sábado, 11 de novembro de 2023

SERMÕES DO CURA D'ARS (XIV)

 SOBRE OS MANDAMENTOS DE DEUS

'Amarás o Senhor, teu Deus, com todo o teu coração, com toda a tua alma e com todas as tuas forças' (Dt 6,5)

O Senhor nos deu o mandamento de o amarmos como Ele nos ama, com todo o nosso coração, com toda a nossa alma e com todas as nossas forças; e, assim, nos promete a recompensa eterna se cumprirmos fielmente o mandamento e nos ameaça com o castigo eterno se não o cumprirmos. Se somos assolados por tantos problemas neste mundo, é porque negligenciamos os mandamentos de Deus; pois Ele mesmo disse: 'Se guardardes fielmente os meus mandamentos, abençoar-vos-ei de muitas maneiras; se, porém, os transgredirdes, sereis amaldiçoados em tudo o que fizerdes'. Se, pois, meus caros irmãos, quisermos ser felizes neste mundo, na medida do possível, não temos outro meio para isso senão guardar fielmente os mandamentos de Deus; veremos que, se nos desviarmos do caminho que nos é indicado pelos mandamentos de Deus, a alma e o corpo serão infelizes, tanto neste como no outro mundo. A nossa bem aventurança eterna depende da nossa fiel observância aos mandamentos que o bom Deus nos deu, mas Deus recompensa já nesta vida aqueles que lhe são fiéis e eu vou mostrardes isso hoje.

A felicidade dos que obedecem aos mandamentos de Deus e a infelicidade dos que não os cumprem

Se, meus caros irmãos, abrirmos as Escrituras, encontraremos que todos aqueles que se empenharam em observar corretamente os mandamentos de Deus foram sempre felizes, porque Deus nunca abandona aqueles que se empenham em fazer aquilo que lhes ordena. Adão é um bom exemplo disso. Enquanto observou fielmente os mandamentos do Senhor, encontrava-se num estado de felicidade em todos os aspectos; seu corpo, sua alma, sua mente e todos os seus sentidos estavam voltados somente para Deus e até os anjos desceram do céu para lhe fazer companhia. A felicidade dos nossos primeiros pais teria permanecido a mesma para sempre, se tivessem continuado fiéis aos seus deveres; mas esse estado feliz não durou muito. O espírito maligno, invejoso de tal felicidade, mergulhou-os na ruína e roubou-lhes todos os seus bens, dos quais deveriam ter desfrutado por toda a eternidade. Assim que tiveram a infelicidade de transgredir os mandamentos do Senhor, tudo deu errado para com eles; problemas e preocupações, doenças, medo da morte, do julgamento e da punição na outra vida tomaram o lugar de sua felicidade anterior; sua vida agora não era nada além de um estado permanente de lágrimas e sofrimentos.

O Senhor disse a Moisés: 'Diz ao meu povo que, se observarem fielmente os meus mandamentos, enchê-los-ei de toda a espécie de bênçãos; mas se ousarem transgredi-los, castigá-los-ei com toda a espécie de sofrimentos'. Deus disse a Abraão: 'Porque guardaste fielmente os meus mandamentos, abençoar-te-ei em tudo. Abençoarei todos os que te abençoarem, amaldiçoarei todos os que te amaldiçoarem; da tua raça nascerá o Redentor do mundo'. Ele deu a conhecer ao povo de Abraão, quando chegou o momento de entrarem na terra prometida: 'Os povos que habitavam nesta terra cometeram grandes pecados; por isso, eu os expulsarei e colocar-vos-ei no seu lugar. Mas não transgridais os meus mandamentos. Se os guardares fielmente, eu abençoar-te-ei em tudo e sobre tudo. Quando estiverdes nos campos ou nas vossas casas, abençoarei os vossos filhos, que vos amarão, respeitarão e obedecerão, e vos darão toda a espécie de consolação. Ordenarei aos céus que vos deem chuva no momento oportuno, tanto quanto for necessário para regar os vossos campos e os vossos prados; tudo prosperará convosco'. Em outro lugar das Escrituras, Deus diz: 'Se guardardes fielmente os meus mandamentos, velarei incessantemente pela vossa conservação; podereis estar sem medo nas vossas casas; impedirei que as feras vos façam mal; podereis dormir em paz; nada vos perturbará. Estarei sempre convosco. Caminharei convosco. Eu sou o vosso Deus, e vós sereis o meu povo'. E ainda falou a Moisés: 'Dizei ao meu povo que, se guardarem os meus mandamentos, livrá-los-ei de todos os males que os oprimem'. E o Espírito Santo diz que 'aquele que guarda os mandamentos do Senhor é mais feliz do que se possuísse toda a riqueza da Terra'.

