terça-feira, 23 de abril de 2013

DA FUGA DAS OCASIÕES DE PECADO

Um sem número de cristãos se perde por não querer evitar as ocasiões de pecado. Quantas almas lá no inferno não se lastimam e queixam: Infeliz de mim! Se tivesse evitado aquela ocasião, não estaria agora condenado por toda a eternidade!

Falando aqui da ocasião de pecado, temos em vista a ocasião próxima, pois deve-se distinguir entre ocasiões próximas e remotas. Ocasião remota é a que se nos depara em toda a parte e que raramente arrasta o homem ao pecado. Ocasião próxima é a que, por sua natureza, regularmente induz ao pecado. Por exemplo, achar-se-ia em ocasião próxima um jovem que muitas vezes e sem necessidade se entretêm com pessoas levianas de outro sexo. Ocasião próxima para uma certa pessoa é também aquela que já a arrastou muitas vezes ao pecado. Algumas ocasiões consideradas em si não são próximas, mas tornam-se tais, contudo, para uma determinada pessoa que, achando-se em semelhantes circunstâncias, já caiu muitas vezes em pecado em razão de suas más inclinações e hábitos. Portanto, o perigo não é igual nem o mesmo para todos.

O Espírito Santo diz: 'Quem ama o perigo nele perecerá' (Ecli 3, 27). Segundo S. Tomás, a razão disso é que Deus nos abandona no perigo quando a ele nos expomos deliberadamente ou dele não nos afastamos. São Bernardino de Sena diz que, dentre todos os conselhos de Jesus Cristo, o mais importante e como que a base de toda a religião, é aquele pelo qual nos recomenda a fuga da ocasião de pecado.

Se fores, pois, tentado, e especialmente se te achares em ocasião próxima, acautela-te para não te deixares seduzir pelo tentador. O demônio deseja que se se entretenha com a tentação, porque então torna-se-lhe fácil a vitória. Deves, porém, fugir sem demora, invocar os santos nomes de Jesus e Maria, sem prestar atenção, nem sequer por um instante, ao inimigo que te tenta. São Pedro nos afirma que o demônio rodeia cada alma para ver se a pode tragar: 'Vosso adversário, o demônio, vos rodeia como um leão que ruge, procurando a quem devorar' (I Ped 5, 8). São Cipriano, explicando essas palavras, diz que o demônio espreita uma porta por onde possa entrar na alma; logo que se oferece uma ocasião perigosa, diz consigo mesmo: ‘eis a porta pela qual poderei entrar’, e imediatamente sugere a tentação. Se então a alma se mostrar indolente para fugir da tentação, cairá seguramente, em especial se se tratar de um pecado impuro. É a razão por que ao demônio mais desagradam os propósitos de fugirmos das ocasiões de pecado que as promessas de nunca mais ofendermos a Deus, porque as ocasiões não evitadas tornam-se como uma faixa que nos venda os olhos para não vermos as verdades eternas, as ilustrações divinas e as promessas feitas a Deus.

Quem estiver, porém, enredado em pecado contra a castidade, deverá, para o futuro, evitar não só a ocasião próxima, mas também a remota, enquanto possível, porque em tal se sentirá muito fraco para resistir. Não nos deixemos enganar pelo pretexto da ocasião ser necessária, como dizem os teólogos, e que por isso não estamos obrigados a evitá-la, pois Jesus Cristo disse: 'Se teu olho direito te escandaliza, arranca-o e lança-o de ti' (Mt 5, 29). Mesmo que seja teu olho direito deverás arrancá-lo e lançar fora de ti, para que não sejas condenado. Logo, deves fugir daquela ocasião, ainda que remota, já que, em razão de tua fraqueza, tornou-se ela uma ocasião próxima para ti.

Antes de tudo devemos estar convencidos que nós, revestidos de carne, não podemos por própria força guardar a castidade; só Deus, em Sua imensa bondade, nos poderá dar força para tanto. É verdade que Deus atende a quem Lhe suplica, mas não poderá atender à oração daquele que conscientemente se expõe ao perigo e não o deixa, apesar de o conhecer, pois, como diz o Espírito Santo, quem ama o perigo perecerá nele.

Ó Deus, quantos cristãos existem que, apesar de levarem uma vida piedosa, caem finalmente e obstinam-se no pecado, só porque não querem evitar a ocasião próxima do pecado impuro. Por isso nos aconselha São Paulo (Fil 2, 12): 'Com temor e tremor operai a vossa salvação'. Quem não teme e ousa expor-se às ocasiões perigosas, principalmente quando se trata do pecado impuro, dificilmente se salvará.

(Santo Afonso Maria de Ligório, Escola da Perfeição Cristã, Compilação de textos do Santo Doutor pelo padre Saint-Omer, CSSR, IV Edição, Editora Vozes, Petrópolis: 1955)

domingo, 21 de abril de 2013

O BOM PASTOR


No Quarto Domingo da Páscoa, ressoa pela cristandade a imagem e a missão do Bom Pastor: 'As minhas ovelhas escutam a minha voz; eu as conheço e elas me seguem. Eu dou-lhes a vida eterna e elas jamais se perderão. E ninguém vai arrancá-las de minha mão' (Jo 10, 27-28). Jesus, o Bom Pastor, conhece e ama, com profunda misericórdia, cada uma de suas ovelhas desde toda a eternidade. Criadas para o deleite eterno das bem-aventuranças, redimidas pelo sacrifício do calvário e alimentadas pela sagrada eucaristia, Jesus acolhe as suas ovelhas com doçura extrema e infinita misericórdia.  

