Quer queira, quer não, há que se sofrer. Há uns que sofrem como o bom ladrão, e outros como o mau; ambos sofriam igualmente. Mas um soube tornar os seus sofrimentos meritórios e o outro expirou no desespero mais horrendo.
Há dois modos de sofrer: sofrer amando e sofrer sem amar. Os santos sofriam tudo com paciência, alegria e perseverança, porque amavam. Nós, nós sofremos com cólera, despeito e enfado, porque não amamos. Se amássemos a Deus, seríamos felizes de poder sofrer por amor d'Aquele que se dignou sofrer por nós. No caminho da cruz, meus filhos, só o primeiro passo custa. É o temor das cruzes que é a nossa maior cruz...
Não se tem a coragem de carregar a própria cruz, ou se faz isso muito mal; porquanto, façamos o que fizermos, a cruz nos apanha, não lhe podemos escapar. Que temos então a perder? Porque não amarmos as nossas cruzes e não nos servirmos delas para irmos para o céu? Ao contrário, a maioria dos homens voltam as costas às cruzes e fogem diante delas. Quanto mais correm, tanto mais a cruz os persegue, tanto mais os fustiga e os esmaga de pesos.
Se o bom Deus nos manda cruzes, nós nos agastamos, nos queixamos, murmuramos, somos tão inimigos de tudo o que nos contraria, que quereríamos sempre estar numa caixa de algodão; mas é numa caixa de espinhos que deveríamos estar.
É pela cruz que se vai para o céu. As moléstias, as tentações, as penas são outras tantas cruzes que nos conduzem ao céu. Tudo isso em breve terá passado. Vede os santos que chegaram antes de nós; o bom Deus não pede de nós o martírio do corpo, pede-nos só o martírio do coração e da vontade.
Nosso Senhor é nosso modelo; tomemos a nossa cruz e sigamo-lo. Façamos ainda como os soldados de Napoleão. Era preciso atravessar uma ponte sobre a qual atiravam a metralha; ninguém ousava passar. Napoleão tomou a bandeira e marchou por primeiro.
A cruz é a escada do céu. Como é consolador sofrer sob os olhos de Deus, e poder dizer a si, a noite, no exame de consciência: 'Eis, minha alma, tiveste hoje duas ou três horas de semelhança com Jesus Cristo: foste flagelada, coroada de espinhos, crucificada com ele!' Ó que tesouro para a morte! Como é bom morrer quando se viveu na cruz !
Se alguém vos dissesse: 'Eu bem queria ficar rico, que devo fazer?'; vós lhe responderíeis: 'É preciso trabalhar'. Pois bem, para ir para o céu é preciso sofrer. Sofrer! Que importa? É só um momento. Se pudéssemos passar oito dias no céu, compreenderíamos o valor desse momento de sofrimento. Não acharíamos cruz bastante pesada, nem provação que fosse bastante amarga...
(São Cura D'Ars)