A MISSÃO DO ANJO DE PORTUGAL E A MENSAGEM ESQUECIDA DE FÁTIMA
Um anjo é um mensageiro de Deus destinado a realizar, em Seu nome, uma missão particular, sendo inúmeras as intervenções das entidades angélicas nos acontecimentos da história humana. Sabemos, do livro de Daniel, que eles são muitos ('mil milhares O serviam e miríades e miríades O assistiam') e que as Sagradas Escrituras incluem nas hostes celestiais, além dos anjos, também os arcanjos, os principados, as potestades, as virtudes, as dominações, os tronos, os querubins e os serafins. Entretanto, destas miríades de anjos, só nos foram dados a conhecer os nomes de três anjos: Gabriel, Miguel e Rafael. Que os anjos intercedem pelos homens, é matéria de fé e que cada um de nós tem um anjo da guarda pessoal, embora não seja matéria de fé, é crença comumente aceita por todos os católicos. As aparições de Fátima confirmam que não somente pessoas, mas grupos específicos de pessoas (no caso, países) têm a proteção específica de uma entidade angélica.
A missão específica do Anjo de Portugal, nas suas três aparições entre 1915 e 1916, foi a de preparar as crianças para as futuras aparições e revelações de Nossa Senhora: '... Orai! Orai muito! Os corações de Jesus e de Maria têm sobre vós desígnios de misericórdia...' No papel do precursor das extraordinárias revelações e mensagens proféticas que Nossa Senhora daria à humanidade do século XX através dos três pastorinhos de Fátima, as aparições iniciais do anjo propiciaram às crianças a experiência prévia de contato com o sobrenatural, a vivência de uma atmosfera sobrenatural, o êxtase da presença intensa e íntima com Deus, o conhecimento do valor meritório das orações, sacrifícios e penitências, a sensação de uma profunda paz interior e uma crescente mobilização interior no sentido de uma reorientação completa da vida espiritual.
Assim também, nestes tempos dolorosos, os anjos estão destinados a cumprir missões muito especiais. Em várias manifestações recentes, Nossa Senhora faz menção a um gigantesco combate entre as forças do bem e do mal que se trava no domínio espiritual, envolvendo os anjos e os demônios e a humanidade inteira (esta batalha espiritual é exposta como evento apocalíptico em Apoc 12); é uma luta tremenda e incessante entre os espíritos fiéis ao Criador e os sequazes de satanás, desencadeada pelo orgulho e soberba de Lúcifer em ser maior do que Deus. Expulsos do paraíso e precipitados no inferno, os demônios atuam sobre a humanidade, buscando prostrá-la sob o jugo do ódio, da violência, das guerras, do egoísmo, do prazer, da soberba e da apostasia.
Estas mensagens confirmam a revelação do século de provações contida na visão do Papa Leão XIII (1878-1903), ou seja, de que satanás teria sido liberado do inferno para submeter a Igreja à prova, com o intuito de destruí-la completamente e perverter toda a humanidade. Em se aproximando o fim deste período sem conseguir seu intento, satanás estremece de fúria contra Deus e os homens e intensifica ao extremo todas as suas iniquidades. A completa libertação de todo mal e pecado implica o triunfo do Imaculado Coração de Maria e a sua vitória final sobre satanás e seus sequazes, através dos eventos inseridos no âmbito do primeiro combate escatológico (Apoc 19, 19-21). Aos anjos do Senhor está destinada a missão de anunciar a todos os justos os tempos da libertação e do fim de todas as iniquidades impostas à humanidade ao longo de um século de provações.
Além da afirmação do triunfo do Coração Imaculado de Maria e do impacto relativo ao Segredo de Fátima, muitos outros aspectos da mensagem assumiram importância capital no contexto das revelações. A consagração aos Primeiros Cinco Sábados, as orações ensinadas por Nossa Senhora às crianças, o milagre do sol e as aparições do Anjo de Portugal constituem exemplos marcantes destes fatos, tendo sido descritos e abordados em detalhe nos livros e documentos sobre as aparições de Fátima.
Um aspecto, porém, exatamente por não se enquadrar no espírito das revelações, não tem sido analisado com igual rigor, mas, embora secundário, deveria merecer muita atenção e reflexão por parte de todos os homens. É o que poderíamos chamar de “mensagem esquecida de Fátima”. Este fato ocorreu já na primeira aparição e a sua revelação deveu-se a uma resposta de Nossa Senhora a uma pergunta de Lúcia. Recapitulemos o diálogo entre a Mãe de Deus e a pastorinha de Fátima:
'A Maria das Neves já está no céu?