E com ânsias de posse calorosa e zelo desmedido: 'Meu Pai, que me deu estas ovelhas, é maior que todos, e ninguém pode arrebatá-las da mão do Pai. Eu e o Pai somos um' (Jo 10, 29-30). Nada, nem coisa, nem homem, nem demônio algum, poderá nos apartar do amor de Deus. Porque este amor, sendo infinito, extrapola a nossa condição humana e assume dimensões imensuráveis. Ainda que todos os homens perecessem e a humanidade inteira ficasse reduzida a um único homem, Deus não poderia amá-lo mais do que já o ama agora, porque todos nós fomos criados, por um ato sublime e extraordinariamente particular da Sua Santa Vontade, como herdeiros dos céus e para a glória de Deus: 'Dele, por Ele e para Ele são todas as coisas. A Ele a glória por toda a eternidade!' (Rm 11, 36).

Jesus toma sobre os ombros a ovelha de sua predileção, cada um de nós, a humanidade inteira, para a conduzir com segurança às fontes da água da vida (Ap 7, 17), onde Deus enxugará as lágrimas dos nossos olhos. Reconhecer-nos como ovelhas do rebanho do Bom Pastor é manifestar em plenitude a nossa fé e esperança em Jesus Cristo, Deus Único e Verdadeiro, cuja bondade perdura para sempre e cujo amor é fiel eternamente (Sl 99,5). Como ovelhas do Bom Pastor, não nos basta ouvir somente a voz da salvação; é preciso segui-Lo em meio às provações da nossa humanidade corrompida, confiantes e perseverantes na fé, até o dia dos tempos em que estaremos abrigados eternamente na tenda do Pai, lavados e alvejados no sangue do cordeiro (Ap 7, 14b).  

sábado, 20 de abril de 2013

HISTÓRIAS QUE OUVI CONTAR (VII)

Lívia pressentira. Isso, tinha sido um pressentimento. Uma brisa tênue, um sopro delicado que perpassou pela sua mente num instante fugidio. Uma sensação estranha num vislumbre de inquietude. Aquele lugar, aquelas pessoas, aquela agitação movida a muita bebida e música alta, passaram, num relance, a ser uma encenação medonha, um arremedo de alegria, o estertor de uma loucura. Sentiu no corpo como que uma corrente elétrica em redemoinhos, rápida e instintiva, no complemento do desasossego mental. Teve a convicção imediata de que havia algo errado, do risco iminente, da certeza do mal. E agiu de pronto.

Enveredou-se no meio da massa humana que se movia mecanicamente ao som da balada envolvente, avançando e contorcendo-se contra os corpos em desalinho. A penumbra e o espargir acelerado dos raios de luzes coloridas davam a sensação de que se movimentava em câmera lenta, meio sem direção, quase sem gravidade. E avançava aos empurrões de forma desordenada, impelida por um frêmito de medo e ansiedade de sair dali, o mais rápido possível, de qualquer jeito. Teve a clara certeza do empurrão que a lançou uns três metros à frente, em meio a espaços físicos inexistentes, através de corpos repentinamente abstratos, num voo cego e incompreensível. Sabia, sem saber como, que não podia parar, não devia olhar para trás, nem por um instante, nunca. 

A porta aberta pareceu imensa e luminosa como nas manhãs de sol e o vento frio que chegou de fora foi um oceano de bênçãos. Mergulhou na noite aconchegante como fugitiva de uma masmorra tenebrosa e respirou profundamente, como se o ar limpo tivesse os aromas integrados de todos os bálsamos humanos. E correu, correu, correu desabaladamente para longe dali, sem olhar pra trás, nunca. E teve a súbita percepção das estruturas estremecendo, dos estertores do concreto se partindo, dos gritos lancinantes da massa humana em fuga repentina, da espantosa explosão do mundo, dos vidros se despedaçando em todas as fachadas, da nuvem de destroços arrastando tudo num turbilhão enlouquecido, de gritos distantes e, depois de tudo, de um silêncio pesado como chumbo.

Lívia se levantou com desmedido esforço e cambaleou vacilante. Em câmera lenta, seus olhos foram se acostumando ao cenário de guerra agora projetado à sua frente e seus ouvidos foram se reabrindo aos sons de pessoas gritando desesperadas de algum lugar e a uma longínqua sirene de ambulância. Sabia, sem saber como, que estava viva e sem sequela alguma, embora coberta de pó e de uma máscara de fuligem. Sabia, como ninguém saberia nunca, por quem e porque tinha sido salva daquela enorme e brutal tragédia. Apertou a pequena imagem contra o peito e começou a chorar copiosamente. E, ainda cambaleante, começou a andar vagarosamente em direção às luzes mais próximas da cidade, sem sentir o ar gelado da noite, sem olhar para trás. 

