sexta-feira, 26 de março de 2021

O DOGMA DO PURGATÓRIO (I)

Le Dogme du Purgatoire
illustré par des Faits et des Révélations Particulières

Capítulo Preliminar

Objetivo do livro. - A que classe de leitores se destina. - O que somos obrigados a acreditar, o que podemos acreditar piamente e o que somos livres para não acreditar. - Visões e aparições. - Credulidade cega e incredulidade exagerada.

O dogma do purgatório é muito esquecido pela maioria dos fiéis; a Igreja Padecente, onde estão tantos irmãos que ora precisam de ajuda e onde se deveria prever que também se pode estar em breve, parece-lhes algo estranha. Esse esquecimento, verdadeiramente deplorável, fez tremer São Francisco de Sales: 'Ai de mim! - disse este piedoso santo da Igreja -  'não nos lembramos o suficiente dos nossos queridos defuntos: a sua memória parece morrer com o som dos sinos'. A principal causa é a ignorância e a falta de fé: temos sobre o purgatório noções muito vagas e uma fé muito fraca. Devemos, portanto, olhar mais de perto essa vida além da sepultura, esse estado intermediário das almas justas e que ainda não são dignas de entrar na Jerusalém Celestial, a fim de obter noções mais sólidas e reavivar a nossa fé.

Este é o objetivo deste trabalho: nos propomos a fazê-lo, não para provar a existência do purgatório para mentes céticas; mas para torná-lo mais conhecido aos fiéis piedosos, que acreditam com fé divina neste dogma revelado por Deus. É a eles que este livro se dirige por princípio, a fim de dar-lhes uma ideia menos confusa do purgatório; diria uma ideia mais real do que normalmente se tem, projetando-se o máximo de luz possível sobre esta grande verdade da fé.

Para isso, temos três fontes de luz bastante distintas. Primeiro, a doutrina dogmática da Igreja; depois, a doutrina explicada pelos doutores da Igreja; terceiro, as revelações de santos e de aparições, que confirmam o ensino dos doutores da Igreja:

(i) a doutrina dogmática da Igreja sobre o purgatório compreende dois artigos que indicaremos a seguir no capítulo 3; esses dois artigos são de fé e devem ser acreditados por todo católico.

(ii) a doutrina de doutores e teólogos ou, de outra forma, seus pontos de vista e exortações sobre várias questões relativas ao purgatório (ver também a seguir, cap. III e seguintes) não devem ser incorporados como artigos de fé; podem ser passíveis de não aceitação sem capitulação da fé católica. No entanto, seria imprudente, até mesmo temerário, afastar-se deles, pois é inerente ao espírito da Igreja seguir as explanações comumente ensinadas pelos doutores da Igreja.

(iii) as revelações dos santos, também chamadas revelações particulares, não pertencem ao depósito da fé confiado por Jesus Cristo à sua Igreja; são fatos históricos baseados em testemunhos humanos. É permitido acreditar neles e a piedade encontra neles um alimento salutar. Também podemos não acreditar neles sem pecar contra a fé; mas, se foram autenticados pela Igreja, não podem ser rejeitados sem ofender a razão: porque a justa razão ordena a todo homem dar o devido assentimento à verdade, quando ela for suficientemente demonstrada.

Para lançar mais luz sobre este assunto, vamos primeiro explicar a natureza das revelações de que estamos falando. As revelações particulares são de dois tipos: uma consiste em visões, a outra em aparições. São chamadas particulares porque, ao contrário daquelas descritas na Sagrada Escritura, não fazem parte da doutrina revelada a todos os homens, e não são propostas pela Igreja para que sejam acreditadas como dogmas de fé.

As próprias visões constituem luzes subjetivas que Deus derrama na inteligência de uma criatura para descobrir os seus mistérios. Essas são as visões dos profetas, de São Paulo, de Santa Brígida e de muitos outros santos. As visões geralmente ocorrem em estado de êxtase: consistem em certos eventos extraordinários que se apresentam aos olhos da alma e que nem sempre devem ser considerados literalmente. Frequentemente, constituem mais figuras ou imagens simbólicas que representam, em escala proporcional à nossa compreensão, coisas que são puramente espirituais e das quais a linguagem humana é incapaz de expressar em medida adequada. 

