quinta-feira, 24 de julho de 2014

AS DORES DE MARIA POR SÃO JOSEMARIA ESCRIVÁ (III)

Sexta dor: Jesus é descido da Cruz e entregue à sua Mãe

Chegada já a tarde, como era o Dia da Preparação, isto é, a véspera do sábado, José de Arimateia, respeitável membro do Sinédrio, que também esperava o reino de Deus, foi corajosamente procurar Pilatos e pediu-lhe o corpo de Jesus. Pilatos admirou-se d’Ele já estar morto e, mandando chamar o centurião, perguntou-lhe se já tinha morrido. Informado pelo centurião, ordenou que o corpo fosse entregue a José. Este, depois de comprar um lençol; tirou Jesus da cruz e envolveu-O nele. Em seguida, depositou-O num sepulcro cavado na rocha e rolou uma pedra contra a porta do sepulcro (Mc 15, 42-46).

Situados agora no Calvário, quando Jesus já morreu e não se manifestou ainda a glória do seu triunfo, temos uma boa ocasião para examinar os nossos desejos de vida cristã, de santidade para reagir com um ato de fé perante as nossas debilidades e, confiando no poder de Deus, fazer o propósito de por amor nas coisas do nosso dia-a-dia. A experiência do pecado tem de nos conduzir à dor, a uma decisão mais madura e mais profunda de sermos fieis, de nos identificarmos deveras com Cristo, de perseverarmos, custe o que custar, nessa missão sacerdotal que Ele encomendou a todos os seus discípulos sem exceção, que nos impele a sermos sal e luz do mundo (Cristo que passa, 96).

É a hora de recorreres à tua Mãe bendita do Céu, para que te acolha nos seus braços e te consiga do seu Filho um olhar de misericórdia. E procura depois fazer propósitos concretos: corta de uma vez, ainda que custe, esse pormenor que estorva e que é bem conhecido de Deus e de ti. A soberba, a sensualidade, a falta de sentido sobrenatural aliar-se-ão para te sussurrarem: isso? Mas se se trata de uma circunstância tonta, insignificante! Tu responde, sem dialogar mais com a tentação: entregar-me-ei também nessa exigência divina! E não te faltará razão: o amor demonstra-se especialmente em coisas pequenas. Normalmente, os sacrifícios que o Senhor nos pede, os mais árduos, são minúsculos, mas tão contínuos e valiosos como o bater do coração (Amigos de Deus, 134).

Sétima dor: Jesus é sepultado

Depois disto, José de Arimateia, que era discípulo de Jesus mas em segredo, por medo dos judeus, pediu a Pilatos para levar o Corpo de Jesus. Pilatos permitiu-lhe. Veio, pois, e tirou o Seu Corpo. Veio também Nicodemos, aquele que anteriormente se dirigira de noite a Jesus, trazendo uma composição de quase cem libras de mirra e aloés. Tomaram o Corpo de Jesus e envolveram-no em ligaduras, juntamente com os perfumes, segundo a maneira de sepultar usada entre os judeus. No lugar em que Ele tinha sido crucificado, havia um horto e, no horto, um túmulo novo, no qual ninguém fora ainda sepultado. Por causa da Preparação dos judeus, como o túmulo estava perto, foi ali que puseram Jesus (Jo 19, 38-42).

Vamos pedir agora ao Senhor, para terminar este tempo de conversa com Ele, que nos conceda o poder de repetir com São Paulo que triunfamos por virtude daquele que nos amou. Pelo qual estou certo de que nem a morte, nem a vida, nem os anjos, nem os principados, nem as virtudes, nem o presente, nem o futuro, nem a força, nem o que há de mais alto, nem de mais profundo, nem qualquer outra criatura, poderá jamais separar-nos do amor de Deus que está em Jesus Cristo Nosso Senhor.

Este amor também a Escritura o canta com palavras inflamadas: as águas copiosas não puderam extinguir a caridade, nem os rios afogá-la. Este amor encheu sempre o Coração de Santa Maria, ao ponto de enriquecê-la com entranhas de Mãe para toda a humanidade. Em Nossa Senhora o amor a Deus confunde-se com a solicitude por todos os seus filhos. O seu Coração dulcíssimo teve de sofrer muito, atento aos mínimos pormenores - não têm vinho - ao presenciar aquela crueldade coletiva, aquele encarniçamento dos verdugos, que foi a Paixão e Morte de Jesus. Mas Maria não fala. Como o seu Filho, ama, cala e perdoa. Essa é a força do amor (Amigos de Deus, 237).

