A FLOR DA PAIXÃO
A flor de maracujá, de cor púrpura, é associada comumente ao simbolismo da Paixão do Senhor, seja pela cor roxa característica do tempo quaresmal, seja pelo emaranhado característico das folhas, filamentos e pétalas que remetem aos pregos, chagas e espinhos que compõem o mistério do Calvário. A correlação é tão imediata que os primeiros missionários portugueses e espanhóis que chegaram às Américas no século XVI designaram a planta como Flos Passionis ou Flor da Paixão. Atualmente, acredita-se que existam mais de 500 espécies da flor da Paixão em todo o mundo, mas principalmente no Brasil. As características singulares da Flor da Paixão foram traduzidas por Catulo da Paixão Cearense (1863 - 1946), o chamado poeta do Sertão, no poema transcrito abaixo, elaborado em linguagem livre e regional, conectando ao mesmo tempo, de forma simples e bela, o folclore sertanejo e a religiosidade popular.
A FLOR DO MARACUJÁ
(Catulo da Paixão Cearense)
Encontrando-me com um sertanejo,
Perto de um pé de maracujá,
Eu lhe perguntei: diga-me caro sertanejo,
Porque razão nasce roxa, a flor do maracujá?
Ah, pois então eu lhi conto,
A estória que ouvi contá,
A razão pro que nasci roxa,
A frô do maracujá.
Maracujá já foi branco,
Eu posso inté lhe ajurá,
Mais branco qui a caridadi,
Mais branco do que o luá.
Quando as frô brotava nele,
Lá pros cunfim do sertão,
Maracujá parecia,
Um ninho de argodão.
Mais um dia, há muito tempo,
Num meis que inté num mi alembro,
Si foi maio, si foi junho,
Si foi janeiro ou dezembro.
Nosso sinhô Jesus Cristo,
Foi condenado a morrê,
Numa cruis crucificado,
Longe daqui como o quê,
Pregaro Cristo a martelo,
E ao vê tamanha crueza,
A natureza inteirinha,
Pois-se a chorá di tristeza.
Chorava us campu,
As foia, as ribeira,
Sabiá tamém chorava,
Nos gaio da laranjera,
E havia junto da cruis,
Um pé de maracujá,
Carregadinho de frô,
Aos pé do nosso sinhô.
I o sangue de Jesus Cristo,
Sangui pisado de dô,
Nus pé di maracujá,
Tingia todas as frô,
Eis aqui seu moço,
A estória que eu vi contá,
A razão proque nasce roxa,
A frô do maracujá.
PRIMEIRA SEXTA-FEIRA DO MÊS