quinta-feira, 7 de dezembro de 2023

O DOM DA CIÊNCIA

A alma, estando desligada do mal pelo temor de Deus e aberta às nobres afeições pelo dom de piedade, experimenta a necessidade de saber como evitará aquilo que é objeto de seu temor e como encontrará o que deve amar. O Espírito Santo vem em seu socorro e lhe trás o que deseja, derramando nela o dom da ciência. Por este dom precioso a verdade lhe aparece, ela sabe o que Deus pede e o que reprova, o que deve procurar e do que deve fugir. 

Sem a ciência divina, nossa vista corre o risco de perder-se por causa das trevas que muitas vezes obscurecem totalmente, ou em parte, a inteligência do homem. Essas trevas são provenientes, primeiramente, do íntimo de nós mesmos, que carrega os traços bem reais da decadência do pecado original. São ainda causadas pelos preconceitos e máximas do mundo que enganam diariamente os espíritos que se creem os mais retos. Enfim, a ação de satanás, que é o príncipe das trevas, exerce-se em grande parte com o fim de envolver nossa alma na obscuridade ou perdê-la com a ajuda de luzes falsas.

A fé que nos foi infundida no batismo é a luz da nossa alma. Pelo dom da ciência, o Espírito Santo produz, na virtude da fé, raios tão vivos que dissipam todas as trevas. As dúvidas, então, se esclarecem, o erro se desvanece e a verdade aparece com todo seu fulgor. Vemos cada coisa na sua verdadeira claridade que é a claridade da fé. Descobrem-se os deploráveis erros que estão em curso no mundo e que seduzem tão grande número de almas, dos quais, talvez tenhamos sido, nós mesmos, durante muito tempo, vítimas. O dom de ciência nos revela o fim que Deus se propôs na criação, aquele fim fora do qual os seres não poderiam encontrar nem o bem nem o repouso. Ensina o uso que devemos fazer das criaturas, que nos são dadas não para tropeço, mas para nos ajudar em nossa marcha para Deus. 

Sendo-nos, assim, manifestado o segredo da vida, nossa estrada torna-se segura, não hesitamos mais e nos sentimos dispostos a nos retirar de todo caminho que não nos conduza àquele fim. É esta ciência, dom do Espírito Santo, que o Apóstolo tem em vista quando, falando aos cristãos lhes diz: 'Antes éreis trevas; agora sois luz no Senhor: andeis agora como filhos da luz'. Daí vem a firmeza e a segurança da conduta cristã. A experiência pode faltar algumas vezes e o mundo nos perturba com o pensamento de dar algum temível passo em falso; mas o mundo não conta com o dom de ciência. 'O Senhor conduz o justo por vias retas e para assegurar seus passos lhe deu a ciência dos santos'. Todos os dias esta lição nos é dada. O cristão, por meio da luz sobrenatural, escapa a todos os perigos e, se não tem experiência própria, tem a experiência de Deus. 

Seja bendito, Divino Espírito, por essa luz que derramais e mantendes em nós com tão amável perseverança. Não permitais que nunca procuremos uma outra. Somente ela nos baste; fora dela só existem trevas. Guardai-nos das tristes inconsequências em que muitos se deixam levar imprudentemente, aceitando um dia vossa conduta e depois se entregando às opiniões do mundo; levando uma vida que não satisfaz nem ao mundo nem a Vós. Precisamos, pois, amar esta ciência que nos destes para que sejamos salvos; o inimigo de nossas almas inveja em nós essa ciência salutar e quer substituí-la por suas sombras. Não permitais, Divino Espírito, que ele consiga o seu pérfido desígnio e ajudai-nos sempre a discernir o que é verdadeiro do que é falso, o que é justo do que é injusto. Que segundo a palavra de Jesus, nosso olhar seja simples, a fim de que nosso corpo, quer dizer o conjunto dos nossos atos, dos nossos desejos e dos nossos pensamentos, esteja na luz; salvai-nos daquele olho que Jesus chama de mau e que torna tenebroso o nosso corpo inteiro.

(Excertos da obra 'Os Dons do Espírito Santo', de Dom P. Gueranger)