminta de ti; está sempre desejosa de ver a tua luz na tua luz. Poderás dar-me algo mais do que dar-te a ti mesmo? Tu és o fogo que sempre arde sem jamais se consumir, Tu és o fogo que consome em si todo o amor-próprio da alma; Tu és Luz acima de toda a luz. Tu és o vestuário que cobre a nudez, o alimento que alegra com a sua doçura a todos os que têm fome. Reveste-me, Trindade eterna, reveste-me de ti mesma para que eu passe esta vida na verdadeira obediência e na luz da fé com que embriagaste a minha alma'.

(Santa Catarina de Sena)

quarta-feira, 25 de novembro de 2015

A ALMA DO SANTO ABANDONO

O santo abandono é esse estado da alma amante que se entrega incondicionalmente e sem reservas à Vontade de Deus, quer na ordem da natureza, quer na ordem da graça.

Santo abandono na ordem da natureza

A alma do santo abandono quer tudo o que Deus quer, porque o quer e como o quer. Na saúde ou doença, nesse ou naquele país; na situação em que aprouver a Deus pô-la quanto à casa, ao trabalho, ao alimento, à sociedade. Tudo é indiferente, tudo suave, porque a tudo acrescenta: Deus o quer, é Vontade de Deus.

A alma do santo abandono dorme tranquila no regaço materno da Divina Providência ou descansa em paz aos seus pés, qual a criança despida de preocupação futura. Inquietar-se-á por acaso com o porvir o filho que tem uma mãe carinhosa? Não sabe que ela lhe dará todo o carinho e cuidado? Os elementos se entrechocam. É a tempestade. O mar ameaça tudo engolfar. Mas enquanto todos tremem de medo, o filho do santo abandono dorme sem receio, confiado na Divina Providência, pois para ela não há tempestade.

Os homens, maus que são, querem arrebatar-lhe tudo: bens, liberdade, reputação. Mas a alma do santo abandono deixa-se despojar de tudo sem cólera e sem desespero. Deus lhe resta. Deus a ama, é quanto lhe basta. Sente-se rica e goza da maior liberdade para ir ao encontro do Pai celeste.

Deus às vezes ameaça e parece abandonar a alma querida. Entrega-a ao furor do demônio e aos horrores das tentações. Ela sofre então o martírio da consciência. Mas é Vontade de Deus. 'Fere, se puderes, dirá ao demônio, tu que fizeste flagelar o meu Mestre, que o tentaste, que o carregaste nos braços. Eu, discípulo de tal Mestre, não tenho medo de ti, que só farás o que Deus quiser ou permitir. Jesus está comigo'.

Santo abandono na ordem da graça

A alma do santo abandono, qual um filho inocente nas mãos de Deus, entrega o seu espírito para que Deus lhe seja luz, e luz que quiser - clara ou velada, de fé ou de manifestação. Só quer saber o que Deus quer que ela saiba; é a ceguinha de Deus que lhe abre ou fecha os olhos como melhor convém e que, se lhe fosse dado escolher, havia de preferir a pobreza e humildade de espírito.

A alma do santo abandono dá o coração a Deus, em toda a simplicidade, para indiferente amá-lo a Ele tão somente, em todas as coisas e em todos os estados. Se a quiser abrasar no fogo do seu Amor, alegrar-se-á; se lhe quiser conceder uma graça de consolação, recebê-la-á reconhecida. Mas se Deus lhe fizer beber algumas gotas do seu cálice de fel, ou partilhar de alguns dos seus abandonos ou desamparos, de suas desolações ou tristezas, a alma do santo abandono beberá com amor esse cálice, participará da Agonia de Jesus, e lhe ficará fiel na provação.

A alma do santo abandono remete inteiramente a Deus toda vontade própria para que Ele a governe, a vire e revire à mercê dos seus desejos. Doravante só considerará como bem, alegria, felicidade, virtude, zelo, perfeição, aquilo que trouxer o selo da Vontade de Deus. Que quer Deus? Que deseja Ele? Que lhe agrada mais? Nisto está toda a lei, toda a perfeição, toda a vida da alma do santo abandono.

