terça-feira, 22 de julho de 2025

TESOURO DE EXEMPLOS II (23/26)

 

23. UM SERMÃO OUVIDO DE LONGE

Conta o escritor Súrio que, estando Santo Antônio a pregar em certa cidade, uma senhora devota, que morava distante, tinha imenso desejo de ouvir as pregações do santo. O marido, homem perverso, não lhe permitia de modo algum. Ouvindo que, devido a multidão do povo, o santo iria pregar fora da cidade em campo aberto, a boa senhora, aflita e desconsolada, subiu ao terraço da casa para olhar, ao menos de longe, o lugar onde o santo pregava.

Coisa admirável! Apesar da grande distância, a voz do pregador chegava-lhe aos ouvidos forte e distinta, como se o púlpito estivesse ali mesmo. Admiradíssima chamou o marido, o qual, reconhecendo naquele acontecimento o dedo de Deus, entrou em si, converteu-se sinceramente, e foi dali em diante um ouvinte assíduo da palavra de Deus.

E assim recompensou Nosso Senhor a fé e o amor que aquela senhora demonstrava pela palavra divina.

24. NÃO SOMOS PAGÃOS...

➖Fique tranquilo, senhor vigário - dizia um pai de família - em nossa casa não somos pagãos. É verdade que eu não vou muito à missa e não comungo há muitos anos, mas minha mulher está na igreja todos os domingos e cumpre todos os seus deveres religiosos...
➖ Mas por que a sua mulher é tão fiel em cumprir os deveres para com Deus?
➖ Senhor vigário, por que há de ser, senão para salvar a alma?
➖ Perfeitamente! E você não tem por acaso uma alma que salvar? Porventura a sua mulher tem uma alma para os dois?

25. A DUPLA PÁSCOA DE BERRYER

Pelo fim da quaresma de 1868, o célebre advogado Berryer almoçava com o famoso historiador e literato Thiers. Este perguntou-lhe:
➖ Meu caro Berryer, vais fazer a Páscoa este ano?
➖ Espero que sim, respondeu o advogado; e até pretendo fazer duas: a primeira em Paris para cumprir meu dever e, depois, em Angerville, para servir de exemplo aos meus conterrâneos.
➖ Muito bem, Berryer; se todos seguissem o teu exemplo, a França estaria salva.

26. 'ÚLTIMA MISSA'

Há em Roma um quadro magnífico intitulado 'Última Missa', no qual estão representados os prelúdios do fim do mundo. Bem no fundo, um padre está para terminar a santa missa. Os anjos, inclinados sobre suas trombetas, esperam apenas que a missa termine, para anunciarem, ao som das trombetas, a hora da divina Justiça. 

Esse quadro é devido ao gênio do imortal pintor Leonardo da Vinci, o qual costumava dizer: 'Estou convencido de que, sem a santa missa, o mundo teria caído no abismo sob o peso de suas maldades'.

(Excertos da obra 'Tesouro de Exemplos' - Volume II, do Pe. Francisco Alves, 1960; com adaptações)

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segunda-feira, 21 de julho de 2025

FRASES DE SENDARIUM (LVI)


'A inteligência, iluminada pela fé, encontra Cristo Crucificado na cela do coração, no qual a alma vê o seu próprio nada' 

(Santa Catarina de Sena)

Jesus, quando o meu nada se extinguir de vez, que seja no abismo de Vossa Misericórdia...

OS PAPAS DA IGREJA (XXII)

 




domingo, 20 de julho de 2025

EVANGELHO DO DOMINGO

 

'Senhor, quem morará em vossa casa?' (Sl 14)

Primeira Leitura (Gn 18,1-10a) - Segunda Leitura (Cl 1,24-28) -  Evangelho (Lc 10,38-42)

  20/07/2025 - DÉCIMO SEXTO DOMINGO DO TEMPO COMUM

SÓ UMA COISA É NECESSÁRIA


Em meio às suas muitas viagens e peregrinações, em certa ocasião, Jesus parou para descansar na pequena comunidade de Betânia e ali se hospedou numa casa de propriedade de Marta. Marta era irmã de Maria e Lázaro, família religiosa e de posses, pela qual Jesus nutria grande apreço e amizade. Desta feita, aparentemente já se passara algum tempo sem Jesus ter estado com eles, pois, diante de sua chegada, Maria não arredava pé de sua Santa Presença, ouvindo com admiração e profunda alegria as palavras do Mestre.

