quinta-feira, 21 de maio de 2020

CANTOS DA MISSA TRADICIONAL (II): VIDI AQUAM

Vidi Aquam (Ez 47,9; Sl 117,1) é a antífona cantada no início das missas dos domingos do Tempo Pascal, durante o cerimonial da aspersão da água benta, em substituição ao canto Asperges Me, entoado nos domingos fora do Tempo Pascal. Ao receber a aspersão, o fiel deve fazer o Sinal da Cruz. Durante a entoação das palavras: 'Glória ao Pai, ao Filho e ao Espírito Santo', o sacerdote se volta para o altar e reclina respeitosamente a cabeça, continuando, a seguir, a prática da aspersão aos presentes. Caso necessário, o canto é repetido em sua parte inicial ou no todo.



Vidi aquam  egredientem de templo, a
latere dextro, alleluja: et omnes, ad quos
pervenit aqua ista, salvi facti sunt, et dicent:
alleluia, alleluia. Confitemini Domino,
quoniam bonus: quoniam in sæculum
misericordia ejus.
Gloria Patri, et Filio, et Spiritui Sancto
.sicut era in principio, et nunc, et semper,
et in saecula saeculorum. Amen. 

Vi a água jorrando do lado direito
do Templo, aleluia; e todos a quem
chegou esta água, serão salvos
e dirão: aleluia, aleluia.
Confessai ao senhor porque Ele é bom;
porque é eterna a sua misericórdia.
Glória ao Pai, ao Filho e ao Espírito Santo
assim como era no princípio, agora e sempre,
por todos os séculos dos séculos. Amém.

quarta-feira, 20 de maio de 2020

LEMBRANDO OS MÁRTIRES DE ABITENE...


Em 24 de fevereiro de 303, o imperador Diocleciano publicou um decreto proibindo aos cristãos, sob pena de morte, ter posse das Escrituras, reunir-se aos domingos para celebrar a Eucaristia e construir templos para os cultos da sua religião. Em Abitene, pequena localidade da África romana (na atual Tunísia), o bispo local (chamado Fundano) sucumbiu covardemente ao edito e entregou os Textos Sagrados às autoridades romanas. 

Alguns cristãos, porém, se recusaram a abdicar da fé cristã e continuaram professando a devoção corrente aos sacramentos. Num certo domingo, rezando a missa clandestinamente, 49 cidadãos de Abitene foram denunciados, presos e levados à presença das autoridades romanas em Cartago. Um a um, foram interrogados sobre a ilegalidade destes encontros e um a um, mesmo sob tortura, ratificaram os seus atos e a sua participação no santo sacramento da eucaristia por vontade e consciência próprias. 

O presbítero Saturnino, que havia presidido o culto, morreu sob tortura sem abdicar da sua fé cristã, sendo o seu ato seguido igualmente pelos seus quatro filhos: Saturnino, Felix, Maria e Hilarião, o mais novo. Quando perguntaram a Emérito porque participara do culto, ele respondeu: Sine Dominico non possumus! [Sem o domingo, não podemos (viver)!]. Isto é, sem o domingo, sem o sacramento da missa e da eucaristia, não podemos ser realmente católicos, não podemos viver sem celebrar o Dia do Senhor! Todos os demais proclamaram esse mesmo princípio e, por ele, foram todos assassinados como mártires da eucaristia.

Segundo a Tradição, eis os nomes dos 49 mártires de Abitene: Saturnino (pai), Saturnino (filho), Felix, Maria, Hilarião, Emérito, Dativo, Ampélio, Felix (outro), Rogaciano, Quinto, Maximiano ou Máximo, Tecla ou Tazelita, Rogaciano (outro), Rogado, Januário, Cassiano, Vitoriano, Vicente, Prima, Ceciliano, Restituta, Eva, Rogaciano (terceiro com o mesmo nome), Givalio, Rogado (outro), Pompônia, Secunda, Januária, Saturnina, Martino, Clautus, Felix (terceiro com o mesmo nome), Margarida, Maggiora, Honorata, Regiola, Vitorino, Pelúsio, Fausto, Deciano, Matrona, Cecília, Vitória, Herculina, Secunda (outra), Matrona (outra), Januária (outra) e Benigno, filho recém-nascido de Ampélio.

