terça-feira, 9 de fevereiro de 2016

O PECADO DO ESCÂNDALO

Umas das coisas que mais afligiram o Coração de Jesus, durante a sua vida terrestre, e que haviam de afligi-lo ainda no céu, se ali houvesse tristeza, é o pecado de escândalo. Para compreender isso, devemos considerar quão cara é a Deus cada alma de nossos próximos. Criou-as ele à sua imagem e semelhança (Gn 1, 26), e amando-as desde a eternidade, criou-as para que fossem rainhas no paraíso, onde há de torná-las participantes de sua própria felicidade e dar-se-lhes a si mesmo em galardão: Ego ero merces tua magna nimis (Gn 15, 1) ― 'Eu serei o teu galardão infinitamente grande'.

Depois, o que não tem feito, o que não tem padecido o Verbo encarnado por amor dessas almas, para remi-las da escravidão do demônio, na qual caíram pelo pecado? Chegou a nada menos do que a dar por elas o seu sangue e a sua vida. se, em vez de uma só morte, seu Pai lhe tivera exigido mil; se, em vez de ficar três horas na cruz, tivera de ficar nela até o dia do juízo; se afinal tivera de sofrer para salvação de cada um, o que padeceu para salvação de todos os homens juntos, Jesus Cristo não teria hesitado em fazer tanto. Tão grande é o amor que ele tem às almas. ― Julgai por aí, quão amargo desgosto causam ao Coração de Jesus os escandalosos, que lhe fazem perder tantas almas, roubam-lhe e assassinam tantas filhas tão diletas. Diz São Bernardo, que a perseguição que o Senhor sofre da parte daqueles pérfidos algozes, é mais cruel do que a que sofreu da parte dos que o crucificaram.

Tendo os filhos de Jacó vendido a José, apresentaram ao pai a túnica deste tingida no sangue de um cabrito, dizendo-lhe: Vide utrum tunica filii tui sit (Gn 37, 32) ― 'Vê se é ou não a túnica do teu filho'. Do mesmo modo nos podemos figurar que, quando uma pessoa peca, induzida ao pecado por um escandaloso, os demônios apresentam a Deus o vestido daquela pessoa, tingida do sangue de Jesus Cristo, isto é, a graça perdida por aquela alma escandalizada. Se Deus pudesse chorar, choraria então mais amargamente do que Jacó, dizendo: Fera pessima devoravit eum (Gn 37, 33) ― 'Uma fera péssima a devorou'.

Afim de não afligirmos mais o Coração de Jesus, guardemo-nos, especialmente nestes dias, de darmos ao próximo qualquer escândalo ou mau exemplo, não somente em coisas graves, senão também nas leves. Abstenhamo-nos sobretudo e sempre de toda palavra que possa ofender a bela virtude, lembrando-nos que uma palavra indecente, muito embora dita de gracejo, pode ser causa de mil pecados. ― Se no passado tivemos a desgraça de dar, de qualquer modo, ao próximo ocasião de pecado, saibamos que o Coração aflito de Jesus exige de nós uma rigorosa satisfação, reparando ao menos pelo bom exemplo o mal que fizemos.

Meu amabilíssimo Jesus, eu também sou um daqueles desgraçados cujo mau exemplo encheu de amargura o vosso divino Coração. Ah Senhor! como pudestes sofrer tanto por mim, prevendo as injúrias que Vos havia de fazer? Mas já que me suportastes até este momento, e quereis a minha salvação, dai-me uma grande dor de meus pecados, uma dor que iguale à minha ingratidão.

Senhor, odeio e detesto sumamente os desgostos que Vos causei. Se no passado desprezei a vossa graça, agora estimo-a mais do que todos os reinos da terra. Amo-Vos, Jesus, meu Deus, amo-Vos sobre todas as coisas, e de todo o meu coração. Não quero mais viver senão para Vos amar e fazer que os outros também Vos amem. Vós mesmo abrasai-me cada vez mais em vosso amor, lembrando-me sempre, quanto fizestes e padecestes por mim. ― A mesma graça, peço a vós, ó Maria! Suplico-vos que a alcanceis por mim, pela dor que o vosso divino Filho sentiu e que vós mesma sentistes pela previsão dos escândalos do mundo. 

Excertos da obra 'Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo Primeiro: Desde o primeiro Domingo do Advento até Semana Santa' de Santo Afonso Maria de Ligório. 

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2016

'TOME A SUA CRUZ!'


