sexta-feira, 23 de novembro de 2012

MANUAL DAS INDULGÊNCIAS (III)

CONCESSÕES

1. Inspirai, ó Deus
Indulgência parcial: rezar com piedosa devoção a oração abaixo
Inspirai, ó Deus as nossas ações e ajudai-nos a realizá-las, para que em vós comece e para vós termine tudo aquilo que fizermos. Por Cristo nosso Senhor. Amém.
(Missal Romano, 5a.-feira após as Cinzas, coleta; Liturgia das Horas, I sem., 2a.-feira, laudes).

2. Atos de virtudes teologais e de contrição
Indulgência parcial: concede-se indulgência parcial ao fiel que recitar atos de virtudes teologais e de contrição, nestas ou em outras fórmulas válidas (exemplos abaixo). Cada ato recebe uma indulgência.  

Ato de fé
Eu creio firmemente que há um só Deus, em três pessoas realmente distintas, Pai, Filho e Espírito Santo. Creio que o Filho de Deus se fez homem, padeceu e morreu na cruz para nos salvar e ao terceiro dia ressuscitou.  Creio em tudo o mais que crê e ensina a Santa Igreja Católica, porque Deus, Verdade infalível, o revelou. Nesta crença quero viver e morrer.

Ato de esperança
Eu espero, meu Deus, com firme confiança, que, pelos merecimentos de nosso Senhor Jesus Cristo, me dareis a salvação eterna e as graças necessárias para consegui-la, porque vós, sumamente bom e poderoso, o haveis prometido a quem observar o evangelho de Jesus, como eu proponho fazer com o vosso auxílio.

Ato de caridade
Eu vos amo, meu Deus, de todo o meu coração e sobre todas as coisas, porque sois infinitamente bom e amável, e antes quero perder tudo do que vos ofender. Por amor de vós amo ao meu próximo como a mim mesmo.

Ato de contrição
Senhor meu Jesus Cristo, Deus e homem verdadeiro, Criador e Redentor meu, por serdes vós quem sois, sumamente bom e digno de ser amado sobre todas as coisas, e porque vos amo e estimo, pesa-me, Senhor, de todo o meu coração de vos ter ofendido; pesa-me também de ter perdido o céu e merecido o inferno; e proponho firmemente, ajudado com os auxílios de vossa divina graça, emendar-me e nunca mais vos tomar a ofender. Espero alcançar o perdão de minhas culpas pela vossa infinita misericórdia. Amém.

3. Adoração ao Santíssimo Sacramento
Indulgência parcial: concede-se indulgência parcial ao fiel que visitar o Santíssimo Sacramento para adorá-lo.
Indulgência plenária: concede-se indulgência plenária ao fiel que visitar o Santíssimo Sacramento por, pelos menos, meia hora.

4. Ó Deus verdadeiro
Indulgência parcial: rezar com piedosa devoção a oração abaixo

Ó Deus verdadeiro,
sob o vinho e o pão,
a teus pés depomos nosso coração.

Vista, gosto e tato
dizem-nos que não,
mas o ouvido acolhe tua afirmação.

Cremos que é verdade,
ó Filho de Deus,
tudo o que ensinaste,
porque vens dos céus.

Na cruz escondias
o esplendor de Deus;
mas aqui se ocultam
corpo e sangue teus.

Pois és Deus e homem
como na Paixão;
dá-nos o que deste
ao teu bom ladrão.

Não vemos as chagas
como viu Tomé,
mas Deus proclamamos
com a mesma fé.

Dá-nos cada dia
crer que és Senhor,
única esperança,
todo o nosso amor.

Lembras tua morte
numa refeição,
e dás vida ao homem,
consagrando o pão.

Dá-nos nesta terra
só de ti viver
e outros alimentos
não apetecer.

Ó bom pelicano,
nosso Salvador,
limpa no teu sangue
todo pecador!

Dele uma só gota
leva todo mal,
faz do mundo inteiro
lúcido cristal.

Jesus, que encoberto
temos sobre o altar,
quando te veremos
ante o nosso olhar?

Quando face a face
nos trará assim
a alegria eterna
da visão sem fim?
Amém.

5. Aqui estamos
Indulgência parcial: rezar com piedosa devoção a oração abaixo

Aqui estamos, Divino Espírito Santo, aqui estamos detidos pela crueldade do pecado, mas especialmente reunidos em vosso nome. Vinde a nós, ficai conosco e dignai-vos entrar em nossos corações. Ensinai-nos o que devemos fazer e por onde caminhar; mostrai-nos o que devemos executar, a fim de podermos, com vosso auxílio, agradar-vos em tudo. Só vós inspirais e levais a realizar nossos propósitos, só vós, que possuís com Deus Pai e seu Filho um nome glorioso. Não permitais sejamos perturbadores da justiça, vós que amais a equidade em tudo. Que a ignorância não nos arraste para o mal, não nos dobre a adulação, não nos corrompa a acepção de pessoas ou de cargos. Mas associai-nos a vós eficazmente pelo dom de vossa graça, para que sejamos um em vós e por nada nos desviemos da verdade. Unidos em vosso nome, conservemos em tudo a justiça com bondade. E assim nossas resoluções em nada se apartem de vós e consigamos no futuro o prêmio eterno por todo o bem que fizermos.
  
