domingo, 12 de maio de 2013

TESTEMUNHAS DA ESPERANÇA


SOLENIDADE DA ASCENSÃO DO SENHOR

Antes de subir aos Céus, Jesus manifesta a seus discípulos (de ontem e de sempre) as bases do verdadeiro apostolado cristão, a ser levado a todos os povos e nações: 'e no seu nome (de Jesus) serão anunciados a conversão e o perdão dos pecados a todas as nações, começando por Jerusalém' (Lc 24, 47). Ratificando as mensagens proféticas do Antigo Testamento, Nosso Senhor imprime diretamente no coração humano os sinais da fé sobrenatural e da esperança definitiva na Boa Nova do Evangelho, que nasce, se transcende e se propaga com a Igreja de Cristo na terra.

Antes de subir aos Céus, Jesus nos fez testemunhas da esperança: 'Vós sereis testemunhas de tudo isso' (Lc 24, 48). Pela ação de Pentecostes, pela efusão do Espírito Santo, pela manifestação da 'Força do Alto', os apóstolos tornar-se-iam instrumentos da graça e da conversão de muitos povos e nações. Na mesma certeza, somos continuadores dessa aliança de Deus com os homens, na missão de semear a Boa Nova do Evangelho nos terrenos áridos da humanidade pecadora para depois colher, a cem por um, os frutos da redenção nos campos eternos da glória. Como missionários da graça, 'Que ele abra o vosso coração à sua luz, para que saibais qual a esperança que o seu chamamento vos dá, qual a riqueza da glória que está na vossa herança como santos' (Ef 1, 18).

E Jesus se eleva diante dos seus discípulos e sobe para os Céus. Jesus vai primeiro porque é o Caminho e para preparar para cada um de nós 'as muitas moradas da casa do Pai', levando consigo a nossa humanidade, tornando-nos participantes do seu mistério pascal e herdeiros de sua glória. Na solenidade da Ascensão do Senhor, a Igreja comemora a glorificação final de Jesus Cristo na terra, como o Filho de Deus Vivo e, ao mesmo tempo, imprime na nossa alma o legado cristão que nos tornou, neste dia, testemunhas da esperança eterna em Cristo e herdeiros dos Céus.

96 ANOS DAS MENSAGENS DE FÁTIMA (IV)

O TRIUNFO DO IMACULADO CORAÇÃO DE MARIA

A mensagem de Fátima possui atributos condicionais e incondicionais. Assim, ao discorrer sobre o advento de castigos para a humanidade pecadora, Nossa Senhora prescreve claramente que tais acontecimentos eram passíveis de ocorrer ou não, dependendo da resposta dos homens aos apelos de emenda e conversão, renúncia ao pecado e vida na graça de Deus. 

É importante compreender que Deus, independentemente de todos os seus atributos infinitos, não tem um única estratégia de atuação sobre a raça humana, pronta e fechada desde séculos imemoriais. Deus atua essencialmente em sintonia com o homem criado à sua imagem e semelhança e, assim, a sua intervenção na história humana traduz, em maior ou menor escala, a resposta concreta ou não de cada um nós, e da Igreja em particular, ao plano de salvação delineado para toda a humanidade. Deus guia a humanidade de acordo com o livre arbítrio de todos os homens e, por conseqüência, os planos de Deus são muitos e insondáveis ao homem. 

Como os pedidos de Nossa Senhora não foram atendidos, os castigos anunciados deverão ocorrer inexoravelmente: 'a Rússia espalhará seus erros pelo mundo... guerras e perseguições... o Papa terá muito que sofrer, várias nações serão aniquiladas... a apostasia universal, a crise da Igreja, etc', eventos de longa duração e de abrangência universal. Embora estes eventos sejam hoje definitivos, nem assim são imutáveis: com certeza, a oração, a conversão e a devoção aos Imaculados corações de Jesus e de Maria por um número cada vez maior de homens e mulheres tem propiciado a mitigação e, principalmente, a abreviação de muitos destes castigos e, de uma forma mais geral, a própria abreviação deste período tenebroso da história humana. 