A alma do santo abandono entrega-se ao serviço que Deus lhe determina, mudando-o a toda hora como melhor lhe aprouver, sem outra consideração, sem outro amor do que essa Vontade Divina. Serve a Deus segundo os meios de que dispõe no momento. Não se afeiçoa nem ao estado, nem aos meios, nem às graças; descansa tão somente na santa Vontade de Deus.

(Excertos da obra 'A Divina Eucaristia' - Escritos e Sermões de São Pedro Julião Eymard)

terça-feira, 24 de novembro de 2015

GALERIA DE ARTE SACRA (XX)

OS SETE PECADOS CAPITAIS
(Hieronymus Bosch)


Quadro com dimensões de 150 cm x 120 cm, de autoria do pintor holandês Hieronymus Bosch (1450 - 1516), atualmente integrando o acervo do Museu do Prado, na Espanha. O homem, sob o olhar flamejante da justiça divina, deve superar o jugo das tentações e dos pecados, na certeza de que terá que prestar contas um dia a Deus de todas as suas faltas e fragilidades e, após este julgamento, será elevado à glória ou condenado à danação eterna. Usando uma iconografia bastante pessoal e fortemente pictórica, o artista delineia, num quadro único, os sete pecados capitais e os novíssimos do homem, forjando, a partir de cenas do cotidiano, valores e ações que têm repercussão direta nos tempos da eternidade. 

INSCRIÇÕES

Centro: Cave cave d[omin]us videt: [Cuidado, cuidado; Deus vê (você)]

Topo: Gens absque consilio est et sine prudentia / Utinam saperent et intelligerent ac novissima providerent [Porque é uma nação insensata, desprovida de inteligência / Se fossem sábios, compreenderiam, e discerniriam aquilo que os espera] - Dt 32, 28 - 29.


Base: Anscondam faciem meam ab eis et considerabo novissima eorum [vou ocultar-lhes o meu rosto e ver o que lhes sucederá] - Dt 32, 20.


Assinatura (em letras negras, no centro da base, abaixo da faixa branca inferior): Jheronimus Bosch

Disco central (a partir da base, em sentido anti-horário): Ira / Superbia / Luxuria / Accidia / Gula/ Avaricia / Invidia [Ira / Soberba / Luxúria / Preguiça / Gula / Avareza / Inveja],  tendo a figura de Jesus Cristo ao centro.

Discos laterais (do alto à esquerda, em sentido horário): Morte / Juízo Final / Céu / Inferno.

ICONOGRAFIA SETORIZADA DA PINTURA

I - IRA

II - SOBERBA


III - LUXÚRIA

 IV - PREGUIÇA


V - GULA

VI - AVAREZA


VII - INVEJA


MORTE


JUÍZO FINAL



CÉU


INFERNO

domingo, 22 de novembro de 2015

22 DE NOVEMBRO - SANTA CECÍLIA


Cecília, virgem e mártir romana do século III sob o império de Marco Aurélio, foi a primeira santa da Igreja exumada com corpo incorrupto, muitos séculos após a sua morte, fato que a tornou de imediato uma das santas mais veneradas da Idade Média e que levou o seu nome a figurar no próprio Cânon da Missa.

Os poucos dados disponíveis de sua vida foram relatados na obra 'Paixão de Santa Cecília', do século V. Sabe-se que, desde muito cedo, Cecília perdeu os pais e ofereceu-se a Deus como Esposa de Cristo. Contra as suas pretensões, foi prometida pelos seus parentes em casamento a Valeriano, um jovem nobre romano. Como esposa de Valeriano, conseguiu a conversão do marido e a sua aceitação a uma vida conjugal como irmãos. Mais tarde, Tibúrcio, irmão de Valeriano, também abraçou plenamente a fé cristã.

