quinta-feira, 5 de maio de 2022

SOBRE VIVER E SER FELIZ


'Todos os homens querem ser felizes; não há ninguém que não o queira, e com tanta intensidade que o deseja acima de tudo. Melhor ainda: tudo o que querem para além disso, querem-no para isso. Os homens perseguem paixões diferentes, um esta, outro aquela; também existem muitas maneiras de ganhar a vida neste mundo: cada um escolhe a sua profissão e a exerce. Mas quer adotem este ou aquele gênero de vida, todos os homens agem nesta vida para serem felizes. O que há então nesta vida capaz de nos fazer felizes, que todos desejam mas que nem todos alcançam? Procuremo-lo.

Se eu perguntar a alguém: 'Queres viver?', ninguém se sentiria tentado a responder-me: 'Não quero'. Do mesmo modo, se eu perguntar: 'Queres ser saudável?', ninguém me responderá: 'Não quero'. A saúde é um bem precioso aos olhos do rico e, para o pobre, ela é muitas vezes o único bem que ele possui. Todos concordam no amor pela vida e pela saúde. Ora quando o homem desfruta da vida e é saudável, poderá contentar-se com isso?

Um homem rico perguntou ao Senhor: 'Mestre, que devo fazer para ter a vida eterna?' (Mc 10, 17). Ele temia morrer e era forçado a morrer. Ele sabia que uma vida de dor e de tormentos não é vida, e que se lhe deveria antes dar o nome de morte. Apenas a vida eterna pode nos fazer felizes. A saúde e a vida neste mundo não a garantem, tememos demasiado perdê-las: chamai a isto 'temer sempre' e não 'viver sempre'. Se a nossa vida não é eterna, se não satisfaz eternamente os nossos desejos, não pode ser feliz, nem sequer é vida. Quando entrarmos nessa vida, teremos a certeza de aí ficar para sempre. Teremos a certeza de possuir eternamente a verdadeira vida sem qualquer temor, pois encontrar-nos-emos naquele reino sobre o qual se diz: 'E o seu reino não terá fim' (Lc 1, 33).
(Santo Agostinho)

terça-feira, 3 de maio de 2022

TESOURO DE EXEMPLOS (146/148)

 

146. UM INSTINTO DIVINO

Há coisas que só Deus pode ensinar às crianças. Elas têm às vezes ideias de anjos que espantam os grandes. Para celebrar a primeira comunhão de seus filhinhos, costumam as mães preparar lindos vestidos brancos que simbolizam a alvura da alma e que completam a festa interior do coração. Lindas flores enfeitam o dia da primeira comunhão. A alma, entretanto, tem lá as suas flores que ninguém vê nem suspeita.

Uma menina se preparava com admirável fervor para receber Nosso Senhor, pela primeira vez, em seu coração. Faltavam poucos dias para a solenidade e a mãe, julgando causar alegria à filhinha, disse a ela:
➖ Amélia, venha experimentar o vestido branco.

Sobre a mesa do quarto estava estendido um belíssimo vestido de seda branca. A mãe esperava uma explosão de alegria, mas enganou-se. Vendo o vestido, Amélia parecia cobrir-se de tristeza.
➖ O que é isso, Amélia? Não gostou do vestido?
➖ Ah! mamãe, ele vai me distrair. Naquele dia quisera ver só Jesus, pensar somente nele e falar só com ele. Faça, mamãe, um vestido mais simples e serei feliz, como os pobrezinhos...
➖ Você é um anjo - disse a mãe abraçando-a; só Deus pode ter ensinado a você essas coisas!

147. BEIJAR A MÃO DO PADRE

Um grupo de alegres rapazes combinaram fazer uma excursão. Iam bem dispostos, levando cada um a sua merenda, quando se encontraram com um padre modesto e bondoso. Todos beijaram a mão do ministro de Deus. Todos, não, porque dois, que pareciam ter ideias revolucionárias, logo depois caçoaram dos companheiros e disseram:
➖ Vocês não passam de uns beatos.
➖ De modo nenhum - respondeu um deles; bons cristãos, isso sim. Por que beijam vocês as mãos de suas mães? Porque lhes dão de comer e vestir, ou os curam quando é preciso, não é? Pois bem; nós beijamos a mão do sacerdote porque com ela nos reparte o pão da Eucaristia, nos abençoa, perdoa-nos os pecados e dirige-nos no caminho do céu.
➖ Bobagens! - responderam os mal educados; isso era costume em tempos atrasados; hoje não se beija mais a mão da mãe e menos ainda do padre.
➖ Vocês estão muito enganados. Se não beijam sua mãe, nem são agradecidos ao sacerdote, também não merecem o nome de homens, pois faltam-lhes sentimentos humanos. Temos que respeitar os ministros de Deus, como aos nossos pais, porque realmente são os pais de nossas almas.