As aparições ao contrário constituem, quase frequentemente, fenômenos objetivos, que têm um objeto externo real. Assim foi a aparição de Moisés e Elias no Tabor, a de Samuel evocada pela Pitonisa de Endor, a do anjo Rafael a Tobias, a de muitos outros anjos; enfim, estas são também as aparições de almas no purgatório. Que os espíritos dos mortos às vezes aparecem aos vivos é um fato que não pode ser negado. O Evangelho não evoca isso claramente? Quando Jesus ressuscitado apareceu pela primeira vez aos discípulos reunidos, eles pensaram que viam um espírito. O Salvador, em vez de dizer a eles que os espíritos não aparecem, lhes fala nos seguintes termos: 'Por que estais perturbados, e por que essas dúvidas nos vossos corações? Vede minhas mãos e meus pés, sou eu mesmo; apalpai e vede: um espírito não tem carne nem ossos, como vedes que tenho' (Lc 24, 38- 39).

As aparições das almas que estão no purgatório acontecem com frequência. Elas ocorrem em grande número na vida dos santos e, às vezes, até mesmo na vida de fiéis comuns. Reunimos e apresentamos ao leitor aqueles fatos que nos parecem mais adequados para instruí-lo ou edificá-lo. Mas - pode-se argumentar - estes fatos são historicamente verdadeiros? Nós escolhemos então os que foram mais comprovados¹. Mas se algum leitor não ficar convencido ou encarar com ceticismo alguns deles, pode desconsiderá-los sem problemas. Porém, no sentido de não se adentrar em uma severidade excessiva que beira a descrença, impõe-se ressaltar que, falando genericamente, aparições de almas do Purgatório ocorrem e isso não pode ser negado e nem mesmo que estas aparições não ocorram frequentemente. 

¹ É na vida dos santos, honrados como tais pela Igreja, bem como de outros ilustres servos de Deus, que reunimos a maioria dos fatos que citamos. O leitor que quiser verificar esses fatos e avaliá-los pelo seu valor justo, poderá, sem dificuldade, recorrer às primeiras fontes com o auxílio de nossas indicações. Se o relato for tirado da vida de um santo, indicamos o dia em que seu nome está marcado no martirológio, o que basta para se consultar a Acta Sanctorum. Se falarmos de qualquer outra pessoa venerável, como Pe. José de Anchieta², apóstolo do Brasil, cuja vida não está incluída nos volumes dos Bollandistas³, tivemos que recorrer a biografias ou obras específicas. Para os exemplos tomados da obra 'Merveilles Divines dans les Ames du Purgatoire', do Pe. Rossignoli, nos limitamos a mencionar o número indicado no 'Merveilles', uma vez que o autor indicou uma ou mais fontes de sua própria pesquisa.
² São José de Anchieta, canonizado em 03 de abril de 2014
³ associação de especialistas religiosos na elaboração da biografia dos santos (Acta Santorum)

'Esses tipos de aparições' - diz Ribet - 'não são raros'. Deus os permite para o alívio das almas, que vêm até nós para despertar a nossa compaixão, e também para nos fazer compreender quão terríveis são os rigores da sua justiça contra faltas que podemos considerar como insignificantes. São Gregório, em seus 'Diálogos', relata vários exemplos, cuja autenticidade plena podemos, é verdade, contestar, mas que, na boca do santo Doutor, pelo menos provam que ele acreditava na possibilidade e na existência real desses fatos. Muitos outros autores, não menos louváveis ​​do que São Gregório pela santidade e pela ciência, relatam fatos semelhantes. Além disso, histórias desse tipo abundam na vida dos santos: para se convencer disso, basta acessar as fichas da Acta Sanctorum (RibetLa mystique divine, distinguée des contrefaçons diaboliques et des analogies humaines - Paris, Poussielgue).

