terça-feira, 1 de outubro de 2024

O ROSÁRIO NOSSO DE CADA DIA (I)


PRIMEIRO MISTÉRIO GOZOSO: A ANUNCIAÇÃO

Entrando, o anjo disse-lhe: 'Ave, cheia de graça, o Senhor é contigo'... O anjo disse-lhe: 'Não temas, Maria, pois encontraste graça diante de Deus. Eis que conceberás e darás à luz um filho, e lhe porás o nome de Jesus. Ele será grande e será chamado Filho do Altíssimo, e o Senhor Deus lhe dará o trono de seu pai Davi; e reinará eternamente na casa de Jacó, e o seu reino não terá fim' (Lc 1, 28.30-33).

Nós vos ofererecemos, Senhor Jesus, este mistério em honra da vossa Encarnação e vos pedimos, pela intercessão da vossa Mãe Santíssima, a graça de uma profunda humildade.

Pai Nosso, 10 Ave Marias, Glória ao Pai, Ó meu Jesus...

01 DE OUTUBRO - SANTA TERESA DE LISIEUX

  


Chamada de ‘maior santa dos tempos modernos’ e recentemente elevada à glória de doutora da Igreja Católica, Teresa de Lisieux transformou-se num dos personagens mais venerados no mundo católico como ‘Santa Teresinha do Menino Jesus’. Feitos extraordinários para uma simples carmelita, que viveu no mais absoluto ostracismo e morreu com apenas 24 anos de idade. Marie Françoise Thérèse Martin nasceu em Alençon, em 02/01/1873, e faleceu em Lisieux, em 30/09/1897. Foi canonizada em 17 de maio de 1925 pelo Papa Pio XI, que posteriormente a declarou ‘Patrona Universal das Missões Católicas’ em 1927. O Papa João Paulo II tornou-a Doutora da Igreja no dia 19 de outubro de 1997. 

Por desígnios divinos, Santa Teresinha foi a preceptora de um particular caminho de santificação: a chamada ‘pequena via’, a via de confiança absoluta à vontade de Deus. Na plena aceitação dos desígnios divinos sobre as almas de cada um de nós, no abandono de nossas vidas nos braços de Jesus Cristo, na entrega total de nossas ações e pensamentos à proteção da Santíssima Virgem: eis aí a pequena via, o caminho da infância espiritual, a gloriosa trilha de santificação para os homens comuns, o espantoso atalho ao Céu, proposto e vivido intensamente pela santa carmelita. Eis a sua pequena via maravilhosa de santificação: basta aceitar a nossa própria pequenez, a imensa fragilidade humana que nos domina, as enormes limitações de viver em plenitude os desígnios de Deus sobre as nossas almas; fazer de tantas imperfeições e fragilidades, não meros obstáculos, mas as próprias pedras do caminho, rejuntadas e consolidadas firmemente num imenso amor e numa confiança sem limites na bondade e misericórdia de Deus. 

Além de cartas e poesias (e outros documentos registrados por suas irmãs do Carmelo), o legado de Santa Teresinha está por inteiro em sua famosa obra ‘História de uma alma’ (publicado originalmente em 1898), que registra, além de seus manuscritos autobiográficos e de suas proposições espirituais, as premissas e os fundamentos do seu caminho da infância espiritual. 

Nesta pequena via, a santificação começa e termina pelo propósito de fazer, de cada dia, mais um passo na peregrinação ao Céu, transformando cada ação diária, cada ato da nossa vida mundana, por mais simples e despojado que seja, em obra de perfeição cristã, compartilhado e vivido para a plena glória do Pai (‘sede perfeitos como vosso Pai do Céu é perfeito’). Nesta pequena via, a santificação é caminho simples e fácil para todos os homens e mulheres dos nossos tempos, e precisa apenas da resolução tão claramente expressa na curta vida da carmelita de Lisieux: ‘nunca distanciar a minha alma do olhar de Jesus’.

segunda-feira, 30 de setembro de 2024

TRATADO SOBRE A HUMILDADE (XI)

 

56. Há um tipo de orgulho que é ainda mais abominável aos olhos de Deus do que qualquer outro, e é aquele - como diz a Sagrada Escritura - que pertence mais especialmente aos pobres. 'O pobre que se ensoberbece, minha alma odeia' [Eclo 25,4]. Se o orgulho de quem é rico em méritos, talentos e virtudes - tesouros mais preciosos para a alma - é desagradável a Deus, mais desagradável ainda será para Ele em quem não tem esses mesmos motivos de orgulho, mas que, pelo contrário, teria todas as razões para ser humilde. E este, receio, é o orgulho de que sou culpado.