A mensagem decisiva – a definitiva e primordial mensagem de Fátima – é, entretanto, celestialmente incondicional: 'Por fim o meu Imaculado Coração triunfará!'. É uma afirmação categórica, apaziguadora, essencial, conclusiva e extraordinariamente definitiva: 'Por fim o meu Imaculado Coração triunfará!'. Não existe aqui nenhuma margem para dúvidas, vacilações ou contestações, não se antepõe condição alguma e nem nenhum pré-requisito para a vitória final sobre a ação do demônio e sobre o pecado: 'Por fim o meu Imaculado Coração triunfará!'. Esta é a mensagem de Fátima, escrita para você e para mim, homens deste século XX e na aurora do terceiro milênio: 'Por fim o meu Imaculado Coração triunfará!'

O triunfo do Coração Imaculado de Maria é o triunfo de Deus no mundo sob a forma de uma nova Terra, renovada e transformada como a água em vinho nas bodas de Caná, na abundância dos dons do Espírito Santo e com almas escolhidas que amarão e glorificarão Jesus Cristo com o coração de Maria. Neste tempo inserido nas mensagens de Fátima e, portanto, tão próximo de nós, estaremos vivendo o Reino de Maria, previsto por São Luís Maria Grignion de Montfort (1673 – 1716) duzentos anos antes de Nossa Senhora ratificar definitivamente em Fátima o triunfo do seu Imaculado Coração no mundo: 'Por fim o meu Imaculado Coração triunfará!'. Que seja assim: Ut adveniat regnum tuum, adveniat regnum Mariae -Que venha o Reino de Maria, para que assim venha o Reino de Jesus!

(Da publicação '8 Questões sobre as Aparições de Nossa Senhora em Fátima, do autor do blog).


sábado, 11 de maio de 2013

96 ANOS DAS MENSAGENS DE FÁTIMA (III)

A MISSÃO DO ANJO DE PORTUGAL E A MENSAGEM ESQUECIDA DE FÁTIMA

Um anjo é um mensageiro de Deus destinado a realizar, em Seu nome, uma missão particular, sendo inúmeras as intervenções das entidades angélicas nos acontecimentos da história humana. Sabemos, do livro de Daniel, que eles são muitos ('mil milhares O serviam e miríades e miríades O assistiam') e que as Sagradas Escrituras incluem nas hostes celestiais, além dos anjos, também os arcanjos, os principados, as potestades, as virtudes, as dominações, os tronos, os querubins e os serafins. Entretanto, destas miríades de anjos, só nos foram dados a conhecer os nomes de três anjos: Gabriel, Miguel e Rafael. Que os anjos intercedem pelos homens, é matéria de fé e que cada um de nós tem um anjo da guarda pessoal, embora não seja matéria de fé, é crença comumente aceita por todos os católicos. As aparições de Fátima confirmam que não somente pessoas, mas grupos específicos de pessoas (no caso, países) têm a proteção específica de uma entidade angélica. 

A missão específica do Anjo de Portugal, nas suas três aparições entre 1915 e 1916, foi a de preparar as crianças para as futuras aparições e revelações de Nossa Senhora: '... Orai! Orai muito! Os corações de Jesus e de Maria têm sobre vós desígnios de misericórdia...' No papel do precursor das extraordinárias revelações e mensagens proféticas que Nossa Senhora daria à humanidade do século XX através dos três pastorinhos de Fátima, as aparições iniciais do anjo propiciaram às crianças a experiência prévia de contato com o sobrenatural, a vivência de uma atmosfera sobrenatural, o êxtase da presença intensa e íntima com Deus, o conhecimento do valor meritório das orações, sacrifícios e penitências, a sensação de uma profunda paz interior e uma crescente mobilização interior no sentido de uma reorientação completa da vida espiritual. 

Assim também, nestes tempos dolorosos, os anjos estão destinados a cumprir missões muito especiais. Em várias manifestações recentes, Nossa Senhora faz menção a um gigantesco combate entre as forças do bem e do mal que se trava no domínio espiritual, envolvendo os anjos e os demônios e a humanidade inteira (esta batalha espiritual é exposta como evento apocalíptico em Apoc 12); é uma luta tremenda e incessante entre os espíritos fiéis ao Criador e os sequazes de satanás, desencadeada pelo orgulho e soberba de Lúcifer em ser maior do que Deus. Expulsos do paraíso e precipitados no inferno, os demônios atuam sobre a humanidade, buscando prostrá-la sob o jugo do ódio, da violência, das guerras, do egoísmo, do prazer, da soberba e da apostasia. 

