segunda-feira, 23 de março de 2020

O SINAL DA CRUZ (VIII/Final)


In hoc Signo vinces - 'Por este Sinal vencerás'

VIII/Final

Resta-nos, pois, praticar com resolução, muitas vezes e bem, o Sinal da Cruz. Fazendo-o, temos atrás de nós, à nossa volta e conosco, todos os homens e os grandes homens de todos os séculos, do Oriente e do Ocidente, enfim toda a imortal nação católica, o apuro da humanidade. Não o fazendo, temos atrás de nós, à nossa volta e conosco, os hereges, os incrédulos, os ignorantes e os brutos... grandes e pequenos. Fazendo o Sinal da Cruz, nós nos cobrimos, e também às demais criaturas, com uma defesa invencível. Não o fazendo, nos desarmamos, e também às demais criaturas, e ficamos expostos aos maiores perigos.

O homem e o mundo vivem recebendo necessariamente influxos do espírito do bem ou do espírito do mal. Por isso, há dezoito séculos, nos gritam os chefes do eterno combate, que cubramos a nós e às demais criaturas com o Sinal da Cruz, escudo impenetrável às setas inflamadas do inimigo [scutum in quo ignitae diaboli extinguuntur sagittae]. Como soldados indóceis e infiéis, queremos nos despojar voluntariamente da nossa armadura? Queremos, assim, ficar a peito descoberto e expostos estupidamente aos golpes mortais do exército inimigo?

A profanação progressiva dos domingos e dias santificados, os desprezos às leis do jejum e da abstinência, o abandono dos sacramentos da confissão e da comunhão, não comprometem apenas a alma, mas a saúde do corpo lhes pagam tributo. A excitação dos negócios, a agitação da política, a febre dos prazeres (que conforma o caráter distintivo dessa época de materialismo), a tibieza dos costumes, o hábito anormalíssimo de se trocar a noite pelo dia, a preocupação pela sensualidade na alimentação, o consumo assustador de bebidas alcoólicas, os milhares de botequins e tabernas, quanta consequência perniciosa isso não traz à saúde pública? De onde procede a perda das forças das gerações modernas?

O mundo atual é hoje mais enfermo que outrora. Qual o mal que o persegue? É o enfraquecimento da vida. O Verbo Criador é a vida e toda a vida. A vida, portanto, deve crescer para os que dEle se aproximam e deve diminuir para os que se desviam dEle. No pensar da Igreja e ao longo de todos os séculos cristãos, o ato exterior mais universal e cotidiano que sempre serviu para colocar o homem em contato direto com o Autor da Vida foi e é o Sinal da Cruz. O mundo atual, ao desprezar a sabedoria divina, pensa que pode violar impunemente uma Lei respeitada desde o berço do Cristianismo e que era respeitada inclusive pelos pagãos, que diziam: é necessário orar para ter saúde física e mental [orandum est ut sit mens sana in corpore sano].

Moral e fisicamente, o homem está na alternativa inevitável de viver debaixo da salutar influência do espírito do bem ou da maléfica artimanha do espírito do mal. O Sinal da Cruz nos coloca nessa primeira condição e a falta dele, na segunda. Esta é a doutrina da Igreja. Olha em torno de ti e procura por frontes, lábios, corações e mentes onde se conservam a santidade, a dignidade e a sobriedade do homem e do cristão, as vidas mortificadas e puras, as vidas fortes contra as tentações, as vidas dedicadas à caridade e às virtudes, as vidas que podem sem nenhum acanhamento revelar-se aos amigos e aos inimigos, e tudo isso encontrarás sob a proteção do Sinal da Cruz.

Devemos fazer o Sinal da Cruz bem feito. Devemos fazer o Sinal da Cruz muitas vezes. Devemos fazer o Sinal da Cruz com respeito, com atenção, com confiança e com devoção. Ainda que fosse de pequeno valor o Sinal da Cruz, devemos lembrar o que nos disse o Verbo Encarnado: 'quem é fiel nas pequenas coisas, será fiel nas grandes e quem é injusto no pouco também será injusto no muito' (Lc 16, 10). Esta fidelidade cotidiana forma a nossa vida cristã e nos prepara para a felicidade eterna. Em termos de salvação, não é bastante o que é apenas suficiente. Quem não faz senão o necessário, não o faz por muito tempo. Em se fazendo cinquenta vezes ao dia o Sinal da Cruz, e em se fazendo bem feito, teremos cinquenta boas obras ao final do dia, cinquenta degraus de glória e de felicidade para a vida eterna. São cinquenta moedas a mais para pagar as nossas dívidas ou dos nossos irmãos na terra ou no purgatório. Mais cinquenta súplicas pela conversão dos pecadores e pela perseverança dos justos, para afastar do mundo e das criaturas as moléstias, os perigos e os flagelos.

Repetindo as palavras dos padres e doutores da Igreja, ousemos dizer: Salve, ó Sinal da Cruz! Estandarte do Grande Rei, troféu imortal do Senhor, sinal de vida, salvação e bênção. Terror de satanás e das legiões infernais, baluarte inexpugnável, armadura invencível! Escudo impenetrável, espada real, fronte de honra! És a esperança dos cristãos, o remédio contra todas as enfermidades, a ressurreição dos mortos, o guia dos cegos, o amparo dos fracos, a consolação dos pobres, o deleite dos bons, a ruína dos soberbos, o jugo dos ímpios, a liberdade dos vassalos, a glória dos mártires, a virtude dos santos, o fundamento da Igreja! In hoc Signo Vinces - Por este sinal vencerás! 

(Excertos adaptados da obra 'O Sinal da Cruz', do Monsenhor Gaume, 1862)