A Igreja Padecente sempre implorou pelos sufrágios da Igreja na terra; e este convívio, marcado pela tristeza mas também eivado de instrução, constitui, por um lado, uma fonte inesgotável de alívio e, por outro, um poderoso estímulo à santidade. A visão do purgatório foi concedida a várias almas santificadas. Santa Catarina de Ricci descia ao purgatório em espírito todos os domingos à noite; Santa Lidwina, durante os seus êxtases, adentrou neste lugar de expiação e, conduzida por seu anjo da guarda, visitou as almas em seus tormentos. Um anjo conduziu também o bem aventurado Osanne de Mântua por esses abismos escuros. A bem aventurada Verônica de Binasco, Santa Francisca de Roma e muitos outros receberam visões muito semelhantes, com as mesmas impressões de terror.

Mais frequentemente, são as próprias almas sofredoras que se dirigem aos vivos e clamam por sua intercessão. Várias apareceram assim à bem aventurada Margarida Maria Alacoque⁴ e a uma multidão de outras figuras sagradas. As almas dos defuntos imploravam frequentemente a piedade de Dênis, o Cartuxo. Um dia perguntamos a este grande servo de Deus quantas vezes essas pobres almas lhe apareceram? 'Oh, centenas e centenas de vezes!'- respondeu ele.

⁴ Santa Margarida Maria Alacoque, canonizada pelo papa Bento XV em 1920.

Santa Catarina de Sena, para poupar o seu pai das dores do purgatório, ofereceu-se à justiça divina para sofrer em seu lugar durante a vida. Deus atendeu a sua oferta e a infligiu desde então com dores excruciantes até a sua morte, e acolheu a alma do seu pai na glória. Em troca, essa alma abençoada frequentemente aparecia para a filha, para agradecê-la e para fazer a ela inúmeras revelações.

As almas do purgatório, quando aparecem aos vivos, sempre se apresentam numa atitude que excita a compaixão, às vezes com feições que tiveram em vida ou na morte, com rosto triste e olhares suplicantes, com roupas de luto, com expressão de extrema dor; às vezes, porém, como uma luz, uma nuvem, uma sombra ou alguma figura fantástica, acompanhada de um sinal ou de uma palavra que os permite reconhecer. Em outras ocasiões, elas indicam a sua presença por meio de gemidos, soluços, suspiros, respiração ofegante ou murmurações aflitivas. Frequentemente aparecem envolvidas por chamas. Quando falam, é para expressar o seu sofrimento, para deplorar as suas faltas passadas, para pedir sufrágios ou mesmo para reprovar aqueles que deveriam ajudá-los. 

'Outro tipo de revelação', acrescenta o mesmo autor, 'dá-se por meio de batidas invisíveis que os vivos percebem: batidas à porta, som de correntes, som de vozes. Esses fatos são demasiado frequentes para serem questionados: a única dificuldade é estabelecer a relação direta deles com o mundo da expiação. Mas quando tais manifestações ocorrem com a morte de pessoas que nos são queridas e então cessam, após serem feitas orações e reparações a Deus em nome delas, não nos parece razoável perceber por que estas almas nos dão a conhecer os seus sofrimentos?

Nestes vários fenômenos que acabamos de assinalar, reconheceremos a ação das pobres almas do purgatório. Mas há um caso em que a aparição deve ser considerada suspeita: é quando um pecador escandaloso, inesperadamente surpreendido pela morte, vem implorar as orações dos vivos para serem libertados do purgatório. O demônio está inclinado a nos fazer acreditar que uma alma pode viver na maior iniquidade até a morte e, ainda assim, escapar do inferno. Porém, mesmo nesses encontros, não é proibitivo imaginar que a alma que se manifesta se arrependeu retamente e que se encontra nas chamas da expiação temporária, nem, portanto, se deve deixar de orar por ela; mas é aconselhável atentar com a maior reserva sobre esses tipos de visões e sobre o crédito que elas possam ter (Ribet, Mystique Divine, tomo II, cap. X).

