quarta-feira, 17 de outubro de 2018

BREVIÁRIO DA CONFIANÇA (IV)


17 DE OUTUBRO

GOLPES DE MISERICÓRDIA 

Os golpes que sofremos na vida vêm do Alto. São golpes de misericórdia, golpes de cirurgião, para curar. Ferem, causam dor, provocam gemidos? Não importa. Deixemos que o Médico Divino faça a operação necessária. Sem ela nos perderemos. Abençoemos a Mão Divina, que nos fere por misericórdia. É mão de pai, de amigo, que nos quer salvar. Não há outro remédio para nossa salvação. 

O Senhor, na Sua Providência Amorosa, decretou bater-nos, ferir-nos. Faça-se a vontade Divina, toda santa, toda amável! Um dia, no Céu, compreenderemos tudo. E' por castigo que Deus, muitas vezes, nos deixa na prosperidade. Felizes os que são batidos pela Mão Divina! E' o sinal mais certo de que caminham para a salvação. Sofremos, choramos, aflige-nos a dor? Vamos! Coragem! Deixemos que os golpes nos firam, que nos abram feridas, que as façam sangrar! Tudo será bom para o Céu. 

E' com sangue e com lágrimas que se argamassa aqui o edifício do Amor. São golpes de misericórdia ou, melhor, do Amor Misericordioso. Nas nossas aflições, é assim que devemos rezar: 'Batei, cortai, feri, meu Deus, contanto que me salve. Faça-se a Vossa Santíssima e Adorável Vontade!' Nos golpes que nos vêm do Alto, há justiça e misericórdia. A Justiça pune e expia o pecado. A misericórdia salva, purifica e nos leva ao Amor.


18 DE OUTUBRO

A MELHOR DAS ORAÇÕES 

A melhor das orações é o 'Pai Nosso' e, no 'Pai Nosso', o melhor é aquele 'Seja feita a Vossa Vontade assim na terra como no Céu'. Nesse conceito está todo o segredo da santidade. Não basta dizer: 'Senhor/ Senhor!' É mister acrescentar: 'Seja feita a Vossa Vontade'. 'Não são os que dizem: "Senhor! Senhor!" ­- diz o Evangelho - que hão de entrar no Reino dos Céus, mas som os que fazem a Vontade do Pai Eterno'. 

Pouco importam mil coroas e devoçõezinhas originais, se não sabemos conformar a nossa vontade com a Vontade de Deus.  Já  disse e repito: 'Fazer o que Deus quer e querer a que Deus faz, é  a melhor das orações'. E nisto se resume toda a vida cristã. A oração de conformidade é a mais perfeita e agradável a Nosso Senhor. Porque nos sobrecarregarmos frequentemente com tantas devoções, até com prejuízo dos deveres mais graves de estado, e observarmos todas tão escrupulosamente, se o essencial, que é o dever, talvez monótono, fica esquecido e desprezado, e não aceitamos sem revolta o que Deus Nosso Senhor nos envia de sofrimentos e cruzes? 

Digamos, sim, o 'Pai Nosso' todo dia, e com fervor. Não nos esqueçamos, porém, de que, se a prece dominical é a melhor das orações, é justamente porque naquele 'Seja feita a Vossa Vontade assim na terra como no Céu' se resume toda a nossa vida cristã.

(Excertos da obra 'Breviário da Confiança', do Mons. Ascânio Brandão, 1936)

terça-feira, 16 de outubro de 2018

POEMAS PARA REZAR (XXVII)



OS ANOS SÃO DEGRAUS

Os anos são degraus; a vida, a escada. 
Longa ou curta, só Deus pode medi-la. 
E a Porta, a grande Porta desejada, 
só Deus pode fechá-la, 
e pode abri-la. 

São vários os degraus: alguns sombrios, 
outros ao sol, na plena luz dos astros, 
com asas de anjos, harpas celestiais; 
alguns, quilhas e mastros 
nas mãos dos vendavais. 

Mas tudo são degraus; tudo é fugir 
à humana condição. 
Degrau após degrau, 
tudo é lenta
 ascensão. 

