sábado, 17 de julho de 2021

TESOURO DE EXEMPLOS (85/87)


85. A VIDA LENDÁRIA DE SÃO DIMAS

Contam antigas lendas que a Sagrada Família, ao fugir para o Egito, quis refugiar-se, para passar a noite, numa cova que, por desgraça, era uma guarida de ladrões. O capitão dos bandidos sentiu-se comovido ao ver a venerável bondade de São José, a pureza e formosura da Santíssima Virgem e o olhar todo celeste do Menino Jesus. Acolheu-os, deu-lhes de comer e, na manhã seguinte, ofereceu-lhes pão para a viagem e, a Maria, uma bacia de água para banhar o Menino. 

O capitão tinha um filhinho, aproximadamente da idade de Jesus, que se achava coberto de lepra. Nossa Senhora, correspondendo às finezas daquele homem rude e duro, mas que algo de bom tinha no coração, aconselhou-o a lavar o filhinho na água em que banhara o Menino Jesus. Assim o fez o bandoleiro e, no mesmo instante, seu filhinho ficou curado da lepra. O capitão lembrou muitas vezes ao filho a quem devia a saúde e a vida, dizendo: 'Foi o milagre de um Menino de tua idade, que seria, quem sabe, o Messias anunciado pelos profetas'.

Crescendo, seguiu aquele menino o exemplo do pai, tornando-se ladrão. Preso e condenado à morte, ao subir ao Calvário, ia pensando em Jesus, seu companheiro de suplício, que era tão santo e paciente, que, sem dúvida, havia de ser o Messias, aquele mesmo menino que o livrara da lepra. As lendas dizem que o bom ladrão se chamava Dimas e o mau, Gestas. Ambos foram condenados a morrer junto com Jesus e no mesmo suplício.

Atrás de Jesus subiram ao Calvário, levando suas cruzes. Junto com Ele, foram levantados nas respectivas cruzes. Viram como os soldados repartiam entre si as vestes do Salvador; mas, como a túnica era de uma só peça, tiraram a sorte a ver quem a levaria. Ouviram as palavras de Cristo: 'Pai, perdoai-lhes porque não sabem o que fazem'. Jesus era objeto de todos os insultos. A multidão, curiosa e soez, passava por diante dEle, e, movendo a cabeça em sinal de desprezo, diziam: 'Vamos! Tu que destróis o templo de Deus e em três dias o reedificas, salva-te a ti mesmo. Se és o Filho de Deus, desce da cruz...'

Todos blasfemavam e insultavam a Jesus. Mas a graça operou um milagre: um dos ladrões, Dimas, considerando as virtudes sobre-humanas de Jesus, acreditou ser Ele o Messias prometido e amou de todo o coração a Bondade infinita. Dirigindo-se a Gestas, o outro crucificado, repreendeu-o, dizendo: 'Como não temes a Deus, estando como estás no mesmo suplício? É justo, na verdade, que soframos por nossos crimes, mas Jesus, que mal Ele fez?'

E, cheio de esperança e com grande arrependimento, disse a Jesus: 'Senhor, quando chegares ao teu reino, lembra-te de mim'. Jesus, olhando Dimas com infinita misericórdia, respondeu: 'Em verdade te digo que hoje mesmo estarás comigo no paraíso'. Naquela mesma noite, a alma de Jesus visitou o limbo dos justos e concedeu ao Bom Ladrão a vista de Deus e a felicidade eterna. Sua festa litúrgica é celebrada no dia 25 de março.

86. UM PREGADOR QUE SACUDIA O AUDITÓRIO

Nascido em meados do século XIV, na formosa Valença, São Vicente Ferrer, já na infância, deu claros indícios de extraordinária missão que Deus lhe reservara. Gostava de ouvir sermões, para, depois, reunidos com os seus colegas, repetir-lhes com grande ardor os trechos mais impressionantes.

Apareceram, no pescoço de um seu amiguinho de cinco anos, umas chagas malignas. Vicente foi visitá-lo e, para mortificar-se e aliviar o doente, lambeu-lhe as chagas, que, imediatamente, desapareceram. Este foi o primeiro milagre que operou. Aos dezoito anos, entrou para a Ordem Dominicana, tornando-se professor famoso em várias universidades. Mas o fruto obtido por seus sermões fê-lo abandonar a cátedra e dedicar-se exclusivamente à pregação.