'Se alguém quiser seguir-Me, renuncie a si mesmo, tome a sua cruz e siga-Me' (Mt 16,24). Parece dura e pesada a ordem do Senhor: quem quiser segui-Lo, tem que renunciar a si mesmo. Mas não é duro nem pesado quem ordena, pois Ele próprio nos ajuda a cumprir o Seu preceito. Assim como é verdade o que Lhe dizem no salmo: 'Seguindo as palavras dos vossos lábios, percorri duros caminhos' (Sl 16,4), também é verdade o que Ele nos disse: 'O meu jugo é suave e meu fardo é leve' (Mt 11,30). A caridade torna leve tudo quanto é duro no preceito.

Que significa: 'Tome a sua cruz'? Quer dizer: suportar tudo o que custa, e então segui-Lo. Na verdade, quem começar a seguir os seus exemplos e preceitos, encontrará muitos que o critiquem, que o impeçam, que tentem dissuadi-lo, mesmo entre os que parecem discípulos de Cristo. Andavam com Cristo os que proibiam os cegos de clamar por Ele. Tu, portanto, no meio das ameaças, de carinhos ou proibições, sejam quais forem, se quiseres seguir a Cristo, transforma tudo em cruz: suporta, carrega e não desistas!

(...)

Esta palavra não deve ser ouvida como dirigida apenas às virgens e não às esposas; nem só para as viúvas e não para as casadas; nem só para os monges e não para os maridos; nem só para os clérigos e não para os leigos. Pois toda a Igreja, todo o corpo, todos os seus membros, diferentes e distribuídos segundo suas próprias tarefas, devem seguir Cristo.

Siga-O toda a Igreja que é uma só, siga-O a esposa, redimida e dotada pelo sangue do Esposo. Nela encontra lugar tanto a integridade das virgens como a castidade das viúvas e o pudor dos casais. Estes membros, que nela encontram o seu lugar, sigam Cristo, cada um segundo a sua vocação, posição ou medida.

Renunciem a si mesmos, isto é, não se vangloriem; tomem a sua cruz, quer dizer, suportem no mundo, por amor de Cristo, tudo o que lançarem contra eles. Amem o único que não ilude, o único que não é enganado nem engana; amem-nO, porque é verdade aquilo que promete. Como as suas promessas tardam, a fé vacila. Mas sê constante, perseverante, suporta a demora e terás tomado a tua cruz.

(Dos Sermões de Santo Agostinho)

domingo, 7 de fevereiro de 2016

'AVANÇA PARA ÁGUAS MAIS PROFUNDAS!'

Páginas do Evangelho - Quinto Domingo do Tempo Comum


'Avança para águas mais profundas' (Lc 5,4). A orientação imperativa de Jesus aos pescadores, às margens do Lago de Genesaré, é um clamor que reverbera a todos os homens de todos os tempos. Que os filhos de Deus manifestem, além dos horizontes estreitos de sua religiosidade comum, a vocação de autênticos apóstolos, movidos na plenitude do amor e da generosidade de corações verdadeiramente cristãos. Não nos basta sermos artífices da graça de Deus em nós; neste quinto domingo do Tempo Comum, Jesus nos convoca a sermos missionários das graças de Deus para a salvação de muitos.

Após uma noite de duro trabalho totalmente infrutífero, os pescadores exaustos sabiam e tinham razões mais do que suficientes para julgar que o pedido de Jesus seria inútil. Com toda a experiência acumulada de anos de pesca naquelas águas, da pescaria mais adequada sob a luz noturna, voltar às águas à luz da manhã parecia um despropósito completo. Pedro, no entanto, abre mão do seu conhecimento especializado e do seu juízo dos fatos, em obediência e em generosa confiança às palavras do Mestre: 'Mestre, nós trabalhamos a noite inteira e nada pescamos. Mas, em atenção à tua palavra, vou lançar as redes' (Lc 5, 5). Naquele pescador de lida bruta, Jesus divisou a alma do verdadeiro apóstolo! E o milagre dos peixes antecipou o milagre da salvação dos homens. 

Quanto trabalho e esforço em vão dispensaram tantos pescadores naquela noite sem resultados... E, certamente, eles eram os mais preparados e os mais qualificados para a tarefa. Não são assim as práticas daqueles que se vêem em suas obras? Que partilham com os outros sua diligência e disponibilidade como senhores dos seus dons? E, por mais que julguemos tais obras meritórias do ponto de vista das concepções humanas, são apenas trabalho e esforço vão de pescadores qualificados e disponíveis. Porque foi o próprio Cristo quem nos alertou: 'Sem mim, nada podeis fazer' (Jo, 15,5). E nada é nada mesmo. Sem a reparação infinita por Jesus Cristo, qualquer atitude nossa, por maior que seja sua relevância e excepcionalidade, torna-se meramente figurativa e essencialmente insignificante, porque moldada na superficialidade dos valores humanos. 