Em função da perseguição romana aos que professavam a fé cristã e, uma vez denunciados, Valeriano e Tibúrcio foram decapitados. Quanto a Cecília, foi condenada inicialmente à morte por asfixia em uma câmara úmida sob elevadas temperaturas. Ilesa diante dessa condenação, Cecília foi levada a um templo para ser decapitada e, mesmo mortalmente ferida, agonizou ainda por muito tempo. Seu corpo foi sepultado, na mesma posição de sua morte, nas catacumbas romanas.

Em 1599, o túmulo de Santa Cecília foi encontrado e, uma vez aberto, revelou o corpo intacto da santa em uma posição de suave repouso, imagem que foi reproduzida e ratificada em uma célebre escultura de puro mármore feita pelo artista Stefano Maderno (1566-1636). É considerada a padroeira da música sacra e dos músicos, sendo comumente representada com um instrumento musical porque, durante os festejos do seu casamento, durante músicas e canções festivas, teria elevado o pensamento a Deus em piedosa aspiração: 'Senhor, guardai sem mancha meu corpo e minha alma, para que eu não seja confundida'. 

(decapitação de Santa Cecília)

(estátua em mármore de Santa Cecília)


Santa Cecília, rogai por nós!

JESUS CRISTO - REI DO UNIVERSO

Páginas do Evangelho - Nosso Senhor Jesus Cristo, Rei do Universo


Jesus Cristo é o Rei do Universo. Como Filho Unigênito de Deus, Ele é o herdeiro universal de toda a criação, senhor supremo e absoluto de toda criatura e de toda a existência de qualquer criatura, no céu, na terra e abaixo da terra. A realeza de Cristo abrange, portanto, a totalidade do gênero humano, como expresso nas palavras do Papa Leão XIII: 'Seu império não abrange tão só as nações católicas ou os cristãos batizados, que juridicamente pertencem à Igreja, ainda quando dela separados por opiniões errôneas ou pelo cisma: estende-se igualmente e sem exceções aos homens todos, mesmo alheios à fé cristã, de modo que o império de Cristo Jesus abarca, em todo rigor da verdade, o gênero humano inteiro' (Encíclica Annum Sacrum, 1899).

E, neste sentido, o domínio do seu reinado é universal e sua autoridade é suprema e absoluta. Cristo é, pois, a fonte única de salvação tanto para as nações como para todos os indivíduos. 'Não há salvação em nenhum outro; porque abaixo do Céu nenhum outro nome foi dado aos homens, pelo qual nós devamos ser salvos' (At 4, 12). O livre-arbítrio permite ao ser humano optar pela rebeldia e soberba de elevar a criatura sobre o Criador, mas os frutos de tal loucura é a condenação eterna.

Diante a interrogação de Pilatos: 'Tu és o rei dos judeus?' (Jo 18, 33), Jesus manifesta sem rodeios a sua realeza eterna: 'Eu sou rei' (Jo 18, 37) e 'o meu reino não é deste mundo' (Jo 18, 36). A realeza de Cristo é, portanto, de natureza espiritual. Provam-no com toda evidência as palavras da Escritura acima referidas, e, em muitas circunstâncias, o proceder do próprio Salvador. Quando os judeus, e até os Apóstolos, erradamente imaginavam que o Messias libertaria seu povo para restaurar o reino de Israel, Jesus desfez o erro e dissipou a ilusória esperança. Quando, tomada de entusiasmo, a turba, que O cerca O quer proclamar rei, com a fuga furta-se o Senhor a estas honras temerárias e se oculta em oração junto do Pai. Diante de Pilatos, vai declarar plenamente a sua verdadeira majestade, soberano senhor de um reino que 'não é deste mundo'.

