segunda-feira, 7 de dezembro de 2020

AS REGRAS DA MORTIFICAÇÃO CRISTÃ (IV/Final)

D. Mortificações que deve praticar nas ações exteriores

1. Deve-se observar a maior exatidão em todos os pontos da sua regra de vida, e obedecer sem demora, lembrando-se de São João Berchmans, que dizia: 'Minha maior penitência é seguir a vida comum'; 'Fazer o maior caso das menores coisas, esse é o meu lema'; 'Antes morrer que violar uma só de minhas regras!';

2. No exercício de seus deveres de estado, trate de estar muito contente com tudo o que parece feito de propósito para desagradá-lo e molestá-lo, lembrando-se também aqui da frase de São Francisco de Sales: 'Nunca estou melhor do que quando não estou bem';

3. Não conceda jamais um momento à preguiça; da manhã à noite, esteja ocupado sem descanso;

4. Dedica a sua vida, ao menos em parte, ao estudo, pratique os seguintes conselhos de Santo Tomás de Aquino aos seus alunos: 'Não se contentem em receber superficialmente o que leem ou escutam, mas tratem de penetrar e aprofundar o sentido. Não fiquem nunca com dúvidas sobre o que podem saber com certeza. Trabalhem com uma santa avidez em enriquecer o espírito; classifiquem com ordem na memória todos os conhecimentos que possam adquirir. Sem embargo, não tratem de penetrar os mistérios que estão acima de sua inteligência';

5. Ocupe-se unicamente da ação presente, sem voltar-se ao que precedeu nem adiantar-se pelo pensamento ao que vem a seguir; diga com São Francisco: 'Enquanto faço isto, não estou obrigado a fazer outra coisa'; 'Apressemo-nos com bondade: será tão logo tanto quanto esteja bom';

6. Seja modesto na compostura. Nenhum porte era tão perfeito como o de São Francisco; tinha sempre a cabeça direita, evitando igualmente a ligeireza que a gira em todos os sentidos, a negligência que a dobra adiante e o humor orgulhoso e altivo que a inclina para trás. Seu rosto estava sempre tranquilo, livre de toda preocupação, sempre alegre, sereno e aberto, sem ter, todavia, uma jovialidade indiscreta, sem risadas ruidosas, imoderadas ou demasiado frequentes. Quando se encontrava só, mantinha-se em tão boa compostura como diante de uma grande assembleia. Não cruzava as pernas, não apoiava a cabeça no encosto. Quando rezava, ficava imóvel como uma coluna. Quando a natureza lhe sugeria gostos, não a escutava em absoluto;

7. Considere a limpeza e a ordem como uma virtude e a sujeira e a desordem como um vício: evite os vestidos sujos, manchados ou rasgados. Por outra parte, considere como um vício ainda maior o luxo e o mundanismo. Faça de modo que ao lhe verem a vestimenta e adereços, ninguém diga: 'está desarrumado'; nem 'está elegante'; mas que todo o mundo possa dizer: 'está decente'.

E. Mortificações para praticar nas relações com o próximo

1. Aguente os defeitos do próximo: faltas de educação, de espírito, de caráter. Aguente tudo o que nele lhe desagrada: o modo de andar, a atitude, o tom de voz, o sotaque, e todo o resto;

2. Aguente tudo de todos e aguente até o fim e cristãmente. Não se deixe levar jamais por essas impaciências tão orgulhosas que fazem dizer: Que posso fazer de tal ou qual? Em que me interessa o que diz? Para que preciso do afeto, da benevolência ou da cortesia de uma criatura qualquer, e desta em particular? Nada é mais distante de Deus que esses desprendimentos altaneiros e essas indiferenças depreciativas; melhor seria, certamente, uma impaciência;

3. Encontra-se tentado a irar-se? Por amor de Jesus, seja manso. De vingar-se? Devolva bem ao mal. Diz-se que o segredo de chegar ao coração de Santa Teresa, era fazer-lhe algum mal. De mostrar a alguém uma cara má? Sorria com bondade. De evitar seu encontro? Busque-o por virtude. De falar mal dele? Fale bem. De falar-lhe com dureza? Fale doce e cordialmente;

4. Ame elogiar os irmãos, sobretudo aqueles a quem a sua inveja se dirige mais naturalmente;

5. Não diga acuidades em detrimento da caridade;

6. Se alguém se permite na sua presença palavras pouco convenientes ou mantém conversações próprias a danificar a reputação do próximo, poderá às vezes repreender com doçura a quem fala, mas antes será melhor distanciar-se habilmente da conversação ou manifestar por um gesto de descontentamento ou desatenção proposital que o assunto o desagrada;

7. Quando lhe custar fazer um favor, ofereça-se a fazê-lo: terá duplo mérito;

8. Tenha horror de apresentar-se diante de si mesmo ou dos demais como uma vítima. Longe de exagerar suas cargas, esforce-se em considerá-las leves. Em realidade, elas são leves, muito mais vezes do que parece, e o seriam sempre se você tivesse um pouco mais de virtude.

Conclusão

Em geral, negue à natureza o que ela pede sem necessidade. Saiba fazê-la dar o que nega sem razão. Seus progressos na virtude, disse o autor da Imitação de Cristo, serão proporcionais à violência que cometa contra si.

Dizia o santo Bispo de Genebra: 'Há de se morrer a fim de que Deus viva em nós: porque é impossível chegar à união da alma com Deus por outro caminho, senão o da mortificação. Estas palavras: Há de se morrer! são duras, mas serão seguidas de uma grande doçura, porque não se morre a si mesmo sem se unir a Deus por essa morte'.

Quisera Deus que pudéssemos referir a nós com pleno direito as seguintes palavras de São Paulo: 'Em todas as coisas sofremos a tribulação...Trazemos sempre em nosso corpo a morte de Jesus, a fim de que a vida de Jesus se manifeste também em nossos corpos' (2Cor 4, 10).

(Cardeal Mercier)