Ora, já pensastes que Deus dá tanta importância à observância dos seus mandamentos e que promete tão grandes benefícios em troca da sua fiel observância? Concordareis então comigo que toda a nossa felicidade consiste em guardar fielmente os mandamentos. Para vos provar, caros irmãos que, desde que transgridamos os mandamentos, só podemos ser infelizes, deixemos que Davi nos sirva de exemplo. Enquanto trilhou o caminho que os mandamentos lhe prescreveram, tudo lhe correu bem: era amado, estimado e obedecido pelos seus vizinhos. Mas, no exato momento em que deixou de observar os mandamentos, a sua felicidade terminou e toda a espécie de problemas o assaltou. A ansiedade e o remorso de consciência tomaram o lugar da paz e do contentamento que até então desfrutara. Lágrimas e sofrimentos eram o seu pão de cada dia. Um dia, enquanto lamentava os seus pecados, foi informado de que o seu filho Amon tinha sido trespassado com uma espada pelo seu irmão Absalão, num acesso de embriaguez. Absalão tentou destituir o pai, intentando até a sua morte, para poder reinar em seu lugar; Davi foi obrigado a esconder-se em um bosque para escapar à morte. Além disso, a peste matou um grande número de súditos de Davi.

Salomão nos dá outro exemplo. Enquanto guardou fielmente os mandamentos, teve a admiração do mundo; a sua fama chegou até aos confins da terra; a rainha de Sabá chegou mesmo a vir de longe para testemunhar as maravilhas que o Senhor tinha operado nele; mas, assim que teve a infelicidade de deixar de observar os mandamentos, tudo lhe correu mal. Ao ouvir esses exemplos, mesmo que sejam tirados do Antigo Testamento, concordareis comigo, queridos irmãos, que todos os nossos problemas decorrem do fato de não observarmos fielmente os mandamentos de Deus, e que, se esperamos felicidade e paz, tanto quanto podemos esperar possuir neste mundo, neste vale de sofrimento e tristeza, então, eu digo, o único meio de garantir esses benefícios é fazer tudo o que estiver ao nosso alcance para agradar a Deus - tudo, portanto, que Ele nos pede para seguir os seus mandamentos.

Mas, se passarmos ao Novo Testamento, descobrimos que Cristo Nosso Senhor nos exorta constantemente a observar os mandamentos e nos promete uma grande recompensa. Jesus Cristo nos promete o céu, porque nada nesta terra é capaz de satisfazer o coração do homem, que foi criado unicamente para Deus, e que o homem não pode encontrar a felicidade senão em Deus. Jesus Cristo exorta-nos urgentemente a preocuparmo-nos pouco com as coisas deste mundo e a procurarmos as bênçãos do Céu, que nunca terão fim. Lemos no Evangelho que Jesus Cristo, estando certa vez entre certas pessoas que pareciam pensar apenas nas suas necessidades corporais, disse-lhes: 'Não vos preocupeis tanto com o que haveis de comer, nem com o que haveis de vestir'. E, querendo fazer-lhes compreender que tudo o que diz respeito ao corpo é de pouca importância, disse-lhes: 'Considerai os lírios do campo, que não trabalham nem fiam, e eis que vosso Pai celeste os veste; pois eu vos digo que nem mesmo Salomão, em toda a sua glória, se vestiu como um deles. Observai as aves do céu: elas não semeiam nem ceifam, nem ajuntam em celeiros, mas vede como o vosso Pai celestial cuida delas. Ó vós, de pouca fé, não sois mais importantes do que elas? Buscai primeiro o Reino dos Céus, isto é, guardai fielmente os meus mandamentos, e todas as outras coisas vos serão acrescentadas, para além delas'. O que é que devemos deduzir destas palavras, caros irmãos? Apenas isto, que um cristão que procura, em primeiro lugar, agradar a Deus e salvar a sua alma, nunca passará falta em suas necessidades corporais.