Estas mensagens confirmam a revelação do século de provações contida na visão do Papa Leão XIII (1878-1903), ou seja, de que satanás teria sido liberado do inferno para submeter a Igreja à prova, com o intuito de destruí-la completamente e perverter toda a humanidade. Em se aproximando o fim deste período sem conseguir seu intento, satanás estremece de fúria contra Deus e os homens e intensifica ao extremo todas as suas iniquidades. A completa libertação de todo mal e pecado implica o triunfo do Imaculado Coração de Maria e a sua vitória final sobre satanás e seus sequazes, através dos eventos inseridos no âmbito do primeiro combate escatológico (Apoc 19, 19-21). Aos anjos do Senhor está destinada a missão de anunciar a todos os justos os tempos da libertação e do fim de todas as iniquidades impostas à humanidade ao longo de um século de provações.

Além da afirmação do triunfo do Coração Imaculado de Maria e do impacto relativo ao Segredo de Fátima, muitos outros aspectos da mensagem assumiram importância capital no contexto das revelações. A consagração aos Primeiros Cinco Sábados, as orações ensinadas por Nossa Senhora às crianças, o milagre do sol e as aparições do Anjo de Portugal constituem exemplos marcantes destes fatos, tendo sido descritos e abordados em detalhe nos livros e documentos sobre as aparições de Fátima.

Um aspecto, porém, exatamente por não se enquadrar no espírito das revelações, não tem sido analisado com igual rigor, mas, embora secundário, deveria merecer muita atenção e reflexão por parte de todos os homens. É o que poderíamos chamar de “mensagem esquecida de Fátima”. Este fato ocorreu já na primeira aparição e a sua revelação deveu-se a uma resposta de Nossa Senhora a uma pergunta de Lúcia. Recapitulemos o diálogo entre a Mãe de Deus e a pastorinha de Fátima:

'A Maria das Neves já está no céu?
Sim, está.
E a Amélia?
Estará no Purgatório até o fim do mundo'.

Maria das Neves e Amélia eram duas amigas de Lúcia que frequentavam a sua casa “para aprender a tecer com sua irmã mais velha” e teriam falecido pouco antes das aparições (Maria das Neves faleceu em 26/02/1917 e Amélia faleceu a 28/03/1917, ambas com 20 anos de idade). A resposta de Nossa Senhora quanto ao destino eterno de Amélia é categórico: 'Estará no Purgatório até o fim do mundo'.

São palavras duras e preocupantes quando revelam a justiça de Deus aplicada a uma jovem portuguesa que vivera apenas 20 anos, no início do século XX, em um lugar isolado e deserto, perdido nos contrafortes da Serra do Aire, então distante cerca de 150 km do norte de Lisboa, onde predominam colinas pedregosas e azinheiras, descendente de um povo bom e ordeiro, católicos praticantes e devotos do terço diário. Fátima, em 1917, representava provavelmente um ambiente de extrema religiosidade e de prática corrente da moral cristã. Que pecados terríveis teriam sido cometidos por esta moça de modo a ter que pagar as penas e danos devido a eles no Purgatório até o fim do mundo?

A primeira questão que surge desta revelação deveria ser a de uma reflexão profunda sobre o pecado e a justiça divina. É evidente que morar em Fátima em 1917 não constituiu garantia de salvação a ninguém e que é possível que alguma alma tenha, inclusive, sido condenada eternamente. Mas isto é uma absoluta elucubração; o destino de Amélia, ao contrário, é fato, é uma revelação direta de Nossa Senhora aos homens. Qual seria a nossa reflexão sobre a justiça divina transferindo a realidade do destino eterno de Amélia à realidade dos homens e mulheres, jovens e crianças das nossas grandes e pequenas cidades, às Amélias (almas) do nosso tempo? Não deveríamos nós reavaliarmos profundamente os conceitos de misericórdia e justiça de Deus e começarmos a praticar, na vida diária de cada um, o preceito lógico de São Domingos Sávio: 'antes morrer do que pecar?'.