Tão absorta e tão entretida estava Maria com a chegada do Senhor, que relegara ao completo esquecimento quaisquer outras tarefas ou atribuições, ainda que motivadas pela chegada de visitante de tal honra. Honra maior do que servi-lo ou preparar-lhe a refeição, era amá-lo, era estar envolvida pela sua presença, era encher o coração de graça e de se deleitar na graça do Senhor. Atitude diversa tivera a sua irmã Marta. Na praticidade e nas exigências das ações humanas, movia-se de esforços concentrados em dar ao Mestre a refeição mais ligeira e mais substanciosa. E, nesse intuito, estava imersa por completo em mil afazeres e preparativos, moldada pelo intento de oferecer uma generosa hospitalidade e propiciar uma acolhida calorosa ao Senhor em sua casa. Santas e gratas intenções do coração humano!

Foi, pois, movida por tais preocupações imediatas, que Marta abordou Jesus, buscando a sua intervenção em induzir Maria a ajudá-la nas tarefas a cumprir: 'Senhor, não te importas que minha irmã me deixe sozinha, com todo o serviço? Manda que ela me venha ajudar!' (Lc 10, 40). A hospitalidade e a docilidade da acolhida são afligidas pelas queixas e uma certa admoestação a Jesus no pedido de Marta: 'não importas?'; 'manda'... Diante de Deus, Maria se alimenta do Verbo Encarnado; diante de Deus, Marta se apequena nas suas próprias tribulações humanas.

Jesus vai conduzi-las ambas a si. Com Maria, mediante as palavras e os ensinamentos que o Evangelho não transcreveu. Com Marta, com as palavras que ressoam para todos nós: 'Marta, Marta! Tu te preocupas e andas agitada por muitas coisas. Porém, uma só coisa é necessária' (Lc 10, 41-42). Todas as ações humanas podem ser belas e santas, desde que comecem no espírito da Santa Presença de Deus. Por Cristo, com Cristo, em Cristo: tudo em Cristo para a glória de Deus! Maria escolheu a melhor parte porque fez a acolhida do Senhor Que Vem primeiro na alma. E esta escolha, ratificada por Jesus, é outra verdade que ressoa para cada um de nós, no agora da vida humana e no depois da eternidade: a melhor parte definitivamente 'não lhe será tirada' (Lc 10, 42).

sábado, 19 de julho de 2025

GALERIA DE ARTE SACRA (XLII)


O afresco Fractio Panis - Partição do Pão - constitui a representação mais antiga conhecida da celebração da Eucaristia, localizada na chamada 'Capela Grega', na Catacumba de Priscila, Via Salaria Nova, em Roma. Inteiramente recuperada e posteriormente descrita nos trabalhos do Padre Joseph Wilpert [Die Malereien der Katakomben Roms (1903)], a obra encimava o arco superior do altar da capela, datada da primeira metade do século II. Na mesma câmara, ao lado do afresco, está representado o sacrifício de Abraão e, no lado oposto, há também uma representação de Daniel na cova dos leões.

O registro histórico dos primórdios do cristianismo é contundente em demonstrar como as representações artísticas da celebração da Eucaristia variaram ao longo do tempo, dependendo do estado do conhecimento e da teologia da época. Nesta abordagem primitiva, a referência explícita está concentrada no ato eucarístico da partição do pão por um personagem imponente postado na extremidade de uma grande mesa: 'Unidos de coração, frequentavam todos os dias o templo; partiam o pão nas casas e tomavam a comida com alegria e singeleza de coração' (At 2,46) ou 'No primeiro dia da semana, estando nós reunidos para partir o pão...' (At 20,7). Da extremidade da mesa, este personagem, estendendo as mãos para a frente, formaliza a partição do pão diante dos demais convivas reunidos em torno da mesa e representados por 5 homens e uma mulher.. 

O significado eucarístico da imagem é corroborado por outros acessórios presentes na imagem, Com efeito, mais adiante na mesa, há dois pratos grandes, um contendo dois peixes e o outro, cinco pães. Em cada extremidade da mesa, estão presentes cestos cheios de pães - quatro cestos em uma extremidade e três na outra. Os pães e os peixes sobre a mesa apontam diretamente para a multiplicação milagrosa realizada duas vezes por Cristo. A associação deste milagre com a Santíssima Eucaristia é conhecida não apenas em outros monumentos arqueológicos, mas também na própria literatura cristã primitiva.

sexta-feira, 18 de julho de 2025

TRATADO SOBRE A HUMILDADE (XXVI)


Exame sobre a Humildade para com o Próximo

119. De acordo com a doutrina de São Tomás [2a 2æ, qu. clxi, art. 3], o primeiro ato de humildade consiste em nos submetermos a Deus, e o seguinte é submeter-nos - isto é, humilhar-nos - ao próximo por amor a Deus; como diz o Espírito Santo por meio de São Pedro: 'Sujeitem-se, portanto, a toda criatura humana por amor de Deus' [1Pd 2,13] e o mesmo Espírito Santo nos exorta através de São Paulo a nos superarmos uns aos outros em humildade: 'Com humildade, cada um considere os outros superiores a si mesmo' [Fl 2,3].