Eis porque se impõe o avanço confiante às águas mais profundas, para ir ao encontro de tantos que estão perdidos no submundo das drogas, do aborto e do hedonismo, nas trevas do pecado, submersos na orgia das consciências destes tempos de carnaval, na miséria do ateísmo e da indiferença religiosa. Em águas profundas, com Cristo, por Cristo e em Cristo, um nosso ato de generosidade confiante é capaz de produzir prodígios, um nosso ato de amor tem o poder de operar milagres! E, feitos apóstolos dos nossos dias, como Pedro e os homens à beira do Lago de Genesaré, poderemos ser também pescadores de homens! E, como eles, seremos aqueles outros que 'levaram as barcas para a margem, deixaram tudo e seguiram a Jesus' (Lc 5,11).

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2016

A SANTIFICAÇÃO DOS TEMPOS DE CARNAVAL

ARQUIVOS DO SENDARIUM
(publicado originalmente no blog em 09/02/2013)


Se a alma cristã compreendesse, na sua verdadeira agonia, o que o pecado produz nas coortes divinas, teria o zelo dos santos e um horror desmedido a praticar ainda que fosse a mais leve ofensa a Deus. No carnaval, o desprezo e as injúrias às coisas sagradas são levadas até às últimas consequências, aos últimos limites e a nudez, o prazer e o hedonismo mais escancarado são colocados nos altares da insensatez humana, como um tributo e idolatria aos instintos e às paixões humanas mais desregradas. 

E, em meio a loucuras e deboches morais cada vez mais incrementados, prega-se como atributo da dignidade e da cidadania, os valores de tolerância e do discernimento para se lidar com o 'livre pensar' alheio. Pode-se prescindir ao máximo de tolerância com os princípios cristãos, mas há que se criar modelos de restrições e imposições severas a todos que não compartilham da mundanidade mais descabida, da miséria humana mais exacerbada, do aniquilamento das referências morais mais autênticas, da conspurcação da fé.

Não há carnaval católico, porque não há alegria cristã no pecado. Não há santo carnaval, porque você não vai encontrar Jesus sob serpentinas e paetês, porque Ele não percorreu a via dolorosa do Getsêmani ao Calvário há dois milênios para o encontrar nestes quatro dias de ócio e de folia. Aquelas gotas de sangue são o testemunho da tortura mental imposta pelos pecados dos homens de todos os tempos e como eles se espalham como enxames de abelhas nestes tempos do carnaval! 

É mister que sua alma cristã diga não à vertigem coletiva, ao desvario de tantos. E sua resposta não pode ficar limitada ao isolamento do burburinho ou ao descanso dos acomodados. Mais do que nunca, torna-se imperativa a santificação desse tempo de carnaval. Seja num retiro espiritual, seja no anonimato de sua pequena oração diante o Santíssimo, seja pela intercessão junto à Virgem Maria, rezemos em desagravo a tantos pecados cometidos nesta época, particularmente pela omissão e covardia daqueles que estão consagrados a Deus pelo batismo, pela confirmação, pela devoção sacramental, missionária ou religiosa. 

Rezemos pela santificação dos tempos de carnaval. Rezemos pelos homens e mulheres que padecem as falsas alegrias do pecado. Rezemos pelos insensatos que buscam nas ruas festivas e ensurdecedoras um calvário feito de purpurinas. E que esta torrente de graças, tangidas pelo desagravo, expiação e perdão de tantos pecados de agora, seja a fonte de redenção para muitos em outros carnavais.

terça-feira, 2 de fevereiro de 2016

A LOTERIA DE SÃO JOÃO BOSCO

Um homem pobre ouviu falar das maravilhas e dos milagres realizados por São João Bosco e correu à sua procura para lhe perguntar algo muito importante: a fórmula para se ganhar na loteria. Queria que o santo lhe dissesse que números devia escolher ao comprar o bilhete.

São João Bosco meditou por um tempo e lhe respondeu com segurança: 'os números que você deve jogar para ganhar na loteria são 10, 7 e 14; pode jogá-los em qualquer ordem que, mesmo assim, você ganhará!'. O homem se encheu de alegria e se despediu apressado para ir correndo comprar o bilhete.