Mas, dirás, talvez, se não tivermos nada, ninguém nos dará nada! Responder-vos-ei que tudo o que temos vem da beneficência de Deus e não de nós próprios. Se quereis, meus caros irmãos, experimentar a grandeza da bondade de Deus, fazei o dever de observar exatamente o que os mandamentos vos ordenam, e vereis com espanto como Deus cuida daqueles que se esforçam por agradá-lo. Se quiserdes ver uma prova disso, voltai-vos para as páginas da Sagrada Escritura, e lá encontrareis plena confirmação disso. Lemos, por exemplo, na Sagrada Escritura que o profeta Elias se escondeu num bosque para escapar às perseguições da rainha Jezabel. Ali, privado de todo auxílio humano, pensais que o Senhor o deixou morrer de fome? Não, caros amigos, certamente que não. O Senhor não perdeu de vista o seu servo fiel. Enviou imediatamente um anjo do céu para o consolar e lhe trazer tudo o que era necessário para a sua subsistência. Vede também como o Senhor se preocupou com a viúva de Sarepta. Ele disse aos seus profetas: 'Procurai esta boa viúva, que tão fielmente me serve e guarda os meus mandamentos; aumentai-lhe a provisão de alimentos, para que não tenha fome'. Outro exemplo é a sua ordem a um dos profetas, Habacuc, para levar comida a Daniel na cova dos leões em Babilônia. 

Todos esses exemplos são tirados do Antigo Testamento mas, no Novo Testamento, os milagres que Deus opera em favor daqueles que observam seus mandamentos não são menos grandiosos ou numerosos. Vede como Deus, com cinco pequenos pães e dois peixes, alimentou milhares de pessoas que, seguindo Jesus Cristo, procuravam o reino dos Céus e a santificação das suas almas. Vede como, durante quarenta anos, Ele proveu o sustento do santo eremita Paulo por meio de um corvo; prova inequívoca de que Deus nunca perde de vista aqueles que o amam, e que lhes fornece tudo o que é necessário. Ó meu Deus, como é grande o vosso amor por aqueles que vos amam! Que cuidado tendes para que não lhes falte nada! Dizei-me, caríssimos irmãos, quem deixou que as provisões de cada dia fossem levadas por um cão a São Roque no deserto? Não foi Deus, meus caros irmãos? E por que é que Deus cuidou tanto do sustento de todos os santos, se não foi senão porque eles observaram fielmente os mandamentos que Ele nos deu?

Sim, queridos irmãos, podemos dizer com segurança que os santos encontravam toda a sua felicidade em guardar os mandamentos e que preferiam sofrer o martírio a transgredi-los; e os mártires não sofreram torturas e morte apenas porque não ousaram transgredir os mandamentos de Deus? Que vergonha para nós, queridos irmãos, quando, no dia do juízo, nos defrontarmos com esses mártires; nós que tantas vezes somos levados a agir pelo simples pensamento 'daquilo que nos pode dizer o mundo' ?Sim, queridos irmãos, se quisermos alcançar a verdadeira felicidade, as próprias palavras de Deus e a história, tanto da antiga como da nova lei, ensinam que é necessária a exata observância dos mandamentos. E uma vez que Deus, em sua misericórdia, nos ajuda com a sua graça a observá-los, por que deveríamos recuar e ser tão temerosos?

Que a nossa firme resolução desta manhã seja obedecer fielmente os mandamentos de Deus e não deixar que qualquer consideração de ganho ou perda terrena, de medo ou favor, nos induza a transgredi-los, para que no fim dos nossos dias possamos ter a grande sorte de olhar para trás e ver uma vida temente a Deus e fiel, que nos abrirá as portas de uma recompensa eterna, o que desejo a todos vós. Amém.

sexta-feira, 10 de novembro de 2023

DA MEDITAÇÃO SOBRE A MORTE

1. Muito depressa chegará teu fim neste mundo; vê, pois, como te preparas: hoje está vivo o homem, e amanhã já não existe. Entretanto, logo que se perdeu de vista, também se perderá da memória. Ó cegueira e dureza do coração humano, que só cuida do presente, sem olhar para o futuro! De tal modo te deves haver em todas as tuas obras e pensamentos, como se fosse já a hora da morte. Se tivesses boa consciência não temerias muito a morte. Melhor fora evitar o pecado que fugir da morte. Se não estás preparado hoje, como o estarás amanhã? O dia de amanhã é incerto, e quem sabe se te será concedido?

