sábado, 31 de maio de 2025

O DOGMA DO PURGATÓRIO (CII)

Capítulo CII

Meios de se Evitar o Purgatório - Santa Margarida maria e as Almas Sofredoras - As Consolações de Deus para com as Almas Caridosas

Entre as revelações de Nosso Senhor a Margarida Maria sobre o Purgatório, há uma delas que mostra como são particularmente severas as punições infligidas pelas faltas contra a caridade. 'Um dia' - relata Monsenhor Languet - 'Nosso Senhor mostrou à sua serva várias almas privadas da assistência da Santíssima Virgem e dos santos e até mesmo das visitas de seus anjos da guarda; isso era em castigo por sua falta de união com seus superiores e por certos mal-entendidos. Muitas dessas almas estavam destinadas a permanecer por muito tempo em chamas terríveis. A abençoada irmã reconheceu também muitas almas que haviam vivido na religião e que, por causa de sua falta de união e caridade com seus irmãos, foram privadas de seus sufrágios e não receberam nenhum alívio'.

Se é verdade que Deus castiga tão severamente aqueles que falharam na caridade, Ele será infinitamente misericordioso para com aqueles que praticaram essa virtude tão querida ao seu Coração. Mas, antes de tudo, Ele nos diz pela boca do seu Apóstolo, São Pedro, que tenhamos uma caridade mútua constante entre nós, pois a caridade cobre uma multidão de pecados (1Pd 4,8).

Ouçamos novamente Monsenhor Languet na Vida de Margarida Maria. É o caso da Madre Grefiber, diz ele, que, nas memórias que escreveu após a morte da abençoada irmã, atesta o seguinte fato. 'Não posso omitir a causa de certas circunstâncias particulares que manifestam a verdade de uma revelação feita nesta ocasião à serva de Deus. O pai de uma das noviças foi a causa disso. Este senhor havia falecido algum tempo antes e fora recomendado às orações da comunidade. A caridade da Irmã Margarida, então Mestra das Noviças, a levou a rezar mais especialmente por ele. Alguns dias depois, a noviça foi recomendá-lo às suas orações. 'Minha filha', disse sua santa mestra - 'fique perfeitamente tranquila; seu pai já está em condições de rezar por nós. Pergunte a sua mãe qual foi a ação mais generosa que seu pai realizou antes de morrer; essa ação lhe rendeu um julgamento favorável de Deus'.

'A ação a que ela se referia era desconhecida para a noviça; ninguém em Paray sabia das circunstâncias de uma morte que havia ocorrido tão longe daquela cidade. A noviça só viu sua mãe muito tempo depois, no dia de sua profissão. Ela então perguntou qual foi a ação cristã generosa que seu pai realizou antes de morrer. 'Quando o Santo Viático lhe foi levado' - respondeu sua mãe - 'o açougueiro juntou-se àqueles que acompanhavam o Santíssimo Sacramento e colocou-se em um canto da sala. O doente, ao percebê-lo, chamou-o pelo nome, disse-lhe para se aproximar e, apertando-lhe a mão com uma humildade incomum em pessoas de sua posição, pediu perdão por algumas palavras duras que lhe dirigira de vez em quando e desejou que todos os presentes fossem testemunhas da reparação que ele lhe fazia'. A irmã Margarida soube apenas por Deus o que havia acontecido, e a noviça soube, por isso, da verdade consoladora do que ela lhe havia dito a respeito do estado feliz de seu pai na outra vida. Acrescentemos que Deus, por meio dessa revelação, nos mostrou mais uma vez como a caridade cobre uma multidão de pecados e nos fará encontrar misericórdia no dia da justiça.

A bem-aventurada [santa] Margarida Maria recebeu de nosso Divino Senhor outra comunicação relativa à caridade. Ele lhe mostrou a alma de uma pessoa falecida que teve de sofrer apenas um leve castigo e lhe disse que, entre todas as boas obras que essa pessoa havia realizado no mundo, Ele havia levado em consideração especial certas humilhações a que ela se submetera no mundo, porque as havia sofrido com espírito de caridade, não apenas sem murmurar, mas mesmo sem sequer falar delas. Nosso Senhor acrescentou que, em recompensa, Ele lhe havia dado um julgamento brando e muito favorável.

Tradução da obra: 'Le Dogme du Purgatoire illustré par des Faits et des Révélations Particulières', do teólogo francês François-Xavier Schouppe, sj (1823-1904), 342 p., tradução pelo autor do blog.

sexta-feira, 30 de maio de 2025

BREVIÁRIO DIGITAL - ICONOLOGIA CRISTÃ (VI)

Theophanis Strelitzas ou Theophanes Bathas ou ainda Teófanes, o Cretense (1490? - 1559) foi um artista grego bizantino e um dos maiores pintores de ícones da chamada Escola Cretense de Pintura.

Os quinze ícones abaixo, pintados no Monastério de Stavronikita (localizado no Monte Athos, na Grécia e dedicado a São Nicolau), é um dos trabalhos finais de Teófanes e representa um ápice na história da iconografia eclesiástica. Os personagens são retratados como figuras altas e magras, com vestimentas simples e semblantes severos, distribuídos de forma harmônica e equilibrada nos ícones, que representam a sequência cronológica de eventos da vida pública de Jesus Cristo.





quinta-feira, 29 de maio de 2025

A CIÊNCIA DE DEUS (I)


Nicolau Steno (1638-1686), forma latinizada do nome Niels Steensen, foi um cientista e sacerdote dinamarquês, pioneiro em contribuições científicas fundamentais para o estudo da anatomia, paleontologia, geologia (particularmente a estratigrafia) e cristalografia.

Em 1669, publicou o Prodomus ou De solido intra solidum naturaliter contento dissertationis prodromus - Discurso preliminar a uma dissertação sobre um corpo sólido naturalmente contido dentro de um sólido - no qual estabeleceu de forma pioneira e singular os princípios que regem a estruturação das sequências sedimentares, conhecidos atualmente como Princípios de Steno, definidos como:

* Princípio da Superposição: os sedimentos se depositam em camadas, sendo as camadas mais novas depositadas acima das camadas mais antigas;
* Princípio da Horizontalidade Original: os sedimentos tendem a se depositar em camadas horizontais;
* Princípio da Continuidade Lateral: as camadas de sedimentos tendem a ser contínuas, com espessuras reduzindo-se lateralmente nas margens da bacia de acumulação.


Steno praticamente abriu mão de uma carreira acadêmica brilhante após a sua conversão ao catolicismo romano em 1667, sendo ordenado sacerdote em 1675. Em 1677, tornou-se bispo titular e passou o resto de sua vida ministrando a fé católica às populações católicas romanas minoritárias no norte da Alemanha, Dinamarca e Noruega e vivendo uma vida pautada por completa modéstia, jejum e oração. Foi beatificado pelo papa São João Paulo II em 1988.

OS PAPAS DA IGREJA (X)

 


quarta-feira, 28 de maio de 2025

ORAÇÃO A JESUS NO TABERNÁCULO


Ó Jesus, como eu seria feliz se tivesse sido muito fiel, mas, infelizmente, muitas vezes fico triste à noite porque sinto que poderia ter respondido melhor às vossas graças. Se eu fosse mais unida a Vós, mais caridosa com as minhas irmãs, mais humilde e mais mortificada, teria menos dificuldade em falar convoso na oração. Mas, ó meu Deus, longe de desanimar à vista das minhas misérias, dirijo-me a Vós com confiança, lembrando-me que 'não são os que estão bem de saúde que precisam de médico, mas sim os doentes'. 