Senhor, como é possível a descrença, 
imaginar, sequer, que ao fim da estrada 
se encontre após esta ansiedade imensa 
uma porta fechada 
e nada mais?

(Fernanda de Castro, escritora e poetisa portuguesa, 1900 - 1944)

segunda-feira, 15 de outubro de 2018

15 DE OUTUBRO - SANTA TERESA DE ÁVILA


Terceira dos nove filhos do segundo casamento de Alonso Sanchez Cepeda e Beatriz D'Ávila y Ahumada, Teresa nasceu em 28 de março de 1515 na cidade medieval de Ávila, na região de Castela (Espanha). Inteligente e extremamente afável, desenvolveu desde muito cedo um espírito de intensa oração e vida interior que a levaria, antes dos 20 anos, a ingressar no Convento da Encarnação das Carmelitas onde vivenciou fenômenos místicos extraordinários, como a transverberação de seu coração por um Serafim e o 'desposório místico' com Cristo.

Superando doenças e provações diversas, transformou-se, então, na grande reformadora da Ordem dos Carmelitas, a partir de 1562, quando passou a aplicar à mesma as regras formais dos antigos conventos, impondo o rigor das orações, do silêncio completo e de meditações contínuas. Neste modelo, fundou vários outros conventos e, junto com São João da Cruz, o ramo masculino dos Descalços. Seus escritos e obras expressam a singular inspiração mística de sua vida interior e a poesia de sua intimidade espiritual com Cristo.  

Em 1582, durante uma viagem a Alba de Tormes, seu estado de saúde piorou rapidamente e a santa teve a certeza que era chegada a hora de sua morte. Ao receber os últimos sacramentos do Pe. Antônio de Heredia, ergueu-se de repente do leito exclamando: 'Oh, Senhor, por fim chegou a hora de nos vermos face a face!' e, em seguida, pronunciou sua última frase: 'Morro como filha da Igreja'. Eram 9 horas da noite do dia 4 de outubro de 1582. Uma vez que, exatamente no dia seguinte efetuou-se a mudança para o calendário gregoriano com a supressão de dez dias do mesmo, a data de sua celebração é comemorada no dia 15 de outubro.

Suas relíquias repousam ainda em Alba de Tormes. Teresa foi beatificada pelo Papa Paulo V em 1614 e canonizada por Gregório XV em 1622. O Papa Paulo VI, em 27 de setembro de 1970, proclamou Santa Teresa de Ávila como Doutora da Igreja.

domingo, 14 de outubro de 2018

O JOVEM RICO E AS CONTINGÊNCIAS DA GRAÇA

Páginas do Evangelho - Vigésimo Oitavo Domingo do Tempo Comum


'Bom Mestre, que devo fazer para ganhar a vida eterna?' (Mc 10, 17). Eis a pergunta do jovem rico, ao correr ao encontro de Jesus e lhe atirar aos pés, cheio da iniciativa da graça. Eivado das riquezas do mundo, encontrara tempo e discernimento para buscar valores mais altos e definitivos, que pavimentam caminhos de heranças eternas. Tal santa predisposição, ainda que bela, entretanto, é movida apenas pela natureza humana. 

O jovem rico vê em Jesus um santo, um sábio, um mestre, mas não como Deus. Ciente dessa visão, ao vislumbrar o coração do moço cheio de bons propósitos, Jesus vai questioná-lo sobre ser chamado por ele de 'bom', sob uma mera conduta da concessão humana da admiração, quando Ele, por ser Deus, é a própria Bondade Infinita. Em seguida, Jesus o conclama a ir muito mais longe nos mistérios da graça, ciente de suas virtudes em praticar os mandamentos que acabara de enumerar. Consumado de amor, Jesus o invoca aos cumes da vida espiritual: 'Só uma coisa te falta: vai, vende tudo o que tens e dá aos pobres, e terás um tesouro no céu. Depois vem e segue-me!' Ao ouvir isso, porém, o jovem 'ficou abatido e foi embora cheio de tristeza, porque era muito rico' (Mc 10, 22).