Uma segunda questão que se apresenta refere-se ao próprio destino final de Amélia. A alma no Purgatório nada pode fazer para diminuir ou abreviar os seus sofrimentos, mas as orações daqueles que ainda vivemos na terra podem intervir profundamente nesta condição, por graça e obra da misericórdia divina. Esta interação de bens espirituais dos filhos de Deus constitui a comunhão dos santos e o tesouro da Igreja, obtido através dos méritos infinitamente satisfatórios da redenção de Cristo. Assim, pois, deve-se entender que Amélia estará no Purgatório até o fim do mundo se não houver quem reze por ela ou mande celebrar missas em sua intenção. E novamente, a mensagem de Fátima mostra a sua unidade perfeita ao relacionar o exemplo de Amélia com o apelo fervoroso de Nossa Senhora: 'Rezai, rezai muito e fazei sacrifícios pelos pecadores, que vão muitas almas para o Inferno por não haver quem se sacrifique e peça por elas'. 

Reconheçamos definitivamente o valor imponderável das orações, penitências e sofrimentos no plano salvífico de Deus. Todas as grandes obras de Deus, e em particular àquelas relacionadas à conversão e salvação das almas, são feitas com a dor e o sacrifício de algumas almas privilegiadas. Em Fátima, estas foram as missões específicas desempenhadas por Jacinta e Francisco Marto – as duas crianças morreram em circunstâncias extremamente sofridas e dolorosas - almas escolhidas por Deus como vítimas da expiação e reparação dos pecados de Amélia e de todos nós.

(Da publicação '8 Questões sobre as Aparições de Nossa Senhora em Fátima, do autor do blog).

QUANDO O INFERNO É AQUI...

24 de abril. Periferia da cidade de Daca, em Bangladesh. O trágico desabamento de um edifício de nove andares, o Rana Plaza, que abrigava lojas, bancos e cinco fábricas têxteis, resultou até agora em 1089 mortos, ainda sendo removidos os escombros dos andares inferiores. Das ruínas remanescentes, eleva-se um fedor de corpos em decomposição. Uma mistura de ganância, má construção, falta de segurança, miséria espiritual e descaso humano, registrado na trágica fotografia do último anelo de humanidade.


sexta-feira, 10 de maio de 2013

ORAÇÃO: SALVE RAINHA

SALVE REGINA  (SALVE RAINHA)

Um monge chamado Herman Contractus é geralmente considerado o autor dessa que é a mais popular das orações marianas, que a teria escrito por volta do ano 1.050, no mosteiro de Reichenan (Alemanha). Presume-se que o texto original não incluía a frase final 'O clemens, O pia, O dulcis Virgo María', que teria sido adicionada por São Bernardo (1091-1153). O que se sabe com certeza é que a oração completa já era cantada pelos monges beneditinos de Cluny em 1135. O complemento das duas frases finais não fazem parte da oração propriamente dita. Uma indulgência parcial é concedida a todos os fiéis que recitarem devotamente esta oração. 



Salve, Regina, Mater misericordiae, Salve, Rainha, Mãe de misericórdia,  vita, dulcedo, et spes nostra, salve. vida, doçura e esperança nossa, salve!  Ad te clamamus exsules filii Hevae. A vós bradamos, os degredados filhos de Eva;  Ad te suspiramus gementes et flentes a vós suspiramos, gemendo e chorando  in hac lacrimarum valle. neste vale de lágrimas.  Eia ergo, advocata nostra, Eia, pois advogada nossa, illos tuos misericordes oculos ad nos converte. esses vossos olhos misericordiosos a nós volvei; Et Jesum benedictum fructum ventris tui, nobis post hoc exsilium ostende. e depois deste desterro nos mostrai Jesus, bendito fruto do vosso ventre, O clemens, O pia, O dulcis Virgo Maria.  ó clemente, ó piedosa, ó doce sempre Virgem Maria.
Ora pro nobis, sancta Dei Genetrix. Rogai por nós, santa Mãe de Deus, Ut digni efficiamur promissionibus Christi. Para que sejamos dignos das promessas de Cristo.

O LIBERALISMO E AS APARIÇÕES DE FÁTIMA

O texto abaixo é uma compilação quase integral dos capítulos II e XV da obra 'Fátima e a Redenção de Portugal', de J.M. Félix (1939) que mostra, de maneira inequívoca, que as aparições de 1917 de Nossa Senhora em Fátima constituiu a resposta divina definitiva à difusão generalizada e desenfreada dos erros heréticos do liberalismo sobre toda a humanidade. 

