'O silêncio é o segredo das grandes almas', já escreveu alguém. As grandes almas são raras. Por isso há pouco silêncio no mundo. Mas muito barulho. Muita confusão. Muitas palavras. Já não se ouvem, por isso, as discretas admoestações da consciência. Nem o perpassar dulcíssimo da graça. Nem os convites suaves para as boas resoluções. O barulho a tudo sufoca. Dispersando forças. Enfraquecendo energias. Mirrando as almas. Tornando-as mesquinhas também.
Pois 'é no silêncio que as almas crescem'’ diz a Imitação de Cristo. O silêncio é força. 'O silêncio é vida' — escreveu a santa carmelita Ir. Marie Aimée — 'ele é que forja os santos, trabalha-os, aperfeiçoa-os'. O Eterno Pai é vida. Por isso Ele diz uma só palavra: o Verbo Eterno. E por meio deste único Verbo criou todas as maravilhas do Universo. Maria, melhor do que ninguém, compreendeu toda a força e todo o encanto do silêncio. E a ele se entregou ciosamente.
Eis por que são tão raras as palavras que dela se leem nos santos Evangelhos, palavras de humildade, palavras de amor. E, justamente, por causa deste seu silêncio, se diz dela uma sentença profunda: 'Maria conservava todas estas palavras em seu coração' (Lc 2, 19), meditando-as, refletindo sobre elas, o que é um dos mais belos frutos do silêncio. E a seu esposo castíssimo, São José, dá-se o nome de 'santo silencioso', ó que admirável silêncio não havia de reinar então na casinha de Nazaré!
Mas não era um silêncio de cemitério, silêncio infrutífero, mas sim realizador e produtivo, assim como o silêncio das águas nos grandes reservatórios que, saindo de sua concentração, desenvolvem energias prodigiosas, produzindo força, produzindo luz. Eis a missão do silêncio. E um dos silêncios mais admiráveis de Maria é o grande silêncio ao pé da cruz. Nada de frases, de exclamações, de lamentos, mas o silêncio dos heróis.
Foi este sempre o seu procedimento. Silêncio que a acompanhou pela vida afora. Silêncio de humildade: nunca falando sobre si mesma; silêncio de caridade: nunca entristecendo o próximo; silêncio de obediência: nunca murmurando; silêncio de resignação: nunca se queixando; silêncio de prudência: nunca dizendo uma palavra demais; silêncio de recolhimento: nunca dizendo palavras ociosas; silêncio de fé: nunca ofendendo a Deus presente. Era assim o silêncio da alma gloriosa de Maria!
Eis por que todos os quadros marianos, de pintores célebres, nos mostram o rosto amavelmente sério de quem sabia medir suas palavras. Como são silenciosas, por exemplo, as Madonas de Rafael e de Murilo! Nem se pode imaginar de outro modo aquela que andava a escutar, continuamente, o Verbo Eterno Humanado. Se nós aprendêssemos o silêncio de Maria!
Silêncio que é amor, que é adoração! Se nós soubéssemos nos calar, como cresceriam depressa as nossas almas! Mas nós gostamos de muitas palavras, de muita dissipação. É conhecida e bem verdadeira a frase antiga: 'muitas vezes, me arrependi de ter falado, nunca de me ter calado'. E quando nos calamos exteriormente, quem sabe, quantos diálogos e discursos no nosso interior! Se queremos, pois, ter forças para a ação, forças para o amor e forças para o sacrifício, amemos o silêncio.
Ele é de tanta utilidade que todos os Fundadores de Ordens o puseram em suas regras e, quanto melhor observado ele é, mais florescem todas as virtudes. E o apóstolo São Tiago escreve que 'é varão perfeito somente aquele que pratica o silêncio' (1 Jb 3, 2). Virgem Prudentíssima, Vaso Insigne de Devoção, ó Maria, estabelecei-nos num grande silêncio exterior e interior, em espírito de fé, de adoração e de amor para com a Santíssima Trindade, 'na qual temos a vida, o movimento e o ser' (At 17, 28).
(Excertos da obra 'A Alma Gloriosa de Maria' de Frei Henrique G. Trindade, 1937)