Sou pobre de alma, sem virtude nem mérito, cheio de iniquidade e malícia, e, no entanto, me estimo e amo tanto a minha própria estima que fico perturbado se os outros não me estimam também. Sou verdadeiramente uma criatura pobre, orgulhosa e miserável; e quanto maior é a minha pobreza, mais o meu orgulho é detestável aos olhos de Deus. Tudo isto resulta de não conhecer a mim próprio. Concedei, ó meu Deus, que eu possa dizer como o profeta: 'Eu sou o homem que vê a minha pobreza' [Lm 3,1]. Fazei-me conhecer, Senhor, a minha própria miséria, que de mim mesmo nada sou, nada sei, nada possuo senão os meus pecados, e nada mereço senão o inferno. Recebi de Vós muitas graças, luzes e inspirações, e muita ajuda, e no entanto com que ingratidão respondi à vossa infinita bondade! Quem mais pecador, quem mais ingrato e quem mais perverso do que eu? Quanto mais fizestes por mim, tanto mais humilde devo ser, pois terei de te prestar contas rigorosas de todos os vossos benefícios: 'E a quem muito for dado, muito será pedido' [Lc 12,48]. E, no entanto, quanto maior é a vossa bondade, maior tem sido o meu orgulho. Coro de vergonha, e é o conhecimento do meu orgulho que me obriga agora a ser humilde.

57. É mais fácil ser humilde na adversidade do que na prosperidade, e é impossível dizer o quanto a felicidade temporal influencia o homem a ser orgulhoso. 'Dos sofrimentos dos mortais não participam' [Sl 72,5], assim o Profeta-Rei fala dos pecadores, e acrescenta: 'Por isso a soberba os prendeu' [Sl 72,6]. A adversidade contrabalança o nosso amor-próprio e impede o seu crescimento, pois, por um lado, dá-nos a conhecer as nossas fragilidades, tanto mais quando é inesperada e dolorosa, e, por outro lado, obriga-nos a voltar os nossos pensamentos para Deus, a implorar a sua misericórdia e a humilharmo-nos sob a sua mão, como fez o profeta: 'Na minha aflição invoquei o Senhor' [Sl 17,7] e 'E como um triste, assim me humilhei' [cf Sl 34, 13-14]. Portanto, se não soubermos suportar as tribulações com alegria, pelo menos suportemo-las com paciência e humildade.

Ó como são preciosas essas humilhações pelas quais adquirimos e aprendemos a exercitar a humildade! É então que devemos exclamar com o salmista: 'na sepultura, acaso há de se falar no seu amor? [Sl 88,11] ou então, como o rei Nabucodonosor quando, caindo em si, humildemente exclamou: 'Por isso, agora louvo, engrandeço e glorifico o Rei dos Céus, porque Ele é capaz de humilhar os que andam na soberba' [Dn 4,34]. As aflições não faltam neste vale de lágrimas, mas são poucos os que sabem usá-las como meio de se tornarem humildes. Concedei, ó meu Deus, a vossa misericórdia, para que eu possa estar entre esses poucos!

('A Humildade de Coração', de Fr. Cajetan (Gaetano) Maria de Bergamo, 1791, tradução do autor do blog)

domingo, 29 de setembro de 2024

EVANGELHO DO DOMINGO

    

'A lei do Senhor Deus é perfeita, alegria ao coração' (Sl 18)

Primeira Leitura (Nm 11,25-29) - Segunda Leitura (Tg 5,1-6) -  Evangelho (Mc 9,38-43.45.47-48)

  29/09/2024 - VIGÉSIMO SEXTO DOMINGO DO TEMPO COMUM

44. A SANTIFICAÇÃO EXIGE O ÓDIO AO PECADO

Naqueles dias, nos caminhos da Galileia, os discípulos de Jesus ainda se tomavam como os únicos arautos da Verdade e discutiam à qual deles esta primazia haveria de se elevar mais alto, pois viviam ainda reféns de uma perspectiva puramente humana do reino prometido por Jesus. Atento às murmurações deles, o Senhor vai condenar o pecado do orgulho ao lhes assegurar que o maior de todos é o que serve a todos (Mc 9, 35) para, em seguida, os exortar que, no caminho da santificação, o amor a Deus implica um ódio extremado ao pecado, a todo tipo de pecado.