Capítulo II - Causas do Liberalismo

Foram muitas as circunstâncias e causas que contribuíram para o aparecimento das tendências liberais desde os fins da Idade Média. Recordemos as principais. Os excessos do feudalismo provocaram reações violentas da parte das populações tiranicamente vexadas e oprimidas. Os monarcas desse tempo, vendo na decadência do feudalismo uma condição indispensável para o revigoramento do seu poder, não hesitaram em secundar as insurreições populares contra as prepotências dos senhores feudais. A própria Igreja Católica, sempre disposta a combater as injustiças e a defender os fracos e os oprimidos, colocou-se à frente deste movimento destinado a melhorar as condições materiais, intelectuais e morais daqueles que então viviam na 'miséria imerecida'. A melhoria da situação das classes populares originou o desenvolvimento das comunas, dos municípios e das cidades burguesas.

Claro está que era justo esse movimento renovador das instituições medievais. Mas começava já a preparar-se o ambiente em que havia de intensificar-se a sede de liberdade e as tendências individualistas. Ainda em pleno século XIII aparece a Magna Carta das liberdades inglesas, e pouco depois, o Parlamento, que estava destinado a desempenhar um papel importante na marcha do liberalismo e na história da Inglaterra e das outras nações que importariam mais tarde essa instituição tão querida dos apaixonados da democracia e da liberdade.

Desde os fins do século XIII e princípios do seguinte, começa a diminuir o prestígio e a influência da Igreja. Contribuíram para isso as lutas de Bonifácio VIII com o ambicioso e avarento Felipe IV, o Belo, que, servindo-se audaciosamente da mentira, do insulto e da violência, ofendeu gravissimamente a dignidade e os direitos do Sumo Pontífice. A esses fatos lamentáveis sucederam outros acontecimentos de piores consequências para o prestígio da Santa Sé, isto é, a residência dos papas em Avignon e o Cisma do Ocidente.

A residência dos papas em Avignon, deixando o Chefe da Igreja na dependência, pelo menos aparente, do rei da França, foi ocasião de começarem a desconfiar do Sumo Pontífice os outros monarcas da cristandade. Daí nasceram os graves conflitos entre a Santa Sé e os imperadores da Alemanha, que tiveram o seu período mais agudo no reinado de Luiz da Baviera, o qual chegou a invadir a Itália, entrar em Roma e a criar um anti-papa.

O Cisma do Ocidente, que durou 39 anos, teve o triste condão de dividir a cristandade e de afrouxar consideravelmente os vínculos da obediência, do respeito e do amor à Santa Sé... As rebeliões do poder civil contra a Santa Sé eram até então fatos mais ou menos espaçados... A partir do século XIV tornam-se uma rebelião sistemática, uma epidemia permanente e universal, devido ao aparecimento de doutrinas avariadas que libertavam os príncipes da sujeição à Santa Sé e lhes atribuíam poderes maiores aos do Pontífice Romano e conferiam o direito absoluto de regularem a própria vida interna da Igreja.

... o primeiro célebre doutrinador do sistema regalista foi Marsílio de Pádua que, na luta entre o Papa e Luiz da Baviera, atacou com violência os direitos da Igreja e do Sumo Pontífice e defendeu as orgulhosas pretensões do imperador alemão. As suas péssimas teorias...tornaram-se a medula dos sistemas semelhantes que foram aparecendo, depois, com diferentes denominações: regalismo, galicanismo,  jansenismo, febronianismo, josefinismo e, finalmente, o liberalismo contemporâneo.


Para preparar o terreno e abrir o caminho ao movimento liberal concorreu também não pouco a decadência da Escolástica, iniciada no entardecer do século XIII, em consequência de circunstâncias de vária ordem ... Com a multiplicação das universidades... começam as rivalidades entre as diversas escolas filosóficas: surge o Escotismo com a sua crítica cerrada aos argumentos do Tomismo; ressurge o Nominalismo que subverte alguns fundamentos da filosofia tradicional; consomem-se as energias e perde-se muito tempo com subtilezas  dialéticas e questões de importância secundária; e, assim, vai caindo no esquecimento a doutrina fundamental dos grandes mestres... Aparecem novas tendências científicas a que a escolástica decadente não consegue opor resistência eficaz... progridem bastante as ciências naturais e fazem-se notáveis descobertas científicas que alvoroçam os espíritos e imprimem nova direção à vida da humanidade...