Por isso, peço-vos que me cureis, que me perdoeis, e lembrar-me-ei, Senhor, que a alma a quem destes mais deve também amar-vos mais do que as outras! Ofereço-vos cada batida do meu coração como atos de amor e reparação e uno-os aos vossos méritos infinitos. Peço-vos, ó meu Divino Esposo, que sejais Vós mesmo o Reparador da minha alma, agindo dentro de mim sem levar em conta a minha resistência, pois não quero ter outra vontade que não a vossa e, amanhã, com a ajuda da vossa graça, poder começar uma vida nova em que cada momento será um ato de amor e de renúncia.

Depois de vir todas as noites aos pés do vosso altar, chegarei finalmente à última noite da minha vida e começarei então o dia eterno em que repousarei no vosso Divino Coração depois das lutas do exílio! Assim seja.

(Santa Teresa de Lisieux)

terça-feira, 27 de maio de 2025

SOBRE A MANSIDÃO E A SIMPLICIDADE DE CORAÇÃO

Antes do sol sai a luz da manhã e à humildade precede a mansidão, como nos declarou a mesma luz, que é o Senhor, quando disse: 'Aprendei de mim que sou manso e humilde de coração'. Justo é, pois, e conforme a ordem natural, gozar da luz antes do sol, pois a este ninguém pode ver, se primeiro não vê esta luz.

Mansidão é conservar a alma em um mesmo estado sem perturbação alguma, quer nas honras, quer nos desgostos. Mansidão é, nas perturbações e aflições do próximo, fazer oração por ele com suma compaixão. Mansidão é firmeza da paciência, porta da caridade, ministra do perdão, confiança na oração, argumento de discrição. Porque o Senhor, como diz o profeta, ensinará aos mansos os seus caminhos.

Mansidão é aposento do Espírito Santo, segundo aquilo que está escrito: 'Sobre quem repousará meu espírito senão sobre o humilde e manso e que trema sob minhas palavras?' Mansidão é auxiliadora da obediência, guia dos irmãos, freio dos furiosos, vínculo dos irados, ministra de gozo, imitação de Jesus Cristo, condição de anjos, prisão de demônios e escudo contra as amarguras do coração.

O Senhor repousa nos corações dos mansos, mas a alma do furioso é aposento do inimigo. Os mansos herdarão a terra, ou melhor dizendo, serão senhores dela. Mas os homens loucos e furiosos serão destruídos e desprezados dela. A alma mansa é filha da simplicidade, mas a alma irada é casa e aposento de malícias. A alma do manso receberá as palavras da sabedoria, porque o Senhor guiará no juízo os mansos, ou melhor dizendo, na virtude da discrição. A causa disto é que a alma quieta e tranquila está muito disposta e aparelhada para ser dirigida e iluminada pelo Espírito Santo. A alma reta é familiar companheira e esposa da humildade.

Mas a má é filha moça e louca da soberba. As almas dos mansos serão cheias de sabedoria mas, nas almas dos irados, moram as trevas e a ignorância. O irado e o dissimulado se encontram e não se acha palavra reta entre eles. Se abrires o coração do primeiro, acharás loucura. Se abrires o do segundo, acharás maldade.

A simplicidade é um hábito e disposição da alma, que carece de variedade e não sabe que coisa é perversa intenção, nem é movido com algum mau pensamento. Malícia é astúcia, ou melhor dizendo, maldade e mentira de demônios, porque pecar por malícia é pecar não por fraqueza ou ignorância, mas por opção e vontade deliberada, como pecam os demônios, que toda a sua astúcia empregam em buscar como fazer maior mal.

Hipocrisia é estado contrário à disposição do corpo e da alma, cheio de suspeitas e más intenções, porque o hipócrita em tudo se contrafaz, querendo parecer outro, suspeitando que os outros sejam como ele. Inocência é disposição e estado da alma, alegre e seguro e livre de toda a suspeita e astúcia porque o verdadeiro inocente, assim como não faz mal a ninguém, assim também não suspeita mal de ninguém.

Fujamos, pois, do despenhadeiro do fingimento e do lago da malícia e astúcia, ouvindo a sentença daquele que disse: 'os que maliciosamente vivem serão destruídos'. Estes, como a verdura das ervas, desfalecerão logo, e serão pasto dos demônios. Assim como Deus é caridade, assim é retidão e igualdade. E por isso, disse o sábio, nos Cânticos, falando com ele: 'os retos são os que te amam'. E o pai deste mesmo sábio disse em um salmo: 'Bom e reto é o Senhor'. E assim diz Aquele que salva aos retos de coração. 

(Excertos da obra 'A Escada do Céu'. de São João Clímaco)

OS PAPAS DA IGREJA (IX)

 


segunda-feira, 26 de maio de 2025

QUESTÕES SOBRE A DOUTRINA DA SALVAÇÃO (XV)

P. 33 - Quais são esses argumentos sofísticos com os quais eles são tão enganados?

Nós os vimos acima e os refutamos completamente, um por um. Mas o grande erro deles surge de suas idéias errôneas de ignorância invencível e das condições requeridas para ser um membro da Igreja de Cristo. Pois como eles devem ou negar sua própria fé ou permitir essa proposição geral, que 'sem fé é impossível agradar a Deus', enquanto eles admitem a verdade disso, eles pretendem que, como a ignorância invencível desculpará um homem diante de Deus em todos os outros casos, então ela deve desculpá-lo nisso também. E que, portanto, embora um homem não tenha a verdadeira fé, 'a ignorância invencível o salvará', não advertindo para os dois sentidos que essas palavras contêm, um dos quais é certamente verdadeiro, e o outro não menos certamente falso. A ignorância invencível de fato o salvará da culpa de ter uma fé falsa e de não ter a fé verdadeira: isso é certamente verdade. Mas dizer que a ignorância invencível o salvará, isto é, o levará à salvação, é certamente falso, como tudo o que vimos acima prova plenamente.

Novamente, enquanto eles admitem essa outra proposição geral, que 'fora da verdadeira Igreja de Cristo não há salvação', que eles devem reconhecer ou desistir de sua própria religião, eles supõem que um homem pode ser um membro da verdadeira Igreja aos olhos de Deus, embora não esteja unido a ela em comunhão, como todas as crianças batizadas são, embora nascidas em heresia, pelo menos até que cheguem à idade de julgar por si mesmas. O erro deles está em não refletir que todos os adultos em uma religião falsa podem ser membros da Igreja à vista de Deus em nenhum outro sentido além daqueles de quem nosso Salvador diz: 'Tenho outras ovelhas que não são deste aprisco'. Mas como Ele declarou expressamente que era necessário trazer até mesmo esses à comunhão da sua Igreja, isso evidentemente mostra que eles e todos os outros não são membros da Igreja de tal forma que possam ser salvos em seu estado atual sem serem unidos a esta comunhão.

P. 34 - Mas não é louvável e digno de louvor mostrar toda a indulgência e condescendência para com aqueles que estão fora da Igreja e se comportar em relação a eles com toda a clemência e brandura?