Este reino é destinado aos que se abrem à Verdade, pois 'todo aquele que é da verdade escuta a minha voz' (Jo 18, 37). Ninguém pode ser nele admitido sem a fé e o batismo. Este reino opõe-se ao reino de Satanás e ao poder das trevas e, de seus adeptos, exige o desprendimento não só das riquezas e dos bens terrestres, como também a prática cotidiana da mansidão, da fome e sede da justiça, da aceitação plena das dores e sofrimentos desta vida. Foi para adquirir a Igreja que Cristo, enquanto 'Redentor', verteu o seu sangue; para isto é, que, enquanto 'Sacerdote', se ofereceu e de contínuo se oferece como vítima. Pois foi por sua paixão, morte e ressurreição, que Cristo, rei do Universo, atraiu para si a humanidade inteira, libertada do pecado e da morte, que será o último adversário a ser vencido.

sábado, 21 de novembro de 2015

BREVIÁRIO DIGITAL - CATECISMO ILUSTRADO DE 1910 (XXVII)







(Catecismo Ilustrado de 1910, parte XXVII)

ORAÇÃO AO PAI

 

Pai,
confortai os vossos filhos que choram,
tantos que padecem de dores físicas e espirituais,
os que se perderam pelos caminhos do mundo
e não sabem voltar às fontes da graça.
Olhai com especial misericórdia
os que se inclinam sob o peso dos erros
pela insensatez de conhecer pela malícia
os limites do nada.

Fazei com que os réprobos e os cativos do mal
conheçam a vossa misericórdia
e se refaçam como arautos de todo o bem;
envolvei com carinho paternal
os desiludidos do mundo
os que não têm mais sentido de viver
porque perderam a capacidade de sonhar.

Tornai a volver aos vossos olhos clementes
os que se angustiam nas visões do inferno
e se debatem nas trevas do pecado,
e plantai nos corações eunucos do silêncio
a suavidade do vosso chamado,
reerguendo da lama dos vozerios da terra
a vossa cruz bendita e salvadora.

Retende nos contrafortes de tantas misérias
a doçura do vosso clamor de perdão;
Atraí para o Céu os desmemoriados da vida
ensandecidos de prazeres e volúpias
e mostrai a todos os vossos filhos
que toda e qualquer glória humana 
é mais vã que o tempo que passou.

Penetrai no mais íntimo das almas
e refazei vontades e arbítrios,
transformai em preces e bênçãos
tantas pedras deixadas nos caminhos;
levantai do chão as vossas criaturas
e fazei com que a Jerusalém celeste
seja de todos o único destino.

E, então, nos limites da divina providência,
 os que se consolam sejam consolados,
de uma a outra extremidade da terra,
para que possam cantar por toda a eternidade
a vossa glória, ó Pai!

(Arcos de Pilares)

sexta-feira, 20 de novembro de 2015

OS 21 PASSOS DA CONFISSÃO PERFEITA


1. A confissão é um sacramento de misericórdia; devemos por isso aproximar-nos dela com uma piedosa alegria e inteira confiança. 

2. Se vos acontece esquecerdes algumas faltas leves, nem por isso deixam de ser perdoadas. Reparai numa judiciosa observação de São Francisco de Sales: 'Não devemos inquietar-nos quando nós não lembramos as faltas, para as confessarmos; porque não é crível que uma alma que faz muitas vezes o exame da sua consciência, o não faça de modo que se lembre das suas faltas graves. Não devemos ser tão delicados que queiramos confessar tantas imperfeições pequenas, tantas faltas leves: um ato de humildade interior, um suspiro basta para as apagar'. Não digais que tendes pecados ocultos que não confessais. Isso é um artifício do demônio para vos inquietar. Recordai-vos ainda de que a relação minuciosa das vossas faltas não é o que as perdoa, assim como uma enumeração exata das dívidas não apaga nada ao credor.

3. Tende a certeza que quanto mais examinardes, menos encontrareis. Além disso, um exame prolongado fatiga o espírito e entorpece o coração.