O relativo bem-estar do período áureo da Idade Média e os diversos acontecimentos que acabamos de referir-nos originaram uma geral e acentuada decadência dos costumes, que se agravou consideravelmente com os triunfos do Humanismo iniciado na Itália no século XIV, intensificado com a queda do império bizantino e espalhado rapidamente para todas as nações da Europa. O movimento humanista, considerado em si mesmo, nada tinha de condenável. Como sempre, a Igreja Católica colaborou eficazmente nesse movimento literário e científico. Mas a paixão com que os estudiosos começaram a cultivar as belezas artísticas e a forma literária da antiguidade clássica foi ocasião de reviverem também as antigas ideias e os velhos sistemas do mundo pagão.


Surgiu, assim, dentro em pouco, ao lado da renascença cristã, uma verdadeira renascença pagã ... Em resumo: 'A partir do século XIV, os princípios basilares em que apoiara a Idade Média começam a apresentar uma decadência manifesta: - enfraquece o vigor social da cristandade, pela debilitação da autoridade pontifícia; perde-se a noção da disciplina, pela força dissolvente do cisma ocidental; diminui a influência civilizadora da Igreja, pela negligência do clero; acentua-se o desmoronamento da filosofia escolástica, pela multiciplidade das universidades, onde passam a ensinar professores sem a competência dos do século XIII; impõe-se o domínio das forças políticas, pelo triunfo do Absolutismo; modificam-se as forças da atividade econômica, social e mental, pelo conhecimento da bússola, da pólvora e da imprensa.


É então que, no meio dessa efervescência extraordinária, começa a se esboçar uma vigorosa corrente de opinião que, tentando modificar as concepções artísticas, literárias e científicas e as bases constitutivas da sociedade, pelo abandono das fontes espirituais e cavalheirescas da Idade Média, procura, na antiguidade greco-romana, os princípios orientadores do pensamento e da vida. 'Faz-se o estudo da antiguidade pagã na sua arte e na sua literatura; imitam-se os modelos clássicos, fonte de toda a inspiração; espalha-se a afirmação de que o conhecimento das letras antigas fará a humanidade mais civilizada, mais ditosa e mais feliz; exalta-se o domínio exclusivo da razão. Estavam lançadas as bases de um movimento que em breve se espalha por toda a Europa com o nome de Renascimento. Às tradições nacionais da Idade Média, substitui-se o gosto apaixonado pela antiguidade; a alma pagã, desordenada e insubmissa, procura vencer a noção cristã da vida; a ciência e a arte tentam emancipar-se da autoridade da Igreja; e o engenho humano, conduzido pelo espírito clássico, desperta para novas concepções intelectuais, artísticas e científicas.' (A. G. Matoso, 'Compêndio de História Medieval, Moderna e Contemporânea, Lisboa, 1933). 


Capítulo XV - Esplendores de Fátima


O movimento liberal, que invadiu todos os campos da vida humana, no indivíduo e na família, nos confins de cada pátria e no mundo internacional, foi uma expansão lenta, mas persistente, do orgulho da humanidade; foi um atentado estulto contra a ordem natural e sobrenatural sapientissimamente estabelecida pela Providência de Deus Criador e Senhor de todas as coisas. Quando o liberalismo atingia o auge da loucura, da violência, da anarquia e da libertinagem; quando amadureciam os frutos mais amargos do liberalismo envenenador da humanidade; quando a avalanche libertária ameaçava subverter o mundo, a sua ordem e a sua civilização - nessa hora tremenda, em que não havia esperança de humano remédio para os graves males da humanidade, desce do Céu à Terra, em plena luz do dia, em pleno mês de maio, em plena primavera, ... a Santíssima Virgem, Nossa Senhora de Fátima, Nossa Senhora de Portugal ... Tal é o sentido da providencial mensagem de Fátima, tal é a resposta da Mãe de Deus à desvairada ideologia libertária que tanto mal trouxe ao mundo.


O liberalismo tentou desligar os homens de Deus. Fátima é a Mãe de Deus a chamar os homens para a ideia de Deus, para a união com Deus, para a vida em Deus. O liberalismo desviou os homens dos caminhos de Deus, dos caminhos do Céu, da ordem natural e sobrenatural, concebida por Deus desde toda a eternidade, executada no tempo pelo Divino Criador e Governador de todas as coisas, e intimada aos homens pela voz da Razão ou da Revelação. Fátima é a Mãe de Deus a convidar os homens ao arrependimento, a lembrar-lhes a ordem providencial estabelecida por Deus, e a chamar os homens ao cumprimento das leis eternas de Deus. 


