Durante as duras provações a que ficou submetida para conquistar o vosso amor e durante as vossas longas ausências, ó meu Jesus, a alma interior não ficou paralisada. Por meio de obras e, sobretudo pelos seus pensamentos, forjou fabricar um mel de muita doçura e de odor delicioso, que agora ela vos oferece. E que Vós aceitais. Parece à alma que ela se fez alimento para ser absorvido por Deus, sem perder, entretanto, a sua real integridade. É como um alimento misterioso, integral em obras e substância, transformado em alimento digno de Deus, ainda que não acrescente nada à essência divina. A mudança é uma absoluta conversão no próprio Deus: sed tu muraberis in me (Santo Agostinho). A rigor, a alma se mantém substancialmente no que é e, no entanto, não é mais a mesma. Vê, pensa, age e ama como Deus, com Deus e em Deus. Sem transubstanciação, mas sob uma transformação integral. Feliz e ditosa transformação!
Durante muito tempo Deus foi o sustento da alma interior e, pouco a pouco, Ele a transformou em uma imagem de si mesmo. Até o momento em que, transformada integralmente segundo a sua Vontade, Ele toma para si essa alma divinizada, como seu próprio alimento. Antes, era a alma que se sentia fortalecida internamente por um alimento que era, ao mesmo tempo, doce e misterioso. Emanava dela uma grande felicidade, uma felicidade íntima e particular, a sua felicidade plena. Sentia possuir os limites da felicidade possível neste mundo. E agora percebe que mesmo isso era nada. Uma alegria completamente nova acalenta agora o seu coração, uma vez transformada em alimento digno de Deus. Uma felicidade que não tem medidas, pois absorvida e inebriada pelo próprio Deus.
É certo que a alma interior não ignora que nada pode acrescentar à felicidade que possui em Deus. No entanto, tudo se passa como se, nestes ditosos momentos, a alma fizesse a própria felicidade de Deus. A alma experimenta não apenas a sua alegria interior, mas também a de ser causa da alegria divina. Nenhuma comparação pode fazer entender o que significa tal felicidade. Seria necessário extrapolar e sublimar ao infinito a felicidade da mãe mais abnegada que alimenta o seu filho com o melhor de si e sustenta toda a sua felicidade em fazer feliz aquela criança tão amada que aperta fortemente ao coração. Seria preciso se elevar até Maria, Virgem e Mãe. E a alegria da alma interior não dilui, não se desvanece nunca. Quanto mais se dá a Deus, mais, muito mais, recebe de Deus, fonte infinita de amor. Recebe e se sacia deste amor, que inunda o seu coração, e que a faz estremecer de alegria.
(Excertos da obra 'A Vida Oculta em Deus', de Robert de Langeac; Parte III - A União com Deus; tradução do autor do blog)