sábado, 5 de abril de 2025

TESOURO DE EXEMPLOS II (04/06)

 

04. A MULHER MODERNA

Viviam aquelas pombas irrequietas e felizes na doce paz do seu pombal. Todas as manhãs voavam ao campo, com o pescoço irisado pelo sol e bicavam os grãos que haviam caído ao golpe da foice do ceifeiro. À noite, o pombal dava-lhes abrigo e calor e, ali no ninho escondido na parede, ouviam alegremente o piado dos seus filhotes. Nao careciam de nada; tinham tudo, viviam ditosas e morriam tranquilas. 

Mas, eis que um dia apareceu no pombal uma pomba revolucionária. Vinha de outras terras, onde as pombas sacrificavam a felicidade à liberdade, e falou-lhes desta maneira: 'Companheiras, viveis dois séculos atrasadas com respeito às pombas de outros países. Basta de clássicas submissões, de vida aborrecida e estéril. Por que havemos de ser inferiores às patas? Elas podem ir à esterqueira e nós temos medo de nos mancharmos; elas podem banhar-se até na água suja e nós nã temos coragem de meter-nos no rio. Para que defender tanto a nossa alvura, a nossa pureza? Isso sao preconceitos da Idade Média! Cada uma fala o que bem entender, pois para isso é dona de seu corpo e de sua vida. Chega! Vamos à esterqueira! Ao charco!' Todas as pombas incautas aplaudiram a estrangeira agitando as asas. Dirigidas pela revolucionária, voaram para um pântano infecto que se via à distância. Enlambuzaram-se, revolveram-se no lodo com grande algazarra e... não vos direi como saíram dali as pombas! 

Assim, caros leitores, viviam em nossa terra ditosas e tranquilas mulheres. No ninho do seu lar viviam em paz a vida do trabalho e do amor. Mas a civilização revolucionária começou a cantar o seu canto de sereia assim: 'Como! Ficareis toda a vida fechadas em casa? E escravas dos homens? Basta, basta já de submissões! Nao vedes como se chegou, em outros países, à emancipação da mulher? Abandonai os vossos preconceitos medievais! A mulher é dona do seu corpo e de sua vida. Por que sacrificar à alvura da pureza todas as alegrías do prazer? Ao charco! Ao pântano! E as mulheres modernas lançaram-se e revolveram-se no charco da vida... e não vos direi eu como saem dele as mulheres de hoje!

05. O REMORSO DE CONSCIÊNCIA

Em 1859, uma aldeia da Morávia, chamada Leibnitz, foi devastada por um pavoroso incêndio. A princípio, ninguém suspeitou que o fogo tivesse sido obra de urna terrível vinganga. O que chamou a atenção foi que, desde o dia do incêndio, um dos habitantes se afastava cautelosamente dos demais e passava seus dias em casa, sempre sozinho, com as portas cerradas. Era o incendiário que, depois do seu crime, via continuamente os espectros das vítimas que pereceram no fogo. 

Estas bailavam diante dos seus olhos e, apontando para uma árvore do quintal, pareciam dizer-lhe: 'Ali serás enforcado!' O infeliz então cortou a árvore. Em vão. Os moradores do povoado viam-no rezar todos os dias ajoelhado e erguendo as mãos aos céus. Nem assim teve sossego. Por fim, ele mesmo foi apresentar-se às autoridades, dizendo: 'Eu sou o culpado, eu sou o autor do incêndio!' 

Ah! É inútil. Pretendem alguns abafar a voz da consciência, entregando-se aos prazeres e folguedos; mas é inútil. Por algum tempo, talvez, a consciência ficará calada; mas chega um dia em que, dentro de nós, ela começa a gritar com a severidade de um juiz: 'Tu és o incendiário! Tu és o assassino! Tu és o pecador!' 

06. SE NÃO HOUVESSE INFERNO... 

Nos terríveis dias da Revolução Francesa, um pároco de Lyon foi barbaramente arrastado aos tribunais.
➖ Crês que há um inferno? - perguntou-lhe cinicamente um dos juízes revolucionários. 
➖ Claro que sim - respondeu o pároco; e se não cresse, vendo agora os vossos crimes, não teria dúvida em crer; porque, se de fato não existisse o inferno, seria mister inventá-lo para vos castigar!

