quinta-feira, 2 de março de 2023

O DOGMA DO PURGATÓRIO (LI)


Capítulo X

Auxílio às Santas Almas - Santo Agostinho e Santa Mônica - O Santo Sacrifício da Missa 

Na Nova Lei temos o Santo Sacrifício da Missa, do qual os diversos sacrifícios da Lei Mosaica eram apenas pálidas referências. O Filho de Deus a instituiu, não só como digna homenagem prestada pela criatura à Divina Majestade, mas também como propiciação pelos vivos e pelos mortos; isto é, como um meio eficaz de apaziguar a Justiça de Deus, provocada pelos nossos pecados. O Santo Sacrifício da Missa foi celebrado em intenção dos falecidos desde o tempo da fundação da Igreja. 'Celebramos o aniversário do triunfo dos mártires' - escreve Tertuliano no século III - 'e, segundo a tradição de nossos pais, oferecemos o Santo Sacrifício pelos falecidos no aniversário de sua morte' (De Corona, c. 5).

'Não se pode duvidar' - escreve Santo Agostinho - 'que as orações da Igreja, o Santo Sacrifício e as esmolas distribuídas pelos defuntos aliviam essas almas santas e movem Deus a tratá-las com mais clemência do que merecem os seus pecados. É a prática universal da Igreja, uma prática que ela conserva tal como tendo recebido dos seus antepassados ​​– isto é, dos santos Apóstolos' (Serm. 34, De Verbis Apost.). 

Santa Mônica, a digna mãe de Santo Agostinho, quando estava prestes a expirar, pediu apenas uma coisa ao seu filho: que ele se lembrasse dela no altar de Deus e o santo Doutor, ao relatar essa comovente circunstância no Livro de suas Confissões, pede a todos os seus leitores que se unam a ele para recomendá-la a Deus durante o Santo Sacrifício da Missa (Liv. 9., c. 5). Desejando retornar para a África, Santa Mônica foi com Santo Agostinho até Ostia, a fim de embarcar; mas ela adoeceu e logo sentiu que seu fim estava se aproximando. 'É aqui' - disse ela ao filho - 'que você vai enterrar a sua mãe. A única coisa que peço a você é que se lembre de mim no altar do Senhor' - Ut ad altare Domini memineritis mei

Santo Agostinho continua: 'Que me perdoem as lágrimas que então derramei, pois não se deve lamentar aquela morte que foi apenas a entrada para a verdadeira vida. No entanto, considerando com os olhos da fé as misérias de nossa natureza caída, posso derramar diante de Ti, ó Senhor, outras lágrimas além das da carne, lágrimas que fluem ao pensar no perigo a que se expõe toda alma que pecou por Adão'.

'É certo que minha mãe viveu de maneira a dar glória ao Vosso Nome, pela atividade de sua fé e pela pureza de seus costumes; ainda ouso afirmar que nenhuma palavra contrária à Tua lei jamais escapou de seus lábios? Infelizmente o que será da vida mais santa se a examinares em todos os rigores da tua justiça? Por isso, ó Deus do meu coração, deixo de lado as boas obras que minha mãe tem feito para pedir-Vos apenas o perdão dos seus pecados. Ouve-me pelas chagas daquele que morreu por nós na Cruz e que, agora sentado à tua direita, é o nosso Mediador'.

'Sei que minha mãe sempre teve misericórdia, que perdoou de coração todas as ofensas e perdoou todas as dívidas que lhe eram devidas. Cancela então as dívidas dela, se durante o curso de sua longa vida houver alguma devida a Ti. Perdoa-a, ó Senhor, perdoa-a, e não entres em juízo contra ela; pois Tuas palavras são verdadeiras; Tu prometeste misericórdia aos misericordiosos'.

'Esta misericórdia, creio, já lhe mostraste, ó meu Deus; mas aceita a homenagem da minha oração. Lembre-se que, em sua passagem para a outra vida, tua serva não desejou para seu corpo nem um funeral pomposo e nem perfumes preciosos; ela não pediu uma sepultura magnífica, nem que fosse carregada para aquele sepulcro que havia mandado construir em Tagaste, sua terra natal; mas apenas para que nos lembremos dela em teu altar, cujos mistérios ela prezava'.

'Tu sabes, Senhor, que todos os dias de sua vida ela participou daqueles Divinos Mistérios que contêm a Santa Vítima cujo sangue apagou a sentença de nossa condenação. Que ela descanse então em paz com meu pai, seu esposo, com o esposo a quem ela foi fiel durante todos os dias de sua união, e nas dores de sua viuvez com aquele de quem ela se fez humilde servo, para conquistá-lo para ti. pela sua mansidão e paciência. E Tu, ó meu Deus, inspira os teus servos, que são meus irmãos, inspira todos aqueles que leem estas linhas a se lembrarem em teu altar de Mônica, tua serva e Patrício, que era o seu esposo; que todos os que ainda vivem na falsa luz deste mundo possam se lembrar piedosamente dos meus pais, que a última oração de minha mãe moribunda seja ouvida e acatada, muito além de suas expectativas'.

Esta bela passagem de Santo Agostinho nos mostra a opinião deste grande Doutor sobre o tema dos sufrágios pelos defuntos e nos mostra claramente que o maior e mais eficaz de todos os sufrágios é o Santo Sacrifício da Missa.

Tradução da obra: 'Le Dogme du Purgatoire illustré par des Faits et des Révélations Particulières', do teólogo francês François-Xavier Schouppe, sj (1823-1904), 342 p., tradução pelo autor do blog)