DEZ PASSOS PARA A MORTIFICAÇÃO DO CORPO

1 – Limitai-vos, tanto quanto possível, em assuntos de comida, ao simplesmente necessário. Contemplai essas palavras que Santo Agostinho dirigia a Deus: 'Vós me ensinantes, ó Deus, a só tomar alimentos como simples remédios. Oh! Senhor, quem entre às vezes não cruza o limite? Se houver alguém, declaro que este homem é grande e que ele deve glorificar muito o seu nome.' (Confissões, Livro X, capítulo 31).

2 – Rezai a Deus frequentemente, rezai a Ele todos os dias para vos impedir, por sua graça, de ultrapassar os limites da necessidade e que não vos deixeis que vos dirijais para o atrativo do prazer.

3 – Não tomai nada entre as refeições, a menos em caso de necessidade ou de razões da conveniência.

4 – Praticai a abstinência e o jejum, mas fazei-os somente sob obediência e com discrição.

5 – Não lhe é proibido experimentar alguma satisfação corporal, mas o faça com uma intenção pura e abençoando Deus.

6 – Regulai o vosso sono, evitando, aqui, toda frouxidão, toda moleza, principalmente pela manhã. Fixai uma hora, se podeis, para dormir e levantar; deveis segui-la energicamente.

7 – Em geral, repousai apenas na medida do necessário; dedicai-vos generosamente ao trabalho, não vos poupeis em vossos esforços. Tomai cuidado para não extenuar vossos corpos, mas vigie para não agradá-los; assim que o perceberdes, um pouco que seja, disposto a brincar de mestre, trate-o como escravo.

8 – Se vós sentis qualquer ligeira indisposição, evitai ser uma carga aos outros por vosso mau humor; deixai aos vossos irmãos o cuidado de se queixarem por vós; sejais pacientes e mudos como o cordeiro divino que carregou todas as nossas dores.

9 – Cuidado para não usar a menor inquietação como uma razão de dispensa ou derrogação de vosso preceito ou ordem do dia: 'Deve-se odiar como uma peste toda dispensa em matéria de regras', escrevia São João Berchmans.

10 – Recebei com docilidade, suportai com humildade, paciência e perseverança, a mortificação terrível a que chamamos de doença.


(Revista Sel de la terre, n.º 7, p. 115-116, ‘La mortification chrétienne’, pelo Cardeal Désiré Mercier)

PALAVRAS DE SALVAÇÃO





'Quando nascemos, somos filhos de nossos pais; quando morremos, somos filhos de nossas obras'.

Pe. Antônio Vieira (1608-1697)

A MISSA TRIDENTINA


A Missa Tridentina, ou Missa de Sempre ou Missa de São Pio V constitui  o rito romano original da Igreja Católica, estabelecida como fruto da Tradição da Igreja desde os seus primórdios e formalmente consolidada como rito pleno pelo Papa São Pio V. Em sua bula intitulada Quo Primum Tempore, este grande papa estabelecia que o rito da Santa Missa jamais poderia ser alterado. Na Missa Tridentina, o sacerdote fica sempre de frente para o altar onde é oferecido o sacrifício; o rito é todo rezado na língua formal destinada à liturgia - o latim, que é a língua oficial da Igreja; as palavras, os gestos e a sequência da Missa conduzem a alma para a oração, para o sacrifício da Cruz que está sendo renovado de forma incruenta; o altar do sacrifício e as vestimentas do sacerdote e dos acólitos refletem a solenidade do evento; a comunhão é distribuída pelo sacerdote aos fiéis que a recebem de joelho e na boca; os presentes usam trajes discretos e respeitosos e as mulheres se cobrem com o véu na Igreja. A Missa Tridentina inspira santidade e evoca a santificação de cada um.

Com a introdução da Missa Nova de Paulo VI, instituída após o Concílio Vaticano II, a Missa Tridentina, embora nunca tenha sido oficialmente proibida pela Igreja, foi relegada ao caráter de exceção, sendo ministrada por e para comunidades muito restritas. A Missa Nova rapidamente deteriorou-se nos erros intrínsecos à sua própria concepção, no descalabro das missas-shows, encenações teatrais, quebra do rigor litúrgico, inserção de instrumentos e músicas profanas, mistura com eventos sociais, presença dos ministros da eucaristia, perda da valorização do ambiente de silêncio e adoração, uso de trajes informais e mesmo vulgares, comunhão de pé e nas mãos dos fieis, perda do referencial cristocêntrico do rito original.

Com a Carta Apostólica Motu Proprio Summorum Pontificum do Papa Bento XVI, a Igreja permitiu a qualquer sacerdote rezar a Missa Tridentina, ainda que considerada como 'rito extraordinário'. Neste documento, tem-se a referência e contatos dos locais onde atualmente são celebradas missas tridentinas no Brasil. Como tais oportunidades constituem exceções muito especiais, uma alternativa é acessar vídeos sobre a Missa Tridentina na internet.