Acabamos de viver uma Páscoa sem sacramentos - um cenário indescritível nos 2000 anos da Igreja. Fundano é exemplo para quem? Pelo sangue destes mártires, a Igreja primitiva nos faz recordar que é melhor um cristão morrer do que abdicar da eucaristia e dos santos sacramentos... Quantos homens de Deus, nestes tristes tempos, seriam capazes de seguir até o fim o exemplo extremado dos 49 mártires de Abitene: sem o Domingo, o dia do Senhor, nós já não podemos viver?

terça-feira, 19 de maio de 2020

A VIDA OCULTA EM DEUS: A MANSIDÃO


A mansidão é uma das virtudes morais mais importantes para a vida contemplativa. Para nos dedicarmos à contemplação, precisamos da paz interior e exterior. A mansidão acalma a agitação de nossa alma e nos permite preservar a mais valiosa paz interior e exterior; facilita a oração, o diálogo em família e a conversa íntima com Deus; graças a isso, podemos ouvir a voz de Deus e segui-la. Existe em nós um poder de reação e irritação que nos permite lutar contra os obstáculos e combater o mal presente. É bom e lícito em si; sem ele, não seríamos capazes de agir, nossa alma tenderia a ser como uma roupa gasta e inerte e não seríamos capazes de reagir sensivelmente contra mal nenhum, nem mesmo contra o pecado.

Mas esse apetite, que por si só não é ruim, torna-se facilmente desordenado e repreensível quando se fica com raiva de coisas que não importam ou por razões que não são boas. Então, nasce na alma um desejo de vingança. Quando somos contrariados e feridos, sofremos e, porque sofremos, mantemos em nossos corações o desejo secreto de revidar no momento oportuno.

Portanto, é aconselhável ter muito cuidado porque essa é a pior coisa que existe na raiva, não só por ser contrária à caridade para com o próximo, a quem devemos querer bem, mas também muitas vezes contra a justiça. O terreno é escorregadio; pois esse desejo de vingança totalmente consentido, exceto no caso de matéria leve, poderia tornar-se um pecado mortal. Numa alma piedosa, o desejo surdo de vingança não é totalmente consentido, mas é perturbador por princípio e, como uma corrente profunda e semi-consciente, pode inspirar toda a nossa atividade sem que percebamos disso.

Daí aquelas estocadas, as provocações, aquelas palavras pretensamente amáveis ​​que têm suas gotas de amargura no final e com que habilidade o momento propício é capturado para machucar, morder ou espetar! Mas isso não é bom, pois é essencialmente contrário à virtude da mansidão e intimidade com Deus. Nunca uma alma que mantém esse sentimento - e nem estou falando de um grande desejo de vingança, mas daquele desejo que está oculto e que nem mesmo alguém deseja confessar a si mesmo - nunca esta alma poderá alcançar a paz. Este é um mal-estar espiritual muito doloroso que impede a completa tranquilidade e serenidade necessárias para contemplar a Deus.

A segunda e mais comum forma de imperfeição oposta  à virtude da mansidão é a impaciência, o mau humor. Quando nosso julgamento é contrariado, sentimos irritação, descontentamento, birra. Parece que se tira algo de nós, da nossa alma: uma preferência, um gosto por alguma coisa secundária que nos agradava, uma vontade que assumimos como nossa ... e sentimos a necessidade de demonstrar o nosso descontentamento por uma manifestação externa e, daí, o encolher dos ombros, a resposta inflamada e altiva, o olhar furtivo.

É aí que a virtude da mansidão deve intervir para paralisar o apetite irascível, com força reativa a outra força, para impedir de extravasar o que sentimos. Temos que ficar calados. Nenhuma palavra. Nem mesmo uma daquelas frases que parecem tão oportunas, tão justas. Não tente se  explicar. Mantenha-se calado! Se for possível, fale em um tom absolutamente moderado, totalmente amigável. Mas se não for possível, mantenha-se calado para deter, reprimir e sufocar a erupção vulcânica que está prestes a acontecer.

