... A salvação do homem depende da oração, e, por isso, ela é primordial e necessária, pois, através dela, a fé é vivificada e as boas obras se realizam. Numa palavra, com a oração tudo se processa com êxito; sem a oração, não podemos praticar ato algum de piedade cristã. Desse modo, a exigência de que nossa vida seja incessantemente oferta, depende exclusivamente da oração. As outras virtudes têm seu tempo próprio, mas, no caso da oração, pedem-nos uma atitude ininterrupta: 'Orai sem cessar'. É justo e oportuno que rezemos sempre, por toda parte.
A verdadeira oração apresenta suas condições. Deve ser oferecida com espírito e coração puros, zelo ardente, rigorosa atenção, com temor e respeito, com a mais profunda humildade. Mas quem, conscientemente, deixará de reconhecer estar longe de cumprir essas condições? quem não reconhecerá que oferece a sua oração mais por necessidade do que por um domínio sobre si mesmo, do que por uma inclinação, preferência e amor à oração? Também a esse respeito a Sagrada Escritura nos diz não estar no poder do homem conservar seu espírito inabalável, purificá-lo dos maus pensamentos, porque 'os pensamentos do homem são maus desde a sua juventude' e que só Deus nos pode dar outro coração e um espírito novo, 'porque meu espírito (quer dizer, minha voz) está em oração, mas minha inteligência nenhum fruto colhe' (1 Cor 14,14). 'Não sabemos o que pedir como convém' (Rm 8,26), afirma ainda o apóstolo. Conclui-se que somos incapazes, por nós mesmos, de oferecer a verdadeira oração. Não podemos, em nossas preces, manifestar as propriedades essenciais da verdadeira oração.
Se é essa a incapacidade de todo ser humano, o que sobra à vontade e à força do homem para a salvação
da alma? O homem não pode adquirir a fé sem oração; essa asserção aplica-se, igualmente, às boas
obras. Mas a autêntica oração não está em seu poder. Que lhe resta, então, fazer? que parte lhe cabe
para exercer sua liberdade e sua força, para que não venha a perecer, mas ser salvo?
Cada ato tem seu valor, e Deus reservou para si a liberdade de concedê-lo ou não. Para que a
dependência do homem em relação a Deus, ao querer divino, se manifeste mais profundamente na
humildade, Deus confiou à vontade e à força do homem o número de orações. Mandou rezar sem
cessar, sempre, a cada momento e em toda parte. É aí que se encontra revelado o método secreto da
verdadeira oração, e, ao mesmo tempo, da fé e do cumprimento dos mandamentos de Deus. É,
portanto, o número de orações que é assinalado ao homem; a frequência da oração pertence a ele e
encontra-se sob a oscilação de sua vontade.
Esse é o ensinamento dos Padres da Igreja. São Macário,
o anacoreta, diz que, na realidade, rezar é dom da graça. São Hesíquio afirma que a oração frequente
torna-se um hábito, depois uma segunda natureza, e que, sem invocar com frequência o nome de Jesus
Cristo, é impossível purificar o coração. Calisto e Inácio aconselham a invocação assídua e contínua do nome de Jesus, antes de todas as asceses e obras, pois, tal insistência leva a oração imperfeita à
oração perfeita. O bem-aventurado Diádoco insiste em dizer que, se um homem invoca o nome de
Deus tão frequentemente quanto possível, não cairá em pecado.
Quanta sabedoria e experiência desses dizeres e como essas instruções práticas repercutem no
coração! Pela sua experiência e simplicidade, lançam luzes sobre os meios de levar a alma à
perfeição. E que contraste com as instruções morais da razão teórica! Assim fala a razão: fazei estas
ou aquelas boas ações; armai-vos de coragem, empregai a força de vossa vontade, convencei-vos dos
benéficos frutos da virtude; purificai vosso espírito e vosso coração das ilusões do mundo, substituí-as
por meditações instrutivas, fazei o bem, e sereis respeitado e encontrareis a paz; vivei segundo a
razão e a consciência. Infelizmente, porém, a despeito de toda a sua força, esse raciocínio não atingirá
seu fito, sem a oração frequente, sem invocar a ajuda de Deus.
... Para convencer-vos definitivamente da necessidade e fecundidade da oração frequente, anotai: Todo desejo e todo pensamento de oração é obra do Espírito Santo e a voz do vosso Anjo da
guarda. O nome de Jesus Cristo invocado na oração contém em si mesmo um poder salvífico que existe e
age por si próprio; assim, pois, não vos perturbeis com a aridez de vossa oração, e esperai, com
paciência, o fruto da invocação frequente do nome divino. Não ouçais as insinuações daqueles que,
inexperientes e insensatos, alegam que a invocação tíbia é uma repetição inútil, até mesmo monótona.
Não: o poder do nome divino e sua invocação frequente produzirão frutos a seu tempo.
(Excertos da obra 'Relatos de um Peregrino Russo', autor anônimo, Ed. Vozes, 2008)