Sim, está.
E a Amélia?
Estará no Purgatório até o fim do mundo'.
Maria das Neves e Amélia eram duas amigas de Lúcia que frequentavam a sua casa “para aprender a tecer com sua irmã mais velha” e teriam falecido pouco antes das aparições (Maria das Neves faleceu em 26/02/1917 e Amélia faleceu a 28/03/1917, ambas com 20 anos de idade). A resposta de Nossa Senhora quanto ao destino eterno de Amélia é categórico: 'Estará no Purgatório até o fim do mundo'.
São palavras duras e preocupantes quando revelam a justiça de Deus aplicada a uma jovem portuguesa que vivera apenas 20 anos, no início do século XX, em um lugar isolado e deserto, perdido nos contrafortes da Serra do Aire, então distante cerca de 150 km do norte de Lisboa, onde predominam colinas pedregosas e azinheiras, descendente de um povo bom e ordeiro, católicos praticantes e devotos do terço diário. Fátima, em 1917, representava provavelmente um ambiente de extrema religiosidade e de prática corrente da moral cristã. Que pecados terríveis teriam sido cometidos por esta moça de modo a ter que pagar as penas e danos devido a eles no Purgatório até o fim do mundo?
A primeira questão que surge desta revelação deveria ser a de uma reflexão profunda sobre o pecado e a justiça divina. É evidente que morar em Fátima em 1917 não constituiu garantia de salvação a ninguém e que é possível que alguma alma tenha, inclusive, sido condenada eternamente. Mas isto é uma absoluta elucubração; o destino de Amélia, ao contrário, é fato, é uma revelação direta de Nossa Senhora aos homens. Qual seria a nossa reflexão sobre a justiça divina transferindo a realidade do destino eterno de Amélia à realidade dos homens e mulheres, jovens e crianças das nossas grandes e pequenas cidades, às Amélias (almas) do nosso tempo? Não deveríamos nós reavaliarmos profundamente os conceitos de misericórdia e justiça de Deus e começarmos a praticar, na vida diária de cada um, o preceito lógico de São Domingos Sávio: 'antes morrer do que pecar?'.
Uma segunda questão que se apresenta refere-se ao próprio destino final de Amélia. A alma no Purgatório nada pode fazer para diminuir ou abreviar os seus sofrimentos, mas as orações daqueles que ainda vivemos na terra podem intervir profundamente nesta condição, por graça e obra da misericórdia divina. Esta interação de bens espirituais dos filhos de Deus constitui a comunhão dos santos e o tesouro da Igreja, obtido através dos méritos infinitamente satisfatórios da redenção de Cristo. Assim, pois, deve-se entender que Amélia estará no Purgatório até o fim do mundo se não houver quem reze por ela ou mande celebrar missas em sua intenção. E novamente, a mensagem de Fátima mostra a sua unidade perfeita ao relacionar o exemplo de Amélia com o apelo fervoroso de Nossa Senhora: 'Rezai, rezai muito e fazei sacrifícios pelos pecadores, que vão muitas almas para o Inferno por não haver quem se sacrifique e peça por elas'.
Reconheçamos definitivamente o valor imponderável das orações, penitências e sofrimentos no plano salvífico de Deus. Todas as grandes obras de Deus, e em particular àquelas relacionadas à conversão e salvação das almas, são feitas com a dor e o sacrifício de algumas almas privilegiadas. Em Fátima, estas foram as missões específicas desempenhadas por Jacinta e Francisco Marto – as duas crianças morreram em circunstâncias extremamente sofridas e dolorosas - almas escolhidas por Deus como vítimas da expiação e reparação dos pecados de Amélia e de todos nós.
Reconheçamos definitivamente o valor imponderável das orações, penitências e sofrimentos no plano salvífico de Deus. Todas as grandes obras de Deus, e em particular àquelas relacionadas à conversão e salvação das almas, são feitas com a dor e o sacrifício de algumas almas privilegiadas. Em Fátima, estas foram as missões específicas desempenhadas por Jacinta e Francisco Marto – as duas crianças morreram em circunstâncias extremamente sofridas e dolorosas - almas escolhidas por Deus como vítimas da expiação e reparação dos pecados de Amélia e de todos nós.
(Da publicação '8 Questões sobre as Aparições de Nossa Senhora em Fátima, do autor do blog).