quarta-feira, 28 de março de 2018

MEDITAÇÕES SOBRE A PAIXÃO DE JESUS (VII)


 JESUS MORTO PENDENTE DA CRUZ

1. Minha alma, levanta os olhos e contempla aquele crucificado. Contempla o Cordeiro Divino já sacrificado sobre o altar da dor. Reflete que ele é o Filho dileto do eterno Pai e que morreu pelo amor que te consagrou. Vê como tem os braços estendidos para abraçar-te, a cabeça inclinada para dar-te o ósculo da paz, o lado aberto para receber-te no seu coração. Que dizes? Merece ou não ser amado um Deus tão amoroso? Ouve o que ele te diz daquela cruz: ‘Vê, filho, se existe no mundo quem tenha te amado mais do que eu’. Não, meu Deus, não há no mundo quem tenha te amado mais do que eu. Não, meu Deus, não há no mundo quem me tenha amado mais do que vós. Mas que poderei dar em retorno a um Deus que quis morrer por mim? Que amor de uma criatura poderá jamais compensar o amor de seu criador morto para conquistar o seu amor?

2. Ó Deus, se o mais vil dos homens tivesse sofrido por mim o que sofreu Jesus Cristo, poderia deixar de amá-lo? Se eu visse um homem dilacerado pelos açoites, pregado numa cruz para salvar-me a vida, poderia lembrar-me disso sem me abrasar em amor? E se me fosse apresentado o seu retrato expirando na cruz poderia contemplá-lo com indiferentismo, pensando: ‘Este homem morreu assim atormentado por meu amor e, se não me houvesse amado tanto, não teria morrido dessa maneira?’ Ah, meu Redentor, ó amor de minha alma, como poderei esquecer-me mais de vós? Como poderei pensar que os meus pecados vos reduziram a um tal estado e não chorar sempre as injúrias feitas à vossa bondade? Como poderei vos ver morto de dor sobre essa cruz por meu amor e não vos amar com todas as minhas forças?

3. Meu caro Redentor, bem reconheço nessas vossas chagas e membros dilacerados outras tantas provas do terno amor que me consagrais. Já, pois, que para me perdoar não perdoastes a vós, olhai-me com aquele mesmo amor com que me olhastes uma vez da cruz, na qual morríeis por meu amor; iluminai-me e atraí para vós todo o meu coração para que, de hoje em diante, eu nada mais ame fora de vós. Não permitais que eu me esqueça de vossa morte. Vós prometestes que, levantado na cruz, haveríeis de atrair os nossos corações. Eis aqui o meu coração, que, enternecido com a vossa morte e enamorado de vós, não quer resistir mais ao vosso chamamento: ah, atraí-o todo e tornai-o todo vosso! Vós morrestes por mim e eu desejo morrer por vós e, continuando a viver, só para vós quero viver. Ó dores de Jesus, ó ignomínias de Jesus, ó morte de Jesus, ó amor de Jesus, fixai-vos no meu coração e aí fique sempre a vossa memória a ferir-me continuamente e a inflamar-me em amor. Eu vos amo, bondade infinita, eu vos amo, amor infinito, vós sois e sereis sempre o meu único amor. Ó Maria, Mãe do amor, obtende-me o santo amor.

('A Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo', de Santo Afonso Maria de Ligório)

MEDITAÇÕES SOBRE A PAIXÃO DE JESUS (VI)


 JESUS MORRE NA CRUZ

1. Eis que o Salvador está prestes a morrer. Contempla, minha alma, aqueles belos olhos que se obscurecem, aquela face já pálida, aquele coração que palpita lentamente, aquele sagrado corpo que já se entrega à morte. Tendo Jesus experimentado o vinagre disse: ‘Tudo está consumado’ (Jo 19, 30). Põe ainda uma vez diante dos olhos todos os padecimentos sofridos durante sua vida, pobreza, desprezos, dores e, oferecendo então tudo a seu eterno Pai, disse: ‘Tudo está consumado. Meu Pai, eis já completa a redenção do mundo com o sacrifício de minha vida’. E voltando-se para nós, como para que respondamos, repete: ‘Tudo está consumado’, como se dissesse: ‘Ó homens, amai-me, porque eu fiz tudo e nada mais tenho a fazer para conquistar o vosso amor’.

