sábado, 6 de abril de 2024

SERMÕES DO CURA D'ARS (XVIII)

SOBRE A ALEGRIA PASCAL - JESUS RESSUSCITOU!

 'Procurais Jesus que foi crucificado; Ele não está mais aqui, Ele ressuscitou!' 
(Mt 28, 5-6)

Caríssimos no Senhor! Este é o dia que o Senhor fez para nós, alegremo-nos e com Ele triunfemos! A Igreja nos exorta nesse dia com este anúncio jubiloso, adornada como uma noiva. A aurora do dia trouxe-nos um belo, um grande dia de alegria. Quando chegamos ao sepulcro com as santas mulheres, os anjos saudaram-nos com esta mensagem de alegria: 'Procurais Jesus de Nazaré, que foi crucificado: Ele ressuscitou, não está mais aqui'. É esta a alegre mensagem do Céu, que ressoa com alegria de norte a sul, até aos confins da terra. Como esta alegre mensagem deveria ressoar em cânticos de triunfo e inundar o coração de alegria indizível. Os céus contemplam o glorioso ressuscitado e o céu cobre-se do mais belo azul; o sol no firmamento contempla-o e brilha com a mais brilhante e perfeita luz, a terra favorecida e os seus habitantes contemplam a glória do Salvador ressuscitado, e também eles se regozijam. O mundo inteiro junta-se hoje a este glorioso hino de louvor de Santo Ambrósio: 'Deus Todo-Poderoso, nós te louvamos; Senhor, nós louvamos as tuas obras; porque este é o dia que o Senhor fez para nós, alegremo-nos e com Ele triunfemos!'. Vamos meditar juntos:

I. Por que este dia é tão alegre
II. Como devemos exprimir corretamente o nosso júbilo, unidos às palavras do Evangelho da festa, que diz: 'Procurais Jesus de Nazaré, que foi crucificado: Ele ressuscitou, não está mais aqui'

Que o Salvador ressuscitado abençoe a nossa meditação.

Parte I 

1. Amados irmãos, se quereis conhecer a verdadeira razão da nossa alegria pascal, remontemos aos últimos dias da Semana Santa e representemos, para nós mesmos e de maneira viva, o que aconteceu a Jesus de Nazaré naqueles dias em Jerusalém. Todos estes acontecimentos estão frescos na nossa memória; fomos levados, durante a Quaresma, pelas palavras do pregador, a seguir o nosso Salvador na sua paixão. Vimo-lo ser pisado como um verme; vimo-o arrastar a sua cruz até ao local da execução; ouvimos as pancadas do martelo que lhe prendiam as mãos e os pés à cruz; vimos a cruz erguida com o seu precioso fardo; em suma, fomos testemunhas em espírito da terrível morte agonizante do nosso Salvador, de quem até Pilatos disse: 'Que farei de Jesus, chamado justo?' A Igreja quer exprimir a sua justa e profunda dor por meio de sinais exteriores de luto; por isso, a casa de Deus e o seu santuário, o Altar, estavam rodeados de uma quietude mortal, os sons do órgão e o som do sino foram silenciados, apenas a cruz nua atraía para si todos os olhares e enchia os nossos corações de tristeza. Mas, queridos irmãos, o nosso luto transformou-se agora em alegria. O selo da sepultura foi quebrado; Aquele que nela repousava está vivo; Aquele que vimos morrer sobre o madeiro da cruz, como o pária da humanidade, proclamou a sua dignidade divina; nem selo, nem sepultura, nem pedra, nem fechadura poderiam resistir a Ele - Ele ressuscitou! Assim como a vida recém-despertada na primavera se desdobra em mil botões e flores, tocando poderosamente os nossos corações, do mesmo modo toda a alma cristã se sente estranhamente comovida e tocada quando, na manhã de Páscoa, ouvimos os sinos da Páscoa a tocar, para a casa de campo como para o palácio, as boas novas que o anjo trouxe do céu: 'Ele ressuscitou, não está mais aqui! Aleluia, Jesus vive!'

