sexta-feira, 28 de junho de 2013

PARA QUE TODOS SE SALVEM!

A vocação cristã, que é um chamamento pessoal do Senhor, leva cada um de nós a identificar-se com Ele. Não devemos esquecer-nos, porém, de que Ele veio à Terra para redimir o mundo inteiro, porque quer que os homens se salvem. Não há uma só alma que não interesse a Cristo. Cada uma lhe custou o preço do seu Sangue.

Ao considerar estas verdades, vem-me à memória a conversa dos Apóstolos com o Mestre momentos antes do milagre da multiplicação dos pães. Uma grande multidão acompanhara Jesus. Nosso Senhor ergue os olhos e pergunta a Filipe: Onde compraremos pão para dar de comer a toda esta gente? Fazendo um cálculo rápido, Filipe responde: Duzentos dinheiros de pão não bastam para cada um receber um pequeno bocado. Como não dispõem de tanto dinheiro, lançam mão de uma solução caseira. Diz-lhe um dos seus discípulos, André, irmão de Simão Pedro: Está aqui um rapaz que tem cinco pães de cevada e dois peixes, mas que é isto para tanta gente.

Nós queremos seguir o Senhor e desejamos difundir a sua Palavra. Humanamente falando, é lógico que também perguntemos a nós mesmos: mas que somos nós para tanta gente? Em comparação com o número de habitantes da Terra, ainda que nos contemos por milhões, somos poucos. Por isso, temos de considerar-nos como uma pequena levedura, preparada e disposta a fazer o bem à humanidade inteira, recordando as palavras do Apóstolo: Um pouco de levedura fermenta toda a massa, transforma-a. Precisamos, portanto, de aprender a ser esse fermento, essa levedura, para modificar e transformar as multidões.

Se meditarmos com sentido espiritual no texto de São Paulo, compreenderemos que temos de trabalhar em serviço de todas as almas. O contrário seria egoísmo. Se olharmos para a nossa vida com humildade, veremos claramente que o Senhor nos concedeu talentos e qualidades, além da graça da fé. Nenhum de nós é um ser repetido. O Nosso Pai criou-nos um a um, repartindo entre os seus filhos diverso número de bens. Pois temos de pôr esses talentos, essas qualidades, ao serviço de todos; temos de utilizar esses dons de Deus como instrumentos para ajudar os homens a descobrirem Cristo.

Falando ou escrevendo, às vezes compara-se o mundo com o mar. E há muita verdade nessa comparação. Na vida humana, tal como no mar, há períodos de calma e períodos de borrasca, de tranquilidade e de forte ventania. Muitas vezes, os homens nadam em águas amargas, no meio de grandes vagas; caminham no meio de tormentas; viajam cheios de tristeza, mesmo quando parece que têm alegria, mesmo quando falam ruidosamente: gargalhadas que pretendem encobrir o seu desalento, o seu desgosto, a sua vida sem caridade nem compreensão. E devoram-se uns aos outros, tanto os homens como os peixes… É missão dos filhos de Deus conseguir que todos os homens entrem - com liberdade - dentro da rede divina, para que se amem. Se somos cristãos, temos de converter-nos nos pescadores de que fala o profeta Jeremias. Jesus Cristo também utilizou repetidamente essa metáfora: 'Segui-me e Eu farei de vós pescadores de homens', diz a Pedro e a André.

Atrevo-me a assegurar que também o Senhor fará de nós instrumentos capazes de realizar milagres e até, se for preciso, dos mais extraordinários, se lutarmos diariamente por alcançar a santidade, cada um dentro do seu estado, no meio do mundo, no exercício da sua profissão, na vida normal e corrente. Daremos luz aos cegos... Quem não poderia contar mil casos de cegos, quase de nascença, que recobraram a vista, recebendo todo o esplendor da luz de Cristo? E de outros que eram surdos, e outros mudos, que não podiam ouvir ou articular uma palavra como filhos de Deus... E que purificaram os seus sentidos, e já ouvem, e já se exprimem como homens, não como animais!... In nomine Iesu!, em nome de Jesus, os seus Apóstolos dão agilidade àquele aleijado, que era incapaz de uma ação útil... E àquele outro, um poltrão, que conhecia as suas obrigações mas não as cumpria... - Em nome do Senhor, surge et ambula!; levanta-te e caminha! E um outro, já morto, apodrecido, que tresandava a cadáver, também ouviu a voz de Deus, como no milagre do filho da viúva de Naim - Rapaz, eu te ordeno: levanta-te! 

Faremos milagres como os de Cristo, milagres como os dos primeiros Apóstolos... Talvez esses prodígios se tenham dado contigo mesmo, ou comigo... Talvez fôssemos cegos, ou surdos, ou estropiados, ou cheirássemos a cadáver, e a palavra do Senhor nos tivesse levantado da nossa prostração... Pois bem: se amamos Cristo, se o seguimos com sinceridade, se não nos procuramos a nós mesmos mas tão só a Ele, em seu nome poderemos transmitir a outros de graça, o que de graça nos foi concedido.

Deus quer que todos se salvem. Isto é um convite e uma responsabilidade que pesam sobre cada um de nós. A Igreja não é um reduto de privilegiados. A grande Igreja será porventura uma exígua parte da Terra? A grande Igreja é o mundo inteiro. Assim escrevia Santo Agostinho, acrescentando: Aonde quer que te dirijas, aí está Cristo. Tens por herança os confins da Terra. Vem! Toma posse dela toda comigo.

Além disso, quem disse que para falar de Cristo, para difundir a sua doutrina, é preciso fazer coisas especiais, fora do comum? Faz a tua vida normal; trabalha onde estás a trabalhar, procurando cumprir os deveres do teu estado, acabar bem o que é próprio da tua profissão ou do teu ofício, superando-te, melhorando-te dia-a-dia. Sê leal, compreensivo com os outros e exigente contigo mesmo. Sê mortificado e alegre. Será esse o teu apostolado. E, sem saberes porquê, tendo perfeita consciência das tuas misérias, os que te rodeiam virão ter contigo e, numa conversa natural, simples - à saída do trabalho, numa reunião familiar, no carro, ao dar um passeio, em qualquer parte - falareis de inquietações que em todas as almas existem, embora às vezes alguns não queiram dar por isso. Mas cada vez as perceberão melhor, desde que comecem a procurar Deus a sério.

Pede a Maria, Regina apostolorum, que te decidas a participar nas ânsias de sementeira e de pesca que estão no Coração do seu Filho. Garanto-te que, se começares, terás a barca cheia, como os pescadores da Galileia. E Cristo na margem, à tua espera. Porque a pesca é sua.

('Para que todos se salvem', excertos de homilia proferida pelo Santo Josemaria Escrivá de Balaguer, em 11/03/1960)