O liberalismo foi um atentado contra a Religião, uma escola de indiferentismo, de descrença, de ateísmo. Fátima é uma escola de Fé, é o despertar da vida religiosa, é a conversão de tantas almas esquecidas de Deus, é a praia misteriosa aonde arribam satisfeitos e repousam tranquilamente aqueles que naufragaram no oceano da dúvida e da descrença. O liberalismo foi, para muitos, a negação da Providência de Deus, uma revolta contra o governo de Deus no mundo. Fátima é uma extraordinária manifestação da Providência divina, uma afirmação soleníssima da intervenção de Deus nos acontecimentos da história.


O liberalismo foi a negação do Sobrenatural. Fátima é a afirmação irrefutável do Sobrenatural, é a certeza e a evidência do Sobrenatural , é 'a intimidade com o Sobrenatural'. O liberalismo foi uma ofensiva de ódio e de morte contra o Cristianismo, a Religião Cristã, a vida cristã, a civilização cristã. Fátima é o rejuvenescimento cristão, é a renovação da vida cristã, é o triunfo da civilização cristã, é uma divina apologia do Cristianismo. O liberalismo foi um grito de revolta contra a Igreja Católica, pretendeu ser a morte do Catolicismo. Fátima é o triunfo da obediência à Santa Igreja, é uma vitória da Igreja Católica, é o segredo de inúmeras vitórias do Catolicismo.


O liberalismo foi a insolência, o desrespeito, o desamor, por vezes o ódio ao Sumo Pontífice. Fátima é  a plena obediência, é a profunda veneração, é o amor, é a devoção do Vigário de Cristo na Terra. O liberalismo foi o ataque furioso contra as verdades do Cristianismo, contra o magistério infalível da Santa Igreja; foi um louco semeador de dúvidas, de incertezas, de perplexidades, de negativismos destruidores das belezas da fé católica. Fátima é uma 'aula de verdades', é uma escola de certezas, é uma resposta sem réplica a todas as dúvidas e ataques que alvejaram a Verdade Católica. O liberalismo foi a negação da realidade e até da possibilidade da Revelação Divina. Fátima é, na sua essência e no conjunto dos seus efeitos admiráveis, uma autêntica revelação do Céu.


O liberalismo combateu o milagre e até a sua possibilidade. Fátima é uma 'fonte de milagres', de milagres palpáveis, de milagres incontestáveis. O liberalismo foi um escola de sensualismo, de libertinagem, de prazer imoderado. Fátima é o convite à penitência, é uma 'escola de sacrifícios', é a glória da imolação que satisfaz pelo pecado, converte os transviados e dignifica a humanidade. O liberalismo proclamou os direitos do homem, não lembrando os seus deveres; deu vivas à liberdade, não marcando os seus limites. Deste modo, perverteu a liberdade, destruiu a base dos direitos, instaurou no mundo um regime de escravidão. Fátima, lembrando os deveres, mostra a base de todo o direito e defende a única e verdadeira liberdade possível na terra para o indivíduo e para a sociedade.


... O liberalismo esqueceu o Evangelho e pretendeu ser autor de uma fraternidade universal. Mas a 'fraternidade liberal' deu em arrogâncias egoístas, em triunfos individualistas, em ódios fratricidas, em lutas partidárias, em perseguições sectárias, em antagonismos internacionais. Fátima é a família de Deus, é a solidariedade cristã, é a verdadeira fraternidade dos irmãos em Cristo, invocando em comum o mesmo Pai e a mesma Mãe dos Céus... O liberalismo pretendeu ser considerado o portador da nova luz e do verdadeiro progresso das nações. Arvorou o pendão 'iluminista' contra o 'obscurantismo' da Igreja, a bandeira do 'Progresso' contra o Cristianismo 'retrógrado'... Fátima, ao contrário, é a irradiação intensa do esplendor do Cristianismo, é o trinfo da Doutrina Católica, foi a salvação de Portugal, foi a salvação da Espanha, pode ser,s e quiserem, a salvação de todos os povos.