2. Jesus vive! Perante este anúncio, a terra rejubila e abre o túmulo daquele cuja morte no Gólgota a fez estremecer e tremer na sua base: Jesus vive! Perante esta mensagem, o Céu agita-se com alegria e envia um dos seus anjos para quebrar o selo que o ódio dos seus inimigos tinha colocado sobre a sua vítima, mesmo depois da sua morte, para fazer rolar a pesada pedra e anunciar às santas mulheres: 'Procurais Jesus de Nazaré: Ele ressuscitou, não está mais aqui - Resurrexit sicut dixit. Que alegria para os pobres discípulos, que tinham fugido em todas as direções quando ele foi feito prisioneiro! Jesus vive! Que alegria para nós, amados irmãos; que alegria e que prazer para nós, que somos batizados em nome de Jesus, que acreditamos nos ensinamentos de Jesus; para nós, que podemos viver na esperança abençoada de que também nós poderemos ressuscitar um dia para uma vida melhor! Quando o Homem das Dores, terminada a sua luta e os seus sofrimentos, gritou ao mundo, em alta voz, aquelas poderosas palavras: 'Está consumado', quando inclinou a cabeça e entregou o espírito, o sol obscureceu-se e não quis contemplar aquele terrível espetáculo; a terra foi fortemente abalada, os seus túmulos abriram-se e os mortos ressuscitaram. Hoje, porém, abriu-se um túmulo e dele nasceu um sol que nunca se obscurecerá, que nunca se porá; um sol que, como o sol da primavera, cria vida nova. Este novo sol é o Crucificado, o Filho de Deus, o próprio Deus, abençoado por toda a eternidade. Ele é aquele em quem se cumprem as palavras do Apóstolo: 'Porque se humilhou a si mesmo e foi obediente até à morte na cruz, por isso Deus o exaltou e lhe deu um nome que está acima de todos os outros nomes'.

3. Quando a estrela de Jacó surgiu, quando o Verbo se fez carne, o reino da falsidade e das trevas estava condenado à derrota. Já o cântico de berço que os anjos entoaram ao Salvador encarnado: 'Glória a Deus nas alturas!' era um solene hino de louvor que anunciava antecipadamente a glória desse dia. O Gloria in Excelsis daquela noite tão amada é completado de forma gloriosa pelas boas novas do mensageiro celeste na manhã de Páscoa, que disse: 'Vós procurais Jesus de Nazaré: Ele ressuscitou, não está mais aqui'. Mas a verdade que o Filho de Deus trouxe do céu o seu ensinamento divino que não era para ser proclamado sem luta; a luz iluminava as trevas, mas as trevas não podiam compreender. O Filho Unigênito do Pai foi caluniado como o pobre filho do carpinteiro, o Messias enviado do céu foi escarnecido como o galileu, as suas palavras de caridade foram tachadas como obra do inferno. Quando disse que tinha vindo para fundar um reino que não era deste mundo, foi denunciado como sedutor do povo e inimigo de César. Assim, meus irmãos, a falsidade lutou contra a verdade, e parecia que os seus inimigos estavam realmente triunfantes na vitória quando Jesus pendia sangrando na cruz. Seus inimigos pareciam seguros da vitória, quando diziam ao Salvador crucificado em escárnio: 'Se tu és o Cristo, desce da cruz. Tu ajudaste os outros, agora ajuda-te a ti mesmo', e Ele não respondeu a essas palavras, mas inclinou a cabeça e morreu. E ainda mais, Ele foi colocado numa sepultura como um mortal comum, sendo a própria sepultura guardada e selada.

Agora, de acordo com as previsões humanas, tudo estava terminado, o mundo parecia conquistado. De onde, queridos irmãos, aquele grão de mostarda que esse Deus encarnado, agora deitado no túmulo, havia plantado, teria obtido a força para crescer e se expandir numa grande árvore, cujos frutos deveriam abençoar todas as raças da Terra? De onde teriam os tímidos discípulos obtido a coragem de proclamar ao mundo que este Crucificado é o verdadeiro Deus, e de pregar o seu Evangelho a toda criatura? Não tremais, pequeno grupo de discípulos, porque o milagre já se realizou! A terra exulta de alegria, o céu envia os seus mensageiros, o túmulo está vazio, o herói despertou, o Salvador ressuscitou! Porque ressuscitou do túmulo pela sua própria força, porque reedificou o templo do seu corpo em três dias, provou a glória da sua divindade e colocou o selo da plenitude na obra da redenção. Se Cristo não tivesse ressuscitado, diz o Apóstolo, a nossa fé seria vã! Na Sexta-Feira Santa, quando a terra tremeu e as rochas se fenderam, batemos no peito como o centurião e dissemos: 'Em verdade, Ele era o Filho de Deus!', podemos, portanto, gritar ainda mais alegremente ao lado do túmulo vazio na manhã de Páscoa: 'Aquele que ressuscitou é o Filho de Deus, Ele é o Messias, Ele é o cordeiro de Deus que tira os pecados do mundo'. Não é este o dia que o Senhor fez para nós? Não deveríamos regozijar-nos nEle e alegrar-nos? Que os acordes do órgão repiquem na mais doce harmonia, que os sinos toquem em tons emocionantes, que a canção de triunfo ressoe, O Salvador ressuscitou! Aleluia, Jesus vive! Nem selo, nem sepultura, nem pedra, nem rocha, podem resistir-lhe: 'Vós procurais Jesus de Nazaré: Ele ressuscitou, não está mais aqui'.