2. Chega afinal a hora, e Jesus falece. Vinde, ó anjos do céu, vinde assistir à morte de vosso rei. E vós, Mãe dolorosa, chegai-vos mais à cruz e contemplai atentamente vosso Filho, pois está prestes a expirar. E Ele, depois de ter recomendado seu espírito ao Pai, invoca a morte, dando-lhe a permissão de tirar-lhe a vida. Vem, ó morte, lhe diz, depressa exerce o teu ofício, mata-me e salva as minhas ovelhas. A terra treme, abrem-se os sepulcros, rasga-se o véu do templo. Já lhe faltam as forças dos agonizantes, Jesus; pela violência das dores, foge-lhe o calor, fica inerte seu corpo, abaixa a cabeça, abre a boca e morre. ‘E tendo inclinado a cabeça, entregou o seu espírito’ (Jo 19, 30). A gente o vê expirar e, notando que não faz mais movimento, diz: ‘Está morto, está morto’. E a estes se alia também a voz de Maria, que diz por sua vez: ‘Ah, meu Filho, já estás morto.’

3. Está morto! Quem, ó Deus, está morto? Está morto o autor da vida, o Unigênito de Deus, o Senhor do mundo. Ó morte, tu foste o assombro do céu e da terra. Ó amor infinito! Um Deus sacrificar sua vida e seu sangue por quem? Por suas criaturas ingratas, morrendo num mar de dores e de desprezos para pagar as suas culpas! Ó bondade infinita! Ó amor infinito! Ó meu Jesus, vós morrestes, pois, pelo amor que me consagrastes. Não permitais, portanto, que eu viva um instante sequer sem vos amar. Eu vos amo, meu sumo bem, eu vos amo, meu Jesus, morto por mim. Ó Mãe das dores, Maria, ajudai a um servo vosso que deseja amar Jesus.

('A Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo', de Santo Afonso Maria de Ligório)

terça-feira, 27 de março de 2018

MEDITAÇÕES SOBRE A PAIXÃO DE JESUS (V)


PALAVRAS DE JESUS NA CRUZ

1. Enquanto Jesus é ultrajado na cruz por aquela gente bárbara, Ele suplica por eles e diz: ‘Meu Pai, perdoai-lhes, porque não sabem o que fazem’ (Lc 23, 34). Ó Padre eterno, ouvi vosso Filho bem amado, que, morrendo, vos roga que me perdoeis também a mim, que tantas vezes vos ofendi. Depois Jesus, voltando-se para o bom ladrão que lhe pede perdão, diz: ‘Hoje estarás comigo no paraíso’ (Lc 23, 46). Ó como é verdade o que diz o Senhor por Ezequiel que, quando um pecador se arrepende de suas culpas, Ele se esquece, por assim dizer, de todas as ofensas que lhe foram feitas: ‘Se, porém, o ímpio fizer penitência... não me recordarei mais de todas as suas iniquidades’ (Ez 18, 21). Ó se eu nunca vos tivesse ofendido, ó meu Jesus; mas, visto que o mal está feito, esquecei-vos, eu vos suplico, dos desgostos que vos dei e, por aquela morte tão cruel que sofrestes por mim, levai-me ao vosso reino depois de minha morte e, enquanto eu vivo, fazei que o vosso amor reine sempre em minha alma.


2. Jesus agonizando na cruz, com seus ombros dilacerados e sua alma sumamente aflita, procura quem o console. Olha para Maria; mas essa mãe dolorosa mais o aflige com suas dores. Busca conforto junto de seu Pai; mas este, vendo-o coberto com todos os pecados dos homens, também o abandona. Foi então que Jesus deu um grande brado: ‘Meu Deus, meu Deus, por que me abandonastes?’ (Mt 27, 46). Este abandono do Pai eterno fez que a morte de Jesus fosse a mais amarga que jamais sofreu algum penitente ou algum mártir, pois foi uma morte toda desolada e privada de qualquer alívio. Ó meu Jesus, como pude viver tanto tempo esquecido de vós? Agradeço-vos o não vos terdes esquecido de mim. Eu vos suplico que me façais recordar sempre da morte cruel que suportastes por meu amor, para que eu nunca mais me esqueça do amor que tendes testemunhado.

