V
A terceira razão do Sinal da Cruz ter sido dado aos homens é a de nos tirarmos da pobreza, pois é um tesouro inesgotável que nos enriquece. E nos enriquece porque é uma excelente súplica. O Sinal da Cruz é uma súplica poderosa;
uma súplica universal. E o que é um homem suplicando? É um indivíduo que, diante de Deus, confessa sua indigência: indigência intelectual, indigência moral, indigência material. Assim, suplicou por nós sobre a Cruz o adorável Mendigo do Calvário. E o que faz o homem formando o Sinal da Cruz, quer com a mão, quer estendendo os braços?
Imprime em si mesmo a imagem do Divino Mendigo.
Identifica-se com Ele como Jacó cobrindo-se das vestes de Esaú, para obter a bênção paterna.
Quando o homem, ameaçado por um perigo, assaltado
pela dúvida, perseguido por uma tentação, dominado pelo sofrimento ou pela doença, ao pronunciar estas palavras de solene autoridade: 'Em nome do Pai, e do Filho e do Espírito Santo" — e, ao pronunciá-las, faz o Sinal redentor do mundo,
o Sinal vencedor do inferno, como poderás admitir a
menor resistência por parte do mal?
Não satisfez o homem todas as condições necessárias ao resultado?
E não está Deus em posição de intervir e de glorificar o seu Nome e o poder de Seu Cristo?
A piedade de quem faz o Sinal da Cruz, muito contribui para a sua eficácia. O Sinal da é uma invocação tácita a Jesus
Crucificado; é pois, tento mais eficaz quanto maior for o fervor com que é feito.
Seja ela de coração ou de boca, a invocação é tanto
mais apta a produzir efeito quanto mais o fiel é virtuoso
e mais do agrado do Senhor. é uma súplica universal e, de certo modo, com ele pode-se dizer como o próprio Salvador: 'foi-me dado todo o poder do Céu e da terra'.
Se o Sinal da Cruz presidisse todas as lições que
hoje se dão, todos os livros que se imprimem, acreditas
tu que haveríamos de estar, assim, inundados como estamos
de erros, de sofismas, de ideias falsas e de sistemas incoerentes cujo resultado incontestável é fazer baixar a olhos
vistos o mundo moderno às trevas intelectuais de onde o
Cristianismo já o havia tirado?
Vinte vezes ao dia sedutores objetos se oferecem aos nossos olhos; maus pensamentos nos importunam o espírito; e, revoltados, os sentidos solicitam-nos o coração a
traições covardes. Ó de quanta força carece o homem! E onde a encontrará?
No Sinal da Cruz.
O testemunho dos séculos, a experiência dos veteranos e o exemplo dos conscritos na virtude, atestam hoje
como ontem o poder soberano que o Sinal Divino tem
para dissipar os encantos sedutores, afugentar os maus
pensamentos e reprimir os movimentos da concupiscência.
Vês este doente cercado de dores, abandonado de todos ou rodeado de parentes e amigos sem forças para lhes valer?
Detrás dele, há o tempo que foge e, à sua frente, a eternidade que avança.
Sim; a eternidade em que ele vai cair sem que nenhuma força humana possa retardar-lhe o momento da
partida ou adoçar as angústias da. viagem! Este doente, meu caro amigo, és tu, sou eu, é todo o homem, rico ou pobre, súdito ou monarca.
Se durante os combates da vida carecemos de luz, de
força de consolação e de esperança, não teremos nós de
tudo isto uma necessidade mil vezes maior nas lutas decisivas da morte? Pois bem, o Sinal da Cruz é tudo isto para todos nós. À maneira dos mártires que, ao caminhar ao último
combate, não deixavam de se fortalecer pelo Sinal da Cruz,
os verdadeiros cristãos dos séculos passados recorriam
sempre ao Divino Sinal para adoçar as dores e santificar suas mortes.
Mendigo na ordem espiritual, o homem não é menos indigente na ordem temporal.
Nosso corpo e nossa alma vivem senão de esmolas.
Entre os bens necessários ao corpo, há dois em particular que gostaria de mencionar — a saúde e a segurança. Um e outro, o Sinal da Cruz no-los alcança. Quantos e quão numerosos são os testemunhos que o Sinal adorável dAqueIe que veio ao mundo
para curar todas as moléstias, não tem deixado nunca de
dar vista aos cegos, ouvido aos surdos, fala aos mudos, saúde aos doentes e vida aos mortos. O Sinal da Cruz protege não só a nossa vida, mas
tudo quanto nos pertença, e daí o hábito católico de se benzer, com o Sinal libertador, também as nossas casas, animais e todas as coisas de nosso uso particular.
(Excertos adaptados da obra 'O Sinal da Cruz', do Monsenhor Gaume, 1862)