Parte II 

1. Ouvimos dizer que temos todas as razões para nos alegrarmos do fundo do coração neste dia memorável, e para nos aproximarmos do nosso Redentor ressuscitado com alegres Aleluias. Mas isto não é tudo, devemos também ser ativos e fazer um uso prático da celebração de hoje. Cristo morreu por nós e deu-nos o exemplo para seguirmoso seu exemplo. Tal como Cristo ressuscitou, também nós nos devemos levantar e entrar numa vida nova. Convido-vos, pois, pais cristãos, com as palavras do Apóstolo: 'Levanta-te e anda no caminho em que deves andar'. Prometestes perante o santo altar de Deus fidelidade e ajuda mútuas, que carregaríeis os fardos uns dos outros em paz e que educaríeis os vossos filhos no temor do Senhor. Como cumpristes esta promessa? O trono da harmonia está erguido em vosso lar e distribui bênçãos sobre vós? Sois um bom pai e uma boa mãe para os vossos filhos, apascentais o rebanho que vos foi confiado em pastos verdejantes e o conduzis, como deve fazer um bom pastor, à fonte das águas vivas? Ou sois vós, pais, maus exemplos para os vossos filhos, e vós, mães, mães antinaturais para as vossas filhas? Levantai-vos da vossa morte espiritual, fortificai de novo o trono da paz, aproximai-vos do Altar de Deus e renovai os vossos votos conjugais. Educai os vossos filhos como devem fazer os bons pais católicos, ajudai os educadores e aqueles que têm a seu cargo o seu bem-estar espiritual nesta difícil tarefa, e então, e só então, tereis uma Páscoa feliz; então as alegrias e as bênçãos pascais alegrar-vos-ão a vós e à vossa família.

2. Filhos cristãos, filhas cristãs, levantai-vos do túmulo! Nós, adultos, que já não temos a felicidade de ver o pai e a mãe connosco, que agora só podemos ajoelhar-nos junto dos seus túmulos e falar-lhes em espírito, como vos invejamos, queridos e felizes filhos, especialmente neste dia em que é uma alegria celebrar a Páscoa no círculo familiar. E agora, pergunto-vos, amados filhos e filhas, se sabeis apreciar esta grande felicidade de possuir o vosso pai e a vossa mãe, ou se vós, ó filho frívolo, entristeceis o vosso bom pai com os vossos pecados e com a vossa extravagância; e vós, filha orgulhosa, fazeis a vossa mãe derramar lágrimas pelo vosso comportamento e pela vossa desobediência? Pois bem, levanta-te hoje do túmulo do pecado e dá aos teus bons pais uma alegria pascal, tomando a firme resolução de andar no caminho que te trará bênçãos nesta vida e na vida futura. O Salvador ressuscitado é o amigo das crianças, Ele estenderá hoje as suas mãos em bênção sobre vós, vivereis muito tempo e tudo vos correrá bem na terra.

3. Bem podemos aplicar a nós mesmos as palavras do Apóstolo: 'O homem que é da terra, é terreno'. Ora, se no passado fomos escravos da carne, se os nossos pensamentos e ações eram terrenos, esta é a Páscoa; lancemos fora o fermento velho para nos tornarmos uma massa nova. Então, as palavras do Apóstolo tornar-se-ão realidade: 'Se ressuscitastes com Cristo, procurai as coisas que são do Alto e não as que são da terra'. Mas, na realidade, para procurar e encontrar o que é do Alto, não só devemos levantar-nos do túmulo do pecado, limpar o nosso coração de todo o pecado, mas devemos purificá-lo do velho fermento. Quando Cristo se levantou da sepultura, deixou para trás os lençóis de enterro; assim devemos nós, em nossa ressurreição espiritual, deixar nas sepulturas os grilhões de nossos velhos hábitos; devemos romper com a velha vida e andar numa nova; devemos despir-nos do velho homem e revestir-nos do novo homem, que é criado em santidade e justiça. E assim deve ser contigo, ó homem sensual; deixa-me dizer também de ti: ele ressuscitou, ele também não está mais aqui, já não está lá onde tantas vezes pecou. Temos de poder dizer: 'Ressuscitou, o avarento, já não se demora com os seus tesouros, que a ferrugem e a traça hão-de corroer; já não se ajoelha no altar de Mamon; tornou-se pai dos pobres'. Ele ressuscitou, deve ser dito do bêbado, do jogador, ele não está aqui, eis que o lugar está vazio onde antigamente ele se sentava até tarde da noite jogando e bebendo, enquanto sua pobre esposa e filhos famintos sofriam em casa. E isto é o que deve e tem de ser dito de todos os pecadores: ressuscitaram, não estão mais aqui, o túmulo do pecado está vazio, estão a levar uma vida nova. Então, de fcto, todos nós passaremos uma Páscoa abençoada e feliz, um dia de alegria, um dia que o Senhor fez para nós.