3. Afinal, sabendo Jesus que seu sacrifício já estava consumado, disse: ‘Tenho sede’ (Jo 12, 28). E aqueles carrascos lhe puseram nos lábios uma esponja toda embebida no vinagre e fel. Mas, Senhor, vós não vos queixais de tantas dores que vos roubam a vida e agora vos queixais de sede? Ah, eu vos compreendo, meu Jesus, a vossa sede é sede de amor; porque vós nos amais, desejais ser amado por nós. Ajudai-me, pois, a expelir do meu coração todos os afetos que não são para vós: fazei que eu não ame outra coisa senão a vós e nada mais deseja senão cumprir a vossa vontade. Ó vontade de Deus, vós sois o meu amor. Ó Maria, minha Mãe, impetrai-me a graça de não querer outra coisa senão o que Deus quer.

('A Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo', de Santo Afonso Maria de Ligório)

MEDITAÇÕES SOBRE A PAIXÃO DE JESUS (IV)


JESUS NA CRUZ

1. Jesus na cruz. Eis a prova do amor de um Deus. Eis a última aparição que o Verbo encarnado fez sobre a terra; aparição de dor, mais ainda de amor. São Francisco de Paula, contemplando um dia o amor divino na pessoa de Jesus crucificado e entrando em êxtase, exclamou três vezes: ‘Ó Deus caridade! Ó Deus caridade! Ó Deus caridade!’ querendo com isso significar que não podemos compreender quão grande foi o amor de Deus para conosco, para morrer por nosso amor.

2. Ó meu querido Jesus, se vos contemplo exteriormente nessa cruz, nada mais vejo senão chagas e sangue. Se, porém, observo o vosso coração, encontro-o todo aflito e triste. Leio nessa cruz que vós sois rei, mas qual a insígnia de rei que ainda tendes? Eu não vejo outro espólio real senão esse madeiro de opróbrio; não vejo outra púrpura, senão a vossa carne dilacerada e ensanguentada; outra coroa, senão esse feixe de espinhos que vos atormenta. Ah, tudo isso, porém, vos consagra como rei de amor, sim, porque essa cruz, esses cravos, essa coroa e essas chagas são insígnias de amor.

3. Jesus, do alto da cruz, não nos pede tanto compaixão mas nossos afetos e, se procura compaixão, busca-a unicamente para que ela nos mova a amá-lo. Ele, por ser a bondade infinita, já merece todo o nosso amor, mas, posto na cruz, procura que o amemos ao menos por compaixão. Ah, meu Jesus, quem não vos há de amar, se vos reconhece pelo Deus que sois e vos contempla na cruz? Ó que setas de fogo vós disparais sobre as almas desse trono de amor. Ó quantos corações atraístes a vós dessa mesma cruz. Ó chagas de meu Jesus, ó belas fornalhas de amor, recebei-me no meio de vós, para que me abrase, não já no fogo do inferno por mim merecido, mas nas santas chamas de amor por aquele Deus que, consumido de tormentos, quis morrer por mim. Meu caro Redentor, recebei um pecador, que, arrependido de vos ter ofendido, vos deseja amar sinceramente. Eu vos amo, bondade infinita; eu vos amo, amor infinito. Ouvi-me, ó meu Jesus, eu vos amo, eu vos amo, eu vos amo. Ó Maria, ó Mãe do belo amor, impetrai-me mais amor para que me consuma de amor por esse Deus que morreu consumido de amor por mim.

('A Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo', de Santo Afonso Maria de Ligório)

MEDITAÇÕES SOBRE A PAIXÃO DE JESUS (III)


JESUS É PREGADO NA CRUZ

1. Apenas chegou o Redentor ao Calvário, triturado de dores e fatigado, arrancam-lhe as vestes já pegadas às suas carnes dilaceradas e arremessam-no sobre a cruz. Jesus estende seus sagrados braços e oferece ao mesmo tempo ao eterno Pai o sacrifício de sua vida, rogando-lhe que o aceite pela salvação dos homens. Os carrascos tomam, então, com fúria os cravos e os martelos e, atravessando-lhe os pés e as mãos, pregam-no na cruz. Ó mãos sagradas, que só com o vosso contato curastes tantos enfermos, por que vos pregam nessa cruz? Ó pés santos, que tanto vos cansastes para nos buscar a nós, ovelhas desgarradas, por que vos atravessam com tanta crueldade? Quando se fere um nervo do corpo humano, é tão aguda a dor, que ocasiona espasmos e delírios. Ora, quão grande terá sido a dor de Jesus, quando lhe foram atravessados os pés e as mãos, cheios de nervos e músculos, pelos duros cravos! Ó meu doce Salvador, tanto vos custou o desejo de ver-me salvo e de conquistar o meu amor e eu, ingrato, tantas vezes desprezei o vosso amor por um nada; agora, porém, o estimo acima de todos os bens.