Os detalhes que acabamos de explicitar são suficientes para justificar aos olhos do leitor a citação dos fatos que encontrará no decorrer desta obra. Acrescentemos que o cristão deve ter cuidado para não ser muito incrédulo em fatos sobrenaturais, que estão relacionados com os dogmas de sua fé. São Paulo diz-nos que a caridade acredita em tudo (I Cor 13,7), isto é, como nos explicam os intérpretes, tudo o que se pode crer com prudência não pode ser prejudicial à nossa fé. 

Se é verdade que a prudência condena a credulidade cega e supersticiosa, também é verdade que devemos evitar outro excesso, aquele que o Salvador censura no apóstolo São Tomé: 'Creste, porque me viste. Felizes aqueles que creem sem ter visto! (Jo 20, 29) e ainda: 'Não sejas incrédulo, mas homem de fé' (Jo 20, 27). O teólogo que expõe dogmas da fé deve ser severo na escolha de suas provas; o historiador também deve proceder sob rigoroso espírito crítico na exposição dos fatos; mas o escritor asceta, quando cita exemplos e fatos para esclarecer as verdades e edificar os fiéis, não está sujeito a esse rigor estrito. Os luminares mais autorizados da Igreja, como São Gregório, São Bernardo, São Francisco de Sales, Santo Afonso de Ligório, São Belarmino e tantos outros, tão distintos pela sabedoria como pela piedade, ao escrever suas obras de excelência, nada sabiam dos requisitos formais dos nossos tempos - que, de forma alguma, constituem propriamente um progresso.

Com efeito, se o espírito dos nossos pais na fé era mais simples, qual a causa que fez desaparecer entre nós esta simplicidade de outrora? Não é esse o racionalismo protestante que contamina em grande escala os católicos de hoje? Não é esse raciocínio e espírito crítico que emergem da reforma luterana, propagada pelo filosofismo francês, que os faz considerar as coisas de Deus de uma forma completamente humana, e que os torna frios e alheios ao espírito de Deus? O venerável Louis de Blois, falando sobre as revelações recebidas por Santa Gertrudes, disse que 'Este livro contém tesouros. Homens orgulhosos e carnais' - acrescenta - 'que nada entendem do espírito de Deus, tratam os escritos da virgem Santa Gertrudes, de Santa Mechtilde, de Santa Hildegarda e outros como devaneios; porque ignoram com que familiaridade Deus se comunica às almas humildes, simples e amorosas; e como, nessas comunicações íntimas, Ele se deleita em iluminar essas almas com a pura luz da verdade, sem sombra de erros' (Louis de Blois, Epist. Ad Florentium).

Estas palavras de Louis de Blois são muito sérias. Não querendo incorrer na censura deste grande mestre da vida espiritual e buscando evitar a credulidade condenável, reunimos com certa liberdade os fatos que nos pareceram ser os mais autênticos e os mais instrutivos. Que possam aumentar em quem os lê a devoção aos fieis defuntos! E que possam imprimir profundamente nas suas almas o pensamento sagrado e salutar do purgatório!

Tradução da obra: 'Le Dogme du Purgatoire illustré par des Faits et des Révélations Particulières', do teólogo francês François-Xavier Schouppe, sj (1823-1904), 342 p., tradução pelo autor do blog)

quinta-feira, 25 de março de 2021

10 QUESTÕES SOBRE O ABORTO

(fotografia de feto com 12 semanas de gestação)

1. O direito de abortar da mãe é maior do que o direito da criança de viver?

2. A mulher torna-se mais digna por poder abortar?

3. A sociedade que defende o aborto é mais humanitária?

4, A sociedade que nega o direito de nascer respeita os direitos humanos?

