V. A paciência na adversidade, como Jó e como Tobias
(São Bernardo*)
* (Obras Completas de San Bernardo, BAC Editorial, 1993)
'Mais vale a paciência que o heroísmo, mais vale quem domina o coração do que aquele que conquista uma cidade' (Pv 16,32)
Deus nos livra das aflições e adversidades deste mundo de quatro maneiras:
Em primeiro lugar, Deus livra o homem das aflições, afastando-as dele; o que faz raramente. Neste mundo, os santos são afligidos. 'Todos os que quiserem viver piamente em Cristo Jesus, padecerão perseguição', diz São Paulo. (2 Tm 3, 12). No entanto, às vezes, Deus concede a alguns não serem afligidos. Quando Deus sabe que uma pessoa não suporta a prova, age como um médico que evita dar remédios violentos a um doente muito mal. 'Eis' - diz o Senhor - 'que pus diante de ti uma porta aberta que ninguém pode fechar' (Ap 3,8). Na pátria celeste é lei geral que ninguém seja afligido. Está no Apocalipse: 'Já não terão fome nem sede, nem cairá sobre eles o sol nem calor algum. Porque o Cordeiro, que está no meio do trono, os guardará e os levará às fontes das águas da vida, e Deus enxugará toda lágrima dos seus olhos (Ap 7, 16-17).
Em segundo lugar, Deus nos livra do mal, enviando-nos consolações no tempo das aflições. Sem as consolações divinas, o homem não pode subsistir no meio das provações. Diz São Paulo: 'Fomos mal tratados desmedidamente, além de nossas forças' (2 Cor 1, 8) e acrescenta: 'Deus porém que consola os humildes, consolou-nos' (2 Cor 7, 6). E canta o salmista: 'Segundo as muitas dores que provou meu coração, as tuas consolações alegraram a minha alma' (Sl 93, 19).
Em terceiro lugar, Deus cumula os aflitos de tantos benefícios, que chegam a esquecer os seus males. 'Depois da tempestade vem a bonança' - dizia Tobias (Tb 3, 32). Assim não devemos temer as aflições e tribulações do mundo, que são facilmente suportadas por causa das consolações que Deus mistura a elas e também por causa de sua pouca duração. Diz São Paulo: 'A ligeira tribulação do momento presente prepara para nós um peso eterno de glória, além de toda medida. Pois é a tribulação que nos faz alcançar a vida eterna' (2 Cor 4, 17). Em quarto lugar e para estender a ideia do mal a todos os males, Deus tira o bem de todos os males, tentações e tribulações. Jesus não nos faz dizer: livrai-nos da tribulação, mas: livrai-nos do risco do mal que essas tribulações trazem.
Com efeito, as tribulações são dadas aos santos, para o seu bem, para que mereçam a coroa da glória. Por isso, ao invés de pedir para serem liberados das tribulações, os santos fazem suas as palavras do Apóstolo: 'Não só nos gloriamos na esperança e na glória de Deus, mas também nos gloriamos nas tribulações, sabendo que as tribulações produzem a paciência' (Rm 5, 3). E repetem a oração de Tobias: 'Bendito seja o teu nome, ó Deus de nossos pais, que no tempo da aflição, perdoas os pecados aos que te invocam' (Tb 3, 13).
Assim Deus livra o homem do mal e da tribulação, transformando o mal em bem, o que é o sinal da maior sabedoria, pois, com efeito, pertence ao sábio ordenar o mal ao bem. Deus atinge este objetivo, dando ao homem paciência nas tribulações. As outras virtudes se servem dos bens, mas a paciência é a única que tira proveito dos males. São eles que a fazem necessária e é por isso que sua necessidade só aparece no meio dos males, isto é, nas adversidades.
(Sermões de São Tomás de Aquino - A Oração Dominical)