O santo, porém, tomando-lhe pelo braço, disse sorridente: 'um momento, que ainda não lhe expliquei bem os números que você deve jogar e qual loteria ganhar'. O número 10 significa que você deve cumprir sempre os Dez Mandamentos; o número 7 significa que você deve receber com frequência os sacramentos e 14, é o número que você deve praticar para cumprir as 14 obras de misericórdia, tanto as corporais como as espirituais. 

Se você cumprir estas três condições: observar os mandamentos, receber bem os sacramentos e praticar as obras de misericórdia, ganhará a mais estupenda de todas as loterias: a glória eterna do céu'. O homem compreendeu a lição e, com o dinheiro do bilhete, foi dar esmola em um asilo.

E você, já jogou estes números hoje?

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2016

UMA FOTOGRAFIA DE JESUS?


Suposta fotografia de Jesus, tirada pela freira queniana Anna Hadija Ali (1966 - 2012), vidente que teria recebido aparições e mensagens de Jesus no período entre 1987 e 1991.


Comparação da suposta fotografia tirada pela freira queniana com um desenho do rosto de Jesus que teria sido feito por um artista húngaro chamado Semiechen, de divulgação bastante difundida em período prévio à Primeira Guerra Mundial (1914 - 1918).

Utilizando recursos gráficos na foto à esquerda (realizados pelo autor do blog), ficam evidentes as semelhanças e a equivalência entre ambas as figuras.


Felizes aqueles que creem sem ter visto! (Jo 20, 29)

domingo, 31 de janeiro de 2016

O GRANDE MILAGRE DE JESUS EM NAZARÉ

Páginas do Evangelho - Quarto Domingo do Tempo Comum


A dimensão messiânica de Jesus tinha acabado de ser revelada aos moradores da aldeia de Nazaré, onde Jesus vivera até a juventude, como o filho do carpinteiro (evangelho do domingo anterior). Quase ao término do segundo ano de sua pregação pública e após o batismo por João, Jesus retorna às suas origens para proclamar aos seus conterrâneos que Ele é o Messias prometido das Escrituras. E aí vai experimentar, se não pela primeira vez, talvez a rejeição mais dolorosa, pois oriunda daqueles que lhe eram mais próximos, mais conhecidos, que com Ele conviveram cotidianamente por quase trinta anos. 

Jesus havia aberto o livro profético de Isaías nas passagens relativas às previsões messiânicas (Is 61, 1ss). Na sua oratória, embora não se tenha transcrição alguma do conteúdo de sua fala, Jesus certamente teria explicado, com suma riqueza de doutrina e de detalhes, o texto do profeta, como se pode depreender do testemunho do evangelista: 'Todos davam testemunho a seu respeito, admirados com as palavras cheias de encanto que saíam da sua boca' (Lc 4,22). À margem o tesouro da doutrina exposta, aquele evento proclamara a chegada do Ungido, do Messias revelado pelos tempos nas Sagradas Escrituras. E a portentosa revelação fôra proclamada pelas palavras finais do Mestre: 'Hoje se cumpriu esta passagem da Escritura que acabaste de ouvir' (Lc 4, 21).

Mas os seus, ainda que admirados de sua pregação e oratória, não vão entendê-Lo. Eles O têm apenas no espectro da perplexidade e de certa admiração e querem ser testemunhas de desmedidos milagres, de feitos muito mais extraordinários daqueles ocorridos em Cafarnaum e por toda a Galileia. Para os homens de Nazaré daquele tempo, faltou a caridade e sem a caridade (conforme 1 Cor 13, 1-13), tudo se torna incomensuravelmente vão. Jesus foi para eles apenas uma sombra de admiração, tolhida pela incredulidade e covardia de tantos que preferiram, por puro preconceito, perder o convite à plena conversão. Da certeza de que um profeta não é bem recebido em sua terra (Lc 4, 24), Jesus vai revelar publicamente na sinagoga a dureza daqueles corações.

Movidos pelo ódio, e por ódio diabólico, agarraram Jesus não apenas com o intuito de expulsar o filho do carpinteiro da pequena aldeia, mas de matar o Salvador, atirando-o do alto de um precipício às portas da cidade. Dominado pela turba enfurecida e em frenesi para cometer um crime dantesco, Jesus manifestou-lhes certamente o extraordinário milagre que queriam ver. Mais tarde, Jesus iria aceitar com submissão o ódio dos homens na sua Paixão e Morte de cruz. Mas ali, ainda não chegara a sua hora. Sob o influxo de sua divindade, Jesus fez calar naqueles homens todos os espíritos ensandecidos e reduziu à impotência os seus frêmitos de ira e 'passando pelo meio deles, continuou o seu caminho' (Lc 4, 30).