Capítulo XIV
Dores do Purgatório - Aparição de Foligno
Os Religiosos Dominicanos de Zamora
O mesmo rigor é revelado em uma aparição mais recente, envolvendo uma religiosa falecida de vida exemplar, que deu a conhecer os seus sofrimentos de uma forma calculada para inspirar terror a todas as almas. O evento aconteceu em 16 de novembro de 1859 em Foligno, próximo a Assis, na Itália. Fez muito alarde na Itália e, além da marca visível que se viu, um inquérito feito de maneira adequada e pela autoridade competente o caracterizou como fato incontestável.
No convento dos Terciários Franciscanos de Foligno constava uma irmã chamada Teresa Gesta que, durante muitos anos, foi a encarregada das noviças e, ao mesmo tempo, responsável pela sacristia da comunidade. Ela nasceu em Bastia, na Córsega, em 1797 e entrou para o mosteiro no ano de 1826. Irmã Teresa foi um modelo de fervor e caridade. 'Não precisamos ficar surpresos', disse seu diretor, 'se Deus a glorificar por algum prodígio após sua morte'. Ela morreu repentinamente, em 4 de novembro de 1859, de um ataque de apoplexia.
Doze dias depois, no dia 16 de novembro, uma irmã chamada Anna Felicia, que a sucedeu no cargo, dirigiu-se à sacristia e nela já ia entrar, quando ouviu gemidos que pareciam vir do interior da sala. Com certo receio, apressou-se em abrir a porta, mas não havia ninguém. Mas novamente ela ouviu gemidos, e tão distintamente que, apesar de sua coragem habitual, sentiu-se dominada pelo medo. 'Jesus! Maria!" ela gritou, 'o que pode ser isso?' Ela não havia acabado de falar quando ouviu uma voz queixosa, acompanhada de um suspiro doloroso: 'Ó meu Deus, como eu sofro! Oh! Dio, che peno tanto!'
A irmã, estupefata, reconheceu imediatamente a voz da pobre Irmã Teresa. Em seguida, a sala se encheu de uma fumaça espessa e o espírito da Irmã Teresa apareceu, movendo-se em direção à porta e deslizando junto à parede. Tendo alcançado a porta, ela clamou em voz alta: 'Eis aqui uma prova da misericórdia de Deus'. Dizendo essas palavras, ela bateu no painel superior da porta e deixou ali a marca de sua mão direita, queimada na madeira como se fosse um ferro em brasa. E então desapareceu.
Irmã Anna Felicia ficou como que meio morta de susto. Ela explodiu em gritos de socorro. Uma de suas companheiras acorreu de imediato e, em seguida, toda a comunidade. Elas se comprimiam ao redor dela, surpresas pela presença de um forte odor de madeira queimada. Irmã Anna Felicia contou o que havia acontecido e mostrou-lhes a terrível impressão fixada à porta. Elas imediatamente reconheceram a mão da irmã Teresa, que era notavelmente pequena. Tomadas de pavor, rumaram em direção ao coro, onde passaram a noite em oração e penitência pelos falecidos e, na manhã seguinte, todas receberam a Sagrada Comunhão para o repouso da alma da irmã falecida.
A notícia se espalhou fora dos muros do convento e muitas comunidades da cidade uniram as suas orações às dos franciscanos. Dois dias depois, em 18 de novembro, Irmã Anna Felicia, indo à noite para sua cela, ouviu ser chamada pelo nome outra vez e reconheceu imediatamente a voz da Irmã Teresa. No mesmo instante, um globo ou luz brilhante apareceu diante dela, iluminando sua cela com o brilho da luz do dia. Em seguida, ouviu Irmã Teresa pronunciar estas palavras com voz alegre e triunfante: 'Morri numa sexta-feira, dia da Paixão, e eis que, na sexta-feira, entro na glória eterna! Seja forte para carregar a sua cruz, seja corajosa para sofrer, ame a pobreza'. Em seguida, acrescentando afetuosamente 'Adieu, adieu, adieu!', ela se transfigurou e, como uma nuvem clara, branca e deslumbrante, elevou-se em direção ao Céu e desapareceu.