Para nos entregarmos a Deus na vida contemplativa, precisamos nos possuir primeiro. Uma alma que não sabe ter autocontrole não pode alcançar a paz. Existem mais ou menos dificuldades neste caminho, dependendo do temperamento de cada um, mas os movimentos desordenados devem ser dominados por esforços longos e pacientes. Caso contrário, a pessoa está sempre ocupada em ficar aborrecida ou aborrecer os outros. Está sempre refém de ficar ruminando na mente as coisas ditas, o que vai dizer ou o que poderia ter dito, e a pobre alma não arreda pé daí. É um novelo que não se desata, assim que parece terminar, recomeça. É impossível entregar-se a Deus durante esse tempo. Todo o período de oração será tomado por essa discussão interior com quem e com o que nos machucou. E é pena muito grande perder a própria oração! No final, diremos a nós mesmos: 'O que eu estava pensando? Fui infeliz, sofri e não rezei porque não consegui controlar essa paixão, essa corrente subterrânea que levou tudo consigo'.

(Excertos da obra 'A Vida Oculta em Deus', de Robert de Langeac; Parte I -  O Esforço da Alma; tradução do autor do blog)

segunda-feira, 18 de maio de 2020

PALAVRAS DE SALVAÇÃO

'A ti, Senhor, que conheces os abismos da consciência humana, poderia eu esconder algo, ainda que não quisesse confessar-te? Eu poderia esconder-te de mim, mas nunca esconder-me de ti! Agora que meu pranto demonstra quanto me desagrado a mim mesmo, tu resplandeces aos meus olhos e me agradas, e és amável e desejável, a fim de que eu me despreze e renuncie a mim mesmo para escolher-te a ti, e que eu não agrade nem a mim nem a ti, senão por teu amor. Portanto, Senhor, tu me conheces como sou, e eu já disse com que finalidade me confesso a ti. É uma confissão feita, não com palavras e com a voz do corpo, mas com o grito interior da alma e com o clamor do pensamento, que os teus ouvidos já conhecem. Confessar o que fiz de mal significa o desgosto que tenho de mim mesmo. Mas, quando confesso o bem que fiz, nada posso atribuir a mim próprio, pois tu, Senhor, 'abençoas o justo'; no entanto, foste tu que o tornaste justo, do ímpio que era. Assim, esta confissão diante de ti é, ao mesmo tempo, silenciosa e não silenciosa. Cala-se a voz, grita o coração. Tudo que digo aos homens, tu já ouvistes de mim; e de mim nada ouves que tu mesmo não tenhas dito antes'.

(Confissões, Santo Agostinho)

domingo, 17 de maio de 2020

PÁGINAS COMENTADAS DOS EVANGELHOS DOS DOMINGOS


'Será melhor sofrer praticando o bem, se esta for a vontade de Deus, do que praticando o mal. Com efeito, também Cristo morreu, uma vez por todas, por causa dos pecados; o justo, pelos injustos, a fim de nos conduzir a Deus. Sofreu a morte, na sua existência humana, mas recebeu nova vida pelo Espírito' (1Pd 3, 17-18)

PÁGINAS DO EVANGELHO (2019 - 2020)

sábado, 16 de maio de 2020

A INSONDÁVEL PROFUNDIDADE DE DEUS

Deus está em todo lugar, imenso e próximo em toda parte, conforme o testemunho dado por ele mesmo: 'Eu sou o Deus próximo e não o Deus de longe'. Não busquemos, então, longe de nós a morada de Deus, que temos dentro de nós, se o merecermos. Habita em nós como a alma no corpo, se formos seus membros sadios, mortos ao pecado. Então verdadeiramente mora em nós aquele que disse: 'E habitarei neles e entre eles andarei'. Se, portanto, formos dignos de tê-lo em nós, em verdade seremos vivificados por ele, como membros vivos seus: nele, assim diz o Apóstolo, vivemos, nos movemos e somos. 