'Vem e segue-me!' Jesus convidou aquele jovem rico para ser um outro Apóstolo, para herdar desde já a sua herança eterna nos caminhos poeirentos da terra, para tomar posse da verdadeira riqueza, aquela que se guarda no próprio Coração de Deus. E recebeu um não como resposta, cujo eco de insensatez e de vicissitude há de perpassar por todos os tempos e gerações. Um não nascido da tibieza e do orgulho, das mazelas de uma alma enriquecida apenas dos valores humanos na prática dos mandamentos, mas pobre na sabedoria da graça, daquela sabedoria em relação à qual 'todo o ouro do mundo é um punhado de areia e, diante dela, a prata será como a lama' (Sb 7, 9).

A verdadeira riqueza está em Deus. Os valores do mundo, todos os valores do mundo, incluindo a posse de mais ou de menos bens materiais, são efêmeros e incertos. O Reino de Deus é um tesouro impossível de ser encontrado por aqueles que, como o jovem rico, são apegados aos bens e dons desta vida e uma porta aberta, quando trilhado por aqueles que se fazem pobres de espírito para compartilharem as suas misérias com a infinita misericórdia de Deus. Dispor o que se recebe, repartir o que se tem, abandonar todos os apegos terrenos por causa do Evangelho: eis a regra de ouro para se almejar as heranças eternas e acumular tesouros sem limites nos Céus: 'Em verdade vos digo, quem tiver deixado casa, irmãos, irmãs, mãe, pai, filhos, campos, por causa de mim e do Evangelho, receberá cem vezes mais agora, durante esta vida — casa, irmãos, irmãs, mães, filhos e campos, com perseguições — e, no mundo futuro, a vida eterna' (Mc 10, 29 - 30).

sábado, 13 de outubro de 2018

FOTO DA SEMANA

'Abri no deserto um caminho para o Senhor, traçai reta na estepe uma pista para nosso Deus' (Is 40, 3) 

sexta-feira, 12 de outubro de 2018

GLÓRIAS DE MARIA: NOSSA SENHORA APARECIDA

A história é bem conhecida: em 1717, Dom Pedro de Almeida Portugal e Vasconcelos (Conde de Assumar), efetivado como governador das Capitanias de São Paulo e Minas Gerais, viajou de navio de Portugal a Santos, com grande comitiva. Tomando posse do governo em São Paulo, seguiu rumo às minas de ouro em Minas Gerais, fazendo uma longa parada em Guaratinguetá, no período de 17 a 30 de outubro. Para a recepção do ilustre viajante, foram-lhe servidos os melhores pratos da culinária local, incluindo os saborosos pescados do Rio Paraíba do Sul.

Para a nobre tarefa de pescar uma grande quantidade de peixes, foram convocados os pescadores Domingos Alves Garcia, seu filho João Alves e Felipe Pedroso, cunhado de Domingos, entre outros. Entretanto, mesmo com o conhecimento enorme que tinham dos melhores pontos de pesca, não conseguiam nada. Mas algo extraordinário estava para ocorrer. Na rede lançada, surgiu primeiro uma pequena imagem em terracota de Nossa Senhora da Conceição, sem a cabeça, que foi recolhida e guardada com zelo pelos pescadores no fundo do barco. E eis que, numa nova investida, mais abaixo no rio, sem nada de peixe, veio a cabeça da imagem. Um objeto de dimensões tão reduzidas coletado do leito largo e vigoroso do Paraíba do Sul! E, surpresa ainda maior, novas investidas da rede trouxeram agora cardumes de peixes, em tão grande quantidade, repetindo-se, no largo do Porto de Itaguaçu, o milagre de Cristo no Mar da Galileia.