148. CASTIGO DO CÉU

Em 18 de fevereiro de 1881, numa sexta-feira, houve em Mônaco um escandaloso baile de máscaras. Muitos dos mascarados ridicularizavam as vestes sacerdotais e os hábitos religiosos, fantasiando-se de frades e freiras, fingindo-se muito gordos com enchimentos de estopa e lã.

Alguém imprudentemente usou fogo para acender o cigarro, fogo esse que pegou num dos trajes usados e as chamas se propagaram como um rastilho de pólvora. Doze daqueles sacrílegos mascarados morreram no meio do pânico, e os outros, sofrendo dores horríveis, foram transportados ao hospital, onde alguns vieram a falecer e outros ficaram com cicatrizes das queimaduras como lembrança do infeliz divertimento.

Em face desta horrível catástrofe, toda a cidade exclamou:
➖ Castigo! Foi um castigo do Céu!

(Excertos da obra 'Tesouro de Exemplos', do Pe. Francisco Alves, 1958; com adaptações)

segunda-feira, 2 de maio de 2022

SOBRE O PECADO DA SODOMIA

'… Essa torpeza é corretamente considerada como o pior dos crimes, porque está escrito que o Deus Todo-Poderoso a odiou e sempre da mesma maneira tanto que, para outros vícios, Ele estabeleceu limites por meio de preceitos específicos, mas quis condenar esse vício com uma punição da mais rigorosa vingança. Não pode ser olvidado que, de fato, Ele destruiu as duas famigeradas cidades de Sodoma e Gomorra, e todas as regiões próximas, mandando uma chuva de fogo e enxofre dos céus.

... Este vício não deve de modo algum ser considerado um vício comum, porque supera todos os outros pela gravidade. De fato, mata o corpo, arruína a alma, contamina a carne, extingue a luz do intelecto, expulsa o Espírito Santo do templo da alma, introduz nele o demônio instigador da luxúria, induz ao erro, subtrai a verdade pela raiz da mente enganada, prepara armadilhas para aquele que assim peca, lança-o no abismo e ali o encarcera, abre-lhe o inferno, fecha-lhe a porta do paraíso, transforma-o de cidadão da Jerusalém Celeste em herdeiro da Babilônia infernal, de uma estrela no céu em palha destinada ao fogo eterno, separa-o da comunhão da Igreja e o lança no fogo voraz da geena ardente. Este vício se compraz em destruir as muralhas da pátria celestial e reconstruir os muros da Sodoma queimada e revivida. Com efeito, ele viola a austeridade, extingue a modéstia, escraviza a castidade, mata a virgindade irrecuperável com o punhal de um contágio imundo, conspurca tudo, mancha tudo, contamina tudo e, tanto quanto pode, não permite que nada puro e casto se mantenha...

Essa tirania pestilenta de Sodoma torna os homens vis e movidos pelo ódio e em guerra contínua contra Deus; esmaga-os como escravos sob o peso do espírito de iniquidade, corta o vínculo deles com os anjos, extirpa a nobreza da alma, tornando-a infeliz e submetida ao jugo do seu próprio domínio. Priva os infelizes das armas da virtude e os expõem ao assédio de todos os vícios. Humilha-os diante da Igreja, condena-os pela justiça, contamina-os em privado e os proclamam como hipócritas em público, roendo-lhes a consciência como um verme e queimando a sua carne como fogo... Este flagelo abala os fundamentos da fé, enfraquece a força da esperança, dissipa o vínculo da caridade, elimina a justiça, mina a fortaleza, remove a temperança, amortece a perspicácia da prudência e, uma vez que tenha expulsado do íntimo do coração humano toda gama de virtudes, intromete-se no seu interior a barbárie de todos os vícios...

Portanto, tão logo alguém tenha caído nesse abismo de extrema perdição, torna-se um desterrado da pátria celeste, separa-se do Corpo de Cristo, é refutado pela autoridade de toda a Igreja, condenado pelo juízo dos Santos Padres, desprezado pelos homens e rejeitado pela comunhão dos santos... De um lado, não consegue levantar-se, agravado que está pelo peso do seu crime; de outro, não consegue mais ocultar seu mal no esconderijo da ignorância, não pode ser feliz enquanto vive, nem ter esperança quando morre, porque, agora, é obrigado a sofrer o opróbrio da derrisão dos homens e, depois, o tormento da condenação eterna'.