(fonte: www.pt.josemariaescriva)

quarta-feira, 23 de julho de 2014

O CÉU É AQUI...

AS DORES DE MARIA POR SÃO JOSEMARIA ESCRIVÁ (II)

Quarta dor: Maria encontra o seu Filho a caminho do Calvário

Mal Jesus se levantou da Sua primeira queda, encontra Sua Mãe Santíssima, junto do caminho por onde Ele passa. Com imenso amor, Maria olha para Jesus, e Jesus olha para a Sua Mãe; os Seus olhares encontram-se, e cada coração verte no outro a Sua própria dor. A alma de Maria fica mergulhada em amargura, na amargura de Jesus Cristo: 'Ó vós, que passais pelo caminho: olhai e vede se há dor semelhante à minha dor!' (Lam 1, 12).

Mas ninguém repara, ninguém presta atenção; apenas Jesus. Cumpriu-se a profecia de Simeão: 'uma espada trespassará a tua alma' (Lc 2, 35). Na escura solidão da Paixão, Nossa Senhora oferece ao seu Filho um bálsamo de ternura, de união, de fidelidade; um sim à Vontade divina. 

Pela mão de Maria, tu e eu queremos também consolar Jesus, aceitando sempre e em tudo a Vontade do Seu Pai, do nosso Pai. Só assim saborearemos a doçura da Cruz de Cristo e abraçá-la-emos com a força do Amor, levando-a em triunfo por todos os caminhos da terra (Via Sacra, IV Estação).

Quinta dor: Jesus morre na Cruz

Junto da Cruz de Jesus estavam sua mãe, a irmã de sua mãe, Maria, mulher de de Cléofas, e Maria de Magdala. Ao ver sua mãe e, junto dela, o discípulo que Ele amava, Jesus disse à sua Mãe: 'Mulher, eis aí o teu filho'. Depois disse ao discípulo: 'Eis aí a tua mãe'. E, desde aquela hora, o discípulo recebeu-a em sua casa. Depois, sabendo que tudo estava consumado e para que se cumprisse a Escritura, Jesus disse: 'Tenho sede'. Estava ali um vaso cheio de vinagre. Embeberam uma esponja no vinagre e, fixando-a a um ramo de hissopo, levaram-Lha à boca. Quando Jesus tomou o vinagre, disse: 'Tudo está consumado'. E inclinando a cabeça, rendeu o espírito (Jo 19, 25-30).

Agora, pelo contrário, no escândalo do sacrifício da Cruz, Santa Maria estava presente, ouvindo com tristeza os que passavam por ali e blasfemavam abanando a cabeça e gritando: Tu, que arrasas o templo de Deus e, em três dias o reedificas, salva-te a ti mesmo! Se és o Filho de Deus, desce da cruz. Nossa Senhora escutava as palavras de seu Filho, unindo-se à sua dor: 'Meu Deus, meu Deus, por que me desamparaste?' Que podia Ela fazer? Fundir-se com o amor Redentor de seu Filho, oferecer ao Pai a dor imensa - como uma espada afiada - que trespassava o seu Coração puro.

De novo Jesus se sente confortado com essa presença discreta e amorosa de sua Mãe. Maria não grita, não corre de um lado para outro. Stabat: está de pé, junto ao Filho. É então que Jesus olha para Ela, dirigindo depois o olhar para João. E exclama: 'Mulher, aí tens o teu filho'. Depois diz ao discípulo: 'Aí tens a tua Mãe'. Em João, Cristo confia à sua Mãe todos os homens e, especialmente, os seus discípulos, os que haviam de acreditar n'Ele.

Felix culpa, canta a Igreja, feliz culpa, porque nos fez ter tal e tão grande Redentor! Feliz culpa, podemos acrescentar também, que nos mereceu receber por Mãe, Santa Maria! Já estamos seguros, já nada nos deve preocupar, porque Nossa Senhora, coroada Rainha dos Céus e da Terra, é a onipotência suplicante diante de Deus. Jesus não pode negar nada a Maria, nem tão pouco a nós, filhos da sua própria Mãe (Amigos de Deus, 288).