Cientes dos fatos extraordinários ocorridos, os pescadores locais recuperaram a imagem e passaram a venerá-la em suas casas, como imagem peregrina, até que a mesma foi colocada em pequeno oratório na casa de Atanásio Pedroso, filho de Felipe, e depois, com o culto já generalizado na ‘Nossa Senhora Aparecida’, erigiu-se uma pequena capela de sua devoção em Itaguaçu, com o apoio do Padre José Alves Vilela, pároco da Igreja de Santo Antônio de Guaratinguetá. Sob a sua coordenação, a devoção recebeu a aprovação episcopal e foi construída, então, a Igreja de Nossa Senhora Aparecida, no chamado Morro dos Coqueiros, inaugurada em 1745, apenas 28 anos após o achado da imagem. Em torno da igreja, implantou-se rapidamente uma comunidade que constitui hoje a cidade de Aparecida. A igreja tornou-se de imediato centro de romarias e de devoções marianas de toda a natureza.


Com a intensa participação popular e, pela ausência de sacerdotes no Brasil, optou-se pela solicitação de auxílio junto a comunidades religiosas europeias. Em 1894, com a chegada dos padres redendoristas alemães, as atividades religiosas, os cultos e as romarias tornaram-se muito mais organizados, favorecendo muito a rápida difusão da evangelização e a consolidação da igreja como santuário de frequente peregrinação. Tais eventos culminaram com a solene coroação da imagem de Nossa Senhora Aparecida em 8 de setembro de 1904 (com manto azul e coroa de ouro cravejada de diamantes e rubis, ofertados pela Princesa Isabel em visita ao santuário em 6 de novembro de 1888) e com a elevação do santuário à condição de Basílica Menor em 29 de abril de 1908. Em 16 de julho de 1930, o Papa Pio XI outorgou o título de Nossa Senhora Aparecida como Padroeira do BrasilEm 1967, ano da comemoração do jubileu dos 250 anos da aparição da imagem de Nossa Senhora da Conceição Aparecida, o Papa Paulo VI ofertou ao Santuário Nacional da Padroeira do Brasil uma Rosa de Ouro, ato repetido pelo Papa Bento XVI em 2007. O dia da Padroeira do Brasil é celebrado em 12 de outubro, feriado nacional. 

As enormes e crescentes manifestações populares exigiram a construção de uma nova basílica, com dimensões e infraestrutura compatíveis com o maior centro de peregrinação espiritual do Brasil que se tornou Aparecida. Desta forma, entre 1955 e 1980, foi construída a atual Basílica, inaugurada a 04 de julho de 1980 pelo Papa João Paulo II e elevada a Santuário Nacional em 1984. Que continua a receber milhares de peregrinos, infindáveis romarias, em agradecimento, louvor e veneração à Virgem Padroeira do Brasil. Na Sala das Promessas, em meio a milhares de ex-votos, tem-se uma ideia da admirável senda de prodígios e milagres alcançados por tantos romeiros e fieis, pela intercessão de Nossa Senhora Aparecida.


Em Aparecida, ao contrário de tantos outros centros de peregrinação mariana, a Virgem fez-se aparecer apenas sob a forma de uma pobre e pequena imagem de terracota de 38cm de altura, sem quaisquer visões, mensagens ou prodígios sobrenaturais, para falar aos simples, aos humildes, aos fracos, aos desvalidos, que as almas simples, despojadas de valores intrinsecamente humanos e entregues somente à confiança e à misericórdia de Deus por Maria, são as glórias dos Céus.


ORAÇÃO A NOSSA SENHORA APARECIDA

Ó Senhora da Conceição Aparecida, que fizestes tantos milagres que comprovam vossa poderosa intercessão junto ao Pai, ao Filho e ao Espírito Santo, obtende para nossas famílias as graças de que tanto necessitam. Defendei-nos da violência, das doenças, do desemprego e, sobretudo, do pecado, que nos afasta de Vós. Protegei nossos filhos de tantos fatores de deformação da juventude. E concedei a todos os membros de nossas famílias a graça de poderem trilhar o caminho de perfeição e de paz ensinado por Vosso Divino Filho, que afirmou: "Disse-vos estas coisas para que tenhais paz em Mim. Haveis de ter aflições no mundo; mas tende confiança, Eu venci o mundo!" Amém.

quinta-feira, 11 de outubro de 2018

SUMA TEOLÓGICA EM FORMA DE CATECISMO (XVIII)

III 

DOS DONS DO ESPÍRITO SANTO CORRESPONDENTES À FÉ: DOM DE ENTENDIMENTO E DOM DE CIÊNCIA - VÍCIOS OPOSTOS: CEGUEIRA DO ESPÍRITO E INSENSIBILIDAD

É suficiente a virtude da fé para conhecer as verdades sobrenaturais na medida com que podemos conhecê-las neste mundo? 
Com a cooperação de alguns dons do Espírito Santo, sim, Senhor (VIII, 2)*. 