Percorreu, como pregador, grande parte da Europa, não faltando em nenhuma de suas missões o famoso sermão sobre o fim do mundo e o Juízo universal. Certa vez, ao pregá-lo numa praça diante de milhares de ouvintes, quando pronunciou com voz terrível aquelas palavras dos anjos: 'Levantai-vos, ó mortos, vinde ao Juízo!', todo auditório caiu por terra, como morto; e, todos, ao se erguerem, estavam pálidos e a tremer, como se surgissem dos sepulcros.

Outra vez, pregando o mesmo sermão, disse ser ele o anjo, do qual São João diz, no Apocalipse, que cruzará pelos ares, clamando: 'Temei a Deus e honrai-o, porque está chegando a hora do Juízo'. Escandalizaram-se alguns, ao ouvirem tais palavras; mas o santo, para provar-lhes que tinha razão, mandou que trouxessem uma defunta que era levada ao cemitério. Vários homens saíram e, realmente, encontraram o cortejo fúnebre e trouxeram à praça o caixão. Puseram-no, por ordem do santo, no meio do povo. O pregador mandou que a defunta se levantasse e convidou-a a reconhecer que era ele o anjo do Apocalipse, enviado por Deus para lembrar aos homens o fim do mundo. Ela confirmou a palavra do santo, diante daquela imensa multidão admirada.

Dirigindo-se à ressuscitada, perguntou São Vicente: 'Queres viver ou morrer de novo?' - 'Quero viver para fazer mais pelo céu'. E aquela mulher foi, por muitos anos, um atestado vivo do poder de São Vicente. Seus sermões convertiam cidades inteiras e enchiam os seminários e os conventos. Seguiam-no milhares de penitentes, indo os homens à direita, as mulheres à esquerda e, no meio, os sacerdotes, rezando todos o rosário e cantando hinos religiosos. Era de ver o fervor com que todos faziam penitência, disciplinando-se e implorando o perdão de seus pecados. São Vicente morreu como santo em 1419 e sua festa litúrgica é celebrada no dia 5 de abril.

87. SANTA CASSILDA

Era princesa moura, filha do rei Toledo, e nasceu em fins do século décimo. Seu boníssimo coração estremecia diante das misérias e sofrimentos que suportavam os escravos cristãos, aprisionados pelo rei em suas campanhas guerreiras. A princesa visitava as masmorras e socorria os prisioneiros com dádivas e palavras consoladoras. Eles, em troca, instruíam-na pouco a pouco na doutrina cristã.

Atraída pela beleza de nossa religião, tão heroica e ao mesmo tempo tão misericordiosa, Cassilda pedia a Nossa Senhora, da qual lhe haviam falado os cativos, que se compadecesse dela e lhe mostrasse o caminho para receber o batismo e viver seguindo a fé cristã. A Virgem atendeu às suas súplicas. Cassilda começou a sentir-se doente de mal estranho que lhe consumia os ossos, e contra o qual se mostravam impotentes os melhores médicos.

Um cativo cristão contou-lhe que, perto de Burgos, havia uma fonte, chamada de São Vicente, cujas águas curariam a sua doença. A princesa referiu ao pai o que ouvira do cativo e pediu-lhe licença para experimentar aquele remédio. Seu pai opôs-se, a princípio, por achar-se a fonte em terra de cristãos; mas, diante dos progressos da enfermidade, terminou por aceder. Acompanhada de um séquito deslumbrante, chegou Cassilda a Burgos, onde foi cortesmente recebida pelo rei Fernando I da Castela e hospedada com todas as honras. Dirigiu-se logo à prodigiosa fonte e, quando se banhou em suas águas, recobrou a saúde corporal. Atribuindo-a à intercessão de Nossa Senhora, acabou de instruir-se na doutrina cristã e, pouco depois, as águas do batismo deram-lhe a saúde da alma.

O rei, seu pai, alarmado com a demora e com as notícias que recebia, enviou-lhe mensageiros com a ordem de regressar imediatamente. Santa Cassilda mandou dizer-lhe que já era princesa do céu e que, por seu reino temporal, não queria perder o reino eterno. Mandou construir uma humilde cela perto da fonte milagrosa e da igreja, onde recebera o batismo, e ali passou a vida, dando exemplo de todas as virtudes, especialmente de caridade e penitência. Sua festa é celebrada no dia 9 de abril e suas preciosas relíquias são veneradas, atualmente, parte na catedral de Burgos e parte na catedral de Toledo.

(Excertos da obra 'Tesouro de Exemplos', do Pe. Francisco Alves, 1958; com adaptações)

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