6. A vós, São José
Indulgência parcial: rezar com piedosa devoção a oração abaixo

A vós, São José, recorremos em nossa tribulação e, depois de ter implorado o auxílio de vossa santíssima esposa, cheios de confiança solicitamos também o vosso patrocínio. Por esse laço sagrado de caridade que vos uniu à Virgem, Imaculada Mãe de Deus, e pelo amor paternal que tivestes ao Menino Jesus, ardentemente suplicamos que lanceis um olhar benigno sobre a herança que Jesus Cristo conquistou com seu sangue, e  nos socorrais em nossas necessidades com o vosso auxílio e poder. Protegei, ó guarda providente da divina família, o povo eleito de Jesus Cristo. Afastai para longe de nós, ó pai amantíssimo, a peste do erro e do vício. Assisti-nos do alto do céu, ó nosso fortíssimo sustentáculo, na luta contra o poder das trevas, e assim como outrora salvastes da morte a vida ameaçada do Menino Jesus, assim também defendei agora a Santa Igreja de Deus das ciladas de seus inimigos e de toda a adversidade. Amparai a cada um de nós com o vosso constante patrocínio, a fim de que, a vosso exemplo e sustentados com o vosso auxílio, possamos viver virtuosamente, morrer piedosamente e obter no céu a eterna bem-aventurança. Amém.

7. Ação de graças pelos benefícios
Indulgência parcial: rezar com piedosa devoção a oração abaixo

Nós vos damos graças, Senhor, por todos os vossos benefícios. Vós que viveis e reinais pelos séculos dos séculos. Amém.

8. Santo Anjo
Indulgência parcial: rezar com piedosa devoção a oração abaixo

Santo Anjo do Senhor, meu zeloso guardador, se a ti me confiou a piedade divina, sempre me rege, guarde, governe e ilumine. Amém.

9. Anjo do Senhor e Rainha do Céu
Indulgência parcial: rezar com piedosa devoção a oração abaixo (de acordo com as épocas do ano, sendo rezadas comumente de manhã, ao meio dia e à tarde)

·  Durante o ano

O anjo do Senhor anunciou a Maria.
E ela concebeu do Espírito Santo.
Ave, Maria...
Eis aqui a serva do Senhor.
Faça-se em mim segundo a vossa palavra.
Ave, Maria...
E o Verbo se fez homem.
E habitou entre nós.
Ave, Maria...
Rogai por nós, santa Mãe de Deus,
Para que sejamos dignos das promessas de Cristo.
Oremos: Derramai, ó Deus, a vossa graça em nossos corações, para que, conhecendo pela mensagem do Anjo a encarnação do vosso Filho, cheguemos, por sua paixão e cruz, à glória da ressurreição. Por Cristo, nosso Senhor. Amém. 
(Missal Romano, IV domingo do Advento, coleta)

·  No tempo pascal

Rainha do céu, alegrai-vos, aleluia!
Pois o Senhor que merecestes trazer em vosso seio, aleluia.
Ressuscitou, como disse, aleluia.
Rogai a Deus por nós, aleluia.
Alegrai-vos e exultai, ó Virgem Maria, aleluia!
Porque o Senhor ressuscitou verdadeiramente, aleluia!
Oremos: Ó Deus, que vos dignastes alegrar o mundo com a ressurreição do vosso Filho, concedei-nos por sua Mãe, a Virgem Maria, o júbilo da vida eterna. Por Cristo, nosso Senhor. Amém.

10. Alma de Cristo
Indulgência parcial: rezar com piedosa devoção a oração abaixo

Alma de Cristo, santificai-me.
Corpo de Cristo, salvai-me.
Sangue de Cristo, inebriai-me.
Água do lado de Cristo, lavai-me.
Paixão de Cristo, confortai-me.
Ó bom Jesus, ouvi-me.
Dentro de vossa chagas, escondei-me.
Não permitais que eu me separe de vós.
Do espírito maligno, defendei-me.
Na hora da morte chamai-me e
mandai-me ir para vós,
para que com vossos Santos vos louve
por todos os séculos dos séculos.
Amém. 
(Missal Romano, ação de graças depois da missa) 

quinta-feira, 22 de novembro de 2012

MANUAL DAS INDULGÊNCIAS (II)

TRÊS CONCESSÕES MAIS GERAIS

INTRODUÇÃO


1. Propõem-se em primeiro lugar três concessões de indulgências, com as quais se aconselha o fiel a informar de espírito cristão1 as ações de sua existência cotidiana e a tender em seu estado de vida à perfeição da caridade2.

2. A primeira e a segunda concessão equivalem a muitas concessões que existiam outrora de maneira diferente. A terceira convém especialmente aos nossos tempos em que os fiéis devem ser movidos à penitência, além da obrigação da abstinência e do jejum, aliás bastante mitigada3.

3. As três concessões são de fato mais gerais e cada uma delas abraça várias obras do mesmo gênero. Contudo, nem todas essas obras são enriquecidas de indulgências, mas só as que são feitas de maneira e intenção particulares. Considere-se, por exemplo, a primeira concessão, cujos termos são os seguintes: 'Concede-se indulgência parcial ao fiel que, no cumprimento de seus deveres e na tolerância das aflições da vida, ergue o espírito a Deus com humilde confiança, acrescentando alguma piedosa invocação, mesmo só em pensamento'. Por esta concessão, são enriquecidos de indulgências somente os atos em que o fiel, ao cumprir seus deveres e ao suportar as aflições da vida, eleva o espírito a Deus, como se propõe. Estes atos especiais, pela fraqueza humana, não são tão frequentes. Mas se alguém é tão diligente e fervoroso que estende tais atos a vários momentos do dia, então com justiça merece, além de copioso aumento de graça, mais amplo perdão da pena temporal e pode ajudar com mais abundância de méritos às almas do purgatório. Quase o mesmo se deve dizer das outras duas concessões.