Sem dúvida: não é apenas louvável, mas um dever estrito, até onde a verdade pode chegar. Mas trair a verdade com essa visão constitui um crime grave e altamente prejudicial para ambas as partes. A experiência, de fato, mostra que a maneira solta de pensar e falar, que alguns membros da verdadeira Igreja têm adotado ultimamente, produz as piores consequências, tanto para eles mesmos quanto para aqueles a quem desejam favorecer.

(i) Aqueles que estão separados da Igreja de Cristo bem sabem que ela professa constantemente, como um artigo de seu credo, que sem a verdadeira fé e fora da sua comunhão, não há salvação. Quando, portanto, eles veem os membros dessa Igreja falando duvidosamente sobre esse ponto, parecendo questionar a verdade da doutrina e até mesmo alegando pretextos e desculpas para explicá-la, o que eles podem pensar? Que efeito isso deve ter em suas mentes? Será que isso não tende a extinguir qualquer desejo de investigar a verdade que Deus possa ter lhes dado e a fechar seus corações contra qualquer pensamento positivo? O amor-próprio nunca deixa de se apoderar avidamente de tudo o que favorece seus desejos; e se uma vez encontrarem essa verdade questionada, mesmo por aqueles que professam acreditar nela, eles a considerarão como uma mera disputa retórica e não pensarão mais no assunto.

(ii) Essa maneira de pensar e falar tende naturalmente a extinguir todo zelo pela salvação das almas nos corações daqueles que a adotam; pois enquanto eles se persuadem de que há uma possibilidade de salvação para aqueles que morrem em uma falsa fé e fora da Igreja de Cristo, o amor próprio facilmente os inclinará a não se preocuparem com sua conversão. Às vezes, chega-se ao ponto de fazer com que alguns pensem que é mais aconselhável não se esforçar para desiludi-los, para que isso não mude sua atual ignorância desculpável, como eles a chamam, em uma obstinação culpável; não refletindo que, por seus esforços piedosos e zelosos, eles podem ser levados ao conhecimento da verdade e salvar suas almas, enquanto que, por sua negligência sem caridade, podem ser privados de tão grande felicidade. Ai do mundo, de fato, se os primeiros pregadores do cristianismo tivessem sido reféns de sentimentos tão pouco cristãos!

(iii) Não é menos prejudicial para os próprios membros da Igreja adotar tais maneiras de pensar; pois isso não pode deixar de esfriar seu zelo e estima pela religião, torná-los mais descuidados em preservar sua fé, prontos para, por motivos mundanos, expô-la ao perigo e, em tempos de tentação, abandoná-la inteiramente. De fato, se um homem estiver completamente persuadido da verdade de sua santa religião e da necessidade de ser membro da Igreja de Cristo, como é possível que ele se exponha a qualquer ocasião de perder um tesouro tão grande, ou que, por qualquer medo ou favor mundano, o abandone? Uma vez que a experiência mostra que muitos, por alguma vantagem mundana insignificante, se expõem a tal perigo, indo a lugares onde não podem praticar sua religião, mas encontram todos os incentivos para abandoná-la, ou, ao se envolverem em empregos inconsistentes com seu dever, expõem seus filhos às mesmas ocasiões perigosas, isso só pode surgir da falta de uma ideia justa da importância de sua religião; e, após um exame rigoroso, sempre se descobre que algum grau ou outro dos sentimentos de tolerância ou de indiferentismo expostos acima é a causa radical.

(iv) Além disso, se uma pessoa começa a hesitar sobre a importância de sua religião, que estima ou consideração ela pode ter pelas leis, regras ou práticas dela? O amor-próprio, sempre atento à sua própria satisfação, logo lhe dirá que, se não for absolutamente necessário ser dessa religião, muito menos necessário será submeter-se a todos os seus regulamentos; portanto, liberdades são tomadas na prática, os mandamentos da Igreja são desprezados, os exercícios de devoção são negligenciados e uma sombra de religião é introduzida sob a aparência de sentimentos liberais, numa dissipação completa de toda virtude e de uma piedade sólida.

(Excertos da obra 'The Sincere Christian', V.2, do bispo escocês George Hay, 1871, tradução do autor do blog)

domingo, 25 de maio de 2025

EVANGELHO DO DOMINGO

  

'Que as nações vos glorifiquem, ó Senhor, que todas as nações vos glorifiquem!' (Sl 66)

Primeira Leitura (At 15,1-2.22-29) - Segunda Leitura (Ap 21,10-14.22-23) -  Evangelho (Jo 14,23-29)
 
  25/05/2025 - SEXTO DOMINGO DA PÁSCOA

'A MINHA PAZ VOS DOU'


Neste Sexto Domingo da Páscoa, somos chamados a viver plenamente a presença de Jesus Ressuscitado em nossas vidas, como testemunhas da fé e da fidelidade às suas Santas Palavras: 'Se alguém me ama, guardará a minha palavra' (Jo 14,23). Eis aí o legado de Jesus aos seus discípulos: a graça e a salvação são frutos do amor, que é manifestado em plenitude, no despojamento do eu e na estrita submissão à vontade do Pai: 'Desci do Céu não para fazer a minha vontade, mas sim a d’Aquele que me enviou' (Jo 6,38) e 'Amai ao Senhor vosso Deus com todo vosso coração, com toda vossa alma e com todo vosso espírito. Este é o maior e o primeiro dos mandamentos' (Mt 22,37-38).

A graça nasce, manifesta-se e se alimenta do nosso amor a Deus, pois 'quem não me ama, não guarda a minha palavra' (Jo 14,24). Mas este amor terá de ser libertado do mero sentimento arraigado às mazelas humanas para ser transformado em um amor espiritual sem medidas, desapegado dos valores mundanos. Este amor não provém dos sentimentos efêmeros, nem dos sentidos, nem das paixões desregradas, nem dos abismos volúveis das sensibilidades e das vontades humanas.

Este amor não se alimenta da paz do mundo, mas da paz que emana do próprio Coração de Deus: 'Deixo-vos a paz, a minha paz vos dou; mas não a dou como o mundo' (Jo 14,27). Na paz de Deus, na confiança absoluta às divinas promessas, não há porque se perturbar ou se intimidar a fragilidade do pobre coração humano. A presença permanente do Cristo Ressuscitado em nossas vidas vem por meio da manifestação do Espírito Santo, o Defensor, conforme as palavras de Jesus: 'o Espírito Santo, que o Pai enviará em meu nome, ele vos ensinará tudo e vos recordará tudo o que eu vos tenho dito' (Jo 14,26).

Sob a ação do Espírito Santo, o amor humano pode trilhar livremente o caminho da santificação, até o impossível, até os limites de um despojamento absoluto do próprio ser para a plena manifestação em si da glória de Deus, quando enfim, 'o meu Pai o amará, e nós (o Pai, o Filho e o Espírito Santo) viremos e faremos nele a nossa morada' (Jo 14,23).

sábado, 24 de maio de 2025

TESOURO DE EXEMPLOS II (13/15)

13. PROTESTO CONTRA OS FALSOS PROFETAS

Um nobre marquês de França foi certa vez convidado pelo Ministro do Exterior da Grécia a apertar a mão de Ernesto Renan, aquele escritor tristemente famoso que tanto injuriou a Jesus Cristo em seu livro Vida de Jesus.
O marquês, vivamente contrariado, escondeu sua mão, exclamando com voz solene: 'Jamais apertarei essa mão que esbofeteou o meu Deus!'
É triste que, também entre nós, haja quem leia e admire certos escritores ímpios, imorais e blasfemadores.