4. A instrução seguinte de São Francisco de Sales será, pois de uma grande importância prática:  'Quando não virdes claramente que destes alguma espécie de consentimento aos acessos da cólera ou de qualquer outra tentação, deveis dizê-lo ao vosso diretor espiritual, a fim de serdes instruídos como haveis de proceder ... Estando em dúvida se cometestes alguma falta, deveis examinar seriamente se essa dúvida tem fundamento, e depois falar dela com simplicidade. No caso contrário deveis calar-vos, ainda que sintais por isso um pesar'.

5. Também o santo não quer que façamos certas acusações gerais, que muitas pessoas fazem por costume, e a que ele chama supérfluas. Por exemplo: de não ter amado a Deus e ao próximo quanto era do nosso dever; de não ter rezado as orações ou de não ter recebido os sacramentos com o respeito conveniente e coisas semelhantes; porque, acrescenta ele, todos os santos do paraíso e todos os homens do mundo podiam dizer o mesmo, se se confessassem.

6. Tende sempre presente ao espírito este aviso tão útil de São Francisco de Sales: 'Não somos obrigados a confessar os pecados veniais: mas quando os confessamos, devemos ter a resolução de emendar-nos deles: aliás, seria um abuso dá-los por matéria da confissão sacramental'.

7. Depois da confissão fica tranquilo. É absolutamente proibido deixar-vos vencer de temores a respeito do exame de consciência, da contrição ou de qualquer outra coisa que seja. Estes temores são artifícios do vosso inimigo, que deseja tornar-vos amargo um sacramento de consolação e de amor.

8. Devemos arrepender-nos dos nossos pecados, mas não perturbar-nos por causa deles; o arrependimento é feito por amor de Deus; a perturbação, do amor próprio. No mesmo ato de sincero arrependimento devemos dar graças a Deus de que, pela sua misericórdia, não procedemos pior. Prometei-lhe depois sincera emenda, não confiando senão na sua bondade. Ainda que caísses cem vezes por dia, deveis sempre esperar e prometer séria emenda. Num instante Deus pode transformar as pedras em verdadeiros filhos de Abraão, isto é, em grandes santos. Assim o fará se constantemente confiardes n'Ele.

9. A dor dos pecados consiste numa determinação da vontade que detesta as faltas passadas e não quer cometê-las para o futuro. Para a verdadeira contrição não são precisas lágrimas, nem suspiros, nem emoções sensíveis: podemos até ter nosso coração contrito santo e justificante no meio da maior aridez, que nos parecerá ser insensibilidade. Não vos deixeis vencer por nenhum temor a este respeito.

10. Não façais nunca esforço algum para excitardes em vós a contrição; este esforço perturba e fatiga a alma sem lhe dar o que procura. Pelo contrário, estabelecei no vosso coração uma profunda paz, e dizei amorosamente ao vosso Deus que desejareis não o ter ofendido, e que com o seu auxílio não quereis ofendê-lo mais para o futuro: eis a contrição. Ela é um efeito do amor, e o amor procede sempre com tranquilidade.

11. São Francisco de Sales diz que o ato de contrição se faz em um instante com dois rápidos olhares. Um sobre nós com o detestar do pecado, outro sobre Deus com a promessa de nos emendarmos na esperança do seu socorro. Um dos penitentes mais contritos foi Davi: e a sua contrição encerrou-se nesta palavra: 'Pequei' -  pecavi; e com esta só palavra se justificou.

12. Dizeis que quereis ter a contrição; mas que não podeis tê-la. São Francisco de Sales responde-vos: 'É poder muito, muito poder querer. O desejo da contrição prova que há contrição. O fogo que está debaixo da cinza não se sente e não se vê, e contudo existe'. O desejo de sentir a contrição nasce muitas vezes de uma complacência interesseira da nossa parte, que não satisfeita de contentar a Deus, queria também contentar-se a si; e na sua sensibilidade pessoal ter a certeza do seu estado de graça e da sua virtude.

13. Deus não vos faz conhecer a vossa contrição para vos alcançar o mérito da obediência, a qual vos impõe o dever de ficardes em paz. Acredite, pois, humildemente, obedecei desafogadamente, e obtereis uma dupla coroa. Muitas vezes os santos mais elevados julgavam não ter contrição nem amor, mas no meio das suas trevas seguiram a luz da obediência com uma heroica submissão.