O liberalismo chamou ciência a todos os erros, e tornou orgulhosa essa ciência tanta vezes balofa e falsa. Fátima proclama a verdade eterna, reconhece a verdadeira ciência, e acolhe carinhosamente os desenganados e abandonados da ciência, aos quais tantas vezes dá a cura e sempre a resignação. O liberalismo foi em muitos fiéis, em alguns sacerdotes, na escola, na família e na sociedade, a derrocada da vida cristã e do espírito católico. Fátima é a Ação Católica, é a santificação do Clero, é a restauração da família e da sociedade, é a renovação da vida cristã em Portugal e no mundo. O liberalismo é a liberdade sem peias, o desprezo de todas as leis, a renúncia aos compromissos voluntários das almas generosas. Fátima é a liberdade racional, é a submissão amorosa às leis divinas e humanas, é um campo de promessas, propósitos e generosas resoluções. 


O liberalismo é o caminho da corrupção, é a ruína da virtude, é a escola de todos os vícios. Fátima é o caminho da perfeição, é o estímulo de virtudes, é a escola dos santos. O liberalismo é o pendor para a matéria, é a queda na lama, é a morte para uma vida de ideal. Fátima é a oração sentida, é ascensão para Deus, é voo das almas nobres para as altas regiões do mais sublime ideal. O liberalismo é o mau conselheiro dos filhos de Deus, que abandonaram, como o pródigo, a casa do Pai Celeste, para irem dissipar as riquezas do seu talento, das suas qualidades naturais, dos seus dons sobrenaturais, nas longínquas regiões da dúvida, da indiferença, da incredulidade, da embriaguez do vício, da tristeza e desventura. Fátima é o céu chamando os pródigos à casa paterna, ao solar do Pai divino, a  esse ambiente encantador onde vive a dignidade humana, brilha o sol da fé, aquece o calor da caridade, seduz o ideal da santidade, reina a felicidade possível no tempo e sorri a esperança da ventura eterna. 


Numa palavra: o liberalismo é a escola de todos os erros, o campo detestável onde germinam todos os vícios e crescem as plantas daninhas cujos frutos envenenados contaminam e matam as flores das virtudes sociais e individuais. Fátima, pelo contrário, é universidade do bem, a escola da verdade, o jardim abençoado onde germinam as virtudes e crescem as plantas sublimes cujos frutos dão vida, perfeição e beleza ao indivíduo, à família e à sociedade.



(Excertos da obra 'Fátima e a Redenção de Portugal', de J.M. Félix, 1939).

quinta-feira, 9 de maio de 2013

COM NOSSA SENHORA...

Não há forma mais simples e direta de chegar ao coração de Jesus do que pelo coração de Maria. Na Ave Maria, pedimos para que Ela interceda por nós em todos os momentos de nossas vidas e, principalmente, ‘na hora da nossa morte'. Na certeza dessa hora tremenda, peçamos, então a ela, Mãe de Deus, que nos socorra particularmente neste momento e nos leve ao encontro do seu Filho:


Com Nossa Senhora ... 

Eu sei que Deus vai me chamar um dia 
que pode se perder no tempo ou ser agora 
mas, qualquer que seja esse tempo, 
quero estar pronto quando eu for embora... 
Mas, mais que tudo, ao fechar meus olhos, 
quero fechá-los com Nossa Senhora... 

Na nova Jerusalém 
Deus não será pai de ninguém 
que desde agora já não tem 
Nossa Senhora como Mãe. 

Eu sei que Deus vai me pedir contas um dia 
e eu sei como será tremenda essa hora: 
quero levar comigo só a caridade 
o mais que tiver eu vou deixar lá fora... 
Mas, mais que tudo, ao reabrir meus olhos, 
quero abri-los com Nossa Senhora... 

Na nova Jerusalém 
Deus não será pai de ninguém 
que desde agora já não tem 
Nossa Senhora como Mãe.

Eu sei que vou estar com Deus um dia 
e a ânsia de viver tal tempo me devora: 
quero brilhar por toda a eternidade 
com luz mais bela que a mais bela aurora... 
Mas, mais que tudo, no Coração de Deus, 
Terei Jesus porque terei Nossa Senhora... 

Na nova Jerusalém 
Deus não será pai de ninguém 
que desde agora já não tem 
Nossa Senhora como Mãe.

(Arcos de Pilares)