14. DÚVIDAS CONTRA A FÉ

Andava um fervoroso apóstolo do bem a pregar pelas cidades e vilas a doutrina da salvação quando, certo dia, aproximando-se dele um jovem, disse:
➖ Padre, tenho muitas dúvidas contra a fé.

O padre fitou-o demoradamente e, quando o jovem esperava uma erudita conferência sobre religião, aquele perguntou-lhe simplesmente:
➖ E quanto tempo faz que não te confessas?
➖ Não é isso, padre; não venho confessar-me, mas queria que o senhor resolvesse as minhas dúvidas.
➖ E por que não havíamos de inverter os termos: primeiro confessar-te e depois instruir-te?

E com aquela doçura que conquista os corações, converteu-o e o jovem caiu de joelhos aos seus pés, fez uma confissão sincera e demorada de suas culpas e quando terminou pós-se em pé. O padre então lhe disse:
➖ E, agora, meu filho, vamos ver aquelas dúvidas que tinhas contra a fé?
➖ Padre, agora já não tenho mais dúvidas!
Também vós andais a dizer que tendes dúvidas contra á fé. Serão mesmo dúvidas? Não serão culpas? Quanto tempo faz que não vos confessais?

15. ESTAIS SEGUROS DA VOSSA SALVAÇÃO?

Frei Gil, o bendito leigo franciscano, temendo pela sua salvação, abandonara o mundo. Urna gruta às margens de um rio ofereceu-lhe abrigo e ali vivia todo consagrado ao serviço de Deus. A água cristalina matava-lhe a sede e as árvores ofereciam-lhe seus frutos. O sol surpreendia-o em oração e as estrelas da noite eram testemunhas de suas assombrosas penitências.

Um dia, três cavaleiros, que andavam à caça, chegaram à gruta de Frei Gil. Este recebeu-os amavelmente, entreteve-se com eles sobre coisas espirituais e notou que, embora bons cristãos, gostavam mais do mundo do que de Deus.

Ao despedirem-se, um deles disse:
➖ Santo bendito, desde hoje recomenda-nos a Deus.
➖ Em verdade, senhores, vós é que haveis de pedir a Deus por mim, porque tendes mais fé e mais esperança do que eu.
➖ Como assim? Nós?
➖ Sim, disse Frei Gil, porque estou aqui retirado de todo trato com os homens, vestido de burel, dormindo no chão e sempre ando com medo de condenar-me; e vós, cercados de prazeres e comodidades, alimentando vícios e paixões, estais tão seguros de vossa salvação! Tendes, na verdade, mais fé e mais esperança do que eu.

O santo tinha razão. É preciso assegurar a nossa salvação por meio da penitência, pois a eterna Verdade diz: 'Se não fizerdes penitência, perecereis'.

(Excertos da obra 'Tesouro de Exemplos' - Volume II, do Pe. Francisco Alves, 1960; com adaptações)

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sexta-feira, 23 de maio de 2025

SOBRE AS MÁS CONFISSÕES

Uma só coisa pode viciar a nossa confissão e torná-la 'má' ou sacrílega: omitir consciente e deliberadamente a manifestação de um pecado que temos a certeza de ser mortal e que deveríamos confessar. Proceder assim é não querer cumprir uma das condições que Deus nos pede para nos conceder o seu perdão. Se não nos 'abrimos' a Deus, Deus não abrirá o seu tribunal ao perdão. O trágico de uma má confissão é que produz uma reação em cadeia de pecados. 

A não ser que – e até que - retifiquemos a confissão inválida, cada confissão e cada comunhão posteriores serão um novo sacrilégio e um novo pecado se acrescentará ao anterior. Com o passar do tempo, a consciência poderá insensibilizar-se, mas nunca poderá ter verdadeira paz. Felizmente, uma má confissão pode ser corrigida com facilidade, desde que o penitente decida emendar-se. 

Basta que diga ao sacerdote: 'Certa vez fiz uma má confissão e agora quero corrigi-la'. O confessor tomará esta declaração como ponto de partida e, interrogando com compreensão, ajudará o pecador a descarregar-se do seu pecado. É necessário sublinhar a frase 'interrogando com compreensão'. A nossa relutância em confessar uma ação vergonhosa será muito menor se tivermos presente que aquele a quem nos dirigimos está cheio de compreensão e afeto. 

O sacerdote sentado do outro lado da grade do confessionário não está cheio de si nem disposto a franzir o sobrolho a cada falta que lhe comuniquemos. Ele também é humano. Ele também se confessa. Em vez de nos desprezar pelo que temos a dizer-lhe, admirará a humildade com que estaremos vencendo a nossa vergonha. Quanto maior for o nosso pecado, mais alegria daremos ao sacerdote com o nosso arrependimento. Se o sacerdote chegasse a saber quem é o penitente, seu apreço por ele não diminuiria; ao contrário, aumentaria pela sinceridade e confiança depositada no confessor.

(Excertos da obra 'A Fé Explicada', de Leo Trese)

quinta-feira, 22 de maio de 2025

22 DE MAIO - SANTA RITA DE CÁSSIA

  


A santa, que padeceu uma vida doméstica de sofrimentos e provações, tornou-se a advogada dos desesperados e a padroeira das causas impossíveis. Filha única de pais já envelhecidos - Antonio Mancini e Amata Ferri - Margherita (que ficou Rita) nasceu no vilarejo de Roccaporena, na região de Cascia, na Úmbria (centro da Itália) em 1381. Inclinada à vida religiosa, cedeu às tratativas paternas e aos rigores da época, desposando, logo após a adolescência um homem chamado Paulo Ferdinando, com o qual teve dois filhos.

Sua vida matrimonial, entretanto, foi um período de enormes provações e humilhações em relação ao marido, sempre violento e agressivo. Depois de muitas orações pelo marido, este se converteu e passaram a formar uma igreja doméstica até que uma tragédia a desfez por completo: Paulo foi assassinado numa ato de vingança devido às suas desavenças passadas. Outra tragédia se anunciava: os dois filhos estavam decididos a vingar a morte do pai. Rita preferiu perdê-los do que eles ao Céu e ofereceu as suas vidas a Deus antes de cometerem tal crime. Com efeito, cerca de um ano após a morte do pai, ambos faleceram, arrependidos do sentimento de vingança.

Rita ficou, então, sozinha no mundo e buscou, sem sucesso, a vida religiosa, por já ter vivido uma união matrimonial por 18 anos. A opção por converter-se em uma monja agostiniana foi-lhe repetidamente negada. Entregando a sua vocação nas mãos de Deus e sobrecarregando-se em orações, alcançou a causa impossível por um milagre extraordinário. Certa feita, foi conduzida por três pessoas à capela interna do mosteiro, totalmente fechado e a altas horas da noite: São João Batista (também concebido na velhice dos pais), Santo Agostinho (fundador da ordem agostiniana) e São Nicolau de Tolentino (religioso agostiniano). Diante do relato e dos fatos sobrenaturais, Rita foi aceita na ordem, dedicando o resto da sua vida aos votos de pobreza, obediência e castidade. 

