sexta-feira, 23 de fevereiro de 2024

TRABALHA E LUTA, COMO UM BOM SOLDADO DE CRISTO!

Labora sicut bonus miles Christi (II Tm 2,3) - Trabalha como um bom soldado de Cristo.Os combates pelo amor são longos e por vezes difíceis, e toda alma, por pouco generosa que seja, verifica em si mesma, em dados momentos, um movimento de depressão que se chama desânimo. Essa depressão nasce insensivelmente da acumulação de contratempos e reveses sucessivos. A alma sente-se abatida depois, de repente, de um acidente qualquer, de uma pequena indisposição, de uma fadiga corporal, de uma palavra de repreensão, de uma falta de atenção que sobrevém a nosso respeito e, então, a alma desanima.

Então tudo se torna pesado. A conversação espiritual é insípida, os livros que de ordinário a estimulavam perdem o sabor, os exercícios espirituais tornam-se um ônus intolerável. Nada a encoraja, tudo a aborrece e a desgosta. A vida espiritual parece uma ilusão; atingir-lhe o cimo, uma impossibilidade. E ela senta-se tristemente a meia encosta sem forças para as alturas. Eis, por certo, um sério obstáculo, que impede por vezes o caminho às almas mais resolutas. Importa procurar as causas do desânimo e os meios de frustrar-lhes a influência paralisante.

Antes de tudo, o que deve consolar-te, alma piedosa, é não seres tu a única, sujeita a essas depressões passageiras. As melhores almas sofrem por vezes desse mal. Jesus, em sua infinita sabedoria, permite de bom grado que as almas mais dispostas sintam algumas vezes sua impotência pessoal. 'Não é extraordinário' - como diz São Francisco de Sales - 'que a miséria se sinta por vezes miserável'. Não é de estranhar que a natureza se canse e não queira mais avançar. Não é de admirar que o  nosso corpo, como o asno de Balaão, recuse às vezes, os seus serviços e, insensível aos golpes, se deixe abater antes que nos conduzir.

A razão dessa canseira é quase sempre uma série de exercícios espirituais e trabalhos exteriores por demais longa. É preciso que tudo se faça com medida e não exigir do corpo e do espírito senão o que eles podem razoavelmente dar. É preciso, pois, repousar, confortar-se a tempo, e depois dizer com nova energia: 'Vamos! Ainda um pouco de tempo, o cimo já não está tão longe, Deus ajudará. Para frente!'

Os sentidos do homem são inclinados, desde tenra idade, para o sensível e fascinados pelos objetos exteriores. A razão não conhece a existência de Deus, senão por um trabalho de educação. Tudo que ele sabe do mundo sobrenatural sabe-o por ouvir dizer! E esse ser tão ínfimo, tão ignorante e tão inclinado para o mal, que somos nós, quer aspirar, por um esforço contínuo, a tornar-se amante apaixonado de uma beleza superior. Quer esgotar, para atingir esse ideal, todas as forças de sua alma e de seu corpo, e a cada inspiração, a cada apelo apenas perceptível, de uma graça invisível, quer elevar-se ainda mais alto.

Esse homem fraco, feito de sangue e de pó, propõe-se renunciar a todas as aspirações animais, modificar-se, contradizer-se, corrigir seu raciocínio e seu coração, não uma vez por acaso, mas sempre, e isso sob a influência de um agente misterioso que ele não vê e no qual crê e cujo socorro implora. Não, uma vida tão heróica só pode ser levada graças a uma luta incessante. Como é belo ver esse homem, exposto a todas as seduções, a todos os ataques do mundo e do inferno, a todas as conivências íntimas, voltar-se para Deus, impertubavelmente, apesar de suas fraquezas!

Também a santidade não exclui a luta, ela a supõe e a exige. A perfeição na terra não é o repouso nem o prazer. Não é um estado fixo. É uma ascensão para Deus, uma continuidade de esforços, uma tendência incessante para aproximar-se do ideal sobrenatural: ad ea vero quae priora sunt extendens meipsum (Fp 3,13). Toda santidade no mundo é relativa; pode e deve aumentar continuamente. Quanto mais a alma se une a Deus, e afunda-se na sua infinidade, tanto mais os espaços se estendem e os horizontes se ampliam. É o infinito a atravessar.

Afasta, pois, de teu espírito essa falsa ideia de que aqui na terra encontrarás repouso. Não estás no mundo para se deleitar de Deus, mas para amá-lo no trabalho, no sofrimento e na luta. E se há luta, haverá quedas algumas vezes; o soldado que combate valorosamente expõe-se a golpes e ferimentos, porém suas cicatrizes são para ele títulos de glória. Muitos há que não distinguem, na vida espiritual, a parte que lhes pertence e a que pertence a Deus.

(Excertos da obra 'O Divino Amigo', do Pe. Schrijvers)