Durante a investigação realizada imediatamente a seguir, em 23 de novembro, na presença de um grande número de testemunhas, foi aberto o túmulo da Irmã Teresa e constatou-se que a impressão na porta correspondia exatamente à mão da falecida. 'A porta, com a marca da mão queimada' - acrescenta monsenhor Segur - 'está preservada com grande veneração no convento. A madre abadessa, testemunha do fato, teve o prazer de me mostrar ela mesma'.
Desejando assegurar-me da perfeita exatidão desses detalhes relatados por monsenhor Segur, escrevi ao bispo de Foligno. Ele respondeu dando-me um relato circunstancial, perfeitamente de acordo com o exposto acima, e acompanhado por um fac-símile da marca milagrosa. Esta narrativa explica ainda a causa da terrível expiação a que foi submetida Irmã Teresa. Depois de dizer: '“Ah! quanto eu sofro! Oh! Dio, che peno tanto!' acrescentou que foi penalizada por ter, no exercício da função na sacristia, transgredido em alguns pontos a extrema pobreza prescrita pela Regra [justificativa, entretanto, de difícil entendimento no contexto dos fatos].
De qualquer forma, vemos que a Justiça Divina pune mais severamente as menores faltas. Pode-se perguntar aqui por que a aparição, ao fazer a marca misteriosa na porta, a chamou de 'prova da misericórdia de Deus'. É porque, ao nos dar um aviso desse tipo, Deus demonstra por nós uma grande misericórdia. Ele nos exorta, da maneira muito eficaz, a ajudar as pobres almas padecentes e a estar vigilantes em relação a nós mesmos.
Neste mesmo contexto, podemos relatar um caso semelhante ocorrido na Espanha, e que causou também grandes repercussões naquele país. Fernando de Castela assim o relata em sua História de São Domingos (Malvenda, Annal. Ord. Praedic.). Um religioso dominicano levou uma vida santa em seu convento em Zamora, cidade do reino de Leão. Ele estava unido pelos laços de uma piedosa amizade com um irmão franciscano como ele, homem de grande virtude. Um dia, conversando sobre o assunto da eternidade, prometeram mutuamente que, se fosse do agrado de Deus, o primeiro que morresse deveria aparecer ao outro para lhe dar conselhos salutares.
O frade menor morreu primeiro; e um dia, enquanto seu amigo, o filho de São Domingos, preparava o refeitório, apareceu a ele. Depois de saudá-lo com respeito e carinho, disse-lhe que estava entre os eleitos mas que, antes de ser admitido no gozo da felicidade eterna, havia sofrido muito por uma infinidade de pequenas faltas das quais não havia se arrependido suficientemente durante a sua vida. 'Nada na terra', acrescentou ele, 'pode lhe dar uma ideia dos tormentos que sofri, e dos quais Deus me permite lhe dar uma prova visível'. Dizendo essas palavras, ele colocou a mão direita sobre a mesa do refeitório, e a marca da sua mão ficou gravada na madeira carbonizada como se tivesse sido aplicada por um ferro em brasa.
Essa foi a lição que o fervoroso franciscano falecido deu ao seu amigo vivo. Foi de grande proveito não só para ele, mas para todos aqueles que viram a marca impressa na madeira queimada; tão profundamente significativa porque tornou-se um objeto de piedade que as pessoas vinham de todas as partes para contemplar. 'Ainda pode ser vista em Zamora', disse o padre Rossignoli (Mervelles, 28), 'na época em que escrevo [em meados do século XVIII]; para protegê-la, a marca foi coberta por uma folha de cobre. A mesa marcada foi preservada até o final do século XVIII, sendo então destruída, durante a época das revoluções, como tantos outros memoriais religiosos.
Tradução da obra: 'Le Dogme du Purgatoire illustré par des Faits et des Révélations Particulières', do teólogo francês François-Xavier Schouppe, sj (1823-1904), 342 p., tradução pelo autor do blog)