Parte III - Conclusão

1. Cristo foi ressuscitado dentre os mortos para não mais morrer. Ele é exaltado acima dos principados, potestades e majestades, e está sentado à direita do Pai. Suas palavras, ditas aos discípulos de Emaús, são verdadeiras: 'Não convinha que Cristo padecesse estas coisas, e assim entrasse na sua glória?' Se, pois, caríssimos irmãos, nos sobrevierem cruzes e sofrimentos, ajoelhemo-nos também nós no horto das oliveiras; esvaziemos o cálice do sofrimento até à última gota no Gólgota, olhemos para cima com coragem e santo zelo. À Sexta-feira Santa seguiu-se uma alegre manhã de Páscoa para o Deus encarnado, e também nós gozaremos de um dia de júbilo pois, se sofrermos com Cristo, seremos também glorificados com Ele. A nossa cruz será para nós a escada de Jacó, na qual subiremos da terra para o céu, onde não haverá mais choro, nem dor, mas onde reinarão a alegria eterna, a paz eterna e o júbilo eterno.

2. O Salvador glorificado e ressuscitado traz na mão, em vez da cana, uma bandeira de vitória, na qual está escrito: 'Eu sou a ressurreição e a vida; quem crê em mim viverá, ainda que esteja morto'. Meus irmãos, que palavra consoladora! Podemos exclamar com júbilo: 'Morte, onde está o teu aguilhão?' A morte foi derrotada; agora podemos encarar a morte com confiança e dizer com santa alegria: 'Eu sei que o meu Redentor vive, e que ele me ressuscitará no último dia'. Seca as tuas lágrimas, então, pobre esposa, tu que estás chorando pela pesada perda do provedor dos teus filhos; não chores, pobre marido, pela morte prematura da tua esposa; filhos, não lamenteis a perda dos vossos pais, que vos deixaram órfãos. Meus irmãos, não choremos e lamentemos os nossos mortos queridos, como aqueles que não têm esperança. Temos uma esperança no Salvador ressuscitado, que um dia enviará os seus anjos para nos chamar dos nossos túmulos; ver-nos-emos de novo; regozijar-nos-emos e a nossa alegria ninguém a poderá nos tirar!

3. E se nos nossos dias olharmos com tristeza para o futuro, e se o inimigo pressionar duramente a nossa mãe, a Igreja, também ela - a nossa Igreja - se levantará do túmulo da opressão. Todos os séculos o testemunham; quanto mais fundo cavarem a sua sepultura, quanto mais a selarem e fecharem, mais gloriosamente ela se ergueu da sepultura e mais vitoriosamente desfraldou a sua bandeira. O seu fundador, que hoje se levantou do túmulo, disse: 'As portas do inferno nunca prevalecerão contra ela'. E este fundador proclama isso com alegria ao mundo redimido de hoje: 'Salve, Conquistador do Gólgota, Conquistador Único! Aleluia!'

Celebremos, pois, caríssimos irmãos, esta festa pascal com o coração alegre e jubiloso; junto ao túmulo vazio do Redentor, Príncipe da Paz, estendamos uns aos outros a mão do perdão. Ele nos chama de fato: 'A paz seja convosco!' Quebremos os laços do pecado, vivamos em Deus, juremos hoje de novo fidelidade à bandeira vitoriosa de Jesus Cristo, permaneçamos firmes na fé! Então, sim, então, um dia levantar-nos-emos gloriosos; seremos transformados e possuiremos o reino que nos foi preparado desde o princípio. Que Deus nos conceda esss graça! Amém.