2. Que nos aproveita vivermos muito tempo, quando tão pouco nos emendamos? Oh! nem sempre traz emenda a longa vida, senão que aumenta, muitas vezes, a culpa. Oxalá tivéssemos, um dia sequer, vivido bem neste mundo! Muitos contam os anos decorridos desde a sua conversão; frequentemente, porém, é pouco o fruto da emenda. Se for tanto para temer o morrer, talvez seja ainda mais perigoso o viver muito. Bem aventurado aquele que medita sempre sobre a hora da morte, e para ela se dispõe cada dia. Se já viste alguém morrer, reflete que também tu passarás pelo mesmo caminho.

3. Pela manhã, pensa que não chegarás à noite, e à noite não te prometas o dia seguinte. Por isso anda sempre preparado e vive de tal modo que te não encontre a morte desprevenido. Muitos morrem repentina e inesperadamente; pois na hora em que menos se pensa, virá o Filho do Homem (Mt 24,44). Quando vier àquela hora derradeira, começarás a julgar muito diferentemente toda a tua vida passada, e doer-te-á muito teres sido tão negligente e remisso.

4. Quão feliz e prudente é aquele que procura ser em vida como deseja que o ache a morte. Pois o que dará grande confiança de morte abençoada é o perfeito desprezo do mundo, o desejo ardente do progresso na virtude, o amor à disciplina, o rigor na penitência, a prontidão na obediência, a renúncia de si mesmo e a paciência em sofrer, por amor de Cristo, qualquer adversidade. Muito fácil é praticar o bem enquanto estás são; mas, quando enfermo, não sei o que poderás. Poucos melhoram com a enfermidade; raro também se santificam os que andam em muitas peregrinações.

5. Não confies em parentes e amigos, nem proteles para mais tarde o negócio de tua salvação, porque mais depressa do que pensas te esquecerão os homens. Melhor é providenciar agora e fazer algo de bem, do que esperar pelo socorro dos outros. Se não cuidas de ti no presente, quem cuidará de ti no futuro? Muito precioso é o tempo presente: agora são os dias de salvação, agora é o tempo favorável. Mas, ai! Que melhor não aproveitas o meio pelo qual podes merecer viver eternamente! Tempo virá de desejares, um dia, uma hora sequer, para a tua emenda, e não sei se a alcançarás.

6. Olha, meu caro irmão, de quantos perigos te poderias livrar e de quantos terrores fugir, se sempre andasses temeroso e desconfiado da morte. Procura agora de tal modo viver, que na hora da morte te possas antes alegrar que temer. Aprende agora a desprezar tudo, para então poderes voar livremente a Cristo. Castiga agora teu corpo pela penitência, para que possas então ter legítima confiança.

7. Ó louco, que pensas viver muito tempo, quando não tens seguro nem um só dia! Quantos têm sido logrados e, de improviso, arrancados ao corpo! Quantas vezes ouviste contar: morreu este a espada; afogou-se aquele; este outro, caindo do alto, quebrou a cabeça; um morreu comendo, outro expirou jogando. Estes se terminaram pelo fogo, aqueles pelo ferro, uns pela peste, outros pelas mãos dos ladrões, e de todos é o fim a morte, e, depressa, qual sombra, acaba a vida do homem.

8. Quem se lembrará de ti depois da morte? E quem rogará por ti? Faze já, irmão caríssimo, quanto puderes; pois não sabes, quando morrerás nem o que te sucederá depois da morte. Enquanto tens tempo, ajunta riquezas imortais. Só cuida de tua salvação, ocupa-te só nas coisas de Deus. Granjeia agora amigos, venerando os santos de Deus e imitando suas obras, para que, ao saíres desta vida, te recebam nas eternas moradas (Lc 16,9).