Esta firme exortação tem origem na pergunta de João: 'Mestre, vimos um homem expulsar demônios em teu nome. Mas nós o proibimos, porque ele não nos segue' (Mc 9, 38), cuja ação é imediatamente contestada por Jesus, pois não havia sido movida pela caridade, mas por meros ciúmes da concessão de dons sobrenaturais a quem não era do restrito círculo fechado dos discípulos do Senhor: 'Quem não é contra nós é a nosso favor' (Mc 9, 40). Não deve haver limites ou impedimentos para os mistérios da Graça, quando o bem é feito compartilhado com o autor da Vida: 'quem vos der a beber um copo de água, porque sois de Cristo, não ficará sem receber a sua recompensa' (Mc 9, 41).

E, de forma oposta, Jesus condena aquele que, por malícia, se conspurca na obstinação do pecado, consumindo a graça na lama do escândalo, expondo-se e expondo a muitos no caminho da ruína espiritual de suas almas, no caminho do inferno. Quanto a este, a admoestação de Jesus é severa: 'melhor seria que fosse jogado no mar com uma pedra de moinho amarrada ao pescoço' (Mc 9, 42). A gravidade do pecado do escândalo - por ações, por exemplos, por palavras - está em que, muito além de provocar a perda da inocência alheia ou propagar blasfêmias, é que, ao conduzir à perda das almas, é um pecado que simula, em sua essência, a ação do próprio demônio.

Jesus exorta, então, se cumprir, em tudo e para todos, a santificação em plenitude, traduzida na observância radical aos seus Mandamentos. Isso implica não ceder ao pecado sob concessão alguma e não afrontar a graça divina por nenhum propósito humano. A verdadeira santificação exige, portanto, vigilância extrema, oração constante e fuga da ocasião de pecado por todos os meios disponíveis, pelos mais extremos possíveis: 'Se tua mão te leva a pecar, corta-a! É melhor entrar na Vida sem uma das mãos, do que, tendo as duas, ir para o inferno, para o fogo que nunca se apaga. Se teu pé te leva a pecar, corta-o! É melhor entrar na Vida sem um dos pés, do que, tendo os dois, ser jogado no inferno. Se teu olho te leva a pecar, arranca-o! É melhor entrar no Reino de Deus com um olho só, do que, tendo os dois, ser jogado no inferno, onde o verme deles não morre, e o fogo não se apaga' (Mc 9, 43.45.47-48).

29 DE SETEMBRO - SÃO MIGUEL ARCANJO

    

(São Miguel com elmo e armadura medieval - Catedral de Bruxelas)

'Houve uma batalha no Céu: Miguel e os seus Anjos guerrearam contra o Dragão. O Dragão batalhou, juntamente com os seus Anjos, mas foi derrotado e não se encontrou mais um lugar para eles no Céu' (Ap 12, 7-8).

'Naquele tempo, surgirá Miguel, o grande Príncipe, constituído defensor dos filhos do seu povo e será tempo de angústia como jamais houve' (Dn 12, 1).

Assim como Lúcifer é o chefe dos demônios, Miguel é o maior dentre os anjos, Príncipe das milícias celestes, protetor da Santa Igreja e da humanidade contra as forças do inferno. Assim, a designação de arcanjo (oitavo coro dos anjos) tem sentido genérico e nominativo, pois certamente São Miguel, sendo o primeiro dentre os Anjos, é o maior dos serafins. Dentre os vários santuários destinados à devoção ao Arcanjo São Miguel, Príncipe das milícias celestes, destaca-se aquele localizado no Monte Saint Michel na França, cuja foto constitui a abertura e o símbolo deste blog.