4. As três concessões, como é claro, de modo especial, concordam com o Evangelho e com a doutrina da Igreja, lucidamente proposta pelo Concílio Vaticano II. Para comodidade dos fiéis, os textos tirados da Sagrada Escritura e das Atas do Concílio, que se referem a cada uma das concessões, se aduzem a seguir.

CONCESSÕES


Concede-se indulgência parcial ao fiel que, no cumprimento de seus deveres e na tolerância das aflições da vida, ergue o espírito a Deus com humilde confiança, acrescentando alguma piedosa invocação, mesmo só em pensamento. Por esta primeira concessão os fiéis, executando o mandato de Cristo: 'É preciso orar sempre e não desistir'4, são como que conduzidos pela mão e ao mesmo tempo aconselhados ao cumprimento de seus deveres, de modo a conservar e aumentar sua união com Cristo.

Mt 7,7-8: Pedi e será dado, buscai e achareis, batei e será aberto. Pois todo aquele que pede recebe, quem procura acha, e a quem bate se abre.
Mt 26,41: Vigiai e rezai para não cairdes em tentação.
Lc 21,34-36: Estai atentos, para que o vosso coração não fique insensível por causa... das preocupações da vida... Vigiai sempre e orai.
At 2,42: Frequentavam com assiduidade a doutrina dos apóstolos, as reuniões em comum, o partir o pão e as orações.
Rm 12,12: Sede alegres na esperança, pacientes na tribulação e perseverantes na oração.
1Cor 10,31: Quer comais, quer bebais, quer façais qualquer outra coisa, fazei tudo para glória de Deus.
Ef 6,18: Vivei em oração e súplicas. Rezai em todo tempo no Espírito. Guardai vigilância contínua na oração e intercedei por todos os santos.
CI 3,17: E tudo quanto fizerdes por palavras ou obras, fazei em nome do Senhor Jesus, dando graças a Deus Pai, por ele.
CI 4,2: Aplicai-vos com assiduidade e vigilância à oração, acompanhada de ação de graças.
1Ts 5,17-18: Orai sem cessar: em todas as circunstâncias dai graças.

Concílio Vaticano II, constituição dogmática sobre a Igreja, Lumen Gentium, 41: ‘Portanto todos os fiéis cristãos nas condições, ofícios ou circunstâncias de sua vida, e através disto tudo, dia a dia, mais se santificarão, se com fé tudo aceitam da mão do Pai celeste e cooperam com a vontade divina, manifestando a todos, no próprio serviço temporal, a caridade com que Deus amou o mundo’.

Concílio Vaticano II, decreto sobre o apostolado dos leigos, Apostolicam Actuositatem, 4: ‘Esta vida íntima de união com Cristo na Igreja alimenta-se por meios espirituais que ... devem ser de tal sorte utilizados pelos leigos que estes, enquanto cumprem corretamente as funções mesmas do mundo nas condições ordinárias da vida, não separem a união com Cristo de sua vida, mas cresçam nela, enquanto realizam o próprio trabalho segundo a vontade de Deus... Nem os cuidados pela família, nem os demais assuntos seculares devem ser estranhos à espiritualidade da sua vida, segundo a expressão do Apóstolo: 'O que quer que façais por palavra ou por ação, fazei-o em nome do Senhor Jesus Cristo, dando graças a Deus Pai por ele'.5

Concílio Vaticano II, constituição pastoral sobre a Igreja no mundo de hoje, Gaudium et Spes 43: ‘Este divórcio entre a fé professada e a vida cotidiana de muitos deve ser enumerado entre os erros mais graves do nosso tempo... Portanto não se crie oposição artificial entre as atividades profissionais e sociais de uma parte, e de outra, a vida religiosa... Alegrem-se antes os cristãos porque podem desempenhar todas as atividades terrestres, unindo os esforços humanos, domésticos, profissionais, científicos ou técnicos em síntese vital com os valores religiosos, sob cuja soberana direção todas as coisas são coordenadas para a glória de Deus’.

II

Concede-se indulgência parcial ao fiel que, levado pelo espírito de fé, com o coração misericordioso, dispõe de si próprio e de seus bens no serviço dos irmãos que sofrem falta do necessário. O fiel é atraído por esta concessão de indulgência para que, seguindo o exemplo e preceito do Cristo Jesus6, execute mais frequentemente obras de caridade ou de misericórdia.

Contudo, nem todas as obras de caridade são enriquecidas de indulgência, mas só as que são feitas "para serviço dos irmãos que sofrem falta do necessário" como comida ou roupa para o corpo, ou consolação para alma.