(fonte: www.pt.josemariaescriva)

terça-feira, 22 de julho de 2014

22 DE JULHO - SANTA MARIA MADALENA







'Junto à cruz de Jesus, estavam de pé sua mãe e a irmã de sua mãe, Maria de Cleofas, e Maria Madalena' (Jo 19,25).

AS DORES DE MARIA POR SÃO JOSEMARIA ESCRIVÁ (I)

Primeira dor: a profecia de Simeão


Quando se cumpriu o tempo da sua purificação, segundo a Lei de Moisés, levaram-nO a Jerusalém para O apresentarem ao Senhor, como está escrito na Lei do Senhor: 'Todo o primogênito varão será consagrado ao Senhor', e para oferecer um sacrifício, de acordo com o que diz a Lei do Senhor: 'um par de rolas ou duas pombinhas'.

Ora, havia em Jerusalém um homem chamado Simeão; era justo e piedoso, esperava a consolação de Israel e o Espírito Santo estava com ele. Tinha-lhe sido revelado pelo Espírito Santo que não morreria antes de ver o Messias do Senhor. Impelido pelo Espírito, foi ao templo e, quando os pais trouxeram o menino Jesus a fim de cumprirem o que ordenava a Lei a seu respeito, tomou-O nos braços, bendisse a Deus e exclamou: 'Agora, Senhor, podes deixar o teu servo partir em paz , segundo a tua palavra, porque os meus olhos viram a Salvação, que preparaste em favor de todos os povos: luz para iluminar as nações e glória de Israel, teu povo'. 

Seu pai e Sua mãe estavam admirados com o que se dizia d’Ele. Simeão abençoou-os e disse a Maria, Sua mãe: 'Este menino está aqui para a queda e o ressurgimento de muitos em Israel, e a ser sinal de contradição; uma espada trespassará a tua alma, a fim de se revelarem os pensamentos de muitos corações' (Lc 2, 22-35).

Nossa Senhora ouve com atenção o que Deus quer, pondera aquilo que não entende, pergunta o que não sabe. Imediatamente a seguir, entrega-se sem reservas ao cumprimento da vontade divina: eis aqui a escrava do Senhor, faça-se em mim segundo a Vossa palavra. Vedes esta maravilha? Santa Maria, mestra de toda a nossa conduta, ensina-nos agora que a obediência a Deus não é servilismo, não subjuga a consciência, pois move-nos interiormente a descobrirmos a liberdade dos filhos de Deus (Cristo que passa, 173)

Mestra de caridade! Recordai aquele episódio da apresentação de Jesus no templo. O velho Simeão assegurou a Maria, sua Mãe: este Menino está destinado para ruína e para ressurreição de muitos em Israel e para ser sinal de contradição; o que será para ti mesma uma espada que trespassará a tua alma, a fim de que sejam descobertos os pensamentos ocultos nos corações de muitos. A imensa caridade de Maria pela Humanidade faz com que se cumpra também n'Ela a afirmação de Cristo: ninguém tem mais amor do que aquele que dá a vida pelos seus amigos.

Com razão os Romanos Pontífices chamaram a Maria Corredentora: juntamente com o seu Filho paciente e agonizante, de tal modo padeceu e quase morreu e de tal modo abdicou, pela salvação dos homens, dos seus direitos maternos sobre o seu Filho e o imolou, na medida em que d'Ela dependia, para aplacar a justiça de Deus, que com razão se pode dizer que ela redimiu o género humano juntamente com Cristo. Assim entendemos melhor aquele momento da Paixão de Nosso Senhor, que nunca nos cansaremos de meditar: stabat autem iuxta crucem Jesu mater eius, junto da Cruz de Jesus estava a sua Mãe (Amigos de Deus, 287).