(Excertos da obra Liber Gomorrhanus, São Pedro Damião, in Patriologia Latina, por J. P. Migne)

domingo, 1 de maio de 2022

01 DE MAIO - SÃO JOSÉ OPERÁRIO


São José, São José carpinteiro,
dai-me o cinzel do entalhador
para que eu molde almas, muitas almas,
com a sagrada face do Senhor...


São José, modelo de virtudes,
imprimi em mim virtuoso labor
para que eu seja luz, luz que alumie,
os santos caminhos do Senhor...


São José, homem de oração,
dai-me a graça da vida interior
para que eu leve ovelhas, muitas ovelhas,
 ao rebanho do Bom Pastor...
  

São José, São José missionário,
guiai-me no apostolado do amor
pelos homens, para que muitos se salvem,
 na infinita misericórdia do Senhor...



 São José, esposo de Maria,
ungi-me a fronte com especial fervor
de levar as almas, todas as almas,
às fontes da graça do Senhor...


São José, São José camponês,
dai-me o arado e fazei-me semeador
que eu possa dar frutos, muitos frutos,
nas vinhas gloriosas do Senhor...


São José, homem justo na fé,
fazei de mim esteio consolador
de todos que sofrem, dos que padecem,
crucificados como o Senhor...



São José, São José operário,
fazei de mim um santo trabalhador
que eu seja obra de muitos nomes
nas moradas eternas do Senhor...

('Poema a São José', de Arcos de Pilares)

Acesse a página COMPÊNDIO DE SÃO JOSÉ

EVANGELHO DO DOMINGO

 

'Eu vos exalto, ó Senhor, porque Vós me livrastes' (Sl 29)

 01/05/2022 - Terceiro Domingo da Páscoa

23. TESTEMUNHAS DO AMOR 


Às margens do mar de Tiberíades, Jesus Ressuscitado aparece pela terceira vez a seus discípulos. E lhes aparece após uma longa noite de aparentes fracassos porque eles não haviam conseguido pescar peixe algum. Aqueles homens, pescadores exímios, bem o tentaram; sabedores dos humores e segredos do mar, bem o tentaram; sabedores das nuances dos ventos e das propícias condições noturnas, bem o tentaram. E tentaram em vão, porque são vãos todos os esforços quando não compartilhados pela graça de Deus.

Ao amanhecer, resignados e confusos, aqueles pescadores obedecem a recomendação de Jesus, embora não O tivessem ainda em plenitude, pois 'os discípulos não sabiam que era Jesus' (Jo 21,4). Mas, ainda assim, lançam as redes à direita da barca, pois aqueles que estiverem à direita de Cristo não serão confundidos e verão as maravilhas de Deus (Mt 25, 33-34). E agora, não lhes é vã a tentativa; a rede se enche de 153 grandes peixes, símbolo de uma pesca extremada, milagrosa porque eivada da graça manifesta de Deus aos homens.

E, tomado de assombro, o discípulo a quem Jesus amava faz um imediato testemunho de amor: 'É o Senhor!' (Jo 21,4). É um testemunho de fé no Filho do Homem, testemunho de esperança, testemunho em Jesus Ressuscitado, condutor verdadeiro dessa barca, que representa a Santa Igreja, testemunho que perpassa os tempos e as gerações humanas dos bem-aventurados que haverão de crer como João. Sim, é o Senhor! O cordeiro imolado para a redenção do mundo, o Salvador, o Ungido do Pai.

Mas é Pedro quem se arroja nas águas frias do mar naquele amanhecer de novos tempos ao encontro do Jesus amado e retorna, na mesma toada, para arrastar a rede cheia de grandes peixes até a margem. Mais uma vez, Jesus prepara-lhes o alimento e distribui o pão e os peixes entre eles. E é a Pedro quem Jesus pergunta por três vezes: 'Simão, filho de João, tu me amas?' (Jo 21, 15-17). E o sim de Pedro, por três vezes, é a prova manifesta universalmente do amor verdadeiro do homem em resposta ao infinito amor de Deus: 'Senhor, tu sabes tudo; tu sabes que eu te amo' (Jo 21, 17). E ante a resposta firme e decidida de Pedro, Jesus o tornará o pastor de suas ovelhas e a pedra da Igreja: 'Segue-me' (Jo 21, 19).

sábado, 30 de abril de 2022

VERSUS: A IGREJA E O MUNDO SÃO INIMIGOS MORTAIS

A origem de toda a decadência dos valores cristãos da atual geração está irremediavelmente vinculada ao conceito falso e apóstata de que é possível uma reconciliação plena e eficaz entre as coisas de Deus e as coisas do mundo. Esse pensamento norteia grande parte do clero e uma imensa maioria dos leigos católicos e alimenta os princípios pervertidos do liberalismo, do ecumenismo, do indiferentismo e do materialismo tóxico.