Mt 25,35-36 e 40: Tive fome e me destes de comer, tive sede e me destes de beber, fui peregrino e me acolhestes estive nu e me vestistes, enfermo e me visitastes, estava preso e viestes me ver... em verdade vos digo, todas as vezes que a fizestes a um destes meus irmãos menores, a mim o fizestes.
Jo 13,34-35: Um novo preceito eu vos dou: que vos ameis uns aos outros. Assim como eu vos amei, amai-vos também uns aos outros. Todos hão de conhecer que sois meus discípulos, se vos amardes uns aos outros.
Rm 12,8.10-11 e 13: Se distribuir esmolas, faça-o com simplicidade... quem exerce a misericórdia, que o faça com afabilidade... Sede cordiais no amor fraterno entre vós. Rivalizai em honrar-vos reciprocamente. Não relaxeis no zelo. Sede fervorosos de espírito. Servi ao Senhor... Socorrei as necessidades dos fiéis. Esmerai-vos na prática da hospitalidade.7
1Cor 13,3: E se repartir toda a minha fortuna... mas não tiver a caridade, nada disso me aproveita.
GI 6,10: Por conseguinte, enquanto dispomos de tempo, façamos bem a todos, especialmente aos irmãos na fé.   
Ef 5,2: Progredi na caridade segundo o exemplo de Cristo que nos amou.
1Ts 4,9: Vós mesmos a prendestes de Deus a vos amar uns aos outros.
Hb 13,1: Perseverai no amor fraterno.
Tg 1,27: A religião pura e imaculada diante de Deus Pai é visitar os órfãos e as viúvas em suas tribulações e conservar-se sem mancha neste mundo.8
1Pd 1,22: Em obediência à verdade, vos purificastes para praticardes um amor fraterno sincero. Amai-vos, pois, uns aos outros ardentemente do fundo do coração.
1Pd 3,8-9: Finalmente, tende todos um mesmo sentir, sede compassivos, fraternais, misericordiosos, humildes. Não pagueis mal com mal, nem injúria com injúria. Ao contrário, abençoai, pois fostes chamados para serdes herdeiros da bênção.
2Pd 1,5-7: Por estes motivos esforçai-vos quanto possível... para unir à piedade a estima fraterna, e à estima fraterna o amor.
1Jo 3,17-18: Quem possuir bens deste mundo e vir o irmão passando necessidade, mas lhe fechar o coração, como poderá estar nele o amor de Deus? Meus filhinhos, não amemos com palavra nem de boca, mas com obras e verdade.

Concílio Vaticano II, decreto sobre o apostolado dos leigos, Apostolicam Actuositatem 8: ‘Onde quer que haja alguém que carece de comida e bebida, de roupa, casa, medicamentos, trabalho, instrução, de condições necessárias para uma vida realmente humana, que esteja atormentado pelas tribulações ou doença, que sofra exílio ou prisão aí a caridade cristã deve procurá-lo e descobri-lo, aliviá-lo com carinhosa assistência e ajudá-lo com auxílios oportunos... Para que o exercício desta caridade esteja acima de qualquer crítica e se apresente como tal; olhe-se no próximo a imagem de Deus, segundo a qual foi criado, e o Cristo Senhor, a quem na realidade se oferece o que é dado ao indigente’.

Concílio Vaticano II, decreto sobre o apostolado dos leigos, Apostolicam Actuositatem 31c: ‘Uma vez que as obras de caridade e misericórdia apresentam testemunho luminoso de vida cristã, a formação apostólica deve levar também à prática das mesmas, para que aprendam os fiéis, desde a infância, a sofrer com os irmãos e a auxiliar de coração generoso os que sofrem’.

Concílio Vaticano II, constituição pastoral sobre a Igreja no mundo de hoje, Gaudium et Spes 93: ‘Lembrados da palavra do Senhor: 'Nisto todos conhecerão que sois meus discípulos,  se vos amardes uns aos outros'9, os cristãos nada podem desejar mais ardentemente do que prestar serviço aos homens de hoje, com generosidade sempre maior e mais eficaz... Pois o Pai quer que reconheçamos Cristo como irmão em todos os homens e amemos eficazmente tanto em palavras como em atos’.

III

Concede-se indulgência parcial ao fiel que se abstém de coisa lícita e agradável, em espírito espontâneo de penitência. Por esta terceira concessão é impelido o fiel a refrear suas más inclinações, a aprender a sujeitar o corpo e a se conformar com Cristo pobre e paciente.10

Pois a penitência tanto mais vale quanto mais se une à caridade, conforme as palavras de São Leão Magno: ‘Demos à virtude o que subtrairmos ao prazer. Torne-se refeição dos pobres a abstinência do que jejua’.11

Lc 9,23: Se alguém quiser seguir-me, negue-se a si mesmo, tome a cruz cada dia e me siga.12
Lc 13,5: Digo-vos que, se não vos converterdes, todos vós perecereis do mesmo modo (cf. também o v. 3).
Rm 8,13: Se pelo Espírito mortificardes as obras da carne, vivereis.
Rm 8,17: Soframos com ele, para sermos também com ele glorificados.
lCor 9,25-27: Quem se prepara para a luta abstém-se de tudo, e isto para alcançar uma coroa corruptível; porém nós, para alcançar uma incorruptível. E eu corro, mas não vou sem direção; eu luto, mas não como quem dá socos no ar. Porém castigo meu corpo e o domino.
2Cor 4,10: Trazemos sempre no corpo a morte de Jesus, para que também a vida de Jesus se manifeste em nosso corpo.
2Tm 2,11-12: Verdadeira é a palavra. Pois se padecemos, com ele, também com ele viveremos. Se com ele sofremos; com ele reinaremos.
Tt 2,12: Veio para nos ensinar a renúncia... aos desejos mundanos, para vivermos sóbria, justa e piedosamente neste século.
lPd 4,13: Deveis alegrar-vos na medida em que participais dos sofrimentos de Cristo, para que, na revelação de sua glória, possais exultar e alegrar-vos.

Concílio Vaticano II, decreto sobre a formação sacerdotal, Optatam Totius 9: ‘Com particular solicitude sejam de tal modo formados na obediência sacerdotal, na vida de pobreza e no espírito de abnegação, que estejam prontos a renunciar até as coisas lícitas... para se conformarem a Cristo crucificado’.

Concílio Vaticano II, constituição dogmática sobre a Igreja, Lumen Gentium 10: ‘Os fiéis, no entanto, em virtude de seu sacerdócio régio, concorrem na oblação da eucaristia e o exercem na recepção dos sacramentos, na oração e ação de graças, pelo testemunho de uma vida santa, pela abnegação e caridade ativa’.

