A alma que se aproxima de Deus às vezes experimenta em si a doce impressão de que perfumes misteriosos a envolvem e a impregnam completamente. Não são como os perfumes naturais que afetam os sentidos. Não. Mas essas realidades espirituais têm meios de se manifestar à alma de modo análogo às emanações dos odores físicos. Nesse sentido existem perfumes espirituais. Eles têm o privilégio de não só serem mil vezes mais agradáveis que o mais requintado dos bálsamos, mas também, e sobretudo, de serem sobrenaturalmente benéficos. Eles fortalecem e se propagam. Sob o seu influxo, a alma desenvolve e respira livremente. E cresce. A vida, uma vida totalmente divina, é infundida nela por dentro. Ela se compenetra disso e percebe que a causa imediata de tudo é esse perfume misterioso.
Quando Deus faz a alma entrar em união imediata com as realidades espirituais, sobretudo consigo mesmo, algo similar acontece quando se percebem as propriedades sensíveis dos corpos; perfumes, por exemplo. A bondade de Deus tem o seu aroma, assim como tem um também a sua doçura, e de forma semelhante com os outros atributos divinos. Parece que tudo acontece como se, de fato, a alma fosse dotada de um olfato espiritual, harmonizado pelo Criador com os seres da ordem sobrenatural, que lhe são reconhecidos pelo olfato. Quando a alma quer traduzir para a linguagem humana o que experimenta em sua união íntima com Deus, não encontra melhor comparação: 'As coisas divinas me fazem experimentar prazeres que são para mim, na ordem espiritual, o que na ordem sensível são os prazeres do olfato impregnados pelo perfume das flores'.
Nessa intimidade, Deus quer falar com a alma predileta e suas palavras fluem docemente. A alma interior capta então toda a sua graça. Antes mesmo de serem articulados quaisquer sons, já a encantam a delicadeza e o suave perfume que exalam. Não queremos dizer certamente com isso que Deus possui lábios ou que Jesus deixa, por um momento, contemplar os seus. Não é isso; mas a alma interior e Deus estão tão próximos que se podem falar, como de uma boca para outra boca. Toda a afeição verdadeira, profunda e pura que lábios humanos poderiam expressar é refletida, sobre a alma interior, como uma projeção nascida da boca de Deus. Na expressão e no movimento desses lábios misteriosos, a alma subtende que agrada a Deus e que é amada por Ele.
Um delicioso perfume brota dos lábios divinos. Pode-se dizer que vem do mais íntimo do Coração de Deus e faz a alma interior provar todos os encantos de outros perfumes. Por que a essência divina não deveria ter o seu perfume? É isso que subtende a esposa na hora abençoada de sua união. Esse perfume que ela chama de 'essencial', essa 'mirra puríssima', já lhe antecipa algo das alegrias do céu. Uma espécie de atmosfera perfumada a envolve por completo. Ela se sente, ao mesmo tempo, isolada e protegida por esse ambiente, invisível e ao mesmo tempo tão real. E então pode amar a Deus sem reservas. E faz isso sem contratempos e sem esforço, movida por um instinto divino que a impele e a sustenta ao mesmo tempo. A alma interior saboreia essa nova maneira de viver desconhecida até agora, mas compreende que encontrou nela a verdadeira vida e então exulta de alegria.
(Excertos da obra 'A Vida Oculta em Deus', de Robert de Langeac; Parte III - A União com Deus; tradução do autor do blog)