I. O que significa celebrar o Natal?
Significa celebrar na Liturgia, memorial do culto cristão, instituído por Jesus nosso Senhor, o mistério e a graça da sua piedosa Vinda, da sua graciosa Manifestação na nossa natureza humana e no nosso mundo, cumprindo as promessas feitas por Deus a Israel.
II. O que é esse Memorial instituído pelo Senhor?
No Israel da Antiga Aliança, toda a obra salvífica do Senhor era celebrada anualmente nas festas instituídas pelo Senhor Deus: a Páscoa, Pentecostes, as Tendas, o Kippur, a Dedicação do Templo... Tudo isto preparava para o Cristo nosso Senhor. Ele veio, realizou a salvação e na noite em que foi entregue, instituiu o Sacramento do seu Corpo e do seu Sangue, Memorial sagrado de tudo quanto Ele fez por nós, cumprindo tudo quanto Deus havia prometido.
Assim, no Sacramento da Ceia, no santo Sacrifício Eucarístico, toda a salvação torna-se presente: a criação do mundo, a história santa do antigo Israel, os atos e gestos salvíficos do Senhor, as graças dadas aos cristãos, a vida da Igreja e até mesmo a sua Vinda no final dos tempos. Na Liturgia, pela força potente do Santo Espírito do Cristo imolado e ressuscitado, tudo, tudo absolutamente, em Cristo Senhor, torna-se contemporaneamente, simultaneamente presente, de modo que, para um cristão, celebrar os santos mistérios litúrgicos é entrar realmente e verdadeiramente em contato com o Mistério da nossa salvação e com cada um dos mistérios especificamente. Na Liturgia, toda a obra da salvação é-nos dada realmente: 'Fazei isto em memória = memorial ou zikaron, isto é, celebração ritual, eficaz e presentificante ) de Mim!'
III. O Natal é, então, celebração do quê?
É real e verdadeira celebração da Manifestação, da Vinda do Senhor na nossa carne mortal. Celebrar a Eucaristia no Natal é tornar realmente presente sobre o Altar como oferta ao Pai no Espírito Santo o Cordeiro imolado e ressuscitado no Qual tudo, absolutamente tudo da nossa salvação se encontra presente! Cristo é tudo, resume tudo, sintetiza tudo, atrai tudo, realiza tudo! Nele, eucarístico, está a criação do mundo; nele, toda a história de Israel; nele o Natal; nele a Páscoa; nele a vida da Igreja; nele a Glória dos santos; nele o Dia Final, na consumação de tudo!
Cada mistério da nossa fé que celebramos na Liturgia coloca-nos realmente, verdadeiramente em contato com a graça que nos veio daquele mistério. Qem celebra as Eucaristias do tempo sagrado do Natal entra em contato real com a graça da Vinda do Salvador! Este é um luxo, uma graça, uma elegância de Deus que somente recebe quem participa da Liturgia e só na Liturgia é dado!
IV. O Natal é o aniversário de Jesus?
De modo algum! Jamais a Igreja pensou numa coisa dessas! Na Liturgia não se diz: Jesus nasceu há 2000 anos! Diz-se: 'Hoje nasceu para vós um Salvador: Cristo, o Senhor!' A Liturgia, na potência do Espírito, coloca-nos no Hoje de Deus, coloca-nos em contato direto com a graça salvífica do acontecimento que, ocorrido uma vez por todas no passado, torna-se eternamente presente na Glória do Céu, em Cristo, único e eterno sacerdote, que na Tenda eterna do Céu ministra a Liturgia eterna que torna-se presente sobre o Altar da Igreja!
No Natal nunca, de modo algum, por motivo algum, deve-se cantar 'Parabéns' para Jesus! Seria algo totalmente contrário ao significado do Natal cristão!
V. Cristo nasceu no dia 25 de dezembro?
Não, com certeza. E os cristãos sempre souberam disso! Desde o início, esta festa é celebrada em datas diferentes pela Igreja no Oriente e no Ocidente: no Oriente, a 6 de janeiro; no Ocidente, a 25 de dezembro.
Eis os motivos do 25 de dezembro: Segundo antigas tradições, o mundo teria sido criado no dia 25 de março. Neste dia também se celebrava a Festa da Anunciação de Gabriel à Virgem Maria, início da recriação de todas as coisas em Cristo: Ele, vindo ao nosso mundo no seio da Virgem, recriou o mundo envelhecido e caduco pelo pecado. Assim, o 25 de dezembro ocorre nove meses após a celebração da concepção.
Mas, há outro motivo. Depois de o cristianismo já ter se espalhado no Império Romano e os imperadores terem aceitado a fé cristã, surgiu um que apostatou da fé e quis restaurar o paganismo em Roma: Juliano, o Apóstata! Ele fez o possível para restaurar a festa do deus Sol Vencedor em Roma, que ocorria no dia 25 de dezembro, solstício do inverno. Exatamente a época em que o sol começa a ficar mais forte e fazer os dias começarem a ficar mais longos, vencendo o frio e as trevas do inverno. Esta seria a vitória do deus sol sobre as trevas!
Os cristão reagiram fortemente, celebrando aí não o deus sol, mas o verdadeiro Sol da justiça, Luz do Alto que nos veio visitar, vencendo as trevas da idolatria, do pecado e da morte! O verdadeiro Sol Invicto é o Cristo nosso Deus, que vindo à nossa terra, tudo iluminou com a sua piedosa Manifestação. Assim, a data do Natal estabeleceu-se de vez no século IV para toda a Igreja do Oriente e do Ocidente. No dia 6 de janeiro, a Igreja passou a celebrar a Epifania do Senhor.
VI. Seria realmente errado ver o Natal como aniversário de Jesus?
Totalmente. Comemora-se o aniversário contando os dias de acontecimentos ou pessoas neste tempo. Jesus é o Senhor, entrou na Eternidade, é Senhor do tempo; não mais está preso ao nosso tempo, mas preenche todos os tempos: 'A Ele o tempo e a eternidade'!' - diz a Igreja na Vigília Pascal.
Comemora-se o aniversário de alguém para festejar sua entrada nesta vida. Jesus entrou nesta vida, neste mundo, por humilhação, por esvaziamento de si mesmo: sendo rico fez-se pobre, sendo Deus fez-se homem, sendo Senhor fez-se servo para nos salvar. Na verdade o nascimento de Jesus segundo a carne é um gesto de humildade e humilhação por amor!
O nascimento definitivo para um cristão é o nascimento para a Glória: dos santos, celebra-se não o dia do nascimento para este mundo, mas o Die Natalis para o Céu, o dia da morte para este mundo.
E o mais importante: nenhuma celebração da Liturgia é de aniversário; nunca é uma recordação do passado que ficou lá trás, mas é um tornar-se realmente presente de um fato ou evento salvífico que se torna atual e atuante na vida dos que celebram os santos mistérios na Liturgia.
VII. O que é essencial para um cristão celebrar o Natal?
O que é essencial para qualquer festa cristã: participar da santa Liturgia eucarística. É na Eucaristia que todo o mistério da nossa fé, o mistério da nossa salvação, da criação à Parusia do Senhor, faz-se presente: 'Eis o Mistério da fé!' Isto é: ali, no Cordeiro imolado e ressuscitado, tudo faz-se contemporâneo na potência do Espírito! Na Eucaristia, tudo é celebrado na vida cristã e na vida do cristão! Sem a participação na Eucaristia é impossível ser cristão plenamente!
(Dom Henrique Soares da Costa, então Bispo de Palmares/PE)