5. A mulher que engravida espera um filho, mas a que aborta não mata um filho?

6. O filho gerado é gente depois de x semanas e, antes disso, é apenas um projeto de gente?

7. O aborto é mais um direito da mulher do que a vida que medra é um dever e uma responsabilidade dos pais?

8. O aborto derivado de um crime deve tornar a criança gerada automaticamente em réu de outro crime?

9. Abortar implica empoderar-se?

10. A liberdade de abortar justifica o direito de matar?

quarta-feira, 24 de março de 2021

A COMUNHÃO NA MÃO

Um artigo de reflexão dos anos 70, muitíssimo atual...


... Damos nós um exemplo: 'a comunhão na mão'. Até poucos anos atrás, era um abuso praticado por vários membros da Outra Igreja [refere-se aqui à Igreja Conciliar, aquela pós-Concílio Vaticano II], com a intenção de bem marcar uma nova e desembaraçada atitude do crente diante da Hóstia Consagrada, isto é, o Santíssimo Sacramento do altar, que, além de conferir a graça, contém o Autor da Graça.

Se essa evoluída atitude não é a de um acintoso desrespeito, que a minha Igreja [refere-se à Igreja Católica tradicional] chama de sacrilégio e profanação, só pode ser a de uma simples e translúcida falta de fé na Presença Real. Ora, quem de tal modo publica essa falta de fé está exatamente no caso dos discípulos de Jesus (Jo 6,67). Já não são católicos. Isto era assim: mas agora as autoridades da Outra Igreja, a da CNL [Conselho Nacional de Leigos, atual Conselho Nacional do Laicato do Brasil - CNLB] da CNBB, acabam de declarar que aquele abuso tornou-se evolução que eles facilmente previam e agora aprovaram*.

Quando ouvi na missa do Corpo de Deus, especialmente escolhida, delicadamente aprazada, o pobre padre anunciar palavras emanadas de um 'bispo' chamado Castro Pinto, que anunciavam a oficialização da comunhão na mão, senti-me esbofeteado por satanás. E então compreendo que aquela missa reformada é uma invenção que permite a bispos da Outra Igreja ditarem regras à Igreja de Cristo: sim, inventada, composta, reformada, especialmente para tornar confuso, ambíguo, insuportavelmente misturados dois credos inconciliáveis. Tive uma pena enorme de toda aquela pobre gente que cumpria um mandamento da Igreja (ir à missa em dia de preceito é mandamento da Igreja; não ir, é pecado. Obviamente, isso não se aplica à chamada missa nova, porque ela não é católica; e nem a autoridade que a criou) numa arapuca comandada pela Outra Igreja.

Estão ali, sentados ou de pé, apatetados, desinformados, desdoutrinados, a perder dia a dia a fé na Presença Real de Jesus. Estão ali os pobres incautos que vagamente querem ser católicos, a ouvir instruções emanadas do bispo Castro Pinto que anos atrás festejou, contra a vontade de seu superior, o 450º centenário da reforma luterana.

Amanhã, começarão nas diversas dioceses as comunhões que levarão o Corpo de Deus até à macumba, para alegria dos abades beneditinos que já acharam certo enquadramento das feitiçarias na Regra de São Bento. Hipocritamente, as autoridades fingiram proteger o uso ainda mais profano das Hóstias consagradas, recomendando que sejam consumidas no ato. Mas quem poderá evitar as fáceis escamoteações? Aliás, essa nova profanação da Hóstia levada para todos os usos imagináveis já não está na linha de uma evolução facilmente previsível?

Compreendi com uma dor lancinante que a nova missa não é apenas uma liturgia achatada ou mutilada: é realmente, como se vê, uma oportunidade de deixar os católicos à mercê de autoridades anticatólicas. A evidência se impõe: é uma ocasião de pecado para os advertidos. Há trinta anos caminho procurando acertar os passos pela presença de Jesus. Não sei como fazer para conseguir receber o Santíssimo Sacramento do Altar em templos em que a Santa Hóstia esteja fora do alcance da CNL da CNBB e das autoridades que julgam possível servir à Igreja e à anti-Igreja. 