Concílio Vaticano II, constituição dogmática sobre a Igreja, Lumen Gentium 41:  ‘Todos os que, movidos pelo Espírito de Deus, obedecem à voz do Pai e adoram a Deus Pai em espírito e verdade, cultivamos vários gêneros de vida e ofícios mas uma única santidade. Eles seguem a Cristo pobre, humilde e carregado com a cruz, para que mereçam ter parte na sua glória’.

Constituição apostólica Paenitemini, III, c: ‘A Igreja convida a todos os fiéis a corresponderem ao preceito divino da penitência que, além das renúncias impostas pelo peso da vida cotidiana, pede alguns atos de mortificação também de corpo... A Igreja quer indicar na tríade tradicional 'oração, jejum, caridade' os modos fundamentais para obedecer ao preceito divino da penitência. Ela defendeu a oração e as obras de caridade, mas também, e com insistência, a abstinência de carne e o jejum. Tais modos foram comuns a todos os séculos; todavia, no nosso tempo, motivos particulares existem pelos quais, segundo as exigências dos diversos lugares, é necessário inculcar, de preferência a outras, alguma forma especial de penitência. Por isso, onde quer que seja maior o bem-estar econômico, dever-se-á, de preferência, dar um testemunho de abnegação, a fim de que os filhos da Igreja não sejam envolvidos pelo espírito do mundo; e ao mesmo tempo dever-se-á dar um testemunho de caridade para com os irmãos, também de regiões longínquas, que sofrem de pobreza e de fome’.13

1 Cf. 1Cor 10,31 e Cl 3,17; Concílio Vaticano II, decreto sobre o apostolado dos leigos, Apostolicam Actuositatem 2, 3, 4 e 13.
2 Cf. Concílio Vaticano II, constituição dogmática sobre a Igreja, Lumen Gentium 39 e 40-42.
3 Cf. constituição apostólica Paenitemini, 17 de fev. de 1966, II e: AAS 58 (1966), pp. 182-183.
4 Lc 18,1.
5 C1 3,17.
6 Cf. Jo 13,15 e At 10,38.
7 Cf. também Tb 4,7-8 e Is 58,7
8 Cf. também Tg 2,15-16.
9 Jo 13,35.
10 Cf. Mt 8,20 e 16,24.
11 Sermão 13 (ou 12) sobre o jejum do décimo mês, 2: PL 54, 172.
12 Cf. Lc 14,27
13 AAS 58 (1966), pp. 182-183.

MANUAL DAS INDULGÊNCIAS (I)

SAGRADA PENITENCIARIA APOSTÓLICA

DECRETO 

Na Constituição Apostólica Indulgentiarum Doctrina, de primeiro de janeiro de 1967, lê-se o seguinte: "Para que o próprio uso das indulgências seja elevado a maior dignidade e estima, a Santa Mãe Igreja julgou oportuno inovar algo nessa disciplina e decretou a promulgação de novas normas". Na norma 13 da mesma Constituição, eis o que se determina: "O Manual das Indulgências seja revisto com o critério de se enriquecerem com indulgências somente as obras principais de piedade, caridade e penitência". 

Cumprindo a vontade do Sumo Pontífice, manifestada tanto pela Constituição Apostólica Indulgentiarum Doctrina, como pelas novas determinações por ele próprio indicadas, esta Sagrada Penitenciaria diligentemente cuidou de compor um novo Manual das Indulgências. 

O Sumo Pontífice Paulo VI recebeu, em audiência de 14 ele junho desse ano, ao Cardeal Penitenciário-mor, abaixo assinado: este lhe apresentou o novo Manual das Indulgências, impresso na tipografia Vaticana. A 15 de agosto do mesmo ano, o Sumo Pontífice o aprovou e mandou que o reconhecessem como autêntico, ab-rogando todas as concessões de indulgências não contidas no mesmo manual. Ab-rogou, além disso, no assunto de indulgências, as ordenações do Código de Direito Canônico, das Letras Apostólicas mesmo as dadas de motopróprio, dos Decretos da Santa Sé, enfim o que não estivesse incluído nas normas sobre as indulgências. 

Revogam-se as disposições em contrário, mesmo as de especial menção. 

Dado em Roma, pela Sagrada Penitenciaria Apostólica, a 29 de junho de 1968, na festa dos Santos Apóstolos Pedro e Paulo. 
† José Cardo Ferretto 
Bispo titular da Igreja suburbana
Sabinense e Mandelense 
Penitenciário-mor 

João Sessolo
Regente

NORMAS SOBRE AS INDULGÊNCIAS


1. Indulgência é a remissão, diante de Deus, da pena temporal devida pelos pecados já perdoados quanto à culpa, que o fiel, devidamente disposto e em certas e determinadas condições, alcança por meio da Igreja, a qual, como dispensadora da redenção, distribui e aplica, com autoridade, o tesouro das satisfações de Cristo e dos Santos1.

2. A indulgência é parcial ou plenária, conforme liberta, em parte ou no todo, da pena temporal devida pelos pecados2.

3. Ninguém pode lucrar indulgências a favor de outras pessoas vivas3.

4. Qualquer fiel pode lucrar indulgências parciais ou plenárias para si mesmo ou aplicá-las aos defuntos como sufrágio4.

5. O fiel que, ao menos com o coração contrito, faz uma obra enriquecida de indulgência parcial, com o auxílio da Igreja, alcança o perdão da pena temporal, em valor correspondente ao que ele próprio já ganha com sua ação5.

