56. Há um tipo de orgulho que é ainda mais abominável aos olhos de Deus do que qualquer outro, e é aquele - como diz a Sagrada Escritura - que pertence mais especialmente aos pobres. 'O pobre que se ensoberbece, minha alma odeia' [Eclo 25,4]. Se o orgulho de quem é rico em méritos, talentos e virtudes - tesouros mais preciosos para a alma - é desagradável a Deus, mais desagradável ainda será para Ele em quem não tem esses mesmos motivos de orgulho, mas que, pelo contrário, teria todas as razões para ser humilde. E este, receio, é o orgulho de que sou culpado.
Sou pobre de alma, sem virtude nem mérito, cheio de iniquidade e malícia, e, no entanto, me estimo e amo tanto a minha própria estima que fico perturbado se os outros não me estimam também. Sou verdadeiramente uma criatura pobre, orgulhosa e miserável; e quanto maior é a minha pobreza, mais o meu orgulho é detestável aos olhos de Deus. Tudo isto resulta de não conhecer a mim próprio. Concedei, ó meu Deus, que eu possa dizer como o profeta: 'Eu sou o homem que vê a minha pobreza' [Lm 3,1]. Fazei-me conhecer, Senhor, a minha própria miséria, que de mim mesmo nada sou, nada sei, nada possuo senão os meus pecados, e nada mereço senão o inferno. Recebi de Vós muitas graças, luzes e inspirações, e muita ajuda, e no entanto com que ingratidão respondi à vossa infinita bondade! Quem mais pecador, quem mais ingrato e quem mais perverso do que eu? Quanto mais fizestes por mim, tanto mais humilde devo ser, pois terei de te prestar contas rigorosas de todos os vossos benefícios: 'E a quem muito for dado, muito será pedido' [Lc 12,48]. E, no entanto, quanto maior é a vossa bondade, maior tem sido o meu orgulho. Coro de vergonha, e é o conhecimento do meu orgulho que me obriga agora a ser humilde.
57. É mais fácil ser humilde na adversidade do que na prosperidade, e é impossível dizer o quanto a felicidade temporal influencia o homem a ser orgulhoso. 'Dos sofrimentos dos mortais não participam' [Sl 72,5], assim o Profeta-Rei fala dos pecadores, e acrescenta: 'Por isso a soberba os prendeu' [Sl 72,6]. A adversidade contrabalança o nosso amor-próprio e impede o seu crescimento, pois, por um lado, dá-nos a conhecer as nossas fragilidades, tanto mais quando é inesperada e dolorosa, e, por outro lado, obriga-nos a voltar os nossos pensamentos para Deus, a implorar a sua misericórdia e a humilharmo-nos sob a sua mão, como fez o profeta: 'Na minha aflição invoquei o Senhor' [Sl 17,7] e 'E como um triste, assim me humilhei' [cf Sl 34, 13-14]. Portanto, se não soubermos suportar as tribulações com alegria, pelo menos suportemo-las com paciência e humildade.
Ó como são preciosas essas humilhações pelas quais adquirimos e aprendemos a exercitar a humildade! É então que devemos exclamar com o salmista: 'na sepultura, acaso há de se falar no seu amor? [Sl 88,11] ou então, como o rei Nabucodonosor quando, caindo em si, humildemente exclamou: 'Por isso, agora louvo, engrandeço e glorifico o Rei dos Céus, porque Ele é capaz de humilhar os que andam na soberba' [Dn 4,34]. As aflições não faltam neste vale de lágrimas, mas são poucos os que sabem usá-las como meio de se tornarem humildes. Concedei, ó meu Deus, a vossa misericórdia, para que eu possa estar entre esses poucos!
('A Humildade de Coração', de Fr. Cajetan (Gaetano) Maria de Bergamo, 1791, tradução do autor do blog)