Não posso, evidentemente, ir todos os dias a Petrópolis, Mariana, Campos ou Porto Alegre atualmente [dioceses que eram exceções em meados dos anos 70, que não são mais exceções nos dias atuais], ou outra diocese onde, com a Graça de Deus, os excelentíssimos senhores bispos resistiram e proibiram o novo abuso contra a fé na Presença Real e onde todos os católicos esperam que, com especial auxílio de Nossa Senhora de Fátima e de Nossa Senhora Aparecida, esses bispos católicos resistam e permaneçam fieis a Jesus e repilam energicamente a regra de evolução publicada em Itaici por Dom Clemente; e, assim, não podendo evidentemente colher esses frutos tão esparsos, só vejo uma saída para não me deixar levar pelos que se afastam de Jesus, na prática de tantos desrespeitos: pedir a Deus que me abrevie os dias que uma saúde ainda sólida ameaça de um incompreensível prolongamento.

* se o CNL já era assim, seria impossível a Corção imaginar o que representa hoje o tal CNLB...

(artigo publicado por Gustavo Corção, no jornal 'O Globo', de 05/06/1975, com inserção de trechos em itálico pelo autor do blog)

terça-feira, 23 de março de 2021

PALAVRAS DE SALVAÇÃO

Você encontra-se afastado dos locais de culto, mas a fé habita ainda em você. Vejamos: o que é mais importante, o lugar ou a fé? Verdadeira fé, é claro. Quem perdeu e quem ganhou nesta luta, quem guarda a sé ou quem guarda a fé? É verdade, os edifícios são bons, quando a fé apostólica é pregada a você; são santos se tudo ali acontece de maneira santa ... Vós sois felizes, vós que permaneceis na Igreja por causa da vossa fé, que conservais os seus alicerces fortes, como vos foram transmitidos pela tradição apostólica. E se algum ciúme execrável tenta sacudi-lo em várias ocasiões, não consegue. São eles que romperam com isso na crise atual. Ninguém, nunca, prevalecerá contra sua fé, amados irmãos, e acreditarmos que Deus nos fará um dia retornar às nossas igrejas. Quanto mais violentos eles se tornam para ocupar os lugares de culto, mais se separam da Igreja. Eles afirmam que representam a Igreja mas, na realidade, são eles que, por sua vez, são expulsos dela e saem do verdadeiro caminho.

(Santo Atanásio de Alexandria, exortação aos cristãos perseguidos pelos arianos)

segunda-feira, 22 de março de 2021

A VIDA OCULTA EM DEUS: DEUS CRIA O VAZIO NA ALMA


Vós, ó meu Deus, separais progressivamente a alma de tudo o que não vem de Vós. Em torno dela e em si mesma, cria-se o vazio e nada além de Vós passa a dizer alguma coisa para ela. Os seus próprios exercícios de piedade são desprovidos de qualquer encanto. Eles por si só não a satisfazem mais. Ao perceber isso, a alma se inquieta mas continua a realizá-los, embora com pouca satisfação e pouco sucesso, e não os abandona por crer que, assim, ela pode pensar e se aproximar de Vós. 

Pensar em Vós e se aproximar de Vós passa a ase uma experiência dolorosa e deliciosa para a alma. No íntimo, Vós exerceis sobre ela uma atração misteriosa da qual ela só se encontra vagamente consciente e que não permite que se dedique mais às suas orações como antes. Isso porque agora o Vosso amor a envolve suavemente e a dispõe num recolhimento totalmente novo para ela. Quão feliz ela se sente, apesar de sua inquietação! Assim ela gostaria de permanecer sempre sob esse misterioso encantamento, cuja origem e cuja natureza mal acabou de compreender. 