6. A divisão das indulgências em pessoais, reais e locais já não se usa, para mais claramente constar que se enriquecem as ações dos fiéis, embora sejam atribuídas às vezes a coisas e lugares6.

7. Além da autoridade suprema da Igreja, só podem conceder indulgências aqueles a quem esse poder é reconhecido pelo direito ou concedido pelo Romano Pontífice7.

8. Na Cúria Romana, só à Sagrada Penitenciaria se confia tudo o que se refere à concessão e uso de indulgências; excetua-se o direito da Congregação para a Doutrina da Fé de examinar o que toca à doutrina dogmática sobre as mesmas indulgências8.

9. Nenhuma autoridade inferior ao Romano Pontífice pode conferir a outros o poder de conceder indulgências, a não ser que isso lhe tenha sido expressamente concedido pela Sé Apostólica9.

10. Os Bispos e os equiparados a eles pelo direito, desde o princípio de seu múnus pastoral, têm os seguintes direitos: 

1º Conceder indulgência parcial aos fiéis confiados ao seu cuidado. 
2º Dar a bênção papal com indulgência plenária, segundo a fórmula prescrita, cada qual em sua diocese, três vezes ao ano, no fim da missa celebrada com especial esplendor litúrgico, ainda que eles próprios não a celebrem, mas apenas assistam, e isso em solenidade ou festas por eles designadas. 

11. Os Metropolitas podem conceder a indulgência parcial nas dioceses sufragâneas, como o fazem na sua própria diocese.

12. Os patriarcas podem conceder a indulgência parcial em cada um dos lugares do seu patriarcado, mesmo isentos, nas igrejas de seu rito fora dos confins do patriarcado e, em qualquer parte, para os fiéis do seu rito. O mesmo podem os Arcebispos Maiores. 

13. O Cardeal goza do direito de conceder a indulgência parcial em qualquer parte, mas só aos presentes em cada vez.

14. Parágrafo 1. Todos os livros, opúsculos, folhetos etc., em que se contêm concessões de indulgências, não se editem sem licença do ordinário ou hierarca local.
Parágrafo 2. Requer-se licença expressa da Sé Apostólica para imprimir em qualquer língua a coleção autêntica das orações ou das obras pias a que a sé Apostólica anexou indulgências10.

15. Os que impetraram do Sumo Pontífice concessões de indulgências para todos os fiéis são obrigados, sob pena de nulidade da graça recebida, a mandar exemplares autênticos das mesmas à Sagrada Penitenciaria. 

16. A indulgência, anexa a alguma festa, entende-se como transferida para o dia em que tal festa ou sua solenidade externa legitimamente se transfere. 

17. Para ganhar a indulgência anexa a algum dia, se é exigida visita à igreja ou oratório, esta pode fazer-se desde o meio-dia precedente até a meia-noite do dia determinado. 

18. O fiel cristão que usa objetos de piedade (crucifixo ou cruz, rosário, escapulário, medalha) devidamente abençoados por qualquer sacerdote ou diácono, ganha indulgência parcial. Se os mesmos objetos forem bentos pelo Sumo Pontífice ou por qualquer Bispo, o fiel ao usá-los com piedade pode alcançar até a indulgência plenária na solenidade dos Santos Apóstolos Pedro e Paulo, se acrescentar alguma fórmula legítima de profissão de fé11.

19. Parágrafo 1. A indulgência anexa à visita à igreja não cessa, se o edifício se arruíne completamente e seja reconstruído dentro de cinqüenta anos no mesmo ou quase no mesmo lugar e sob o mesmo título. 
Parágrafo 2. A indulgência anexa ao uso de objeto de piedade só cessa quando o mesmo objeto acabe inteiramente ou seja vendido. 

20. Parágrafo 1. Para que alguém seja capaz de lucrar indulgências, deve ser batizado, não estar excomungado e encontrar-se em estado de graça, pelo menos no fim das obras prescritas. 
Parágrafo 2. O fiel deve também ter intenção, ao menos geral, de ganhar a indulgência e cumprir as ações prescritas, no tempo determinado e no modo devido, segundo o teor da concessão12.

21. Parágrafo 1. A indulgência plenária só se pode ganhar uma vez ao dia. 
Parágrafo 2. Contudo, o fiel em artigo de morte pode ganhá-la, mesmo que já a tenha conseguido nesse dia. 
Parágrafo 3. A indulgência parcial pode ganhar-se mais vezes ao dia, se expressamente não se determinar o contrário13.

22. A obra prescrita para alcançar a indulgência plenária, anexa à igreja ou oratório, é a visita aos mesmos: neles se recitam a oração dominical e o símbolo aos apóstolos (Pai-nosso e Creio), a não ser caso especial em que se marque outra coisa14.

23. Parágrafo 1. Para lucrar a indulgência plenária, além da repulsa de todo o afeto a qualquer pecado até venial, requerem-se a execução da obra enriquecida da indulgência e o cumprimento das três condições seguintes: confissão sacramental, comunhão eucarística e oração nas intenções do Sumo Pontífice15.
Parágrafo 2. Com uma só confissão podem ganhar-se várias indulgências, mas com uma só comunhão e uma só oração alcança-se uma só indulgência plenária. 
Parágrafo 3. As três condições podem cumprir-se em vários dias, antes ou depois da execução da obra prescrita; convém, contudo, que tal comunhão e tal oração se pratiquem no próprio dia da obra prescrita. 
Parágrafo 4. Se falta a devida disposição ou se a obra prescrita e as três condições não se cumprem, a indulgência será só parcial, salvo o que se prescreve nos números 27 e 28 em favor dos "impedidos". 
Parágrafo 5. A condição de rezar nas intenções do Sumo Pontífice se cumpre ao se recitar nessas intenções um Pai-nosso e uma Ave-Maria, mas podem os fiéis acrescentar outras orações conforme sua piedade e devoção. 