2. Levantam a cruz com o crucificado e fazem-na cair com violência no buraco feito no rochedo. Esse buraco é em seguida entupido com pedras e madeira e Jesus fica pendente na cruz, para aí consumar sua vida. Estando Jesus já agonizando naquele leito de dores e achando-se tão abandonado e triste, procura quem o console, mas não encontra. Ao menos terão compaixão de vós, ó meu Senhor, os homens que vos veem morrer? Pelo contrário; vejo que uns o injuriam, outros zombam dele; estes blasfemam, aqueles o encarnecem, dizendo: ‘Desça da cruz se é o Filho de Deus. Salvou os outros e agora não pode salvar-se a si mesmo’ (Mt 27, 40). Ah, bárbaros, ele já está expirando, como é que assim gritais; ao mesmo tempo não o atormenteis com as vossas zombarias.

3. Vê quanto padece naquele patíbulo o teu Redentor. Cada membro sofre o seu tormento e um não pode aliviar o outro. A cada momento ele experimenta penas mortais. Pode-se dizer que durante aquelas três horas que Jesus agonizou na cruz, ele sofreu tantas mortes quantos foram os momentos que aí passou. Não encontra na cruz o mínimo alívio ou repouso. Se se apoia nas mãos ou nos pés, aumenta a dor, já que seu corpo sacrossanto está pendente dessas mesmas chagas. Corre, minha alma, e chega-te enternecida a essa cruz, beija esse altar, sobre o qual morre como vítima de amor por ti o teu Senhor. Coloca-te debaixo de seus pés e deixa que caia sobre ti aquele sangue divino. Sim, meu caro Jesus, que esse sangue me lave de todos os meus pecados e me inflame todo em amor para convosco, meu Deus, que quisestes morrer por meu amor. Ó Mãe das dores, que estais ao pé da cruz, rogai a Jesus por mim.

('A Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo', de Santo Afonso Maria de Ligório)

segunda-feira, 26 de março de 2018

MEDITAÇÕES SOBRE A PAIXÃO DE JESUS (II)


 JESUS LEVA A CRUZ AO CALVÁRIO

1. Publicada a sentença contra nosso Salvador, apoderam-se imediatamente dele com fúria. Arrancam-lhe novamente aquele trapo de púrpura e o revestem com suas vestes, para ser crucificado sobre o Calvário, lugar destinado para a morte dos malfeitores. ‘Despiram-lhe a clâmide e o revestiram com suas vestes e o conduziram para ser crucificado’ (Mt 27, 31). Arranjam duas rudes traves, fazem com elas às pressas uma cruz e obrigam-no a carregá-la sobre os ombros até ao lugar de seu suplício. Que barbaridade impor nos ombros do réu o patíbulo sobre o qual deve morrer. Mas assim deve ser, ó meu Jesus, pois que vós tomastes sobre vós todos os meus pecados.

2. Jesus não recusa a cruz, abraça-a até com amor, sendo ela o altar destinado para a consumação do sacrifício de sua vida pela salvação dos homens. ‘E levando sua cruz às costas, saiu para aquele lugar que se chama Calvário’ (Jo 19, 17). Os condenados saem da casa de Pilatos e entre eles se acha também nosso divino Salvador. Ó espetáculo que causou admiração ao céu e à terra: ver o Filho de Deus que segue para morrer por esses mesmos homens que a ela o condenam. Eis realizada a profecia: ‘E eu sou como um cordeiro que é levado para ser sacrificado’ (Lm 11, 19). Jesus oferecia um aspecto tão lastimoso, que as mulheres judias, ao vê-lo, não puderam deixar de chorar: ‘E o choravam e lamentavam’ (Lc 23, 27). Meu caro Redentor, pelos merecimentos dessa viagem dolorosa, dai-me a força de levar com paciência a minha cruz. Eu aceito todas as dores e desprezos que me destinais a sofrer; vós os tornastes amáveis e doces, abraçando-os por vosso amor. Dai-me força de suportá-los com paciência.