Quais são os dons do Espírito Santo destinados a cooperar com a fé? 
Os de entendimento e ciência (VIII, IX). 

De que maneira auxilia o dom do entendimento a virtude da fé, para conhecer as verdades reveladas?
Se se trata de verdades que não excedem a capacidade de nosso entendimento, fazendo que este, debaixo do influxo direto do Espírito Santo, penetre no sentido íntimo e mais recôndito dos enunciados divinos e das proposições que com eles guardam relação; e quando se trate de mistérios, fazendo-lhe ver que não se lhes opõe nenhuma outra verdade conhecida, apesar dos problemas e dificuldades que os mistérios apresentam (Ibid). 

Logo, o dom do entendimento é o dom de iluminação por excelência? 
Sim, Senhor, e quanto de claridade e puros gozos intelectuais da ordem sobrenatural há em nós, o devemos ao dom de entendimento, o qual faz frutificar na alma os germes da verdade infinita, objeto próprio e direto da virtude da fé. 

Influi também o dom do entendimento na prática das virtudes? 
Sim, Senhor; visto como tem por objeto por em relevo os bens sobrenaturais anunciados e prometidos na Revelação, com o intuito de que a vontade, divinizada pelo amor de caridade, as busque como meio de alcançar a eterna bem-aventurança (VIII, 3, 4, 5). 

Podereis dizer-me em que se distinguem a fé e outros dons do Espírito Santo, tais como os de sabedoria, ciência e conselho, do dom do entendimento, suposto que a fé e os outros dons aperfeiçoam a mesma inteligência? 
Sim, Senhor; a fé tem por objeto propor-nos três classes de verdades reveladas: umas referentes a Deus na ordem sobrenatural, outras às criaturas, e outras à direção e governo dos atos humanos. Pode o homem prestar-lhes assentimento, mediante a fé; porém, não pode compreendê-las, nem penetrar o seu sentido íntimo, de modo que lhe sirvam de base para formular juízo fundado e seguro. Manifestar o sentido íntimo, próprio e exclusivo das verdades reveladas é objeto do dom do entendimento; formar juízo reto e seguro, nas referentes a Deus, é o objeto próprio do dom da sabedoria; nas concernentes às criaturas é objeto do dom de ciência e no que diz respeito aos atos humanos é objeto do dom de conselho (VIII, 6). 

Tomando em conta estas doutrinas, podeis explicar-me o objeto e alcance do dom de ciência? 
É o dom da ciência uma virtude por mercê da qual, o cristão, no estado de graça e diretamente movido pelo Espírito Santo, conhece e distingue imediatamente, sem discurso, nem raciocínio, de modo direto, poderemos dizer, intuitivo, o que é objeto da fé, regra de bem proceder e ato virtuoso, daquilo que não é objeto de fé, e a maneira como havemos de servir-nos das criaturas para nos acercarmos da Verdade Suprema, objeto da fé e último fim de nossas ações (IX, 1, 3). 

Tem este dom importância especial em nossos dias? 
Sim, Senhor; porque é o remédio por excelência para uma das maiores pragas que afligem o gênero humano desde a época da Renascença. 

A que praga vos referis? 
A uma que prevaleceu até nos povos, em outro tempo, profundamente cristãos, o reinado da falsa ciência que, esquecida de como as criaturas devem servir de meios para nos acercarmos do Criador, na ordem especulativa converteu o estudo em arma para combater a fé e, na prática, renovou os costumes corrompidos dos antigos pagãos, tanto mais perniciosos, quanto sucediam a uma esplêndida floração das virtudes sobrenaturais praticadas pelos Santos. 

