quinta-feira, 2 de outubro de 2014

COMO ASSISTIR COM DEVOÇÃO A SANTA MISSA

A Eucaristia é, na verdade, a alma da piedade e o centro da religião cristã, à qual se referem todos os seus mistérios e leis. É o mistério da caridade, pelo qual Jesus Cristo, dando-se a nós, nos enche de graças dum modo tão amoroso quão sublime. A oração feita em união com este sacrifício divino recebe uma força maravilhosa, de sorte que a alma, Filotéia, cheia das graças de Deus, da suavidade de seu espírito e da influência de Jesus Cristo, se acha naquele estado de que fala a Escritura quando diz que a Esposa dos Cantares estava reclinada sobre o seu Dileto, inundada de delícias e semelhante a uma nuvem de fumaça que o incenso mais precioso levanta o céu, aromatizando o ar.

Faze o possível para arranjar o tempo necessário de ouvir todos os dias a Santa Missa, a fim de oferecer, juntamente com o sacerdote, o sacrifício do teu divino redentor a Deus, seu Pai, por ti mesma e por toda a Igreja. São João Crisóstomo nos afirma que os anjos a ele assistem em grande número, para honrar com sua presença este mistério adorável.

Não devemos duvidar que, unindo-nos com ele num mesmo espírito, tornemos o Céu propício a nós, enquanto a Igreja triunfante e militante se ajunta com Jesus neste ato divino, para ganhar-nos nele e por ele o Coração de Deus, seu Pai, e merecer-nos todas as suas misericórdias.Que dita para uma alma poder concorrer para isso algum tanto, por uma devoção sincera e afetuosa!

Se absolutamente não poder ir à igreja, é necessário então suprires a falta da presença corporal pela espiritual; nunca omitas, numa hora da manhã, ir em espírito aos pés do altar, identificar a tua intenção com a do padre e dos fiéis e ocupar-te com este santo sacrifício, em qualquer parte que estiveres, como o farias, se estivesses na igreja. Proponho-te em seguida um método de ouvir a Missa devotamente:

a) Desde o começo da Missa até o padre subir ao altar, faze com ele a preparação, que consiste em te apresentares a Deus, em confessares a tua indignidade e em pedires perdão de teus pecados.

b) Depois de subir o padre ao altar, até o Evangelho, considera a vinda e a vida de Nosso Senhor neste mundo, lembrando-te delas com uma representação simples e geral.

c) Do Evangelho até depois do Credo considera a pregação de Nosso Senhor; protesta-lhe sinceramente que queres viver e morrer na fé, na prática de sua palavra divina e na união da santa Igreja Católica;

d) Do Credo ao Pai Nosso aplica teu espírito à meditação da Paixão e morte de Jesus Cristo, as quais se representam atual e essencialmente neste santo sacrifício, que oferecerás em união com o padre e com todo o povo a Deus, o Pai de misericórdia, para sua glória e nossa salvação.

e) Do Pai Nosso à comunhão, excita teu coração, por todos os modos possíveis, a querer ardentemente unir-se a Jesus Cristo pelos laços mais fortes do eterno amor.

f) Da Comunhão ao fim, agradece à sua divina majestade, por sua encarnação, vida, paixão e morte e também pelo amor que nos testemunhou neste santo sacrifício, conjurando-o por tudo isso a ser propício a ti, a teus parentes e amigos e a toda a Igreja e, ajoelhando-te em seguida com profunda humildade, recebe devotamente a bênção que Nosso Senhor te dá na pessoa de seu ministro.

Querendo, no entanto, fazer no tempo da Santa Missa a tua meditação habitual, escusa-te seguir este método. Será suficiente fazer no começo a intenção de assistir a este santo sacrifício, tanto mais que quase todas as práticas deste método se acham sintetizadas numa meditação bem feita.

(São Francisco de Sales)

quarta-feira, 1 de outubro de 2014

01 DE OUTUBRO - SANTA TERESA DE LISIEUX


Chamada de ‘maior santa dos tempos modernos’ e recentemente elevada à glória de doutora da Igreja Católica, Teresa de Lisieux transformou-se num dos personagens mais venerados no mundo católico como ‘Santa Teresinha do Menino Jesus’. Feitos extraordinários para uma simples carmelita, que viveu no mais absoluto ostracismo e morreu com apenas 24 anos de idade. Marie Françoise Thérèse Martin nasceu em Alençon, em 02/01/1873, e faleceu em Lisieux, em 30/09/1897. Foi canonizada em 17 de maio de 1925 pelo Papa Pio XI, que posteriormente a declarou ‘Patrona Universal das Missões Católicas’ em 1927. O Papa João Paulo II tornou-a Doutora da Igreja no dia 19 de outubro de 1997. 