Quem, pergunto eu, investigará o Altíssimo em sua inefável e incompreensível essência? Quem sondará as profundezas de Deus? Quem se gloriará de conhecer o Deus infinito que tudo enche, tudo envolve, penetra em tudo e ultrapassa tudo, tudo contém e esquiva-se a tudo? Aquele que ninguém jamais viu como é. Por isto, não haja a presunção de indagar sobre a impenetrabilidade de Deus, o que foi, como foi, quem foi. São realidades indizíveis, inescrutáveis, ininvestigáveis; simplesmente, mas com todo o ardor, crê que Deus é como será, do modo como foi, porque Deus é imutável.

Quem, pois, é Deus? Pai, Filho e Espírito Santo, um só Deus. Não perguntes mais sobre Deus; porque os que querem conhecer a imensa profundidade, têm antes de considerar a natureza. Com razão compara-se o conhecimento da Trindade à profundeza do mar, conforme diz o sábio: 'E a imensa profundidade, quem a alcançará'? Do modo como a profundeza do mar é invisível ao olhar humano, assim a divindade da Trindade é percebida como incompreensível pelo entendimento humano. Por conseguinte, se alguém quiser conhecer aquele em quem deverá crer, não julgue compreender melhor falando do que crendo; ao ser investigada, a sabedoria da divindade foge para mais longe do que estava.

Procura, portanto, a máxima ciência não por argumentos e discursos, mas por uma vida perfeita; não pela língua, mas pela fé que brota da simplicidade do coração, não adquirida por doutas conjeturas da impiedade. Se, por doutas investigações procurares o inefável, irá para mais longe de ti do que estava; se, pela fé, a sabedoria estará à porta, onde se encontra; e onde mora poderá ser vista ao menos em parte. Mas em verdade até certo ponto também será atingida, quando se crer no invisível, mesmo sem compreendê-lo; deve-se crer em Deus por ser invisível embora, em parte, o coração puro o possa ver.

(São Columbano, século VII)

sexta-feira, 15 de maio de 2020

O QUE DIZER QUANDO NOS FALAM...

O que dizer quando nos falam...

... que a igreja tornou-se um lugar de risco mortal e não de salvação eterna?

... que a vocação da caridade cristã é nos esconder dos nossos semelhantes em momentos extremos?

... que o lugar de cristãos é ficar em casa rezando para Deus nos proteger para que o vírus não venha bater à nossa porta?

... que o medo da morte precoce libera o cristão de praticar a caridade?

... que o medo da morte precoce libera o cristão de praticar o martírio? (ou talvez isso seja para os santos? Mas, se não formos santos, o Céu não é para nós...)

... que, impedindo o ofício da Santa Missa, estamos mais seguros contra uma epidemia universal?

... que a anulação de nossa fé e vocação cristã deve ser a nossa resposta consciente contra o pânico e o terror induzidos pela mídia insana?

... que devemos ter horror a um vírus (que nos causa a morte física), mas preocupação alguma em relação ao pecado (que nos condena à morte eterna)?

... que um cristão deve agir diante das dificuldades como qualquer outra pessoa? 

... que abandonar o Cristo nos sacrários é uma imposição dos tristes tempos que vivemos e que Deus há de entender isso muito bem?

... que a impotência do medo é a grande solução para enfrentar um grande risco? (e Deus nos chama e nos quer como soldados de Cristo...)

... que sacerdotes e religiosos reclusos e confinados são o sinal visível da igreja em partida?

... que cada um deve viver segundo as suas crenças e interesses, a não ser quando for preciso ser dócil e servil a uma epidemia de medo?

... que ser igual a todos e fazer servilmente tudo o que todos fazem neste caso é o marco da nossa identidade como povo escolhido e a nação santa de Deus?

... que a realidade da morte é sempre causa de desespero natural? (mas a ressurreição de Cristo não é o atributo máximo da nossa fé cristã?)   

...  que não atender e prestar os últimos sacramentos aos doentes e moribundos é apenas uma restrição imposta pela infeliz situação atual?

... que devemos praticar o inverso das palavras de Jesus: 'quem quiser salvar a sua vida a perderá, mas quem perder a sua vida por mim e pelo Evangelho, a salvará' (Mc 8, 35)?

Mas o que ninguém ousa dizer é que...

...  quando todos são iguais no medo e na covardia é porque se tornaram iguais no pecado e na apostasia.