3. Contempla, minha alma, o que se passa com o vosso Salvador; vê como de suas chagas ainda frescas escorre o sangue, como está coroado de espinhos e carregado com a cruz. A cada movimento, renovam-se as dores de todas as suas chagas. A cruz começa a atormentá-lo já antes do tempo, pisando seus ombros chagados e martelando-lhes os espinhos da coroa. Ó Deus, quantas dores a cada passo. Consideremos também os sentimentos de amor com que Jesus vai subindo o Calvário, onde o espera a morte. Ó meu Jesus, vós ides morrer por nós. Eu vos voltei as costas no passado e quereria morrer de dor: mas no futuro não sou capaz de abandonar-vos mais, meu Redentor, meu Deus, meu amor, meu tudo. Ó Maria, minha Mãe, alcançai-me a graça de levar a minha cruz com toda a paz.

('A Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo', de Santo Afonso Maria de Ligório)

MEDITAÇÕES SOBRE A PAIXÃO DE JESUS (I)


JESUS É CONDENADO POR PILATOS

1. Pilatos, depois de haver tantas vezes declarado a inocência de Jesus, mais uma vez a proclama, protestando ser ele inocente do sangue daquele justo (Mt 27, 24), e contudo pronunciou a sentença e o condenou à morte. Ó injustiça nunca vista no mundo! Ao mesmo tempo que o juiz declara inocente o acusado, ele o condena. Ah, meu Jesus, vós não mereceis a morte, mas eu a mereço. Visto, porém, que quereis satisfazer por mim, não é Pilatos, mas é o vosso próprio Pai que vos condena a pagar a pena a mim devida. Eu vos amo, ó Pai eterno, que condenais vosso Filho inocente para livrar-me a mim que sou réu. Eu vos amo, ó Filho eterno, que aceitais a morte devida a um pecador.

2. Pilatos, tendo condenado a Jesus, o entrega às mãos dos judeus, para que façam com ele o que desejavam: ‘Entregou Jesus ao arbítrio deles’ (Lc 23, 25). É de fato o que acontece: quando se condena um inocente, não se limita a pena, mas é ele abandonado às mãos dos inimigos, para que o façam padecer e morrer como lhes aprouver. Pobres judeus, vós então pedistes o castigo, dizendo: ‘Seu sangue caia sobre nós e nossos filhos’ (Mt 27, 25). E o castigo já veio! Desgraçados, sofreis e haveis de sofrer até ao fim do mundo o castigo desse sangue inocente. Ó meu Jesus, tende piedade de mim, que com minhas culpas também motivei a vossa morte. Não quero ficar obstinado como os judeus, quero chorar os maus tratos que vos dei e amar-vos sempre, sempre, sempre.

3. Eis que se lê diante do Senhor a injusta sentença, condenando-o à morte da cruz. Ele a ouve, e, inteiramente submisso à vontade do Pai, obediente a aceita com toda a humildade: ‘Humilhou-se a si mesmo, fazendo-se obediente até à morte e morte de cruz’ (Fl 2, 8). Pilatos na terra diz: 'Morra Jesus!' E o eterno Pai no céu diz também: 'Morra o meu Filho'. E o Filho responde por sua vez: 'Eis-me aqui; eu obedeço e aceito a morte e a morte da cruz'. Meu amado Redentor, vós aceitais a morte que me é devida. Seja bendita a vossa misericórdia para sempre: eu vos agradeço sumamente. Mas visto que vós, inocente, aceitais a morte da cruz por mim, eu, pecador, aceito a morte que me destinardes com todos os sofrimentos que a acompanharem e desde já a uno à vossa morte e a ofereço ao vosso eterno Pai. Vós morrestes por meu amor e eu quero morrer por amor de vós. Pelos merecimentos de vossa santa morte, fazei-me morrer na vossa graça e abrasado no vosso santo amor. Maria, minha esperança, recordai-vos de mim.

('A Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo', de Santo Afonso Maria de Ligório)