Não se colhem frutos bons de árvores más. Não rebentam frutos bons de sementes podres. Não há nenhuma possibilidade de se reunir, num mesmo cesto, as graças de Deus e os pecados dos homens. Não existe possibilidade alguma de se camuflar ou extirpar a inimizade irreconciliável entre o mundo e a Igreja de Cristo, porque este confronto intenso e duradouro foi explicitado e imposto por Deus desde o princípio da criação:

'Porei ódio entre ti e a mulher, entre a tua descendência e a dela. Esta te ferirá a cabeça, e tu lhe ferirás o calcanhar' (Gn 3,15)

Há e haverá sempre uma guerra inevitável e tremenda nesta vida entre duas raças - os filhos da Mulher (Nossa Senhora) e, portanto, os descendentes de Nosso Senhor Jesus Cristo e os filhos da serpente (satanás) que vivem e morrem apenas pelas coisas do mundo. Os primeiros labutam no espaço de uma vida confinada entre o efêmero e o eterno com Deus, incensados pela oração, penitência, perseverança e pela fé. Os filhos do mundo respiram e trabalham em favor da insensatez e da insanidade do mundo, submersos pelo indiferentismo da eternidade e moldados pelos atalhos fáceis e diabólicos do prazer, do livre manuseio e usufruto do corpo e das ideias, do dinheiro, do poder, da ambição desenfreada, do culto da libertinagem, do desvario da criatura feita e moldada pela própria criação.

Essa guerra é contínua e tende a ficar cada vez maior em dois momentos: quando o mal se arvorar de possuir todas as mentes ou quando o bem se acovardar em todos os corações. O reino do anticristo será o momento do apogeu destas duas condições conjugadas. No primeiro caso, nunca na história humana, o demônio se sentiu tanto à vontade para possuir e dominar todas as mentes: heresias, blasfêmias e falsas ideologias campeiam livremente sem freios e com afagos diversos, induzindo a condição humana ao aniquilamento espiritual pela defesa intransigente e a prática criminosa do aborto, da ideologia de gênero, do ateísmo militante, do aviltamento das boas obras. Por outro lado, o bem se retrai, se envergonha da verdade, se acovarda da luta, se beneficia do comodismo, se ilude com a cumplicidade:

Quando veio a primeira chuva, disseram que tinha sido um acaso.
Quando veio a segunda chuva, acharam apenas uma coincidência.
Quando veio a terceira chuva, fingiram que nem se molharam.
Quando veio a primeira tempestade, comportaram-se como se fosse apenas mais uma chuva.
Quando ventos ruinosos e terríveis inundações se juntaram à tempestade, acharam tudo ainda muito normal.
Quando veio, enfim, o dilúvio,
não acharam e nem pensaram mais nada,
porque estavam todos mortos*.


O preço da cumplicidade é a morte de todos. Porque, não havendo possibilidade de amizade entre Deus e o mundo, quem se coloca em favor do mundo impõe-se como inimigo de Deus, como 'adúltero' da verdade, nas palavras perturbadoras de São Tiago:

'Adúlteros, não sabeis que o amor do mundo é abominado por Deus? Todo aquele que quer ser amigo do mundo constitui-se inimigo de Deus' (Tg 4,4).

Na epístola, São Tiago assevera que o amor ao mundo constitui abominação a Deus, que os amigos do mundo são adúlteros e inimigos de Deus. Esta é a premissa que conforma e molda a sã doutrina católica, a pedra angular que fundamenta a Igreja de Cristo. Se essa igreja abandona esta premissa e passa a interagir amigavelmente com o mundo, ela tende a tornar-se refém do mundo, a adulterar a Verdade que a proclama como única, santa, apostólica e verdadeira, a voltar-se contra Deus e a preparar com tapete vermelho os terríveis tempos da chegada do anticristo nesta terra.

* livre exercício pelo autor do blog da ideia central de um famoso poema de Maiakóvsky