9. Considera-te como hóspede e peregrino neste mundo, como se nada tivesses com os negócios da terra. Conserva livre teu coração, e erguido a Deus, porque não tens aqui morada permanente (Hb 13,14). Para lá dirige tuas preces e gemidos, cada dia, com lágrimas, a fim de que mereça tua alma, depois da morte, passar venturosamente ao Senhor. Amém.

(Da Imitação de Cristo)

quinta-feira, 9 de novembro de 2023

O DOGMA DO PURGATÓRIO (LXVIII)

Capítulo LXVIII

Alívio às Santas Almas pelas Indulgências - As Indulgências Plenárias de Madre Francisca de Pamplona - Santa Madalena e Santa Teresa e as Religiosas que Passaram Algumas Horas no Purgatório

A Venerável Madre Francisca do Santíssimo Sacramento, de cuja caridade para com as almas santas já falamos, era também muito zelosa em aliviá-las com indulgências. Um dia, Deus mostrou-lhe as almas de três prelados que tinham ocupado anteriormente a Sé de Pamplona e que ainda padeciam os sofrimentos do Purgatório. A serva de Deus compreendeu que devia empregar todos os meios para conseguir a pronta libertação deles. Como a Santa Sé tinha então concedido à Espanha as Bulas da Cruzada, que permitiam obter a indulgência plenária sob certas condições, ela acreditava que o melhor meio de ajudar aquelas pobres almas seria conseguir para cada uma delas a vantagem desta indulgência plenária.

Dirigiu-se então ao seu bispo, Cristóvão de Ribera, informando-o de que três dos seus antecessores ainda se encontravam no Purgatório e instando-o a obter para ela três indulgências das Bulas da Cruzada. Ela cumpriu todas as condições exigidas e aplicou uma indulgência plenária a cada um dos três bispos. Na noite seguinte, todos eles apareceram à Madre Francisca, libertados de todos os seus sofrimentos. Agradeceram-lhe e pediram-lhe que agradecesse também ao Bispo Ribera pelas indulgências que lhes tinham aberto o Céu (Vie de Franqoise du Sacrem., Merv., 26).

O Padre Cepari relata o seguinte na sua obra 'Vida de Santa Madalena de Pazzi'. Morreu uma religiosa professa que, durante a sua última doença, tinha sido cuidada com muita ternura por Santa Madalena e, como era costume expor o corpo na igreja, Madalena sentiu-se inspirada a ir vê-lo mais uma vez. Dirigiu-se, pois, à grade da sala do coro de onde o podia ver; mas, mal o fez, foi arrebatada em êxtase e viu a alma da irmã defunta a voar para o Céu. Transportada de alegria, ouviu-se dizer: 'Adeus, querida irmã; adeus, alma bendita! Como uma pomba pura, voas para o teu lar celestial e nos deixa nesta morada de miséria. Oh, como és bela e gloriosa! Quem pode descrever a glória com que Deus coroou as tuas virtudes?' Quão pouco tempo passaste no Purgatório! O teu corpo ainda não foi levado ao túmulo e eis que a tua alma já foi recebida nas mansões celestes. Conheceis agora a verdade daquelas palavras que vos dirigi ultimamente: 'Que todos os sofrimentos desta vida nada são em comparação com a recompensa que Deus reservou para os seus amigos'. Nesta mesma visão, Nosso Senhor revelou a ela que esta alma piedosa tinha passado apenas quinze horas no Purgatório, porque tinha sofrido muito durante a vida e porque tinha tivera o cuidado de ganhar muitas indulgências concedidas pela Igreja aos seus filhos, em virtude dos méritos de Jesus Cristo.

Santa Teresa, nas suas obras, fala de uma religiosa que dedicava o maior apreço pela mais singela indulgência concedida pela Igreja, e esforçava-se por obter todas as que estavam ao seu alcance. De resto, levava uma vida bastante rotineira e sem grandes obras de virtude. Quando faleceu, a santa, não com grande surpresa, viu a sua alma subir ao Céu quase que imediatamente após a sua morte, de modo que não teve, por assim dizer, a experiência do Purgatório. Quando Santa Teresa manifestou o seu espanto por tal fato, Nosso Senhor fez saber a ela o grande cuidado que a religiosa tivera em obter todas as indulgências possíveis durante a vida. 'Foi por esse meio' - acrescentou - 'que ela saldou quase toda a sua dívida, que era bastante considerável, antes da sua morte e, assim, compareceu com grande pureza perante o tribunal de Deus'.