A sua extrema capacidade de servir, obedecer e aceitar mesmo o que aparentemente poderia ser improvável pode ser compreendido no milagre que transformou um ramo seco, regado periodicamente e com grande diligência pela santa, numa videira que produziu muitos e muitos frutos. Ou, quase no final de sua vida, com a roseira que, sob os seus cuidados, floriu viçosa em pleno inverno rigoroso. Por 15 anos, estigmatizada, padeceu os sofrimentos e as dores de uma ferida repugnante na testa, que expelia pus e que exalava mau odor, o que a a levou a uma vida de isolamento e de absoluto confinamento numa cela do convento.

Aos 76 anos, Santa Rita de Cascia (adaptado como Cássia) faleceu no convento, em 22 de maio de 1457, sem deixar quaisquer registros escritos, mas os exemplos heroicos de uma vida de santidade. Morta, a ferida tornou-se limpa e passou a exalar um odor perfumado. Foi beatificada em 1627, ocasião em que o seu corpo mostrou-se no mesmo estado quando da sua morte, mais de cento e cinquenta anos antes. Seu corpo atualmente repousa no Santuário de Cascia, desde 18 de maio de 1947, numa urna de prata e cristal.  Exames médicos recentes efetuados no corpo confirmaram os traços de uma ferida óssea (osteomielite) na testa. A santa das causas impossíveis foi canonizada em 24 de maio de 1900, sob o pontificado do Papa Leão XIII.

(urna de cristal com o corpo de Santa Rita de Cássia)

Santa Rita de Cássia, rogai por nós!

OS PAPAS DA IGREJA (VIII)

 




* 50. Anastácio II (o segundo papa omitido da santidade católica nos primeiros 500 anos da história da Igreja); a partir de 55. Bonifácio II, a santidade católica não mais se tornou regra recorrente para os papas da Igreja

quarta-feira, 21 de maio de 2025

TRATADO SOBRE A HUMILDADE (XXIII)


Exame sobre a Humildade para com Deus - Parte I

102. O primeiro ato de humildade, diz São Tomás [2a 2æ, qu. clxi, art. 2 ad 3 ; et qu. clxii, art. 5], consiste em nos submetermos inteiramente a Deus com a maior reverência pela sua Majestade infinita, diante da qual somos como nada: 'Todas as nações estão diante dEle como se não tivessem existência alguma' [Is 6,17]. Mas alguma vez consideraste o teu nada diante de Deus? E que todo o ser que tens, vem de Deus? E que, por necessidade intrínseca, dependes tão inteiramente de Deus que, sem Ele, não podes fazer nada de bom - 'porque sem Mim nada podeis fazer' [Jo 15,5] - que, sem Deus, não pensas, nem dizes, nem fazes nada de bom?

Isto é artigo de fé. 'Ninguém pode dizer que Jesus é o Senhor senão pelo Espírito Santo' [1Cor 12, 3]. 'Não que sejamos capazes por nós mesmos de ter algum pensamento, como de nós mesmos. Nossa capacidade vem de Deus' [2Cor 3, 5].  'Porque é Deus quem, segundo o seu beneplácito, realiza em vós o querer e o executar' [Fp 2,13]. Não basta dizer apenas que sei todas estas coisas, mas é necessário realizá-las para se tornar realmente humilde.

O Doutor Angélico ensina que a razão pela qual a humildade tende principalmente a tornar a alma submissa a Deus é porque esta virtude está mais próxima das virtudes teologais, e como não basta apenas saber em que coisas devemos acreditar ou esperar, mas que também é necessário que façamos atos de fé e de esperança, assim também devemos fazer atos semelhantes de humildade. O próprio Cristo ensinou a humildade do coração, e o coração não deve ficar ocioso, nem deixar de produzir os atos necessários. E que atos de humildade praticais perante Deus? Com que frequência os fazeis? Quando os fizeste? Há quanto tempo não os fazeis?

Seria absurdo esperar a recompensa que é prometida aos humildes sem ser humilde ou pelo menos sem o desejo de ser humilde; e sem fazer atos de humildade; humildade de coração sem que o coração se humilhe a si mesmo - que loucura! E sois suficientemente tolos para acreditar que isso pode ser feito? Às vezes, pronunciais certas palavras que parecem tender para a vossa humilhação; dizeis que sois um miserável desprezível, que não servis para nada, mas dizeis essas coisas sinceramente, de coração? Se receias mentir a ti mesmo, confirmando-as na tua mente, ouve o que São Tomás [Loc. cit. art. 6 ad 1] nos diz para nossa instrução, que cada um pode dizer e crer de si mesmo, com verdade, que é um miserável desprezível, remetendo para Deus toda a sua capacidade e talento.

103. Mas como devemos fazer estes atos práticos de humildade perante Deus? Vou dar-vos alguns exemplos. Podes imaginar-te agora na presença de Deus como um condenado que se humilha e implora misericórdia para o perdão dos seus pecados: 'Tem piedade de mim, ó Deus, segundo a tua grande misericórdia' [Sl 1,1]; ou como um mendigo miserável e necessitado que se humilha e pede uma esmola para o ajudar na sua necessidade: 'O pão nosso de cada dia nos dai hoje'; ou como o doente junto ao tanque de Betsaida, que se humilha perante o Salvador para ser curado da sua doença incurável: 'Senhor, não tenho ninguém...' [ Jo 5,7]; ou como aquele cego que se humilhou para que sua escuridão pudesse ser iluminada: 'Senhor, para que eu possa ver'; ou como a mulher cananeia que se humilhou e exclamou: 'Tem piedade de mim, Senhor, ajuda-me!' [Mt 15,22.25] e não se envergonha de se comparar aos cães que não são dignos de comer o pão do seu dono, mas se contentam em comer as migalhas que caem da sua mesa. A humildade do coração é ingênua e, da mesma forma que o nosso coração ama sem precisar de ser ensinado a amar, ele humilha-se sem precisar de ser ensinado a humilhar-se.

104. Há casos em que somos obrigados a fazer atos de virtude - como atos de fé, a esperança e caridade - que alguma necessidade, circunstância ou dever do nosso estado de vida nos exija, e há casos em que devemos fazer atos de humildade no nosso coração. Em primeiro lugar, é necessário humilharmo-nos quando nos aproximamos de Deus com a oração para obter alguma graça, porque Deus não olha, nem atende, nem dá a sua graça senão aos humildes. 'O Senhor olha para os humildes' [Sl 137,6 ]; 'sempre vos foram aceitas as preces dos mansos e humildes' [Jd 9,16]; 'Deus dá sua graça aos humildes' [Tg 4,6]. Quando, pois, vindes pedir a Deus alguma graça do corpo ou da alma, lembrai-vos sempre de praticar esta humildade?

Quando rezamos, e sobretudo quando dizemos o 'Pai Nosso', dirigimo-nos a Deus; e quantas vezes, ao dizerdes as vossas orações, vos dirigis a Deus com menos respeito do que se estivésseis a falar com um dos vossos semelhantes? Quantas vezes, quando estais na igreja, que é a casa de Deus, ouvis um sermão, que é a Palavra de Deus, e assistis às funções do serviço sem qualquer reverência? A humildade de coração, diz São Tomás [2a 2æ, qu. clxi, art. 2] é acompanhada pela reverência exterior, e faltar a esta é faltar à humildade e é, portanto, um pecado de orgulho.