(Excertos da obra 'Tesouro de Exemplos' - Volume II, do Pe. Francisco Alves, 1960; com adaptações)

sexta-feira, 4 de abril de 2025

POEMAS PARA REZAR (LX)

A FLOR DA PAIXÃO


A flor de maracujá, de cor púrpura, é associada comumente ao simbolismo da Paixão do Senhor, seja pela cor roxa característica do tempo quaresmal, seja pelo emaranhado característico das folhas, filamentos e pétalas que remetem aos pregos, chagas e espinhos que compõem o mistério do Calvário. A correlação é tão imediata que os primeiros missionários portugueses e espanhóis que chegaram às Américas no século XVI designaram a planta como Flos Passionis ou Flor da Paixão. Atualmente, acredita-se que existam mais de 500 espécies da flor da Paixão em todo o mundo, mas principalmente no Brasil. As características singulares da Flor da Paixão foram traduzidas por Catulo da Paixão Cearense (1863 - 1946), o chamado poeta do Sertão, no poema transcrito abaixo, elaborado em linguagem livre e regional, conectando ao mesmo tempo, de forma simples e bela, o folclore sertanejo e a religiosidade popular.

A FLOR DO MARACUJÁ 

(Catulo da Paixão Cearense)

Encontrando-me com um sertanejo,
Perto de um pé de maracujá,
Eu lhe perguntei: diga-me caro sertanejo,
Porque razão nasce roxa, a flor do maracujá?

Ah, pois então eu lhi conto,
A estória que ouvi contá,
A razão pro que nasci roxa,
A frô do maracujá.
Maracujá já foi branco,
Eu posso inté lhe ajurá,
Mais branco qui a caridadi,
Mais branco do que o luá.

Quando as frô brotava nele,
Lá pros cunfim do sertão,
Maracujá parecia,
Um ninho de argodão.
Mais um dia, há muito tempo,
Num meis que inté num mi alembro,
Si foi maio, si foi junho,
Si foi janeiro ou dezembro.

Nosso sinhô Jesus Cristo,
Foi condenado a morrê,
Numa cruis crucificado,
Longe daqui como o quê,
Pregaro Cristo a martelo,
E ao vê tamanha crueza,
A natureza inteirinha,
Pois-se a chorá di tristeza.

Chorava us campu,
As foia, as ribeira,
Sabiá tamém chorava,
Nos gaio da laranjera,
E havia junto da cruis,
Um pé de maracujá,
Carregadinho de frô,
Aos pé do nosso sinhô.

I o sangue de Jesus Cristo,
Sangui pisado de dô,
Nus pé di maracujá,
Tingia todas as frô,
Eis aqui seu moço,
A estória que eu vi contá,
A razão proque nasce roxa,
A frô do maracujá.

PRIMEIRA SEXTA-FEIRA DO MÊS

quinta-feira, 3 de abril de 2025

A INIQUIDADE DAS PALAVRAS MORTAS

O mal é uma aberração da graça divina, sua negação explícita, o aviltamento da verdade. É tão chulo e tão demoníaco, que quase nunca se expõe por inteiro ou toma a forma concreta da iniquidade. Tal medida seria um desastre e o inferno estaria quase vazio. Mas o inferno não está nem um pouco vazio. E isso se deve intrinsecamente não ao mal em si, mas à banalidade do mal.

A banalidade do mal é a iniquidade vestida de miragens, a fronte diabólica escondida atrás da máscara de algo bom. Se o fedor da carniça pudesse ser sentido ao primeiro encontro, não existiria o esgoto da miséria humana. Ninguém seria presa fácil da armadilha se pudesse reconhecer de pronto a cara, as trevas e o mal cheiro abjeto do mal reinante. Não é assim que funciona a maligna trama.

É preciso enganar o homem com um discurso tentador, com ações e palavras incertas e certeiras. A premissa fundamental é que 'nada é realmente como o que foi ensinado ou aprendido', as palavras têm sentidos e ressignificados, a tolerância sem limites é o limite maior de todas as virtudes, posições firmes e contundentes são refugos de uma mentalidade patriarcal, conservadora e deprimente. Aplique-se esses princípios, em todos os níveis e todo o tempo, em todos os elementos da norma moral, social e cultural de uma sociedade e ter-se-á uma contextualização real e concreta do que consiste o aniquilamento completo de uma civilização. 