Segunda dor: a fuga para o Egito


Depois de partirem, um anjo do Senhor apareceu em sonhos a José e disse-lhe: 'Levanta-te, toma o menino e sua mãe, e foge para o Egito; fica lá até que eu te avise, pois Herodes procurará o menino para O matar'. E ele levantou-se de noite, tomou o menino e sua mãe, e partiu para o Egito, permanecendo ali até à morte de Herodes, a fim de se cumprir o que o Senhor anunciou pelo profeta: 'Do Egito chamei o meu Filho' (Mt 2, 13-15)

Maria cooperou com a sua caridade para que nascessem na Igreja os fiéis membros da Cabeça de que é efetivamente mãe segundo o corpo. Como Mãe, ensina; e, também como Mãe, as suas lições não são ruidosas. É preciso ter na alma uma base de finura, um toque de delicadeza, para compreender o que nos manifesta, mais do que com promessas, com obras.

Mestra de fé! Bem-aventurada és tu, porque acreditaste! Assim a saúda Isabel, sua prima, quando Nossa Senhora sobe à montanha para a visitar. Tinha sido maravilhoso aquele ato de fé de Santa Maria: 'eis aqui a escrava do Senhor; faça-se em mim segundo a tua palavra'. No nascimento de seu Filho contempla as grandezas de Deus na terra; há um coro de Anjos e tanto os pastores como os poderosos da terra vêm adorar o Menino. Mas, depois, a Sagrada Família tem de fugir para o Egito, para escapar às intenções criminosas de Herodes. Depois, o silêncio; trinta longos anos de vida simples, vulgar, como a de qualquer lar, numa pequena povoação da Galileia.

O Santo Evangelho facilita-nos rapidamente o caminho para entender o exemplo da Nossa Mãe: Maria conservava todas estas coisas dentro de si, ponderando-as no seu coração. Procuremos nós imitá-la, tratando com o Senhor, num diálogo cheio de amor, de tudo o que nos acontece, mesmo dos acontecimentos mais insignificantes. Não nos esqueçamos de que devemos pesá-los, avaliá-los, vê-los com olhos de fé, para descobrir a Vontade de Deus.

Se a nossa fé é débil, recorramos a Maria. Conta São João que, devido ao milagre das bodas de Caná que Cristo realizou a pedido de sua Mãe, acreditaram n'Ele os seus discípulos. A Nossa Mãe intercede sempre diante de seu Filho para que nos atenda e se nos mostre de tal modo que possamos confessar: - Tu és o Filho de Deus (Amigos de Deus, 284-285).

Terceira dor: Jesus perdido no Templo


Seus pais iam todos os anos a Jerusalém pela festa da Páscoa. Quando chegou aos doze anos, subiram até lá, segundo o costume dos dias da festa. Terminados esses días, regressaram à casa e o Menino ficou em Jerusalém, sem que os pais o soubessem. Pensando que Ele se encontrava com a caravana, fizeram um dia de viagem e começaram a procurá-Lo entre os seus parentes e conhecidos. Não O tendo encontrado, voltaram a Jerusalém à sua procura. Ao fim de três dias, encontraram-nO no Templo, sentado entre os doutores, a ouvi-los e a fazer-lhes perguntas. Todos os que O ouviam estavam estupefatos com a sua inteligência e as suas respostas. Ao vê-Lo ficaram assombrados, e sua mãe disse-Lhe: 'Filho, por que nos fizeste isto? Olha que teu pai e eu andávamos aflitos, à tua procura'. Ele respondeu-lhes: 'Por que me procuráveis? Não sabeis que devia estar na casa do meu Pai?' Mas eles não compreenderam o que lhes disse (Lc 2, 41-50).

O Evangelho da Santa Missa recordou-nos aquela cena comovente de Jesus que fica em Jerusalém ensinando no templo. Maria e José perguntaram por ele a parentes e conhecidos. E, como não o encontrassem, voltaram a Jerusalém à sua procura. A Mãe de Deus, que procurou com afã o seu Filho, perdido sem sua culpa e que sentiu a maior alegria ao encontrá-lo, ajudar-nos-á a voltar atrás, a rectificar o que for preciso, quando, pelas nossas leviandades ou pecados, não consigamos descobrir Cristo. Teremos assim a alegria de o abraçar de novo, para lhe dizer que nunca mais o perderemos.

Maria é Mãe da ciência, porque com Ela se aprende a lição que mais importa: que nada vale a pena se não estamos junto do Senhor, que de nada servem todas as maravilhas da terra, todas as ambições satisfeitas, se no nosso peito não arde a chama de amor vivo, a luz da santa esperança, que é uma antecipação do amor interminável, na nossa Pátria definitiva (Amigos de Deus, 278).