105. Mas quanto mais essencial é para nós a graça que pedimos a Deus, tanto mais necessária é a humildade. Antes de ires ao tribunal da penitência, humilhas-te e pedes a Deus que te dê a dor dos teus pecados, necessária para a validade do sacramento? Como esta dor deve ser sobrenatural, é certo que nunca a poderias alcançar por ti mesmo, por mais que te esforçasses por senti-la. Só Deus pode dá-la, e é igualmente certo que não se trata de uma dívida que Ele tem para convosco, mas de uma grande graça que lhe apraz conferir-vos por sua bondade e sem qualquer mérito da vossa parte. Se, porém, desejais receber esta graça, deveis pedi-la com humildade, protestando de coração que não a mereceis, que não sois dignos de a receber e que só a esperais pelos méritos de Jesus Cristo. Mas praticais esta humildade, que é, pode-se dizer, de preceito para vós, porque é um meio essencial para obter a contrição?

106. O mesmo se pode dizer das vossas resoluções, que são igualmente necessárias para tornar válida a confissão. A confissão deve ser constante e eficaz, mas não o pode ser sem a ajuda especial de Deus. Pensais alguma vez em humilhar-vos e pedir esse auxílio, sabendo e confessando a vossa instabilidade e fraqueza, e que não sois capazes, por vós mesmos, de manter a menor resolução, nem de manhã à noite, nem mesmo de uma hora para outra? É por isso que caís tantas vezes nas mesmas faltas, porque vos falta a humildade. O homem verdadeiramente humilde é totalmente desconfiado de si mesmo e, pondo toda a sua confiança em Deus, é por Ele ajudado da maneira mais admirável: 'Humilha-te perante Deus e espera pelas suas mãos' [Eclo 13,9].

Quantas vezes não dizeis: 'Tomei esta firme resolução e tenciono mantê-la, não tenho medo de a quebrar', confiando iniquamente em ti mesmo, sem reconhecer de modo algum a ajuda divina? Cuidado para que não sejas contado entre os réprobos 'que foram destruídos confiando na sua própria força' [Eclo 16,8]. Se, mesmo que seja só um pouquinho, te apossares de ti mesmo, esse pouquinho pode ser a causa de uma grande ruína, segundo a predição de Jó: 'Levantam-se, subitamente já não existem; caem; como os outros' [Jó 24,24].

107. E como praticais a humildade na vossa confissão sacramental? É na vossa confissão que deveis humilhar-vos como um malfeitor culpado na presença do vosso Juiz. 'Humilha a tua alma diante de um ancião'  [Eclo 4, 7] Esse conselho vem do Espírito Santo. Quantas vezes não tentamos parecer inocentes no próprio ato de nos acusarmos de culpa - ora desculpando os nossos pecados, ora encobrindo ou diminuindo a sua malícia, ora pondo a culpa nos outros em vez de a assumirmos nós próprios? É uma verdadeira falta de humildade, e daquela humildade que não é de conselho, mas de preceito. Deveis dizer com Davi: 'Eu disse: confessarei ao Senhor a minha iniquidade' [Sl 31,5]. A vergonha que vos impede de confessar o vosso pecado com clareza e franqueza provém unicamente do orgulho.

('A Humildade de Coração', de Fr. Cajetan (Gaetano) Maria de Bergamo, 1791, tradução do autor do blog)

terça-feira, 20 de maio de 2025

'COMO EU VOS AMEI'

O Senhor Jesus manifesta um novo mandamento aos seus discípulos, que se amem mutuamente: 'Eu vos dou um novo mandamento: amai-vos uns aos outros' (Jo 13,34). Mas este mandamento já não estava escrito na antiga lei de Deus, onde se lê: 'Amarás o teu próximo como a ti mesmo' (Lv 19,18)? Por que então o Senhor chama novo o que é evidentemente tão antigo? Será um novo mandamento pelo fato de nos revestir do homem novo, depois de nos ter despojado do velho? Na verdade, ele renova o homem que o ouve, ou melhor, aquele que lhe obedece; não se trata, porém, de um amor puramente humano, mas daquele que o Senhor quis distinguir,acrescentando: 'Como eu vos amei' (Jo 13,34).

É este amor que nos renova, transformando-nos em homens novos, herdeiros da nova Aliança, cantores do canto novo. Foi este amor, caríssimos irmãos, que renovou outrora os antigos justos, os patriarcas e os profetas e, posteriormente, os santos apóstolos. Ainda hoje é ele que renova as nações e reúne todo o gênero humano espalhado pelo mundo inteiro, formando um só povo novo, o corpo da nova esposa do Filho Unigênito de Deus. É dela que se diz no Cântico dos Cânticos: 'Quem é esta que sobe vestida de branco?' (cf Ct 8,5). Vestida de branco, sim, porque renovada; e renovada de que modo, senão pelo mandamento novo?

Por isso os membros desta esposa sentem uma solicitude mútua. Se um membro sofre, todos sofrem com ele; se um membro é honrado, todos os outros se alegram com ele. Pois ouvem e praticam a palavra do Senhor: 'Eu vos dou um novo mandamento: amai-vos uns aos outros'. Não como se amam aqueles que vivem na corrupção da carne; nem como se amam os seres humanos apenas como seres humanos; mas como se amam aqueles que são filhos do Altíssimo. Deste modo, tornam-se irmãos do Filho unigênito de Deus, amando-se uns aos outros com aquele mesmo amor com que ele os amou, e por ele serão conduzidos à plenitude final, onde os seus desejos serão completamente saciados de bens. Então nada faltará à sua felicidade, quando Deus for tudo em todos.

Quem nos dá este amor é o mesmo que diz: 'Amai-vos uns aos outros como eu vos amei'. Foi para isto que ele nos amou, para que nos amássemos mutuamente. E com o seu amor, deu-nos a graça, para que, vivendo unidos em recíproco amor, como membros ligados por tão suave vínculo, formemos o Corpo de tão sublime Cabeça.

(Santo Agostinho, em 'Dos Tratados sobre o Evangelho de São João')

OS PAPAS DA IGREJA (VII)

 



segunda-feira, 19 de maio de 2025

FRASES DE SENDARIUM (LII)

 

'O meu coração e o Coração de Jesus são a mesma coisa' 

(Santa Gemma Galgani)

Encerra tua alma nas chagas abertas do Imaculado Coração de Jesus: oceano de compaixão e abismo de misericórdia que tudo sublima e tudo perdoa. A infinita misericórdia de Deus é o bálsamo e refúgio de todos os pecadores.

domingo, 18 de maio de 2025

EVANGELHO DO DOMINGO

 

'Bendirei o vosso nome, ó meu Deus, meu Senhor e meu Rei para sempre' (Sl 144)

Primeira Leitura (At 14,21b-27) - Segunda Leitura (Ap 21,1-5a) -  Evangelho (Jo 13,31-33a.34-35)
 
  18/05/2025 - QUINTO DOMINGO DA PÁSCOA

O NOVO MANDAMENTO


Deus, em sua infinita misericórdia, destinou ao homem, não apenas a plenitude de uma felicidade puramente natural mas, muito mais que isso, por desígnios imensuráveis à condição humana, a plenitude da eterna felicidade com Ele. E, para nos tornar co-participantes de sua glória, nos escolheu, um a um, desde toda a eternidade, como criaturas humanas privilegiadas e especiais, moldadas pelo infinito amor do divino intelecto. Glória aos homens bem-aventurados que, nascidos e criados pelo infinito amor, foram e serão redimidos pelo amor de Cristo para toda a eternidade!

