terça-feira, 9 de julho de 2019

SUMA TEOLÓGICA EM FORMA DE CATECISMO (XXXIII)

XLV

DA PACIÊNCIA, LONGANIMIDADE E CONSTÂNCIA

Qual é a característica da virtude da paciência?
Suportar as tristezas e tribulações que o decorrer da vida, a cada momento, nos proporciona e de uma maneira especial as que nos ocasiona o trato com os nossos semelhantes, com olhos postos na vida futura, objeto da caridade (CXXXVI, 1-3)*.

Identifica-se a paciência com a longanimidade e a constância?
Não, Senhor; porque, se bem que estas virtudes nos dispõem a suportar as tribulações da vida, a paciência nos sustém nas contrariedades ocasionadas pelo trato diário com os homens, a longanimidade nos sustém contra a tristeza de ver como se afasta ou desvanece um bem intensamente desejado e a constância contra o desgosto e desfalecimento que podem assaltar-nos na prática continuada do bem (CXXXVI, 5).

XLVI

DA PERSEVERANÇA — VÍCIOS OPOSTOS: MOLEZA OU DESÂNIMO E PERTINÁCIA

Tem alguma coisa de comum a perseverança com as virtudes de que acabamos de falar?
O fim da perseverança não é entrar em reação contra a tristeza, senão contra a fadiga e o desânimo que, em determinadas ocasiões, nos assaltam na prolongada prática da virtude (CXXXVII, 1, 3).

Opõe-se a ela algum vício?
Sim, senhor; o desânimo ou moleza que faz perder o ânimo e desistir das empresas diante das dificuldades e fadigas que se preveem; e a pertinácia, vício dos que se obstinam em não ceder quando seja útil e razoável (CXXXV-III, 1, 2).

XLVII

DO DOM DA FORTALEZA CORRESPONDENTE À VIRTUDE DO MESMO NOME

Existe algum dom do Espírito Santo correspondente à virtude da fortaleza?
Sim, Senhor; o dom conhecido com o mesmo nome (CXXXIX).

Em que se diferençam o dom e a virtude da fortaleza?
Ambos têm por objeto o temor e, de certo modo, a audácia; porém; ao passo que o temor e a audácia, que a virtude da fortaleza modera, dizem respeito aos perigos que o homem pode com suas forças afastar, o temor e a confiança, que o dom correspondente excita, consideram males e perigos que de maneira alguma podem evitar-se; tal é, por exemplo, a dolorosa separação que a morte impõe entre o homem e os bens da vida presente; sem dar por isso a única dádiva que poderia supri-los ou compensá-los seria a posse efetiva da vida eterna. A ação própria e exclusiva do Espírito Santo é dar a vida eterna em troca das misérias da vida temporal, apesar de todos os inconvenientes e dificuldades que se interponham, inclusive a morte. A Ele, por conseguinte, incumbe infundir no homem desejos desta troca e permuta, inspirando-lhe tal confiança que o faça desprezar os maiores perigos e, de certo modo, desafiar a morte, não para sucumbir na luta, senão para obter o triunfo definitivo sobre ela. Este é o efeito do dom de fortaleza e, se quisermos declarar qual o seu objeto próprio, poderemos dizer que é a vitória sobre a morte (CXXXIX, 1).

XLVIII

DOS PRECEITOS RELATIVOS À FORTALEZA

Existem na lei divina preceitos relacionados com a virtude da fortaleza?
Sim, senhor; e estão dados na forma mais conveniente, porque, suposto que a lei divina e especialmente a Nova, está destinada a fixar a alma em Deus, vemos que convida o homem com preceitos negativos a não temer os males terrenos e, com mandatos positivos, a combater sem trégua nem descanso o seu mortal inimigo (CXL, 1).

São tão sábios como estes os preceitos das demais virtudes relacionadas com a fortaleza?
Sim, senhor; porque, a respeito da paciência e da perseverança que têm por objeto as lutas ordinárias da vida, há preceitos positivos; porém, tratando-se da magnificência e da magnanimidade, virtudes que moderam atos perfeitos, não existem mandatos, senão conselhos (CXL, 2).

XLIX

DA TEMPERANÇA, ABSTINÊNCIA E JEJUM — VÍCIO OPOSTO: A GULA

Qual é a quarta virtude moral necessária para não nos extraviarmos no caminho de retorno a Deus?
A virtude da temperança (CXLI-CLXX).

Que entendeis por virtude da temperança?
Aquela que mantém o apetite sensitivo sujeito aos ditames da razão, para evitar que se exceda nos prazeres, especialmente do tato, nos atos necessários à conservação da vida corporal (CXLI, 1-5).