Se pudesse, certamente diria: Domine bonum est nos hic esse (Mt 17,40) - 'Senhor, é bom estarmos aqui'. E assim, quando o encanto se desfaz, seu maior desejo é desfrutá-lo novamente. Vós, porém, geralmente não concedeis de imediato tal desejo. Entretanto, se a alma souber salvaguardar-se nesse recolhimento interior, Vós não tardareis a visitá-la outra vez. Então volvereis mais frequentemente e cada vez permanecereis mais tempo. Ah se pudésseis ficar o tempo todo...

Mas por que não? Não é esse o Vosso desejo, ó meu Deus, e o fim que perseguis constantemente, apesar das inquietações e das resistências mais ou menos conscientes da alma? Você sois a felicidade plena e quereis que toda criatura seja capaz de comungar o mais cedo possível das Vossas bem-aventuranças! Esperar pelo fim da vida é esperar por demais o Vosso amor. E é por isso que o Vosso amor invade aos poucos a alma fiel. Começa por apreender a sua vontade, o poder de amar e, depois, todas as demais  faculdades, para uni-las numa coisa só ou pelo menos para não permitir que a perturbem. E se for necessário para os seus desígnios, busca imobilizar os próprios sentidos para que a alma, por causa do que bem espiritual maior que possui, possa doar-se em todo o seu amor.

Vós restituireis a harmonia mais tarde, quando tiverdes feito a conquista total e quando a alma e Vós se tornarem dois seres, unidos em um único espírito e em um único amor. Esta será a hora da união perfeita e permanente. Vós vivereis no íntimo da alma e a alma viverá em Vós com a sua própria vida. E depois disso não haverá mais nada que não seja o Céu.

(Excertos da obra 'A Vida Oculta em Deus', de Robert de Langeac; Parte II -  A Ação de Deus; tradução do autor do blog)

domingo, 21 de março de 2021

EVANGELHO DO DOMINGO

  

'Criai em mim um coração que seja puro' (Sl 50)

 21/03/2021 - Quinto Domingo da Quaresma

17. A GLORIFICAÇÃO DE JESUS 


Aproxima-se a consumação do sacrifício de Jesus na Paixão e Morte de Cruz. E, neste cenário de antecipação do cumprimento integral de sua missão salvífica, o evangelho de hoje prenuncia que o triunfo messiânico de Jesus perpassa pela conversão dos gentios. O sinal da natureza universal deste triunfo e da aproximação da hora final de sua missão na terra estava dado, pela presença de alguns gregos (símbolo de todos os gentios) que queriam 'ver Jesus' (Jo 12, 21), no sentido de não apenas conhecer, mas também de aceitar e viver em plenitude a doutrina cristã.

Eis definida, então, num episódio aparentemente pouco relevante da subida daqueles gregos até Jerusalém, a revelação contundente da proximidade do calvário e, com ela, da manifestação da glorificação do Filho do Homem, ratificada prontamente pelo Mestre: 'Chegou a hora em que o Filho do Homem vai ser glorificado' (Jo 12, 23). A morte próxima de Jesus é prenunciada neste momento como um triunfo da glória de Deus, como expressa claramente logo na sequência: 'quando for elevado da terra, atrairei todos a mim. Jesus falava assim para indicar de que morte iria morrer' (Jo 12, 32 - 33).

A correlação direta entre sacrifício e glorificação é ensinada por Jesus pelo exemplo da semente que deve morrer para produzir muitos frutos: 'Em verdade, em verdade vos digo: Se o grão de trigo que cai na terra não morre, ele continua só um grão de trigo; mas, se morre, então produz muito fruto' (Jo 12, 24). A glória perpassa pelo sacrifício, a vida humana nada mais é que uma estreita via de sofrimentos e tribulações rumo à pátria celeste; morrer para o mundo traduz a percepção cristã da debilidade da semente que morre, não apenas para não sucumbir às paixões humanas, mas para produzir frutos de salvação: 'Quem se apega à sua vida, perde-a; mas quem faz pouca conta de sua vida neste mundo, conservá-la-á para a vida eterna' (Jo 12, 25).