Neste Quinto Domingo da Páscoa, somos chamados a vivenciar este amor de Deus em plenitude. Jesus encontra-se no Cenáculo, pouco antes de sua ida ao Horto das Oliveiras e da sua prisão e morte na cruz. E acaba de revelar aos seus discípulos amados, mais uma vez, a identidade do amor divino entre Pai e Filho, regida pelo Espírito Santo: 'Agora foi glorificado o Filho do Homem, e Deus foi glorificado nele' (Jo 13, 31). Do amor intrínseco à Santíssima Trindade, medida infinita do amor sem medidas, Jesus vai nos dar o princípio do amor humano verdadeiro e recíproco ao amor divino: 'Eu vos dou um novo mandamento: amai-vos uns aos outros. Como eu vos amei, assim também vós deveis amar-vos uns aos outros' (Jo 13, 34).

Sim, como Cristo nos amou. Na nossa impossibilidade humana de amar como Cristo nos ama, isso significa amar sem rodeios, amar sem vanglória, amar sem zelos de gratidão, amar de forma despojada e sincera aos que nos amam e aos que não nos amam, a quem não conhecemos, a quem apenas tangenciamos por um momento na vida, a todos os homem criados pelos desígnios imensuráveis do intelecto divino, à sombra e imersos na dimensão do infinito amor de Cristo por nós.

Nesta proposição distorcida e acanhada do amor divino, o amor humano se projeta a alturas inimagináveis de santificação, e expressa a sua identificação incisiva no projeto de redenção de Cristo: 'Nisto todos conhecerão que sois meus discípulos, se tiverdes amor uns aos outros' (Jo 13, 35). Eis aí a essência do novo mandamento: amar, com igual despojamento, toda a dimensão da humanidade pecadora, a exemplo de um Deus que se entregou à morte de cruz para nos redimir da morte e mostrar que o verdadeiro amor não tem limites nem medida alguma.

sábado, 17 de maio de 2025

100 ANOS DA CANONIZAÇÃO DE SANTA TERESA DE LISIEUX

Há 100 anos, no dia 17 de maio de 1925, o Papa Pio XI celebrou a Canonização Solene de Teresa de Lisieux, como 'Santa Teresa do Menino Jesus e da Sagrada Face'.


'... Damos graças a Deus por hoje nos ser permitido, como Vigário do Seu Filho Unigênito, repetir e inculcar em todos vós, a partir desta Sede da Verdade e durante este rito solene, uma recordação muito salutar dos ensinamentos do Divino Mestre. Depois de os discípulos o terem interrogado sobre quem era o maior no Reino dos Céus, Ele, chamando uma criança, colocou-a no meio deles e pronunciou estas memoráveis palavras: 'Em verdade vos digo que, se não vos converterdes e não vos tornardes como crianças, não entrareis no Reino dos Céus' (Mt 18,2).

Teresa, a nova santa, tendo absorvido vivamente esta doutrina evangélica, traduziu-a na prática da vida cotidiana; de fato, com a palavra e com o exemplo, ensinou às noviças do seu mosteiro este caminho da Infância Espiritual, e a todos através dos seus escritos, escritos que se espalharam pelo mundo e que, depois de lidos, continuam a ser lidos uma e outra vez pelo máximo benefício e alegria que dão à alma. De fato, esta jovem que desabrochou na clausura do Carmelo, e que juntou ao seu nome o do Menino Jesus, fez sobre si a sua imagem; então deve dizer-se que quem venera Teresa, venera e louva o exemplo divino que ela copiou em si mesma.

Hoje, portanto, esperamos que nas mentes dos fiéis surja o desejo de praticar esta Infância Espiritual, que consiste nisto: que tudo o que a criança pensa e faz por natureza, nós o façamos no exercício da virtude. As criancinhas não são perturbadas pelos pecados e cegas pelas paixões e gozam de paz na posse da sua inocência (e sem meios de engano ou hipocrisia exprimem sinceramente os seus pensamentos e ações, de modo que se mostram como realmente são), de modo que Teresa mostrou uma natureza mais angélica do que humana, e conquistou a simplicidade da criança, segundo a Lei da Verdade e da Justiça.

A Menina de Lisieux guardou sempre na memória o convite e as promessas do seu Divino Esposo: 'Quem for pequeno (Pv 9,4) venha a Mim. Será acolhido no meu regaço e, carregados no colo, como uma criança que a mãe consola, sereis consolados' (Is 66,12-13), de modo que Teresa, consciente da sua fraqueza, se confiava à Divina Providência para que, contando unicamente com a sua ajuda, pudesse alcançar a perfeita santidade de vida, mesmo quando passava por dificuldades, e de uma absoluta, mas alegre, abdicação da própria vontade...'

(Excertos do Sermão de Canonização de Santa Teresa de Lisieux, pelo Papa Pio XI, em 17 de maio de 1925) 

sexta-feira, 16 de maio de 2025

QUESTÕES SOBRE A DOUTRINA DA SALVAÇÃO (XIV)

P. 31 - Isto é muito forte, de fato. Mas como este é um caso em que muitos pretendem dar grande ênfase, de onde vem o peso que parece ter para estes em favor daqueles que até mesmo morrem em uma religião falsa?

O erro deles decorre da ideia que formam para si mesmos das chamadas boas obras e de não observarem a grande diferença que existe entre as boas ações morais naturais e as boas obras cristãs sobrenaturais, que por si só levarão o homem ao céu. Por mais corrompida que seja a nossa natureza pelo pecado, ainda assim há poucos ou nenhum da semente de Adão que não tenha certas boas disposições naturais, sendo alguns mais inclinados a uma virtude, outros a outra. Assim, alguns têm uma disposição humana e benevolente; alguns têm um coração terno e compassivo para com os outros em dificuldades; alguns são justos e retos em seus negócios; alguns são temperantes e sóbrios; alguns são brandos e pacientes; alguns também têm sentimentos naturais de devoção e reverência pelo Ser Supremo. Ora, todas essas boas disposições naturais, por si mesmas, estão longe de ser virtudes cristãs, e são totalmente incapazes de levar um homem ao céu. De fato, elas tornam aquele que as possui agradável aos homens e obtêm estima e consideração daqueles com quem vive, mas não têm qualquer utilidade perante Deus no que diz respeito à eternidade. Para nos convencermos disso, basta observar que boas disposições naturais desse tipo são encontradas em muçulmanos, judeus e pagãos, bem como entre os cristãos; no entanto, nenhum cristão pode supor que um muçulmano, judeu ou pagão, que morre nesse estado, obterá o reino dos céus por meio dessas virtudes.