24. Com a obra, a cuja execução se está obrigado por lei ou preceito, não se podem ganhar indulgências, a não ser que em sua concessão se diga expressamente o contrário. Contudo, quem executa obra que é penitência sacramental e é por acaso indulgenciada, pode ao mesmo tempo satisfazer a penitência e ganhar a indulgência16.

25. A indulgência anexa a alguma oração pode ganhar-se em qualquer língua em que se recite, desde que a tradução seja fiel, por declaração da Sagrada Penitenciaria ou de um dos ordinários ou hierarcas locais. 

26. Para aquisição de indulgências é suficiente rezar a oração alternadamente com um companheiro ou segui-la com a mente, enquanto outro a recita. 

27. Os confessores podem comutar a obra prescrita ou as condições, em favor dos que estão legitimamente impedidos ou impossibilitados de as cumprir por si próprios. 

28. Os ordinários ou jerarcas locais podem além disso conceder aos fiéis que são seus súditos segundo a norma do direito, e que se encontrem em lugares onde de nenhum modo ou dificilmente possam se confessar e comungar, para que também eles possam ganhar a indulgência plenária sem a atual confissão e comunhão, contanto que estejam de coração contrito e se proponham aproximar-se destes sacramentos logo que puderem. 

29. Tanto os surdos como os mudos podem ganhar as indulgências anexas às orações públicas, se, rezando junto com outros fiéis no mesmo lugar, elevarem a Deus a mente com sentimentos piedosos; e tratando-se de orações em particular, é suficiente que as lembrem com a mente ou as percorram somente com os olhos.
  
1 Constituição Apostólica Indulgentiarum Doctrina, norma 1.
Ib., norma 2.
Ib., norma 3.
Ib., norma 5.
Cf. cân. 994, CDC.
Constituição Apostólica Indulgentiarum Doctrina, norma 12.
Cf. cân. 995, 1, CDC.
Cf. Constituição Apostólica Regimini Ecclesiae Universae, 15/08/1967, n. 113: AAs 59, p. 113.
Cf. cân. 995, 2, CDC.
10 Cf. cân. 826, 3, CDC.
11 Constituição Apostólica Indulgentiarum Doctrina , norma 17.
12 Cf. cân. 996, CDC.
13 Constituição Apostólica Indulgentiarum Doctrina , normas 6 e 18.
14 Ib., norma 16.
15 Ib., normas 7,8,9 e 10.
16 Ib., norma 11.

segunda-feira, 19 de novembro de 2012

AS BEM-AVENTURANÇAS DAS INDULGÊNCIAS

EXCERTO DA OBRA 'O PROGRESSO NA VIDA ESPIRITUAL' 
                                                                                            Pe. Frederick William Faber (1814-1863) 


Em primeiro lugar, por terem relação com o pecado, com a Justiça de Deus e com a pena temporal devida ao pecado, as indulgências conservam em nós certos pensamentos que pertencem à fase da purificação, o que para nós é salutar, embora desejemos com impaciência ir adiante e livrar-nos deles.

Em segundo lugar, produzirão em nós a feliz disposição de nos afastar deste mundo: conduzem-nos a um mundo invisível; cercam-nos de imagens sobrenaturais; infundem em nosso espírito uma ordem de idéias que nos desapega das coisas mundanas e exprobra os prazeres terrestres. 

Em terceiro lugar, guardam continuamente diante de nós a doutrina do Purgatório, e assim nos obrigam ao constante exercício da fé e ao mesmo tempo nos sugerem motivos de um santo temor. 

Em quarto lugar, fazem-nos praticar para com os fiéis falecidos o exercício da caridade, que facilmente chegará ao heroísmo, estando assim ao alcance dos que não podem fazer outras esmolas, e produz deste modo em nossa alma os efeitos que acompanham as obras de misericórdia. 

Em quinto lugar, a glória de Deus tem muito interesse nas indulgências, por uma dupla razão: porque libertam as almas do Purgatório, apressando a sua entrada na corte celestial, e porque patenteiam especialmente algumas das perfeições divinas, tais como Sua infinita pureza, Seu ódio ao pecado ainda mesmo ínfimo, e o rigor da Sua justiça, aliada à mais engenhosa misericórdia. 

Em sexto lugar, elas prestam homenagem às satisfações que Jesus ofereceu por nós. São para estas satisfações o que para os Seus méritos é a doutrina de que todo pecado não é perdoado senão devido a Ele. Portanto podemos dizer que, aproveitando d’Ele e dos Seus méritos o mais possível, as indulgências realçam a copiosidade da Redenção. Honram também as satisfações da Virgem Maria e dos Santos, de modo a honrar mais ainda a Jesus. 

Em sétimo lugar, elas nos dão uma idéia mais séria do pecado e aumentam o horror que lhe temos. Com efeito, as indulgências lembram-nos constantemente a verdade de que o castigo é devido mesmo ao pecado perdoado, que este castigo é terrível ainda mesmo que seja apenas por algum tempo, e que só é possível livrar-nos dele pelas satisfações de Jesus. 