É esta uma das principais causas dos males que afligem a sociedade moderna? 
Sim, Senhor. 

Onde, pois, acharemos um poderoso remédio contra os males desta sociedade ímpia e afastada de Deus? 
Na virtude da fé, e em seus inseparáveis aliados, quando o homem está em graça, os dons de entendimento e ciência. 

Quais são os vícios opostos a estes dons? 
Ao dom da ciência, se opõe a ignorância; ao do entendimento, a cegueira do espírito e a insensibilidade ou embrutecimento dos sentidos. 

Donde provêm estes vícios, especialmente estes dois últimos? 
Particularmente dos pecados carnais que asfixiam a alma (XV, 3) 

IV 

PRECEITOS CONCERNENTES À FÉ - O ENSINO CATEQUÉTICO E A SUMA DE SANTO TOMÁS DE AQUINO 

Existem na lei divina preceitos concernentes à fé? 
Sim, Senhor; e particularmente na lei nova.

Por que não se exigiu do povo Judeu conhecimento e fé explícita dos mistérios em concreto, ou pelo menos dos principais, o da Trindade e o da Encarnação, como se exige, hoje de todos os homens? Porque o mistério da Encarnação não existia no Antigo Testamento senão em sua figura e promessa, e estava reservada a Jesus Cristo a missão de revelá-lo conjuntamente com o da Santíssima Trindade.

Por conseguinte, que coisas estavam obrigados a crer os fiéis da antiga lei? 
Explicitamente, nada em particular, nem em concreto dos dois grandes mistérios; implicitamente, tudo, já que acreditavam na inefável grandeza de Deus e confiavam nas suas divinas promessas (XVI, 1). 

Era isto suficiente para que seus atos de fé fossem atos de virtude sobrenatural? 
Sim, Senhor. 

É nossa fé mais completa e perfeita que a dos Judeus?
Sim, Senhor. 

Em que consiste esta superioridade? 
Em que a eles apenas foi dado entrever de uma maneira vaga e simbólica os mistérios sobrenaturais da glória, que a nós, ainda que velados e entre sombras, expressamente se nos declaram. 

Estamos obrigados a meditar neles com frequência e a exercitar-nos em penetrar o mais recôndito do seu sentido, mediante os dons do Espírito Santo? 
Sim, Senhor; e com o fim de facilitar-nos o cumprimento desta obrigação, emprega a Igreja todo o zelo e diligência em ensinar aos fiéis as verdades da fé. 

Que método emprega ordinariamente a Igreja? 
O de ensinar o catecismo. 

Logo, têm obrigação todos os fiéis de aprender o catecismo na medida que lho permitam as suas faculdades? 
Sim, Senhor. 

Tem o Catecismo importância e autoridade especiais? 
Sim Senhor; porque é uma iniciação no estudo e conhecimento das mais sublimes e deslumbradoras verdades da ordem sobrenatural. 

Quem exerce o magistério catequético? 
A Igreja, por intermédio dos seus maiores gênios e doutores. 

Podemos dizer que o ensino do catecismo é fruto dos dons do Espírito Santo, na Igreja de Deus? 
Sim, Senhor; porque no fundo se reduz a propor aos fiéis, com maior ou menor extensão, o mais apreciado e maravilhoso fruto dos dons do Espírito Santo, a Suma Teológica de Santo Tomás de Aquino. 

Tem a Suma Teológica grande e especialíssima autoridade na Igreja de Cristo? 
Sim, Senhor; a Igreja impõe a todos os que ensinam em seu nome a obrigação de inspirar-se nela e ensinar as suas doutrinas (Código de Direito Canônico, 589, 1366). 

É, por conseguinte, digno do maior encômio, o labor dos que a este ensino se dedicam? 
Sim, Senhor; porque é o meio mais seguro para que ninguém se desvie do que ensina a fé e do que exige a razão.

referências aos artigos da obra original

('A Suma Teológica de São Tomás de Aquino em Forma de Catecismo', de R.P. Tomás Pègues, tradução de um sacerdote secular)