(Santuário de São Miguel - Monte Saint Michel/França)

São Miguel, rogai por nós!
Intercedei a Deus por nós!

sábado, 28 de setembro de 2024

AS CINCO IDOLATRIAS MODERNAS


Foi então que soou no céu a trombeta da cólera divina, que ninguém deixou de ouvir; e o Homem Moderno, que havia caído em cinco idolatrias e cinco desobediências, está agora condenado a ser provado e purificado por cinco castigos e cinco penitências:

Idolatria da Ciência, com a qual quis fazer outra Torre de Babel que chegasse até ao céu; e a ciência está neste momento ocupada em construir aviões, bombas e armas de longo alcance para destruir casas, cidades e fábricas.

Idolatria da Liberdade, com a qual quis fazer de cada homem um pequeno e caprichoso tiranete; e eis o momento em que o mundo está cheio de despotismo, e os próprios povos pedem mãos de ferro para sair da confusão que criou esta liberdade insana.

Idolatria do Progresso, com a qual acreditaram que, em pouco tempo, ter-se-iaum Paraíso Terrestre; e eis que o Progresso é o Bezerro de Ouro que mergulha os homens na miséria, na escravidão, no ódio, na mentira e na morte.

Idolatria da Carne, à qual se pediu o céu e as delícias do Éden; e a carne do homem despida, exibida, mimada e adorada, está a ser destroçada, dilacerada e amontoada como esterco nos campos de batalha.

Idolatria do Prazer, com a qual se quer fazer do mundo um carnaval perpétuo e converter os homens em crianças agitadas e irresponsáveis; e o prazer criou um mundo de enfermidades, dolências e torturas, que fazem desesperar todas as faculdades de medicina.

(Excertos da obra 'Cristo vuelve o no vuelve?', do Pe. Leonardo Castellani)

sexta-feira, 27 de setembro de 2024

GALERIA DE ARTE SACRA (XXXIX)

'O Retorno do Calvário' é uma obra do pintor inglês Herbert Gustave Schmalz (1856 - 1935). A pintura retrata um crepúsculo já dominado pelas sombras da noite. Eis o tempo dos homens: a Paixão de Cristo está consumada e seu corpo está confinado por uma pedra no sepulcro novo. Três cruzes solitárias (no alto à direita da pintura) modelam agora o cenário do Calvário. A 'volta para casa' ainda é parte integrante da Paixão, porque o triunfo da ressurreição é ainda uma perspectiva.

Todo o cenário contribui para um jogo contínuo de confrontos: luzes e sombras, a escadaria e a parte baixa da cidade, o distanciamento do Calvário diante a perspectiva ainda indefinida do triunfo da ressurreição. Cinco personagens - 1 homem e 4 mulheres - vivenciando uma elevação de graças e dores muito acima das mazelas do mundo lá embaixo, percorrem lentamente os degraus de uma escadaria.

Eis o homem: João, o discípulo amado que ampara e sustenta a Maria, Mãe do Crucificado. O seu olhar está fixado na visão do Calvário e é quase possível transcrever seu pensamento de agora, demarcado a ferro e a fogo pelas palavras finais de Jesus: 'Eis aí tua mãe'. Maria avança em desolação completa, cada passo agora é abandono e resignação completa: 'Vós todos que passais pelo caminho, olhai e vede: há dor como a minha dor? (Lm 1,12).

Há outras Marias neste grupo que amparam e acompanham a Virgem Maria. A mulher ruiva que a consola diretamente com João é Maria Madalena ou Maria de Magdala, que vai se tornar a primeira testemunha da ressurreição. Maria, mulher de Cleófas ou mãe de Tiago (Menor) é provavelmente a mulher que, mais atrás, tem o olhar dirigido às solitárias cruzes que encimam o Calvário. E a mulher atrás dela, com o rosto envolto pelas mãos, é provavelmente Salomé, 'a mãe de Tiago e João, filhos de Zebedeu'. As duas mulheres que, mais tarde, iriam juntas para comprar aromas para ungir o Corpo de Jesus. Ou, sob outro ponto de vista, podemos inverter a identificação de ambas na pintura.

Mas alguém vislumbrou uma outra interpretação criativa para esta pintura que me agrada muitíssimo mais. Aquelas duas figuras mais atrás - uma que obscurece a própria visão e outra que volve seu olhar ao drama da Paixão, ambas aturdidas, ambas profundamente abaladas - somos nós, eu e você, quaisquer um de nós. Reflexos de nós mesmos, personagens reais ou projetados de quem, no tempo dos homens e na eternidade de Deus, seremos igualmente um dia - todos - testemunhas da Paixão.