Neste labirinto de estratagemas, ouro vira barro e lama reluz como ouro. As palavras têm substâncias diferentes e já não vale o sentido literal das mesmas. O que era pecado ou infâmia torna-se louvável e valioso. O bem é desconstruído em todos os seus alicerces e o mal aflora como novidade e inovação. O homem é mergulhado num redemoinho de tentações por todos os vícios, prazeres e direitos sem fim, que começam no próprio corpo e que terminam na insanidade dos sentidos. 

Nada é sim ou não, e tudo é possível. Pode ser na ideologia de gêneros, na questão do aborto, na relação entre a igreja e o estado, no clima da Terra, no livre pensamento, na arte e nos costumes, na sexualidade humana ou no direito dos animais. Essa metralhadora giratória não tem limites angulares, mas abarca tudo e a todos. Constrói falácias e as vendem como 'verdades científicas' e distorce dogmas e preceitos religiosos com um ecumenismo chulo e vadio. 

É uma guerra atroz e sem armas. Armas no sentido de armas. É uma guerra mortal em que se matam primeiro as palavras. Com palavras mortas, frases e discursos perdem o contexto e a força da linguagem. Palavras vazias não enchem corações e nem movem moinhos. Resultam apenas na efusão da barbárie e do caos generalizado: o bem e o mal ficam submersos nas mesmas águas poluídas. Não existe a verdade e, sim, meias-verdades; nem mocinhos e nem bandidos; apenas os que são os detentores das mais-verdades e os 'outros'. 

Talvez o inferno seja, no rigor das palavras eternas que não mudam, o destino final dos que quiseram matar a Deus matando as palavras dos homens ou comprando simplesmente o silêncio do bons, o que seria, a rigor, apenas uma segunda morte de palavras mortas.

quarta-feira, 2 de abril de 2025

FRASES DE SENDARIUM (XLIX)

 

'Senhor, dai-me tudo o que me une a Vós; afastai de mim tudo o que me separe de Vós' 

(São Nicolau de Flue)

Deus é o Infinito Amor e te escolheu entre os Filhos da Luz desde os tempos do Nada. Este Amor subsiste apenas pelo teu amor: as chamas do Amor Infinito que incendeiam tua alma se alimentam das fagulhas esmaecidas do teu limitado amor humano... 

02 DE ABRIL - SÃO FRANCISCO DE PAULA

 


O grande santo das curas prodigiosas, São Francisco de Paula nasceu na Calábria/Itália em 1416. Analfabeto, místico e profético, tornou-se o 'eremita da caridade' e fundou a Ordem dos Mínimos (formada por aqueles que deveriam ser os menores dos servos de Cristo). 

São Francisco de Paula tinha, entre as suas devoções particulares, o culto ao mistério da Santíssima Trindade, à Anunciação da Virgem e à Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo. Faleceu na Sexta-feira Santa do ano de 1507 (02/04/1507), aos 91 anos de idade. Foi canonizado pelo Papa Leão X em 1518. Em 1562, durante as Guerras de Religião na Europa, os protestantes calvinistas invadiram o convento de Plessis, na França e daí retiraram do sepulcro o corpo ainda incorrupto do santo e o queimaram em seguida; por esta razão, diz-se que São Francisco de Paula foi martirizado depois da morte.

Dotado de poderes sobrenaturais, curou muitas doenças e realizou milagres extraordinários. Além da levitação e da graça da maternidade que concedeu a muitas mulheres estéreis, promoveu a ressuscitação de várias pessoas: seu sobrinho Nicolas, um malfeitor que havia sido morto por enforcamento e, por duas vezes, de um homem chamado Tomás de Yvre, morto em acidentes distintos durante a construção de um convento da cidade de Paterne, na França.


ORAÇÃO A SÃO FRANCISCO DE PAULA

Ó glorioso São Francisco de Paula que tanto vos aprofundastes na humildade, único alicerce de todas as virtudes, alcançando através dela um grande prestígio junto de Deus, a tal ponto de jamais lhe terdes pedido graça alguma que prontamente não vos fosse concedida.