Por desígnios divinos, Santa Teresinha foi a preceptora de um particular caminho de santificação: a chamada ‘pequena via’, a via de confiança absoluta à vontade de Deus. Na plena aceitação dos desígnios divinos sobre as almas de cada um de nós, no abandono de nossas vidas nos braços de Jesus Cristo, na entrega total de nossas ações e pensamentos à proteção da Santíssima Virgem: eis aí a pequena via, o caminho da infância espiritual, a gloriosa trilha de santificação para os homens comuns, o espantoso atalho ao Céu, proposto e vivido intensamente pela santa carmelita. Eis a sua pequena via maravilhosa de santificação: basta aceitar a nossa própria pequenez, a imensa fragilidade humana que nos domina, as enormes limitações de viver em plenitude os desígnios de Deus sobre as nossas almas; fazer de tantas imperfeições e fragilidades, não meros obstáculos, mas as próprias pedras do caminho, rejuntadas e consolidadas firmemente num imenso amor e numa confiança sem limites na bondade e misericórdia de Deus. 

Além de cartas e poesias (e outros documentos registrados por suas irmãs do Carmelo), o legado de Santa Teresinha está por inteiro em sua famosa obra ‘História de uma alma’ (publicado originalmente em 1898), que registra, além de seus manuscritos autobiográficos e de suas proposições espirituais, as premissas e os fundamentos do seu caminho da infância espiritual. 

Nesta pequena via, a santificação começa e termina pelo propósito de fazer, de cada dia, mais um passo na peregrinação ao Céu, transformando cada ação diária, cada ato da nossa vida mundana, por mais simples e despojado que seja, em obra de perfeição cristã, compartilhado e vivido para a plena glória do Pai (‘sede perfeitos como vosso Pai do Céu é perfeito’). Nesta pequena via, a santificação é caminho simples e fácil para todos os homens e mulheres dos nossos tempos, e precisa apenas da resolução tão claramente expressa na curta vida da carmelita de Lisieux: ‘nunca distanciar a minha alma do olhar de Jesus’.

terça-feira, 30 de setembro de 2014

ORAÇÃO DE JOELHOS (POSTAGEM 1000 DE SENDARIUM)


ORAÇÃO DE JOELHOS

Pai,
de joelhos me coloco diante de Vós,
porque é assim, e somente assim,
que a criatura pode estar diante o Criador.
Hoje, os homens são mais insensatos do que homens,
mais loucos do que homens,
e querem ser cada vez mais do que homens.
E, em nome de nomes que não são os vossos,
redefinem, refazem e redimensionam um deus ao gosto de cada um.
Quantos se outorgam donos de suas vidas,
senhores de seus destinos e de destinos alheios,
donos do corpo e dos seus instintos:
e vivem ao léu de suas únicas vontades e desejos
porque creem que, por ser a vida uma vez só,
têm que ser felizes a qualquer preço,
e a felicidade humana consiste, então, em satisfazer todos os imponderáveis limites do nada.

Pai,
de joelhos me coloco diante de Vós,
porque assim compreendo melhor a minha pequenez.
Há tanta loucura lá fora, e tanta gente falando de paz,
e fazendo passeatas e cartazes pedindo paz,
gente vestida de branco com almas de toda cor.
Querem presídios, polícia, grades, sistemas de segurança,
querem a miséria bem longe deles, querem o mal dominado,
querem ser, ter, poder, sem problemas ou riscos.
Quero isso não, Pai,
não que eu queira esta violência gratuita e animalesca,
eu apenas não quero esta paz que conforta a omissão,
esta paz que acovarda e adula a tibieza,
esta paz inútil.
Eu vos peço a paz que é vossa e não dos homens,
a paz interior que me faz primeiro quebrar as grades e as trancas
das prisões de meu coração covarde  
e ansioso por construir masmorras.
E, assim, anseio mais construir um coração sereno,
que cultiva a paz
e pedir, para os que querem tanto a paz das ruas,
encontrar nas ruas corações que têm a Vossa Paz.

