Em 1887 morreu, em Jerusalém, o célebre padre dominicano, Frei Mateus Leconte, homem de grande talento e de uma virtude admirável. Foi um missionário que converteu muita gente em pregações pelas principais cidades da Europa. Quis, depois de uma vida apostólica cheia de méritos, recolher-se na Cidade Santa e fundar lá um convento da sua Ordem, no lugar onde foi martirizado o protomártir Santo Estevão.
Caiu gravemente enfermo e foi transportado para um hospital, onde esteve sob os cuidados de uma santa religiosa que fora sua dirigida espiritual por longos anos, outrora. O piedoso Frei Mateus se assustava com as contas que havia de dar a Deus no tribunal do Juízo. 'Meu padre', consolava-o a enfermeira, 'fizestes tanto bem com vossa pregações e salvastes tantas almas! Que podeis temer?' — 'Ó, minha filha', respondia o bom padre, 'não basta fazer boas obras, é mister fazê-las bem feitas e com muita pureza de intenção! Quando eu morrer, reze muito e muito por mim'. — 'Rezarei, sim, meu padre, e se um dia não precisar mais, venha me avisar' — 'Minha filha', respondeu sorrindo o Padre Mateus da simplicidade da Irmã, 'não é assim tão fácil voltar a este mundo. Em todo caso, prometo ajudá-la quando estiver no céu pela misericórdia de Deus. Ajude-me muito a entrar no céu, socorrendo-me no purgatório'.
Poucos dias depois falecia santamente o bom padre. Durante uma semana mais ou menos, a religiosa orou muito pela alma do Padre Mateus. Depois, ou por ocupações, ou porque pensasse que o padre tão santo não precisasse mais de orações e sufrágios, deixou de orar por ele. Um dia a boa religiosa estava na cela, em trabalho, quando sentiu de repente um forte cheiro de fumaça e alguma coisa que se queimava e muita fumaça insuportável. Em meio do fumo ouviu um gemido angustioso e terrível, que a gelou toda de horror — 'Minha filha! Minha filha! Reze muito por mim, reze muito por mim!'
E tudo desapareceu num instante. Quinze dias depois, o mesmo fenômeno se repete, mas já não com tanta intensidade. A religiosa, neste espaço de tempo, rezou e sofreu muito pela alma que lhe pedira orações. Desta vez, a voz misteriosa lhe disse: 'muito agradecido, minha filha, as tuas orações me aliviaram muito, foram um refrigerante orvalho nas chamas do purgatório que estou padecendo. Eu te peço uma caridade: a de dizer ao Prior do Convento que fundei, mande celebrar uma novena de Missas pela minha alma'.
A religiosa, sem hesitar, foi transmitir o recado ao Superior. Este recebeu-a com certa desconfiança, julgando se tratasse de uma visionária. Em todo caso, pensou ele, uma novena de Missas por alma do Padre Mateus não lhe fará mal. E sem demora mandou celebrar as Santas Missas. No último dia da novena, depois de celebrada a última Santa Missa, o Padre Guardião e os religiosos, após as últimas orações da noite, se retiraram para suas celas.
Um Irmão Leigo, homem muito equilibrado e de um temperamento positivo, nada sujeito a ilusões, sentiu que lhe batiam à porta da cela — 'Entre'! gritou logo. Qual não foi o seu espanto ao ver entrar o Padre Mateus, todo resplandecente e belo, cheio de alegria. O defunto se adiantou para o Irmão e tal como o fazia em vida, sorriu e perguntou com iam as coisas pelo convento — 'Tudo vai bem, Padre Mateus, só as saudades de V. Revma. e a falta que nos faz.' — 'Coragem', disse o defunto, 'eu agora parto para o céu e lá vos serei mais útil do que neste mundo'.
E estendeu a mão, apertando a mão do leigo com tanta força, que este sentiu por muitos dias este aperto. E Frei Mateus desapareceu num halo de luz. O Irmão, comovido, quis acordar o Superior e a Comunidade àquela hora. O Superior ouviu-o e conferindo as datas e as circunstâncias, e atendendo ao espírito equilibrado do Irmão leigo, viu que se tratava de uma verdadeira aparição. Louvou a misericórdia de Deus por ter mandado sufragar a alma do santo sacerdote, segundo o pedido da Irmã.
(Excertos da obra 'Tenhamos Compaixão das Pobres Almas!' de Monsenhor Ascânio Brandão, 1948)