14. Não julgueis que não tendes contrição ou que vos confessais mal, porque tornais a cair em faltas. É preciso fazer distinção entre as faltas: devemos corrigir-nos com vigor das que nascem de uma vontade depravada que ama o pecador, quer o pecado e deseja perseverar no pecado; mas as faltas que nascem da surpresa, da fraqueza, da fragilidade, nos acompanharão em parte até a morte. 'Será muito', diz o nosso santo, 'podermos nos curar de certos defeitos um quarto de hora antes de morrermos'. E em outra parte: 'Devemos suportar não só as fraquezas do próximo, mas também as nossas, e ter paciência à vista das nossas imperfeições'. Procuremos emendar-nos com paz e sem ansiedade, porque não podemos ser anjos antes do tempo.

15. Nas vossas confissões acrescentai em geral alguma falta da vossa vida passada, de que experimentais uma dor particular. Dizei por exemplo: confesso-me dos pecados de impureza, de ódio ou de vingança da vida passada. Deste modo a matéria necessária para o sacramento será muito mais certa.

16. Repeli os temores de terdes omitido pecados nas vossas confissões gerais ou particulares, ou de não os terdes declarado como deveis: A Igreja, que é o intérprete da vontade de Nosso Senhor Jesus Cristo, pede a integridade sacramental e não a integridade material. A primeira consiste na confissão dos pecados lembrados depois de um exame razoável, e proporcionado ao estado atual da nossa alma. A integridade material consiste na declaração material de todos os pecados que cometemos, do seu número, das suas circunstâncias sem omitir nenhuma. A Igreja pede a primeira integridade, porque não exige a segunda, sabendo muito bem que no nosso exame nos poderá escapar alguma coisa ou sobre o número ou sobre as circunstâncias. Em suma: ela não pede aos fiéis senão uma confissão humilde e sincera de tudo o que lhes vem à lembrança depois de um exame conveniente, persuadida de que a boa vontade dos penitentes supre então a falta involuntária da sua memória.

17. Tendo satisfeito abundantemente à integridade sacramental, repeli, pois todas as apreensões e dúvidas como verdadeiras tentações.

18. Lembrai-vos ainda de que se vos parecer que não tendes tido com o vosso exame o cuidado conveniente, o confessor prudente supre esta falta pelas suas interrogações; e se ele não faz nenhuma é porque tem o conhecimento necessário da qualidade dos vossos pecados e do estado da vossa alma, que é o fim, da acusação sacramental.

19. Daí vem o erro dos que querem repetir as suas confissões gerais com o medo de não terem tido as disposições suficientes no seu exame ou na sua contrição; daí a censurável facilidade dos confessores que se prestam a isso. Se devêssemos dar ouvidos a semelhantes apreensões, seria preciso passar a vida inteira a renovar as confissões gerais, porque os mesmos receios se podem apresentar sempre, ainda nos maiores santos; e assim a confissão se transformará em verdadeiro cavalete, em tortura da alma; ora, isto é uma proposição herética, fulminada pelo Concilio de Trento.

20. A doutrina de todos os santos e de todos os teólogos esclarecidos é que, depois de ter feito a vossa confissão geral com sinceridade de coração e desejo de vos emendardes, deveis ficar tranquilo e não a repetir de modo algum. Aquele que obra de outra sorte traz a memória o que devia esquecer e perturba o espírito em vez de sossegá-lo. Tanto mais que como diz São Filipe Nery: 'Quanto mais se varre, mais pó se levanta'.

21. Para chegardes a tranquilizar a vossa alma, achareis um poderoso socorro neste sentimento universal dos santos, de que o temor do pecado deixa de ser salutar quando é excessivo.

(Excertos da obra ' Maria falando ao Coração das Donzelas', do Abade A. Bailey)