Que prazeres são estes?
Os da mesa e os do matrimônio (CXLI, 4).

Que nome recebe a virtude da temperança quando se aplica a por em ordem os prazeres da mesa?
Chama-se abstinência ou sobriedade (CXLIX).

Em que consiste a abstinência?
Em governar conforme a razão o desejo imoderado de manjares e bebidas (CXLVI, 1).

Qual é a maneira própria de praticar a virtude da abstinência?
O jejum (CXLVII).

Em que consiste?
Em suprimir parte da alimentação normal (CXLVII, , 1, 2).

Não será ilícito e prejudicial?
Pelo contrário, pode ser de grandes benefícios, porque serve para reprimir a concupiscência, de modo que o espírito se eleve com maior liberdade à contemplação das mais sublimes verdades e serve também para satisfazer pelos pecados.

Que condições há de reunir o jejum para ser salutar e meritório?
As de ser dirigido e ordenado pela prudência e discrição, não comprometendo a saúde e nem sendo obstáculo para o cumprimento das obrigações do próprio estado (CXVII, 1, ad 2).

Estão obrigados a jejuar todos os que chegam ao uso da razão?
Nem todos os homens estão obrigados ao jejum eclesiástico, porém todos são obrigados a privar-se de alimento, na medida que o exija a prática das virtudes morais (CXLVII, 3, 4).

Que entendeis por jejum eclesiástico?
O prescrito pela Igreja, em determinados dias e a partir da idade por ela marcada (CXLVII,5-8).

Em que consiste?
Em não fazer mais que uma só refeição no dia (CXLVII, 6).

É necessário fazê-la na hora fixa?
Não, Senhor; pode fazer-se no meio dia ou à noite.

Pode tomar-se alimento fora da comida?
Pode tomar-se uma quantidade módica, pela manhã, como desjejum, e outra à noite como complementar (Código, 1251).

Quem está obrigado ao jejum eclesiástico?
Todos os batizados, desde a idade de vinte e um anos até os cinquenta e nove completos (Código, 1254).

Que causas dispensam do jejum?
Motivos de saúde ou de trabalho e, em caso de dúvida, a dispensa concedida pela autoridade legítima (CXLVII, 4).

Quem pode dispensar?
Praticamente basta a dispensa do superior eclesiástico imediato.

Em que dias há obrigarão de jejuar?
No Brasil, a Santa Sé costuma conceder que sejam os seguintes: todas as sextas-feiras da quaresma e quarta-feira de cinzas, jejum com abstinência de carne; todas as quartas-feiras da quaresma, quinta-feira da semana Santa e sexta-feira das têmporas do advento, jejum sem abstinência de carne.

Em que consiste a lei eclesiástica da abstinência?
Em abster-se de carnes e caldos preparados com elas.

Em que dias obriga?
No Brasil, segundo costuma conceder a Santa Sé, só na quarta-feira de cinzas e em todas as sextas-feiras da quaresma e nas vigílias do Espírito Santo, Assunção de Nossa Senhora, de todos os Santos e do Natal.

Quem está obrigado à lei da abstinência?
Todos os fiéis que tenham completado sete anos (Código 1254).

Que vício se opõe à abstinência?
O da gula (CXLVIII).

Que entendeis por gula?
O apetite desordenado de comer e beber (CXVIII, 1).

Contém este vício várias espécies?
Sim, senhor; pode cometer-se, umas vezes, atendendo à natureza, quantidade ou qualidade dos manjares, modo de condimentá-los e, outras vezes, na maneira de consumi-los, já antecipando a hora sem necessidade, já tomando-as com excessiva avidez e glutoneria (CXLVIII, 4).

É a gula um vício capital?
Sim, senhor; visto que facilita os prazeres que com mais força solicitam e arrastam o homem (CXLVIII, 5).

Quais são as filhas da gula?
Torpeza e estupidez do entendimento, alegria injustificada, intemperança na linguagem, chocarrice e impureza (CXLVIII, 6).

Por que estes vícios repugnantes provêm especialmente da gula?
São repugnantes porque degradam e quase extinguem a razão e provêm da gula porque o entendimento, obscurecido e adormecido com os vapores dos manjares, perde o governo e abandona a direção dos nossos atos (Ibid).

referências aos artigos da obra original

('A Suma Teológica de São Tomás de Aquino em Forma de Catecismo', de R.P. Tomás Pègues, tradução de um sacerdote secular)