Pai,
de joelhos me coloco diante de Vós,
porque assim posso interromper meus passos pelos caminhos do mundo.
Um mundo hoje forjado por tantos atalhos,
onde se impõe correr, ultrapassar todas as medidas, chegar na frente,
competir, jogar para ganhar, vencer sempre:
e todo este grande prêmio do mundo tem por nome ilusão.
Como é fácil vender consciências por trocados,
comprar prazeres, barganhar verdades,
como é fácil seguir a louca correnteza
de tantos rios de prazer;
como é doce a vertigem da incerteza e da insensatez tresloucada
do viver por viver...
Pai, tira de mim o não ter tempo nunca;
tira de mim o apego ao escarcéu do mundo,
tira de mim a embriaguez e a euforia das vitórias fáceis:
que os meus passos não me levem para longe de mim mesmo
e da Vossa Santa Presença;
que eu não seja pedra de escândalo
nem juiz dos Vossos filhos,
que eu não seja escravo e nem senhor
da argila humana que me molda;
e que eu aprenda,
com o mais puro amor dos anjos,
a cumprir sempre a Vossa Santa Vontade.

Pai,
de joelhos me coloco diante de vós,
para poder ouvir nas batidas compassadas do meu coração
o portentoso silêncio da Vossa voz.
Pelo homem que sou,
pela consciência de que nada sou,
como um sopro ou um piscar de olhos,
como centelha de chama,
é que, diante de Vós,
eu, obra menor dos Vossos prodígios,
não posso nunca estar de pé...
E, assim, de joelhos,
em nome do Vosso infinito Amor por mim
ouso suplicar a divina graça
de, um dia,
ser o mais comum dos homens
no céu.
Amém.

(Arcos de Pilares)

Aos leitores do blog: para você e sua família, o meu presente é esta oração de minha autoria, em homenagem à postagem número 1000 do SENDARIUM. Obrigado a todos pelas visitas e que Deus lhes dê a Sua bênção e a Sua graça.

segunda-feira, 29 de setembro de 2014

29 DE SETEMBRO - SÃO MIGUEL ARCANJO

(São Miguel com elmo e armadura medieval - Catedral de Bruxelas)

'Houve uma batalha no Céu: Miguel e os seus Anjos guerrearam contra o Dragão. O Dragão batalhou, juntamente com os seus Anjos, mas foi derrotado e não se encontrou mais um lugar para eles no Céu.' (Apoc. 12, 7-8).

'Naquele tempo, surgirá Miguel, o grande Príncipe, constituído defensor dos filhos do seu povo e será tempo de angústia como jamais houve.' (Dan. 12, 1).

Assim como Lúcifer é o chefe dos demônios, Miguel é o maior dentre os anjos, Príncipe das milícias celestes, protetor da Santa Igreja e da humanidade contra as forças do inferno. Assim, a designação de arcanjo (oitavo coro dos anjos) tem sentido genérico e nominativo, pois certamente São Miguel, sendo o primeiro dentre os Anjos, é o maior dos serafins. Dentre os vários santuários destinados ao Príncipe das milícias celestes, destaca-se aquele localizado no Monte Saint Michel na França, cuja foto constitui a abertura e o símbolo deste blog.

(Santuário de São Miguel - Monte Saint Michel/França)

São Miguel, rogai por nós!
Intercedei a Deus por nós!

domingo, 28 de setembro de 2014

OS HUMILDES E OS DUROS DE CORAÇÃO

Páginas do Evangelho - Vigésimo Sexto Domingo do Tempo Comum


No Evangelho deste domingo, encontramos Jesus após a sua entrada triunfal em Jerusalém, acossado pela malícia humana dos escribas, mestres da lei, anciãos e demais membros do Sinédrio. Tomados pela inveja e calúnia, queriam justificar publicamente a sentença de morte que já haviam imposto secretamente a Jesus nos seus corações e mentes. O júbilo messiânico daquele Domingo de Ramos selara em definitivo o destino e a morte de Jesus.

A missão do Senhor aproxima-se do final e impõe-se cumpri-la até o fim. Jesus contempla com enorme tristeza aqueles homens duros de coração que, cientes de todos os textos proféticos, não compreenderam ou não quiseram compreender os sinais da vinda do Messias ao mundo dos homens. Da mesma forma como negaram João Batista, era preciso agora, com muito mais vigor e malícia, negarem a Cristo; mais do que isso, precisavam tramar e manipular o povo para tornar natural e incontestável a condenação de Jesus à morte, a uma morte de cruz.  

