Eu sou um leigo. Não passo de um
leigo e tenho a profunda compreensão da dimensão que me separa - homem comum -
de um sacerdote - homem nada comum. Ao me dirigir, portanto, a um sacerdote,
tenho a plena convicção de que devo me pautar por um grande respeito, pela
solicitude e por uma especial reverência. Assim procedo e me desculpo de pronto
se ousar esquecer estes princípios, ainda que alguns possam imaginar que sejam
homens tão comuns como eu.
Como homem comum, luto
cotidianamente para não ser um cristão comum. Quero ser radicalmente cristão,
como quero ser radicalmente fiel à minha esposa, à minha família, aos
princípios e convicções da minha religião. Onde está o erro em ser um cristão
radical? Ao me decidir pelo matrimônio, eu não jurei fidelidade à minha esposa
por toda a vida? Este propósito não é radicalmente bom? Um sacerdote cristão
não fez também outro tipo de decisão - e que decisão! - e, assim, não se
tornou radicalmente responsável por esta escolha? Ai dos médicos que são mais
ou menos, ai dos pais que são mais ou menos... Mas quantos destes ais poderiam
resumir os que são mais ou menos padres? Se fosse possível pensar assim, penso,
ao lembrar a passagem bíblica dos que tiveram mais e os que tiveram menos, que os sacerdotes passarão
pelo crivo do Pai, mais tangidos pela
justiça do que pela misericórdia divina...
Quanta responsabilidade a vossa,
nestes tempos difíceis, em que tudo parece submergir pelos modismos, pela
insensatez, pela correria e pelo hedonismo. Quanta insensatez que se torna
loucura e quanta loucura que se propaga como um rastilho de pólvora, levando
confusão e mais loucura. Quantos
cristãos estão à míngua, tontos, cegos, sem rumo e sem vida espiritual. Quantos
se dizem cristãos e vivem regularmente em pecado, fazem e refazem dogmas,
vagueiam por seitas e pseudo-crendices, empanturram-se de livros esotéricos e
de autoajuda, adéquam vulgarmente os sagrados ensinamentos aos seus próprios interesses e momices. Não, certamente estes cristãos não
são radicais... Mas, com certeza, estão radicalmente distantes da Una, Santa,
Católica e Apostólica Igreja!
Estou sendo radical? Como
entender, então, a ideia de se pretender adequar a Igreja aos tempos modernos,
ao mundo lá fora? Isso me parece, sem dúvida, uma insensatez radical e insensatez
radical tem por nome loucura. Mas, o que eu penso tem muito pouca importância.
O que interessa realmente é o que Vós pensais. Refleti sobre a imensa
responsabilidade vossa de pastores dos Filhos de Deus, o que cada um estais fazendo contra esta avalanche de erros doutrinários, esta balbúrdia, este
festim ecumênico e sei lá mais o quê de loucura. Coragem, padres, coragem. Não vos limiteis a fazer o que os leigos podem fazer, deveis fazer somente o que é
tarefa intrinsecamente vossa! Rezai, rezai muito e sempre. Qual é o peso da oração, da
confissão, da orientação espiritual no dia-a-dia de cada um de vós?
Sede radicais na defesa da santa
eucaristia: quantos pecados se cometem por que muitos sacerdotes não são
radicalmente intransigentes nos cuidados da santa eucaristia, na confissão, na
Santa Missa? Quem pode errar ao se prevenir radicalmente contra abusos ou
distorções da Santa Eucaristia? Velai-vos por um zelo radical à santa
eucaristia e não pelas concessões e descuidos. Mirai-vos em Nossa Senhora: que outro ser humano foi tão radicalmente fiel a Deus? E vós vos
inquietais porque vos julgam radicais...
Sacerdotes da Igreja Católica:
sede radicalmente fiéis a Cristo, ao Papa, à Santa Igreja. Sim, sede radicais, absolutamente radicais às coisas do Pai. De que adianta palavras
bonitas ou adocicadas nos sermões? Nada. A retórica do orgulho humano esvai-se
com a primeira lufada de vento. Para que serve estes obstinados afazeres para a
melhoria das condições de vida de alguns homens? Nada. Homens comuns podem
fazê-lo com mais proveito e tempo. Para que serve vossos conhecimentos
mundanos, políticos, sociais? Nada. Nem os vossos, nem os meus, nem os de homem
algum, nem os da humanidade inteira vão ponderar alguma coisa na outra vida. Oração,
oração, oração!
Sede homens radicais, sacerdotes de
Cristo! Sede radicalmente coerentes com vossa missão sacerdotal. Coragem,
coragem sempre. Ainda que homens comuns os rotulem de tantos nomes:
conservadores, ultrapassados, ortodoxos,... radicais! Sim, para a glória de
Deus e da Igreja, sede homens radicais e não homens comuns. Talvez, muitos
leigos como eu também queiram infundir-vos ânimo e coragem, compartilhar
convosco tantos dificuldades e incompreensões. Esta carta busca ser uma palavra
de coragem e de solidariedade aos sacerdotes de Cristo: por mais inútil, ela é
mais do que as mais comuns das tarefas humanas hoje em dia: a omissão, o
comodismo, a indiferença. Vós, padres, não tendes o direito de se comportar como
homens comuns! Sede radicais, sacerdotes de Cristo! Não esperais nem
consolação e nem refrigério: escolhestes a cruz e somente nela deveis pregar os
cravos de vossas dores, todas as vossas dores, junto às dores de Cristo. Que estes
cravos e que estas chagas possam ser muitos, para glória da Santa Igreja e
salvação de uma infinidade de homens comuns.
(Arcos de Pilares)