Tradução da obra: 'Le Dogme du Purgatoire illustré par des Faits et des Révélations Particulières', do teólogo francês François-Xavier Schouppe, sj (1823-1904), 342 p., tradução pelo autor do blog.

DOUTORES DA IGREJA (XXX)

   30São Lourenço de Brindisi, Presbítero (†1619)

Doutor Apostólico

(1559 - 1619)

Concessão do título: 1959 - Papa João XXIII

Celebração: 21 de julho (Memória Facultativa)

 Obras e Escritos 

  • Mariale - sermões sobre Salve-Rainha, Magnificat, Ave-Maria e Festividades da Virgem Maria
  • Lutheranismi hypotyposis - obra de refutação ao luteranismo
  • Explanatio in Genesim - exposição dos onze primeiros capítulos do Gênesis
  • De numeris amorosis - opúsculo sobre o significado místico do nome hebraico de Deus
  • Adventus - sermões do Advento
  • Dominicalia - homilias dominicais
  • Sanctorale - festas dos santos e do Tempo Comum
  • Sermões da Quaresma
  • Cartas

terça-feira, 7 de novembro de 2023

ORAÇÃO DA CONFIANÇA EM DEUS


Meu Senhor e meu Deus, eu estou tão convicto de que cuidas de todos os que esperam em ti, e que nada pode faltar àqueles que esperam tudo de ti, que decidi, como norma, viver sem nenhuma preocupação e dirigir a ti toda a minha inquietude.

Os homens podem despojar-me de todos os bens e mesmo da minha honra; as doenças podem privar-me das forças e dos meios para servir-te; com o pecado posso até perder a tua graça, mas não perderei nunca jamais a minha confiança em ti. A conservarei até ao extremo da minha vida e o demônio, com todos os seus esforços, não conseguirá tirá-la de mim.

Outros esperem a felicidade das riquezas e de seu talento ou confiem mesmo na inocência de suas vidas, no rigor de suas penitências, na quantidade de suas boas obras ou no fervor de suas orações; para mim toda a minha confiança está na própria confiança que tenho; confiança que não enganou ninguém.

Eis porque tenho absoluta certeza de ser eternamente feliz, porque tenho a inabalável confiança de sê-lo e porque o espero unicamente de ti.

Por minha triste experiência, devo infelizmente reconhecer ser débil e inconstante; sei quanto as tentações podem contra as virtudes mais firmes; e no entanto nada, enquanto conservar esta firme confiança em ti, poderá assustar-me; me reabilitarei de qualquer desgraça e estarei certo de continuar a esperar, porque espero com esta imutável esperança.

Enfim, meu Deus, sou intimamente persuadido de que não será jamais exagerada a confiança em ti e que o que obterei de ti, será sempre muito mais do que o que terei esperado.

Espero também, Senhor, que Tu me sustentes nas minhas frágeis debilidades; me sustentes nos assaltos mais violentos; faças triunfar a minha fraqueza sobre os meus inimigos mais temidos.

Tenho muita confiança que Tu me amarás sempre e que também eu, por minha vez, te amarei para sempre. E para levar ao mais alto grau esta minha confiança, ó meu Criador, eu espero em ti mesmo, pelo tempo e pela eternidade. Amém.

(São Claúdio de La Colombiére)

segunda-feira, 6 de novembro de 2023

FRASES DE SENDARIUM (XIV)

'A verdadeira sabedoria consiste em obras e não em grandes talentos como o mundo tanto admira, são os tolos que ignoram a vontade de Deus e não sabem como controlar as suas paixões’

(Santa Brígida da Suécia)

Quantos se embriagam das miragens dos palácios, das vertigens dos aplausos e do torpor das paixões mundanas... são insensatos que buscam ganhar o mundo e arriscam a perder as suas almas.