Em oitavo lugar, elas nos mantêm em harmonia com o espírito da Igreja, o que é de suma importância para os que se esforçam por levar uma vida devota e caminham entre as dificuldades do ascetismo e da santidade interior. Depreciar as indulgências é um sinal de heresia, e o ódio que esta lhes vota é um indício de que o demônio as detesta, e isto mostra o valor do poder delas diante de Deus e da sua aceitação por parte d’Ele. Elas estão envolvidas em tantas particularidades da Igreja, desde a jurisdição da Santa Sé até à crença no Purgatório, nas boas obras, nos santos e na satisfação [das penas devidas ao pecado], que são, de certo modo, o sinal inconfundível da nossa ortodoxia [isto é, da nossa catolicidade]. A infeliz história dos erros que a Igreja sofreu a respeito da vida espiritual nos mostra que, para sermos verdadeiramente santos, devemos ser verdadeiramente católicos e católicos romanos, pois fora de Roma não pode haver nem catolicismo, nem santidade alguma. 

Além do que, as devoções indulgenciadas oferecem em si a seguinte vantagem: temos certeza de que são mais que aprovadas pela Igreja. Sabemos que no mundo numerosas almas piedosas as empregam todos os dias, e unindo-nos a elas participamos mais inteiramente da Comunhão dos Santos e da vida da Igreja, que constitui sua unidade. Por todas as razões que enunciei, o emprego das indulgências espiritualiza cada vez mais a nossa alma a aviva a nossa fé. Elas nos levam a rezar como quer a Igreja e sobre assuntos por ela indicados, e assim podemos alcançar muitos fins ao mesmo tempo. Pois pelo mesmo ato não somente rezamos, como fazemos ato de veneração às chaves da Igreja, honramos a Jesus, Sua Mãe e os Santos, evitamos o castigo temporal que nos é devido, ou, o que é ainda melhor, libertamos os mortos [do Purgatório] e assim glorificamos a Deus. Podemos ainda verificar que, ao percorrermos as devoções indulgenciadas, transferimos para o nosso espírito muita doutrina tocante, que serve de alimento à oração mental e a um amor cheio de reverência. 

Tomemos um exemplo. Não posso conceber que um homem seja espiritual se não tem o hábito de rezar o terço, que pode ser chamado a rainha das devoções indulgenciadas. Em primeiro lugar, considerai a importância do Rosário como sendo uma devoção própria da Igreja, imprimindo em nossa alma um caráter particularmente católico, conservando perpetuamente em nosso espírito a lembrança de Jesus e de Maria, e como sendo um precioso auxílio para alcançarmos a perseverança final, se o recitarmos com fidelidade, como no-lo provam diversas revelações. Considerai, em seguida, que São Domingos o instituiu em 1214, inspirado por uma visão, com o fim de combater a heresia, e considerai o êxito que o consagrou. (...) 

Nada desejaria dizer que pudesse restringir qualquer devoção. Todavia, considerando bem todas as coisas, quando a Igreja indulgenciou um tão grande número de orações e devoções, por que recorrer a outras orações vocais em vez de procurar as indulgenciadas?”

sábado, 17 de novembro de 2012

OS INDIFERENTES

Eis como dizia Corção*, face ao indiferente: 'o homem para quem o sim e o não tanto fazem, que se equilibra onde parecia impossível o equilíbrio, esse assombro enfim, tornou-se a coisa mais banal do universo. Está em todos os lugares e seu nome é legião. Para encontrá-lo basta abrir uma porta, atravessar uma rua, debruçar-se numa janela, atender um telefone'. Conceituação lapidar, definitiva. O indiferente é um assombro espantosamente banal nos tempos finais.

Da essência do ato de pensar, dos privilégios da reflexão e do discernimento, bastaria o bem e o mal, um caminho para Deus e o caminho para o nada, a opção entre a luz e as trevas, a busca da Verdade ou a imersão nas crenças mais bisonhas. Mas não. Os indiferentes conspurcam a ideia tão simples da dicotomia tão fácil: entre o bem e o mal, existe o mal no bem e o bem no mal. Entre o sim e o não, há o sim que aparenta ser o não e o não com a solicitude de um sim. Para que o mais ou o menos, se existe o mais ou menos? Entre o Céu e o Inferno, há que existir 'o bom lugar', o paraíso dos indolentes, o nirvana dos trôpegos,  o éden das almas tíbias e indiferentes.

O indiferente se extasia de um céu de brigadeiro. E se locupleta no inferno da música ou dos costumes profanos com a mesma volúpia e servidão. Tudo é perfeitamente admissível e igualmente passível de prosa e verso. Ecumenismo, direitos humanos, liberdade, democracia, livre pensar, tolerância, respeito às minorias são as salvaguardas e os dogmas a serem venerados, porque absolutamente dóceis e intercambiáveis como moeda universal, instrumentos de fácil percussão na retórica mundana, palavras de ordem cujo nome é legião. Nada de extremos, nada de rigidez de convicções, nada de regras e tradições utópicas, nada de se vangloriar de possuir 'a verdade', nada de sofrimentos inúteis e desgastes perfeitamente evitáveis, nada de posar de mártir de causas perdidas, nada de tudo, nada de nada. 

Os indiferentes dominam o mundo. E convertem a graça da vida na banalidade do viver. Estão nos carros, metrôs, e nos trens e aviões. Nas terras e mares, nas praças e ruas, nos mercados e nas confrarias. E vivem muito bem, e isso basta. Não há modo mais fácil e simples de servir ao mundo. E nem meio mais propício de atrair a cólera divina, pois se há uma coisa que causa repugnância ao Pai são as almas tíbias. Por que não há indiferentismo nenhum por trás do resfriamento espiritual das almas; muito pelo contrário, estão presentes, em todos os graus, as obsessões satânicas do inimigo da nossa salvação. Os indiferentes são apenas os (muitos) filhos bastardos de Caim.

* Gustavo Corção: 'Os indiferentes'.