Aos duros de coração, elabora, então, a parábola dos dois filhos que o pai ordena trabalharem na vinha: 'Filho, vai trabalhar hoje na vinha!’ (Mt 21, 28). O primeiro se nega a princípio e depois acata a ordem do pai e o segundo, que parecia acatar, não cumpre a ordem paterna. Filhos que são os filhos deste mundo, chamados por Deus, para serem operários nas vinhas do Senhor: os que ouvem o chamado à graça, pela manhã ou nas horas mais tardias da vida, e vão trabalhar na vinha e os que não vão, por desobediência explícita, por insensatez, por descuidado zelo. Ontem, os primeiros foram os gentios, publicanos e pecadores e os últimos, os escribas e os fariseus que tramaram contra Jesus; ontem e sempre, os primeiros foram aqueles que humildemente refletiram as palavras e os ensinamentos do Mestre no coração e os últimos, os duros de coração, que se ensoberbeceram no jogo das meras palavras e das promessas vazias.

O caminho da salvação perpassa pelo coração. 'Então Jesus lhes disse: Em verdade vos digo que os cobradores de impostos e as prostitutas vos precedem no Reino de Deus' (Mt 21, 31). Foram e são muitos os pecadores que aceitaram o firme propósito do arrependimento sincero e de conversão; infelizmente também são muitos os que se apegam aos valores humanos, à vanglória, à tibieza e à obstinação do orgulho desmedido. Nesta conduta de retidão, serão separados o joio e o trigo, os justos e os ímpios diante do tribunal de Deus, porque 'quando um justo se desvia da justiça, pratica o mal e morre ... quando um ímpio se arrepende da maldade que praticou e observa o direito e a justiça, conserva a própria vida' (Ez 18, 26 - 27).

sábado, 27 de setembro de 2014

27 DE SETEMBRO - SÃO VICENTE DE PAULO


Filho de camponeses, Vicente de Paulo nasceu na pequena aldeia de Pay, região de Bordéus e dos Pirineus, em 24 de abril de 1575. Iniciou seus estudos com os franciscanos em Dax, formando-se mais tarde em teologia em Toulouse, onde tornou-se sacerdote em 23 de setembro de 1600. Forjava-se ali um dos maiores e mais belos exemplos da santificação e de apostolado missionário de toda a história da Igreja. 

Foi o fundador da Companhia da Missão (padres lazaristas) devotada à evangelização dos pobres e co-fundador da Congregação das Filhas da Caridade, cuja primeira superiora foi Santa Luísa de Marillac. Inspirado por seu amor a Deus e aos homens, Vicente de Paulo foi o criador de muitas obras de caridade e de piedade cristãs, às quais devotou toda a sua vida, pautada na missão de levar e viver plenamente o Evangelho de Cristo junto aos pobres, aos doentes, aos renegados, aos presos, aos desvalidos do mundo. O seu exemplo e seus ensinamentos inspiraram, mais tarde, em 1833, a criação das chamadas Conferências Vicentinas, que projetaram o legado da ação e das obras de caridade do santo ao mundo inteiro.



Este grande amigo e benfeitor dos mais necessitados faleceu em 27 de setembro de 1660 e seu corpo foi sepultado na igreja de São Lázaro (ou capela dos Lazaristas) em Paris, sendo encontrado praticamente incorrupto, quando exumado 52 anos após a sua morte. O coração do santo é conservado em um relicário na Capela de Nossa Senhora Milagrosa, também em Paris. Foi canonizado em 1737 pelo Papa Clemente XII e declarado patrono de todas as obras de caridade da Santa Igreja, em 1885, pelo papa Leão XIII.

São Vicente de Paulo, rogai por nós!

CIÊNCIA DOS SANTOS E CIÊNCIA DOS HOMENS

Ao falar da ciência mundana, diz São Paulo: A ciência incha, a caridade porém edifica. O que julga saber muito, ainda ignora como deve saber. Quando a ciência mundana anda associada ao amor de Deus, é de grande vantagem para nós e para os outros; mas, quando se acha desacompanhada da caridade, causa-nos grande dano, tornando-nos orgulhosos e levando-nos a desprezar os outros; porque, tanto o Senhor é pródigo das suas graças com os humildes, como avaro com os orgulhosos.

Ditoso o homem a quem Deus dá a ciência dos santos, como a deu a Jacó: Dedit illi scientiam sanctorum (Sap. 10, 10)! Deste dom, como do maior de todos, fala a Escritura. Ó quantos homens vivem cheios de si mesmos, pelos conhecimentos que têm das matemáticas, belas letras, línguas estrangeiras e antiguidades, que nada aproveitam ao bem da religião, nem aumenta as vantagens espirituais! De que serve possuir uma tal ciência, saber tão belas coisas, se não se sabe amar a Deus e praticar a virtude? Os sábios do mundo, que só procuram adquirir um grande nome, estão privados das luzes celestes, que o Senhor dispensa aos simples: Abscondisti haec a sapientibus et prudentibus (sábios e prudentes do século), et revelasti eo parvulis (Matth.11, 25). Os Parvuli são os espíritos simples, que põem todo o seu cuidado em agradar a Deus.