Os fariseus, entre o povo de Deus, eram notáveis por muitas dessas virtudes: tinham grande veneração pela lei de Deus; faziam profissão aberta de piedade e devoção; davam grandes esmolas aos pobres; jejuavam e oravam muito; eram assíduos em todas as observâncias públicas da religião; eram notáveis por sua estrita observância do sábado e tinham aversão a toda profanação do santo nome de Deus; contudo, o próprio Jesus Cristo declara expressamente: 'Se a vossa justiça não exceder a dos escribas e fariseus, de modo nenhum entrareis no reino dos céus' (Mt 5,20). Dizem-nos que um deles subiu ao templo para orar e que era, aos olhos do mundo, um homem muito bom, levava uma vida inocente, livre dos crimes mais grosseiros que são tão comuns entre os homens, jejuava duas vezes por semana e dava o dízimo de tudo o que possuía; no entanto, o próprio Cristo nos assegura que ele foi condenado aos olhos de Deus. Tudo issonos prova que nenhuma das boas disposições da natureza acima mencionadas é capaz, por si só, de levar qualquer homem ao céu. E a razão é que 'não há outro nome dado aos homens debaixo do céu pelo qual possamos ser salvos, a não ser o nome de Jesus' (At 4,12) e, portanto, nenhuma boa obra, qualquer que seja ela, realizada apenas pelas boas disposições da natureza, pode jamais ser coroada por Deus com a felicidade eterna. 

Para obter essa gloriosa recompensa, nossas boas obras devem ser santificadas pelo sangue de Jesus e se tornarem virtudes cristãs. Ora, se examinarmos as Sagradas Escrituras, encontraremos duas condições absolutamente necessárias para tornar nossas boas obras agradáveis a Deus e conducentes à nossa salvação. Primeiro, que estejamos unidos a Jesus Cristo pela verdadeira fé, que é a raiz e o fundamento de todas as virtudes cristãs; pois São Paulo diz expressamente: 'Sem fé é impossível agradar a Deus' (Hb 11,6). Observe-se a palavra impossível; ele não diz que é difícil, mas que é impossível. Portanto, mesmo que um homem tenha tantas boas disposições naturais e seja tão caridoso, devoto e mortificado quanto os fariseus, se ele não tiver verdadeira fé em Jesus Cristo, não poderá entrar no reino dos céus. Recusaram-se a crer nele e, portanto, todas as suas obras de nada valeram para a sua salvação e, a menos que a nossa justiça exceda a deles neste ponto, como o próprio Cristo nos assegura, nunca entraremos no seu reino celestial. 

Mas mesmo a fé verdadeira, por mais necessária que seja, não basta por si só para tornar as nossas boas obras disponíveis para a salvação; pois é necessário, em segundo lugar, que estejamos em caridade com Deus, na sua amizade e graça, sem o que mesmo a fé verdadeira nunca nos salvará. Para nos convencermos disso, basta ouvirmos São Paulo, que diz: 'Ainda que eu tivesse toda a fé, a ponto de remover montanhas, ainda que distribuísse todos os meus bens para alimentar os pobres, ainda que entregasse o meu corpo para ser queimado, e não tivesse caridade, isso de nada me aproveitaria' (ICor 13,2). Assim, se um homem for pacífico, regular, inofensivo e religioso em seu caminho, caridoso para com os pobres, e o que mais lhe aprouver, ainda assim, se ele não tiver a verdadeira fé de Jesus Cristo e não estiver em caridade com Deus, todas as suas virtudes aparentes não servem para nada; é impossível para ele agradar a Deus por meio delas e se ele viver e morrer nesse estado, elas não lhe aproveitarão em nada. Por isso,  é manifesto que aqueles que morrem numa religião falsa, por mais inaceitável que seja sua conduta moral aos olhos dos homens, ainda assim, como eles não têm a verdadeira fé de Cristo, e não estão em caridade com Ele, eles não estão no caminho da salvação; pois nada pode nos valer em Cristo, senão 'a fé que opera pela caridade' (Gl 5,6).

P. 32 -  Mas sendo tudo isto tão evidente, como é que hoje em dia alguns, que se professam membros da Igreja de Cristo, parecem por em causa esta verdade, advogando continuamente a favor daqueles que não são da sua comunhão, propondo desculpas para eles e usando todos os seus esforços para provar uma possibilidade de salvação para aqueles que vivem e morrem numa falsa religião?

Este é um daqueles artifícios de que o inimigo das almas faz uso nestes tempos infelizes para promover sua própria causa e que há motivos para temer que tenha, por várias razões, encontrado seu caminho até mesmo entre aqueles que pertencem ao rebanho de Cristo, pelas seguintes razões:

(i) como eles vivem entre aqueles que praticam falsas religiões e muitas vezes têm as conexões mais íntimas com eles, eles naturalmente e muito louvavelmente contraem um amor e afeição por eles. Isso faz com que, a princípio, não queiram pensar que seus amigos deveriam estar fora do caminho da salvação. Depois, passam a desejar e esperar que não seja assim. Daí chegam a questionar o fato de ser assim e, a partir daí, é fácil agarrarem-se a qualquer pretexto para se persuadirem disso; 

(ii) princípios fundamentais podem ser encontrados em todos os lugares nestes nossos dias; uma misericórdia não pactuada, por assim dizer, é encontrada em Deus para muçulmanos, judeus e infiéis, que nunca foi ouvida entre os cristãos. Isso é revestido com o caráter ilusório de uma maneira liberal de pensar e sentimentos generosos e tornou-se moda pensar e falar dessa maneira. Ora, a moda é um persuasivo muito poderoso, contra o qual mesmo as pessoas de bem nem sempre estão à prova; e quando alguém ouve esses sentimentos todos os dias ressoando em seus ouvidos e qualquer coisa que pareça contrária a eles ser ridicularizada e condenada, ele naturalmente cede à ilusão e desvia sua mente de querer examinar a força desses sentimentos, por medo de descobrir sua falsidade. Quando, por medo de sermos desprezados, desejamos que qualquer coisa seja verdadeira, é muito fácil acreditar que ela seja verdadeira e, sem um exame mais aprofundado, qualquer demonstração sofística da razão a seu favor é adotada como conclusiva;

(iii) o interesse mundano também muitas vezes concorre com sua influência dominante para produzir o mesmo fim. Um membro da Igreja de Cristo vê seu amigo separado dela mas com poder e crédito no mundo, capaz de ser de grande interesse para ele, e sabe que, se ele abraçasse a verdadeira fé, perderia toda a sua influência e se tornaria incapaz de servi-lo. Isso o faz esfriar em desejar seu amigo ser realmente um homem de fé. Isso faz com que ele não tenha um real desejo pela sua conversão; mas o pensamento de que seu amigo não está no caminho da salvação o aflige e o sujeito então começa a desejar que ele possa ser salvo como ele se encontra em sua própria religião. Por isso, começa a esperar por isso e adota de bom grado qualquer prova que o faça pensar que sim. É verdade, de fato, que todas estas razões teriam pouca influência sobre um membro sincero da Igreja de Cristo, que compreende a sua religião e tem um sentido justo do que ela lhe ensina a este respeito; 

(iv) o grande infortúnio de muitos que adotam essas maneiras frouxas de pensar e falar é que são ignorantes dos fundamentos de sua religião e não examinam o assunto minuciosamente e, uma vez infectados pelo espírito dos tempos, eles nem estão dispostos a examinar e até mesmo consideram impróprio se qualquer amigo zeloso tentar desiludi-los; agarrando-se a esses sofismas miseráveis que são alegados em favor de sua maneira frouxa de pensar, recusam-se a abrir os olhos para a verdade ou mesmo a considerar as próprias razões que a legitimam.

(Excertos da obra 'The Sincere Christian', V.2, do bispo escocês George Hay, 1871, tradução do autor do blog)