Jesus, diante a proximidade de sua hora final na terra, contempla, à luz da ciência divina, a vitória final da Cruz sobre as forças do mal ('julgamento do mundo'), na proclamação universal da sua Palavra e da conversão futura dos gentios. E, como a glória de Cristo é a glória do Pai, Jesus assim o manifesta: 'Pai, glorifica o teu nome!' (Jo 12, 28) e, de imediato, assim o faz também o Pai: 'Então veio uma voz do céu: Eu o glorifiquei e o glorificarei de novo!' (Jo 12, 28). Assim, pela terceira vez, Deus Pai glorifica o seu Filho (a primeira tinha sido no batismo de Jesus e a segunda, na transfiguração do Senhor); desta vez, como manifestação dirigida a todos os homens, povos, raças, nações e gentios, como revelação antecipada dos frutos da Paixão e do Triunfo e Glória do Verbo Encarnado.

sábado, 20 de março de 2021

OS SINAIS EXTERNOS DAS APARIÇÕES DE FÁTIMA


No contexto das aparições de Nossa Senhora em Fátima, são pouco conhecidos um grande número de fenômenos físicos que foram compartilhados por numerosas testemunhas destes eventos. Assim, não apenas os videntes, mas muitas outras pessoas, presentes ou mesmo algo distantes dos locais das aparições, puderam perceber ou sentir os sinais extraordinários da manifestação singular da presença sobrenatural da Mãe de Deus em Fátima. E estas testemunhas foram muitas: cerca de 50 na segunda aparição, entre 3000 e 4000 na terceira, umas 20.000 na quarta, 25000 a 30.000 na quinta e cerca de 70.000 na última aparição, quando ocorreu o sinal visível mais portentoso e extraordinário de todos, conhecido como o milagre do sol.

Estes sinais exteriores foram muitos, dentre eles os seguintes:

(i) relâmpagos e trovões, mesmo com céu limpo: os relâmpagos antecediam as aparições; os trovões ocorriam no momento preciso da aparição ou no seu termo, e pareciam provir da azinheira;

(ii) curvatura dos galhos da azinheira, como afetado por um peso e um manto  que a cobria, de forma a empurrar e inclinar todas as folhas numa mesma direção (segunda aparição);

(iii) exalação de um perfume novo e desconhecido, com origem no arbusto da azinheira, sentido pela senhora Maria Rosa e demais presentes próximos, durante a quarta aparição;

(iv) aparição de um globo luminoso e iridiscente no céu, deslocando-se ordenadamente no sentido de leste para oeste e depois projetando-se em descida suave, até tocar a azinheira (quinta aparição);

(v) presença de uma nuvem branca, às vezes matizada, de aspecto singular, envolvendo a azinheira e os videntes como uma névoa e fluindo em sentido ascendente até cerca de cinco ou seis metros de altura até desvanecer, repetindo-se o processo por três vezes bem distintas (quinta aparição);

(vi) chuva evanescente de pétalas de rosas brancas, aparecendo e desaparecendo em sequência contínua, deslizando suavemente no ar e que tendiam a ficar cada vez menores à medida que se aproximavam do chão, quando se desvaneciam por completo (quinta aparição); 

(vii) diminuição visível e significativa da luz solar (em pleno meio dia, com céu limpo e sem eclipses), tornando também visíveis a lua e as estrelas (segunda até a quinta aparições);

(vii) milagre do sol, que, segundo os testemunhos, constou de três fases bem distintas: primeiro, o sol tornou-se opaco e em tons rosados, passível de visualização direta e continuada sem quaisquer dificuldades; em seguida, passou a cintilar com irradiações de cores diversas, com movimentos de rotação intensa e emitindo feixes irisados e irradiados pelo céu, como explosões de fogos-de-artifício; por último, apresentou um movimento vertiginoso do disco solar, em grau crescente e simulando precipitar-se contra a terra, apresentando, a seguir, movimentos de translação lineares ou irregulares por todo o espaço celeste.