'E do alto lançaste a mão e desta profunda escuridão arrancaste a minha alma, chorando por mim minha mãe, Tua fiel, diante de Ti, mais do que choram as mães nas exéquias do corpo. Ela via a minha morte na fé e no espírito que recebera de Ti, e Tu ouviste-a, Senhor, ouviste-a e não desprezaste as suas lágrimas, quando irrigavam profusamente a terra debaixo dos seus olhos em todo o lugar da sua oração: ouviste-a.
Pois donde veio aquele sonho com que a consolaste, para que acedesse a viver comigo e a ter comigo a mesma mesa em casa? O que começara por não querer, repudiando e detestando as blasfêmias do meu erro. Viu, com efeito, de pé, numa espécie de régua de madeira, um jovem que vinha em direção a ela, resplandecente, alegre e sorrindo-lhe, estando ela acabrunhada e consumida pela tristeza e das suas lágrimas diárias, para informar, como é costume, não para saber, e como ela respondesse que chorava a minha perdição, ele ordenou e advertiu, para que ficasse tranquila, que reparasse e visse que, onde ela estava, estava também eu.
Quando ela reparou, viu-me ao seu lado de pé na mesma régua. Porquê isto, senão porque os Teus ouvidos estavam junto do seu coração, ó Tu, bom e onipotente, que cuidas de cada um de nós como se cuidasses de um só, e de todos como de cada um?'
(Confissões, de Santo Agostinho)