Aqui venho aos vossos pés para suplicar-vos. Extinga do meu coração todo afeto de soberba e vaidade e em seu lugar floresçam os preciosos frutos da humildade para que possa ser verdadeiro devoto e imitador vosso e merecer o grande patrocínio que, de vossa eficaz intercessão, espero e rogo me alcanceis de Deus a graça de que tanto necessito, não sendo contra a vontade do Altíssimo. Amém.

terça-feira, 1 de abril de 2025

OS GRANDES TESOUROS DA MÚSICA SACRA (III)

O moteto (termo derivação do termo francês mot = palavra) constitui um gênero musical polifônico literário (textos diferentes para cada voz) de origem medieval (século XIII), compreendendo textos distintos (sagrados ou profanos, inclusive em diferentes línguas) que são cantados simultaneamente, numa mistura integrada de estilos e palavras. 

Anton Bruckner (1824 - 1896), compositor e organista austríaco, era um homem muito religioso e compôs inúmeras obras sacras. Ele escreveu um Te Deum, cinco conjunto de salmos, uma cantata festiva, um Magnificat, pelos menos sete Missas e cerca de quarenta motetos durante a sua vida, desde uma composição de Pange Lingua por volta de  1835 até o hino Vexilla Regis em 1892 e, entre eles, oito conjuntos de Tantum Ergo e três composições para Christus Factus Est e Ave Maria. Como exemplo, tem-se aqui uma das suas composições para Christus Factus Est.


Christus factus est pro nobis obediens usque ad mortem, mortem autem crucis. Propter quod et Deus exaltavit illum et dedit illi nomen, quod est super omne nomen.

Cristo tornou-se obediente por nós até a morte e morte de cruz. Por isso Deus o exaltou e lhe deu um nome que está acima de todo nome.

segunda-feira, 31 de março de 2025

QUESTÕES SOBRE A DOUTRINA DA SALVAÇÃO (X)

P. 21 - Como se demonstra que se um homem resistir ou negligenciar as graças de Deus, elas lhe serão tiradas? E ainda: se ele se perder, que a culpa é sua?

Isto também é manifesto em toda a Escritura, mas para que este ponto possa ser completamente compreendido, devemos considerar as diferentes consequências fatais que fluem de um abuso obstinado destas graças.

(i) Estas graças são retiradas deles; não, de fato, de uma só vez, pois Deus, em sua infinita misericórdia, espera pacientemente pelos pecadores, e repete os seus esforços para sua conversão; mas se eles ainda resistem ou abusam de suas graças, estas são diminuídas e dadas mais raramente. Assim diz o nosso Salvador do servo inútil: 'Tirai-lhe a moeda... porque ao que não tem, até o que tem lhe será tirado' (Lc 19,24.26). Como assim? Se ele não tem, como é que alguma coisa lhe pode ser tirada? O sentido é: aquele que não melhorou o que tem, até o que tem lhe será tirado. O mesmo é repetido em várias outras ocasiões.

(ii) Quanto mais as graças de Deus são enfraquecidas ou retiradas dos pecadores por seu repetido abuso delas, mais suas paixões são fortalecidas em seus corações, adquirindo maior domínio sobre eles, até que finalmente se tornam seus miseráveis escravos; 'Meu povo não ouviu minha voz' - diz o Deus Todo-Poderoso - 'Israel não me ouviu: então eu os deixei ir de acordo com os desejos de seu coração; eles andarão em suas próprias invenções (Sl 80,12). E São Paulo assegura-nos que, embora os sábios entre as nações pagãs, pela luz da própria razão, chegaram a um claro conhecimento da existência de Deus e do seu poder e divindade, mas 'porque, conhecendo a Deus, não o glorificaram como Deus, nem lhe deram graças. Pelo contrário, extraviaram-se em seus vãos pensamentos, e se lhes obscureceu o coração insensato... Por isso, Deus os entregou aos desejos dos seus corações, à imun­dície' (Rm 1,21.24).

(iii) Se a obstinação deles ainda aumenta, e eles continuam a fechar os olhos para a luz da verdade que Deus lhes oferece, Ele então permite que eles sejam seduzidos pela falsidade, por 'dar ouvidos a espíritos de erro e doutrinas de demônios' (1Tm 4,1). Assim, 'Ele usará de todas as seduções do mal com aqueles que se perdem, por não terem cultivado o amor à verdade que os teria podido salvar. Por isso, Deus lhes enviará um poder que os enganará e os induzirá a acreditar no erro. Desse modo, serão julgados e condenados todos os que não deram crédito à verdade, mas consentiram no mal' (2T 2,10-12). 10. Este texto forte mostra claramente duas grandes verdades; primeiro, que Deus oferece a verdade a todos; e, segundo, que a fonte da condenação deles é inteiramente deles mesmos, ao se recusarem a recebê-la.

