II - PELA NEGLIGÊNCIA DOS DEVERES RELIGIOSOS
Muitos se afastam da fé porque seus pais negligenciaram dar-lhes qualquer instrução na religião. Há uma certa classe de pais que instruem seus filhos em tudo, menos na religião. Há outros pais que permitem que seus filhos cresçam na ignorância de tudo, exceto na maneira pela qual podem ganhar algum dinheiro. Ora, quando se aproxima o momento dessas crianças fazerem a primeira comunhão, os pais levam-nas ao sacerdote para as preparar para esse ato sagrado, em um prazo tão curto quanto uma ou duas semanas. Ora, o que é que as crianças podem aprender num par de semanas? É certo que o que aprendem muito raramente lhes entra no coração. Os seus corações não estão preparados para a Palavra de Deus; são levianos e, em muitos casos, corrompidos, e o que aprendem é aprendido por constrangimento. Logo que se libertam do constrangimento, atiram a sua religião porta fora: tornam-se os piores inimigos da Igreja Católica. O jovem que incendiou a igreja de Santo Agostinho, em Filadélfia, Pensilvânia, era católico e glorificava-se de poder queimar o seu nome do registo de batismo. Por um justo castigo de Deus, essas crianças católicas negligenciadas tornar-se-ão nossos perseguidores. Assim se verifica nestas crianças o que Deus diz através do profeta Isaías: 'Por isso o meu povo foi levado cativo, porque não teve conhecimento' (Is 5,13).
Há outros que não querem ser instruídos nos seus deveres religiosos, a fim de se dispensarem mais facilmente da obrigação de cumprir esses deveres. Ora, é essa mesma classe de homens que facilmente dá ouvidos aos princípios da infidelidade, porque esses princípios agradam mais à sua natureza corrupta do que os da nossa santa religião. A classe desses homens é muito numerosa e seu número está aumentando a cada dia. Pois, não tendo eles próprios nenhuma religião, nem desejando tê-la, que admira que os seus filhos sigam o seu exemplo? Tal como é a árvore, tal será também o fruto.
Há outros que se afastam gradualmente da fé e se tornam infiéis, porque negligenciam um dever cristão essencial, o da oração. 'Os ímpios' - diz Davi - 'corrompem-se e tornam-se abomináveis nos seus caminhos... Todos eles se desviaram, e juntamente se tornaram inúteis; não há quem faça o bem, nem um sequer... A destruição e a infelicidade estão nos seus caminhos'. ' A causa de toda esta maldade' - continua Davi - 'é que não invocaram o Senhor'. Deus é a luz do nosso entendimento, a força da nossa vontade e a vida do nosso coração. Ora, quanto mais negligenciarmos a oração a Deus, mais experimentaremos trevas em nosso entendimento, fraqueza em nossa vontade e frieza mortal em nosso coração. Nossas paixões, as tentações do demônio e as seduções do mundo nos atrairão de cabeça para baixo de um abismo de maldade para outro, até cairmos no mais profundo de todos, na infidelidade e na indiferença a toda religião.
III - PELA LEITURA DE MAUS LIVROS
Há outra causa especial para a perda da fé: é a leitura de maus livros. Os maus livros são (i) livros fúteis que não fazem bem, mas distraem a mente do que é bom; (ii) novelas e romances que não parecem ser tão maus, mas são muito maus na verdade; (iii) livros que tratam declaradamente de assuntos maus; (iv) maus jornais, periódicos, miscelâneas, revistas sensacionalistas, semanários [atualmente, com desgraça ainda maior, internet, redes sociais e programas de televisão]; (v) livros sobre bruxarias e superstições, adivinhações; (vi) literatura protestante e de outras falsas religiões.
Há certos livros fúteis que, embora não sejam maus em si mesmos, são perniciosos, porque fazem o leitor perder o tempo que poderia e deveria empregar em ocupações mais benéficas para a sua alma. Aquele que gastou muito tempo na leitura de tais livros e depois vai à oração, à missa e à santa comunhão, em vez de pensar em Deus e de fazer atos de amor e confiança, será constantemente perturbado por distrações; porque as representações de todas as vaidades que leu estarão constantemente presentes na sua mente. O moinho mói o milho que recebe. Se o trigo é mau, como pode o moinho produzir boa farinha? Como é possível pensar em Deus com frequência e oferecer-lhe atos frequentes de amor, de oblação, de súplica e outros semelhantes, se a mente está constantemente cheia do lixo lido em livros ociosos e inúteis?