120. Ora, como o próximo pode ser seu superior, seu igual ou seu inferior, é certo que você deve praticar a humildade antes de tudo para com seu superior, o que é um preceito, pois, como diz São Pedro, tal é a vontade de Deus: 'Porque assim é a vontade de Deus' [1Pd 2,15]. Você demonstra aos seus superiores a obediência e reverência que sua condição exige? Como você recebe suas repreensões? Você sente aquela humildade de coração para com eles 'servindo de boa vontade' [Ef 6,7] que São Paulo recomenda? Há uma humildade necessária para a imitação de Cristo, 'que se humilhou, tornando-se obediente até a morte' [Fl 2,8]. Às vezes, pode haver uma desculpa de impotência ou inadvertência em não obedecer àqueles que Deus colocou acima de você, mas recusar-se a obedecer é sempre um ato de orgulho indesculpável. Como diz São Bernardo [citando São Tomás]: 'Não estar disposto a obedecer é um esforço orgulhoso da vontade' [2a 2æ, qu. clxi, art. 2].

121. Como você se comporta com os seus iguais? Você deseja estar acima deles, ser preferido a eles, não se contentando com sua própria condição? Toda vez que você sentir esse desejo em seu coração, diga a si mesmo que esse foi o pecado de Lúcifer, que disse em seu coração: 'Eu subirei' [Is 14,14]. E São Tomás ensina que a virtude da humildade consiste essencialmente em moderar esse desejo de nos exaltarmos acima dos outros.

Você se considera acima dos outros por algum dom da natureza, educação ou graça? Isso é verdadeiro orgulho, e você deve subjugá-lo com humildade, considerando-se inferior aos outros, como de fato você pode ser diante de Deus.

122. Como você se comporta com os seus inferiores? É para com eles que você deve exercer a humildade acima de tudo. 'Quanto maior fores' - diz a palavra inspirada - 'tanto mais humilha-te em todas as coisas' [Eclo 3,20]. E embora eles sejam inferiores no que diz respeito à sua condição de vida, lembra-te sempre que diante de Deus eles são teus iguais: 'Sabendo que o Senhor deles e teu está no céu, e que não faz acepção de pessoas' [Ef 6,9].

Dessa forma, você se tornará bondoso e atencioso, como aconselha São Paulo quando diz: 'Consentindo em ser humilde' [Rm 12,16]. Você os comanda com arrogância e imperiosidade, contra a vontade expressa de Deus, que não deseja que você se comporte com seus inferiores 'como senhor'? [1Pd 5,3]. E quando você é obrigado a corrigi-los, você o faz com o espírito adequado: 'Com espírito de mansidão' - como nos ensina o Apóstolo - 'considerando-se a si mesmo, para que também não seja tentado'? [Gl 6,1].

Há também outro tipo de humildade que é falsa e contra a qual somos advertidos pelo Espírito Santo quando Ele diz: 'Não sejas humilde em tua sabedoria, para que, sendo humilhado, não sejas enganado pela loucura' [Eclo 13,11]. Se você possui o talento de ensinar, aconselhar, ajudar e fazer o bem às almas dos outros, e então se retira, dizendo, como se fosse por humildade: 'Não sou bom o suficiente'; ou se você estiver em uma posição em que é seu dever corrigir, punir ou exercer autoridade, e você a abandonar por motivos de humildade, isso não é verdadeira humildade, mas fraqueza e covardia, e no que diz respeito às aparências, devemos observar a regra de Santo Agostinho: 'Para que, enquanto a humildade é observada indevidamente, a autoridade do governante não seja minada entre aqueles que devem ser submissos' [In Reg.].

Por mais que eu deva elogiá-lo por se considerar inferior em mérito a todos aqueles abaixo de você, 'no conhecimento do seu coração' - como diz tão bem São Gregório - isso não deve ser em detrimento do seu cargo, diminuindo a sua superioridade. Pois estar em uma posição superior não o impede de ser humilde de coração; mas essa humildade não deve ser um impedimento para o exercício da sua autoridade. A citação de Santo Agostinho é referida por São Tomás: 'Em segredo, considere os outros como seus superiores, aos quais você é superior em público' [2a 2æ, qu. clxi, art. 6 ad 1].

123. Temos que praticar dois tipos de humildade para com todos os nossos vizinhos: uma é de conhecimento, a outra de afeto. A humildade do conhecimento consiste em reconhecer e manter em nossa alma mais íntima que somos inferiores a todos, e é por isso que Jesus Cristo nos aconselha em seu evangelho a ocupar o lugar mais baixo: 'Sente-se no lugar mais baixo' [Lc 14,10].  Ele não nos diz para nos sentarmos em um lugar no meio, nem em um dos últimos, mas no último; isto é, devemos ter uma opinião de nós mesmos tal que nos consideremos inferiores a todos, como exclama São Bernardo: 'Que você se sente sozinho e em último lugar, não apenas não se colocando à frente dos outros, mas nem mesmo ousando se comparar com os outros' [Serm. 37 in Cant.]. A razão é que você não sabe se aqueles que você considera inferiores a si mesmo, e acima dos quais você se exalta, não são muito mais queridos por Deus e serão colocados no futuro à direita do Altíssimo.