Onde está Jesus? - Senhora: o Menino!... Onde está? Maria chora. - Bem corremos, tu e eu, de grupo em grupo, de caravana em caravana; não O viram. - José, depois de fazer esforços inúteis para não chorar, chora também... E tu... E eu. Eu, como sou um criadinho rústico, choro até mais não poder e clamo ao céu e à terra, por todas as vezes que O perdi por minha culpa e não clamei.

Jesus! Que eu nunca mais Te perca... E então, a desgraça e a dor unem-nos, como nos uniu o pecado, e saem de todo o nosso ser gemidos de profunda contrição e frases ardentes, que a pena não pode, não deve registar. E, ao consolar-nos com a alegria de encontrar Jesus - três dias de ausência! - disputando com os Mestres de Israel (Lc II, 46), ficará bem gravada, na tua alma e na minha, a obrigação de deixarmos os de nossa casa, para servir o Pai Celestial (Santo Rosário, Quinto mistério gozoso).

(fonte: www.pt.josemariaescriva)

domingo, 20 de julho de 2014

O REINO DE DEUS (I)

Páginas do Evangelho - Décimo Sexto Domingo do Tempo Comum


No Evangelho deste Décimo Sexto Domingo do Tempo Comum, Jesus encontra-se ainda numa barca, às margens do mar da  Galileia, falando à multidão. E vai se utilizar de três diferentes parábolas para descrever o Reino de Deus aos homens. 

A primeira parábola é a do campo semeado de trigo e de joio: 'O Reino dos Céus é como um homem que semeou boa semente no seu campo' (Mt 13, 24). No campo do Senhor, ou seja, o mundo, Deus planta sempre a boa semente, plena de fertilidade e capaz de produzir muitos frutos. Mas o Maligno interveio e 'enquanto todos dormiam' (Mt 13, 25), contaminou o campo com a erva inútil. O mal sempre triunfa quando o bem não se manifesta ou se recolhe. No mundo dos homens, ambas as plantas germinam igualmente e convivem igualmente, os Filhos da Luz (o trigo) e os herdeiros do Mal (o joio). E não serão separados nas vinhas do Senhor, mas apenas na colheita final: 'Deixai crescer um e outro até a colheita! E, no tempo da colheita, direi aos que cortam o trigo: arrancai primeiro o joio e amarrai-o em feixes para ser queimado! Recolhei, porém, o trigo no meu celeiro!' (Mt 13, 30). Pois o bem é a prática da virtude que há de superar o mal e o mal pode ser sempre reparado antes da colheita.

A segunda parábola compara o Reino dos Céus a uma minúscula semente de mostarda: 'O Reino dos Céus é como uma semente de mostarda que um homem pega e semeia no seu campo' (Mt 13, 31). De fertilidade ímpar, a pequena semente produz um vigoroso arbusto, tão alto que as aves podem fazer ninhos em seus ramos. O Reino de Deus se desenvolve tal como a pequena semente: no escondimento, quase imperceptível na sua evolução, mas vigoroso e extraordinário na grandeza e dimensão dos seus frutos! O caminho da santificação é essencialmente simples e tranquilo, mas impelido por uma torrente de bênçãos e graças.

A terceira parábola compara o Reino dos Céus a uma porção de fermento: 'O Reino dos Céus é como o fermento que uma mulher pega e mistura com três porções de farinha, até que tudo fique fermentado' (Mt 13, 33). A mistura do bem e do mal no mundo é resultado do campo semeado pelas boas e más sementes; a ação do bem é a de fomentar os ensinamentos evangélicos, atuando como fermento de transformação e transfiguração das almas semeadas nas vinhas do Senhor.

sábado, 19 de julho de 2014

O CRUCIFIXO



Ponho nele muitas vezes os meus olhos; beijo-o, de manhã, apenas desperto; beijo-o à noite antes de adormecer, e durante o dia. Quantas vezes... mas Jesus não está todo aqui. Aqui está a figura, um pouco mais longe a realidade; aqui Jesus sem palavra, além com as suas palavras de vida eterna; aqui vejo-O morto, acolá encontro-O vivo; aqui o Calvário, além o Cenáculo.