... Quanto aos romances, são, em geral, quadros, e normalmente quadros muito bem elaborados das paixões humanas. A paixão é representada como tendo sucesso no seu fim e atingindo os seus objetivos, mesmo com o sacrifício do dever. Esses livros, como uma classe, apresentam visões falsas da vida; e como é o erro dos jovens confundi-las com realidades, eles se tornam os enganos de suas próprias imaginações ardentes e entusiastas, que, em vez de tentar controlar, eles realmente nutrem com o alimento venenoso de fantasias e quimeras... Quanto mais fortemente as obras de ficção apelam à imaginação, e quanto mais amplo é o campo que proporcionam para o seu exercício, maiores são, em geral, as suas perigosas atrações; e é demasiado verdade que elas lançam, por fim, uma espécie de feitiço sobre a mente, fascinando tão completamente a atenção, que o dever é esquecido e a obrigação positiva posta de lado para gratificar o desejo de desvendar, até à sua última complexidade, a teia finamente tecida de alguma criação aérea da fantasia. Sentimentos fictícios são excitados, simpatias irreais são despertadas, sensibilidades sem sentido são evocadas. A mente está enfraquecida; perdeu aquela louvável sede de verdade que Deus imprimiu nela; cheia de um amor banal por ninharias, vaidades e tolices, não tem gosto por leituras sérias e ocupações proveitosas; todo o gosto pela oração, pela Palavra de Deus, pela receção dos sacramentos, está perdido; e, finalmente, a consciência e o bom senso dão lugar ao domínio da imaginação descontrolada.
Tal leitura, em vez de formar o coração, degrada-o. Envenena a moral e excita o espírito. Envenena a moral e excita as paixões; muda todas as boas inclinações que uma pessoa recebeu da natureza e de uma educação virtuosa; arrefece, pouco a pouco, os desejos piedosos, e em pouco tempo expulsa da alma tudo o que havia de solidez e virtude. Por essa leitura, as jovens perdem de repente o hábito da reserva e da modéstia, tomam um ar de vaidade e frivolidade, e não demonstram outro ardor senão por aquelas coisas que o mundo estima, e que Deus abomina. Adotam as máximas, o espírito, a conduta e a linguagem das paixões, que estão ali sob vários disfarces artisticamente incutidos nas suas mentes e, o que é mais perigoso, cobrem toda esta irregularidade com as aparências de civilidade e um humor e disposição fáceis, complacentes e alegres.
Além de seus outros perigos, muitos desses livros infelizmente estão repletos de máximas subversivas da fé nas verdades da religião. A literatura popular atual, em nossos dias, está penetrada pelo espírito da licenciosidade, desde revistas periódicas até o arrogante e irreverente jornal diário; e as publicações semanais e mensais são, em sua maioria, pagãs ou anti-católicas. Expressam e inculcam, por um lado, o orgulho estoico, frio e polido do mero intelecto, ou, por outro, o sentimentalismo vazio e miserável. Alguns empregam a habilidade para caricaturar as instituições e ofícios da religião cristã, e outros, para exibir as formas mais grosseiras de vício e as cenas mais angustiantes de crime e sofrimento. A imprensa ilustrada tornou-se para nós o que o anfiteatro era para os romanos, quando homens eram mortos, mulheres eram ultrajadas e cristãos eram entregues aos leões, para agradar a uma população degenerada: 'O lodo da serpente está sobre tudo isso'.
... Consultar esses livros para obter um conhecimento do mundo é outra desculpa comum para a sua leitura. Bem, onde encontraremos um exemplo de alguém que se tornou um pensador mais profundo, um orador mais eloquente, um homem de negócios mais experiente, lendo maus romances e livros ruins? Eles apenas ensinam a pecar, como Satanás ensinou Adão e Eva a comerem da árvore proibida, sob o pretexto de obterem conhecimento real; e o resultado foi a perda da inocência, da paz e do paraíso, e o castigo da raça humana para sempre...Há uma classe de leitores que se lisonjeia com o fato de que os maus livros poderem magoar os outros, mas não a eles; não lhes causam qualquer impressão. Felizes e superiores mortais! São dotados de corações de pedra ou de carne e osso? Não têm paixões? Porque é que esses livros magoam os outros e não a eles? Será porque são mais virtuosos do que os outros? Não é verdade que as partes más e obscenas da história permanecem mais vivas e profundamente impressas nas suas mentes do que aquelas que são mais ou menos inofensivas? ...Ide aos hospitais e aos bordéis: perguntai ao jovem que está a morrer de uma doença vergonhosa; perguntai à jovem que perdeu a sua honra e a sua felicidade; ide ao túmulo escuro do suicida, perguntai-lhes qual foi o primeiro passo da sua carreira descendente, e eles responderão: a leitura de maus livros.
... Certamente, se somos obrigados por todos os princípios da nossa religião a evitar as más companhias, somos igualmente obrigados a evitar os maus livros; porque, de todas as más companhias corruptoras, a pior é um mau livro. Não há dúvida de que as influências mais perniciosas em ação no mundo, neste momento, provêm dos maus livros e dos maus jornais... Evita não só os livros e jornais notoriamente imorais, mas evita também todas essas miseráveis revistas sensacionalistas, romances e jornais ilustrados que estão profusamente espalhados por todo o lado. A procura que existe de tal lixo diz mal do sentido moral e da formação intelectual de quem os lê. Se quiserdes conservar a vossa mente pura e a vossa alma na graça de Deus, deveis fazer disso um princípio firme e constante de conduta para nunca mais abandonar. Estaríeis dispostos a pagar a um homem por envenenar a vossa comida? E por que deveríeis ser suficientemente tolos para pagar aos autores e editores de maus livros, panfletos e revistas, e aos editores de jornais irreligiosos, para envenenarem a vossa alma com os seus princípios ímpios e as suas histórias e imagens vergonhosas?
(Excertos da obra 'Apostles' Creed', do Pe. Muller, 1889, tradução do autor do blog)