(iv) Se, portanto, eles ainda continuarem em sua perversidade, e morrerem em seus pecados, uma terrível condenação será sua porção para sempre; para eles 'Por isso, jurei na minha cólera: não hão de entrar no lugar do meu repouso (Sl 94,11). Sobre eles, Ele pronuncia aquela terrível sentença: 'Uma vez que recusastes o meu chamado e ninguém prestou atenção quando estendi a mão, uma vez que negligenciastes todos os meus conselhos e não destes ouvidos às minhas admoestações, também eu rirei do vosso infortúnio e zombarei, quando vos sobrevier um terror, quando vier sobre vós um pânico, como furacão; quando se abater sobre vós a calamidade, como a tempestade; e quando caírem sobre vós tribulação e angústia. Então me chamarão, mas não responderei; eles me procurarão, mas não atenderei. Porque detestam a ciência sem lhe antepor o temor do Senhor, porque repelem meus conselhos com desprezo às minhas exortações; comerão do fruto dos seus erros e se saciarão com seus planos, porque a apostasia dos tolos os mata e o desleixo dos insensatos os perde' (Pv 1, 24-32). 

A condenação deles é prefigurada na de Jerusalém, que havia sido rebelde a todos os apelos de Deus, e sobre cujo destino nosso Salvador lamenta com estas palavras tocantes: 'Jerusalém, Jerusalém! Que matas os profetas e apedrejas os que te são enviados; quantas vezes quis eu ajuntar os teus filhos, como a galinha ajunta os seus pintos debaixo das asas, e tu não quiseste! Eis que a tua casa te será deixada deserta' (Mt 23,37-38). 'Eu quis, e tu não quiseste!' Este é o grande crime cometido por eles. 'Enviei-vos os meus profetas e servos, as minhas graças, luzes e intenções sagradas, mas vós os matastes e destruístes, e não lhes destes ouvidos!' O destino miserável de todos esses infelizes pecadores, prefigurado em Jerusalém, arrancou lágrimas dos olhos de Jesus, quando Ele chorou sobre aquela cidade e disse: 'Se também tu, ao menos neste dia que te é dado, conhecesses o que te pode trazer a paz! Mas não, isso está oculto aos teus olhos. Virão sobre ti dias em que os teus inimigos te cercarão de trincheiras, te sitiarão e te apertarão de todos os lados; eles destruirão a ti e a teus filhos que estiverem dentro de ti, e não deixarão em ti pedra sobre pedra, porque não conheceste o tempo em que foste visitada' (Lc 19,42-44). São aqueles que, tendo sido convidados para a ceia nupcial do grande Rei, rejeitaram o seu convite e mataram os seus servos; por isso 'Ele enviou os seus exércitos e destruiu aqueles assassinos, e queimou a sua cidade' (Mt 22,7), declarando depois que 'o banquete está pronto, mas os convidados não foram dignos' (Mt 22,8).

P. 22 - Qual é a consequência de todas essas verdades?

A consequência é muito clara, a saber: embora Deus Todo-Poderoso tenha se agradado em ordenar que ninguém será salvo uma vez que não tenha a verdadeira fé em Jesus Cristo, e não esteja em comunhão com a sua santa Igreja, ainda assim isso não é de forma alguma inconsistente com a infinita bondade de Deus, porque Ele dá a todos as graças suficientes, pelas quais eles podem, se corresponderem a elas, ser trazidos para a verdadeira fé e Igreja de Cristo; e que, se alguém se perde, não é devido a qualquer falta de bondade em Deus, mas ao seu próprio abuso das graças que lhes foram concedidas. A alguns, na verdade, Ele concede essas graças mais abundantemente, dando-lhes cinco talentos; a outros, Ele dá mais parcimoniosamente, dois talentos e a outros apenas um; mas Ele dá a todos o suficiente para suas necessidades atuais, e dará mais se estas forem melhoradas, até que finalmente Ele os leve ao conhecimento da verdade e à salvação.

(Excertos da obra 'The Sincere Christian', V.2, do bispo escocês George Hay, 1871, tradução do autor do blog)