Olho para o meu crucifixo, mas parece-me que Jesus do Tabernáculo o olha mais do que eu; parece-me que me está convidando para eu fixar toda a minha atenção, para eu aprender a recordar sempre que o Jesus da Hóstia é o mesmo que um dia foi o Jesus da Cruz. Mas, és realmente tu, ó meu sacramentado Senhor, que um dia morreste sobre esta cruz, e duma maneira tão bárbara? Estes cravos atravessaram realmente as tuas mãos? Estes espinhos estiveram realmente em volta da tua fronte? E o teu Coração, aquele coração tão doce, tão belo... Foi realmente alanceado desta maneira? E foi sobre estas carnes que realmente se desencadeou uma furiosa saraivada de flagelos? E, por único conforto, deram-te o fel, a mirra e uma tempestade de blasfêmias? És, pois, tu, mesmo tu, este Jesus que eu vejo aqui cinzelado... O Jesus morto sobre o Calvário? E quem foi esse bárbaro assassino? Meu Deus! Que pergunta! Eu próprio fui o carrasco e Jesus, o próprio Jesus, foi a vítima. O delito foi perpetrado lá; a vítima está aqui, no Tabernáculo. E qual é a vingança? A vingança? Ei-la aqui: a Santa Comunhão!

Depois de tantos maus tratos, Tu me vens ainda a me visitar, a estar comigo, a te dares a mim? Mas onde aprendeste um tal modo de punir os teus crucifixores? Eu coroei-te de espinhos, e tu me dás o direito de cingir o diadema e de reinar contigo? Eu te esbofeteei e tu me fazes certas carícias à minha alma, que me levam ao paraíso? Eu te vesti de louco, e tu me vestes com a tua graça? Eu flagelei horrivelmente as tuas carnes, e tu, depois de as tornares imortais e gloriosas, dás-las a mim como refeição? Eu derramei todo o teu sangue, e tu o ofereces a mim como bebida? Eu alanceei o teu Coração, a parte mais nobre da tua humanidade, e tu o ofereces a mim como o teu dom mais precioso? Mas se eu te tivesse amado como um serafim, tu poderias ser mais liberal para comigo? Ó Santa Eucaristia, tu és realmente um mistério! E o que mais me confunde a razão, é que Jesus tenha amado tanto uma criatura tão má como eu sou.

Este Crucifixo, esta imagem fria e muda do meu Jesus, deve, sem dúvida, fazer ouvir uma linguagem misteriosa e potente. Os santos olhavam-no, choravam, eram arrebatados em êxtases. Ficavam horas inteiras, dias inteiros a contemplá-lo, liam nele coisas sempre novas. E não é senão uma figura. Eu estou diante da Hóstia e, momentos após, sinto-me cansada! Rezo um pouco, e já não posso dizer mais nada! Recebo-a, e uma hora depois já estou esquecida de tê-la recebido. E não é uma figura, mas a realidade, a grande realidade de Jesus! Que distância entre mim e os santos!

Mas, ou santa ou pecadora, hei de querer sempre bem ao meu Crucifixo, e a Hóstia hei de considerá-la sempre como coisa minha. Estudarei o Crucifixo para conhecer sempre melhor a Hóstia, e estudarei a Hóstia para conhecer sempre melhor o Crucifixo. O Crucifixo me recordará sobretudo que eu tenho sido a pior das almas, e a Hóstia me recordará que Jesus me tem amado como se eu tivesse sido sempre uma santa. O Crucifixo me fará arrepender dos pecados, a Hóstia me fará amar a Jesus.

Amar a Jesus, que coisa bela! Mas eu amarei a Jesus também crucificado; somente que, crucificado, o amarei com as lágrimas nos olhos e, na Hóstia, o amarei com o sorriso nos lábios; crucificado o amarei gemendo, na Hóstia o amarei cantando. E continuarei a amá-lo sempre, enquanto tiver um fio de vida. E depois? Depois... O Crucifixo sobre o peito, a Hóstia no coração. Que me restará senão morrer e voar para o Céu?

(Excertos da obra 'Centelhas Eucarísticas', de original italiano, 1906; trad. de Adolfo Tarroso Gomes, 1924)