'Entrai pela porta estreita, porque larga é a porta e espaçoso o caminho que conduzem à perdição e numerosos são os que por aí entram. Estreita, porém, é a porta e apertado o caminho da vida e raros são os que o encontram'
(Mt 7, 13-14)
No livro do Deuteronômio [capítulos 28 a 32], Deus dispôs diante o povo hebreu dois caminhos - um repleto de bênçãos; outro eivado de maldições. Dois caminhos antagônicos, opostos, separados por um abismo de consequências irreconciliáveis: 'ponho diante de ti a vida e a morte, a bênção e a maldição. Escolhe, pois, a vida, para que vivas com ela a tua posteridade, amando o Senhor, teu Deus, obedecendo à sua voz e permanecendo unido a ele. Porque é esta a tua vida e a longevidade dos teus dias na terra que o Senhor jurou dar a Abraão, Isaac e Jacó, teus pais' (Dt 30, 19-20).
Jesus nos remete à mesma opção dos dois caminhos que conduzem, ao final da trilha, a uma porta estreita ou a uma porta larga e espaçosa. No primeiro caso, não se anda em bandos, nem no atropelo de caravanas ou romarias, mas impõe uma caminhada pessoal, contínua e perseverante, que nos leva às eternas moradas. Muitas vezes, e quase sempre, estamos sozinhos e seguir em frente não nos dá o privilégio da companhia. Por isso, é um caminho difícil, penoso, que depende essencialmente de uma escolha pessoal. O segundo caminho é plano e espaçoso, que oferece muitos encantos e encontros, muitas opções de paradas e descanso. Nunca estaremos sozinhos e, muitas vezes, seguir é apenas uma opção entre parar e voltar muitos passos.
Cada um de nós é totalmente responsável pelo seu destino final, pela construção de uma caminhada essencialmente pessoal; vamos prestar contas de todos os nossos atos e de nossa vida sozinhos - irremediavelmente sozinhos - diante do Pai. Por isso, o caminho espiritual de elevação a Deus é uma senda estreita; cada passo dado é uma certeza absoluta de que estamos mais perto da felicidade eterna, mais próximos de Deus. O outro caminho, pela sua amplitude, falseia esta realidade e nos consola com apelos mundanos e da companhia provisória, comumente nos expõe às necessidades humanas e aos interesses do tempo, e nos regala com a brevidade da vida e não com a eternidade da graça.
Jesus é enfático em caraterizar as dificuldades de se seguir o 'caminho da vida'. Dizer-se ciente e comprometido com a Santa Vontade de Deus é um propósito bastante atraente e certamente atrai muitas boas intenções e pode ser inclusive bastante romantizado, mas nada tem de fácil ou de romântico. É um caminho de decisões constantes, firmes decisões, no compromisso de se viver a autêntica fé cristã no cotidiano da vida. Exige convicção, fortaleza de espírito, perseverança, confiança em Deus. Não é um percurso de algumas horas ou uma senda de quilômetros. É um caminho a ser percorrido por uma vida inteira, todos os dias. O caminho da vida leva à porta da vida eterna: não se fica diante de Deus pela eternidade sem gastar a sola do sapato no caminho da santidade.
O 'caminho da morte', por outro lado, é gratuito e feliz, quase como uma corredeira de eventos jubilosos. Quase nunca se está sozinho, a felicidade está sempre nos outros, nos prazeres de lugares e acontecimentos. O coração está cheio de amores e disposições, mas apenas para os sentimentos e os interesses mais óbvios e humanos; a vontade está condicionada a um futuro imediato e previsível; a mente está totalmente tomada pelo significado de coisas a fazer no estrito domínio da rendição completa aos ditames do tempo que passa.
Todo homem terá que percorrer um destes dois caminhos; não existe meio termo. Jesus não aceitou a sua missão pela metade e redimiu o mundo porque aceitou plenamente o caminho do amor e o caminho da Cruz. E, ao dar o testemunho da porta estreita, foi incisivo em determinar que o caminho da redenção e da salvação tem o mesmo sentido. Deus não faz opções por quem tem meio coração, um coração partido e dividido entre Deus e o mundo, entre a fé e o pecado. É apenas o pleno amor a Deus que vai empurrar, no amparo do livre arbítrio, as nossas almas para o caminho estreito da vida e para a porta estreita da eternidade, tal como nos conclama o próprio Deus, com santa veemência, pela boca de Moisés: 'Escolhe, pois, a vida' (Dt 30, 19).