O homem verdadeiramente humilde acredita que todos são melhores do que ele e que ele é o pior de todos. Mas você é realmente humilde assim em sua própria opinião? Você se compara facilmente com este e aquele, mas a quantos você não se prefere com o orgulho do fariseu: 'Eu não sou como os outros homens' [Lc 18,11]. Quando você se prefere aos outros, muitas vezes parece que você fala com certa humildade e modéstia, dizendo: 'Pela graça de Deus, não tenho os vícios de tal pessoa; pela graça de Deus, não cometi tantos pecados graves quanto tal pessoa'. Mas é realmente verdade que você reconhece que deve tudo isso à graça de Deus e que dá a Ele a glória, em vez de a si mesmo? Se você se estima mais do que tal pessoa, e se ela, por sua vez, se estima inferior a você, ela é, portanto, mais humilde do que você e, por essa razão, melhor. Se, pela graça de Deus, você é casto, caridoso e justo, deve se esforçar, pela mesma graça, para ser também humilde. E como você pode ser humilde se tem tanta autoestima, preferindo-se aos outros?

Quando São Paulo nos ensina que, em santa humildade, devemos acreditar que todos os outros são melhores do que nós, ele também nos ensina a maneira de conseguir isso, ou seja, não considerando o bem que temos em nós mesmos, mas o que os outros têm ou podem ter, 'cada um não considerando as coisas que são suas, mas as que são dos outros' [Fl 2,4]. Com base nisso, São Tomás fundamenta esta doutrina de que todo o mal que há no homem e é feito pelo homem vem do homem, e todo o bem que há no homem e é feito pelo homem vem de Deus; e ele diz que, por quatro razões, podemos afirmar sem hesitação que todos são melhores do que nós.

A primeira razão é considerar em nossos corações o que realmente nos pertence, ou seja, a malícia e a maldade, e considerar o que nosso próximo possui o que é de Deus, ou seja, seus inúmeros benefícios. A segunda é considerar alguma qualidade boa em particular que essa pessoa possa ter e que nós não temos. A terceira é reconhecer alguma falha em nós mesmos que a outra pessoa não tem. A quarta é ter um temor sábio de que possa haver algum orgulho secreto dentro de nós que corrompa nossas ações mais sagradas e que possamos estar enganados na opinião que temos de nós mesmos, imaginando-nos virtuosos quando não somos [2a 2æ, qu. clxi, art. 3 in 4; dist. 25, qu. ii, art. 3 ad 2].

('A Humildade de Coração', de Fr. Cajetan (Gaetano) Maria de Bergamo, 1791, tradução do autor do blog)

quinta-feira, 17 de julho de 2025

PALAVRAS DE SALVAÇÃO

Conservando-se a perfeita propriedade das duas naturezas que subsistem em uma só pessoa, a humildade é assumida pela majestade, a fraqueza pela força, a mortalidade pela eternidade. Para pagar a dívida contraída pela nossa condição pecadora, a natureza invulnerável uniu-se à natureza passível; e a realidade de verdadeiro Deus e verdadeiro homem associa-se na única pessoa do Senhor. Por conseguinte, aquele que é um só mediador entre Deus e os homens (1Tm 2,5), como exigia a nossa salvação, morreu segundo a natureza humana e ressuscitou segundo a natureza divina. Com razão, pois, o nascimento do Salvador conservou intacta a integridade virginal de sua mãe; ela salvaguardou a pureza, dando à luz a Verdade. Tal era, caríssimos filhos, o nascimento que convinha a Cristo, poder e sabedoria de Deus. Por este nascimento, ele é semelhante a nós pela sua humanidade, e superior a nós pela sua divindade. De fato, se não fosse verdadeiro Deus, não nos traria o remédio; se não fosse verdadeiro homem, não nos serviria de exemplo. Por isso, quando o Senhor nasceu, os anjos cantaram cheios de alegria: 'Glória a Deus no mais alto dos céus, e anunciaram paz na terra aos homens por ele amados' (Lc 2,14). Eles veem, efetivamente, a Jerusalém celeste ser construída pelos povos do mundo inteiro. Por tão inefável prodígio da bondade divina, qual não deve ser a alegria da nossa humilde condição humana, se até os sublimes coros dos anjos se rejubilam?

(São Leão Magno)