Santo Agostinho proclama bem-aventurado o que conhece a grandeza e bondade de Deus embora ignore tudo o mais: Beatus, qui te scit, etiamsi illa nesciat (Conf. 1. 5. c. 4). Quem não conhece a Deus, não pode amá-lo; ora, quem ama a Deus é mais sábio que todos os literatos, que não sabem amá-lo. Hão de levantar-se os ignorantes e arrebatar o Céu, exclama o mesmo santo doutor! Quantos rústicos, quantos pobres camponeses, subirão à santidade e conseguirão a vida eterna, da qual quereriam gozar antes um só instante, do que adquirir todos os bens da terra! Aos Coríntios escrevia o Apóstolo: Não fiz profissão entre vós de saber outra coisa senão a Jesus Cristo, e Jesus Cristo Crucificado. Como seríamos felizes se chegássemos a conhecer a Jesus Crucificado, a conhecer o amor que ele nos testemunhou e o amor que mereceu da nossa parte, sacrificando por nós a sua vida na cruz, e se, estudando um livro tal, chegássemos a amá-lo com um amor ardente!

Um grande servo de Deus, o Pe. Vicente Carafa, escrevendo a alguns jovens eclesiásticos, que estudavam para trabalharem na salvação das almas ,dizia-lhes: 'Para operar grandes conversões nas almas, mais vale ser homem de muita oração, que de muita eloquência; porque as verdades eternas, que convertem as almas, melhor se pregam pelo coração que pelos lábios somente'. Devem pois os ministros do Evangelho ter uma vida que se mostre de acordo com o que ensinam; devem, numa palavra, apresentar-se como homens que, desprendidos do mundo e da carne, só procuram a glória de Deus, e fazê-lo amar de todos. Por isso o Pe. Carafa ajuntava: 'Ponde todo o vosso cuidado em vos dardes ao exercício do amor divino; desde que o amor de Deus toma posse do nosso coração, só por si o desapega de todo o amor desordenado, e o torna puro, despojando-o dos afetos terrenos'. 'Um coração puro', diz Santo Agostinho, 'é um coração vazio de toda a cobiça: Cor purum est cor vacuum ab omni cupiditate'. Com efeito, ajunta São Bernardo, 'quem ama a Deus só pensa em o amar e não deseja outra coisa: Qui amat, amat, et aliud novit nihil' (In Cant. s. 83).

Dizia São Tomás de Vilanova: 'Para converter os pecadores, e fazê-los sair do atoleiro das suas iniquidades, são necessárias flechas de fogo; mas como podem elas provir dum coração gelado, que o amor de Deus não aquece?' A experiência mostra que um padre de ciência medíocre, mas abrasado no amor de Jesus Cristo, atrai mais almas a Deus, que muitos oradores sábios e eloquentes, que deleitam os ouvintes. Aqueles que, por seus conhecimentos raros, belos pensamentos e engenhosas reflexões, despedem os seus ouvintes muito satisfeitos, deixam-nos afinal com o coração desprovido do amor de Deus, e talvez mais frio que antes. Mas o que aproveita isso para o bem comum? E que fruto colhe o pregador, senão agravar mais a sua responsabilidade diante de Deus? Em vez dos bons frutos que podia produzir com o seu sermão, somente granjeia vãos aplausos. Ao contrário, quem de um modo simples prega a Jesus crucificado, não para ser louvado, mas só para o fazer amar, desce da cadeira enriquecido de merecimentos pelo bem que fez, ou que pelo menos desejava fazer nos seus ouvintes.O que acima fica dito tem aplicação, não só aos pregadores, mas também aos professores e confessores. Quanto bem pode fazer um professor de ciências, ensinando a seus discípulos as máximas da verdadeira piedade!O mesmo se pode dizer dos confessores.

Notem-se também os abundantes frutos que se podem produzir nas conversas com os outros. Pode-se pregar sempre; mas que bem um padre instruído e santo pode fazer na conversação, falando a propósito da vaidade das grandezas humanas, da conformidade com a vontade de Deus e da necessidade que temos de nos recomendarmos sem cessar à proteção do Céu, no meio de tantas tribulações que nos afligem e de tantas tentações que nos assaltam! Digne-se o Senhor dar-nos as luzes e forças de que necessitamos para empregarmos os restantes dias da nossa vida em O amar e fazer a sua vontade, pois que só isso nos aproveita e tudo o mais é perdido!

(Excertos da obra 'A Selva', de Santo Afonso Maria de Ligório)