domingo, 10 de março de 2013

PAI DE MISERICÓRDIA

Neste Quarto Domingo da Quaresma, São Lucas nos mostra um das páginas mais belas dos Evangelhos, que é a parábola do filho pródigo. Que poderia muito bem ser a parábola da verdadeira conversão. Ou, com muito mais correção e sentido espiritual, a parábola do pai de misericórdia. Três personagens: o filho mais velho e o filho mais novo que, em meio às dolorosas experiências da vida humana, se reencontram  no grande abraço da misericórdia do pai.

Com a parte da herança que lhe cabe, o 'filho mais novo' opta pelo caminho fácil e tortuoso dos prazeres e vícios humanos, dos instintos insaciados, do vazio do mal. E esbanja, na via dolorosa do pecado, os bens que possuía: a alma pura, o coração sincero, os nobres sentimentos, a fortuna da graça. E, a cada passo, se afunda mais e mais no lodo das paixões humanas desregradas, da vida consumida no nada. Mas, eis que chega o tempo da reflexão madura, da conversão sincera, do caminho de volta ao Pai: 'Pequei contra ti; já não mereço ser chamado teu filho' (Lc 15, 18-19). 

O pai nem ouve as palavras do filho pródigo; no abraço da volta, somente ecoa pelos tempos a misericórdia de Deus: 'Haverá maior alegria no Céu por um pecador que fizer penitência que por noventa e nove justos que não necessitem de arrependimento' (Lc 15, 7). Diante do filho que volta, um coração de misericórdia aniquila a justiça da razão: 'Trazei depressa a melhor túnica para vestir o meu filho. E colocai um anel no seu dedo e sandálias nos pés.' (Lc, 15, 22). Como as talhas de água que se tornam vinho, a conversão verdadeira apaga e aniquila o mal desejado e consumido outrora: na reconciliação de agora desfaz-se em pó as misérias passadas de uma vida de pecado.

O 'filho mais velho' não se move por igual misericórdia e se atém aos limites difusos da justiça humana. Na impossibilidade absoluta de compreender o júbilo do pai com o filho que volta, faz-se vítima e refém da soberba e do orgulho humano: 'tu nunca me deste um cabrito para festejar com meus amigos' (Lc, 15,29).  O filho mais novo, que estava tão longe, está lá dentro outra vez. E o filho mais velho, que sempre lá esteve, recusa-se agora a entrar na casa do pai. Tal como no caso do primeiro filho, o pai de misericórdia vem, mais uma vez, buscar a ovelha desgarrada no filho mais velho que está fora e não quer entrar. Porque Deus, pura misericórdia, quer salvar a todos os seus pobres filhos afastados de casa e espera, com paciência e amor infinitos, a volta dos filhos pródigos e a volta dos seus filhos que creem apenas na justiça dos homens.

sábado, 9 de março de 2013

NO CAMINHO DA VIA ESPIRITUAL

'Deus comunica à alma o seu ser, de tal sorte que a pessoa parece ser Deus mesmo. Poder-se-ia dizer que a alma mais parece ser Deus do que alma.' (Santa Teresa). 

Leônidas, a caminho do martírio, beijou o coração do filho Orígenes, dizendo: 'Aqui mora Deus!' O mesmo Orígenes escreveu: 'Ó cristão, tu és um céu e tu irás ao céu!'

'Deus nos criou à sua imagem e semelhança. Tal foi o sonho do Criador: contemplar-se em sua obra, ver aí brilharem todas as suas perfeições.' (Beata Isabel da Trindade). 

'Congratulemo-nos e demos graças a Deus, pois nos tornamos não somente cristãos e, sim, Cristo.' (Santo Agostinho). 

'Permanecer pequena é reconhecer o seu nada e esperar tudo de Deus. É não se afligir demais com as próprias faltas. Significa não se atribuir a si mesmo as virtudes que pratica. É não desanimar com as próprias falhas; afinal, as crianças caem muito.' (Santa Teresinha). 

'Eu não tenho mais nenhum desejo a não ser o de amar Jesus até à loucura.' (Santa Teresinha). 

'Deus não te proíbe amar as criaturas, mas só de afeiçoar-te a elas como última felicidade. Podes apreciá-las e louvá-las para amar o Criador.' (Santo Agostinho). 

'Ao entardecer da vida sereis julgados sobre o amor!' (São João da Cruz). 

'Quando o homem pensa em Deus, sente doce emoção no coração, o que demonstra que Deus é o Deus do coração humano. O amor é a bandeira do exército das virtudes: todas estas vêm enfileirar-se atrás dela.' (São Francisco de Sales). 

'A oração do justo é a chave do céu. Sobe a prece, desce a misericórdia. E por sua bondade excessiva, o Senhor dá sempre mais do que foi pedido.' (Santo Agostinho). 

'Quem reza se salva; quem não reza se condena. Todos os condenados se perderam por não rezar.' (Santo Afonso). 

'Deus dá a graça da fé, mas a da perseverança só dá aos que rezam.' (Santo Agostinho). 

'Há dias em que a gente vai à oração como à guerra; outras vezes como ao baile.' (São Nicolau de Flue). 

'Os dois pés, com os quais caminhamos na via da perfeição, são mortificação e amor a Deus. Aquele é o pé esquerdo; este, o direito.' (Santa Teresa).

'Quanto mais abraçamos a cruz, mais abraçamos Jesus'. (Beato Charles de Foucauld). 

'O monge não tem o oficio de doutor, mas o de penitente, chorando sobre o mundo e sobre si mesmo.' (São Jerônimo). 

'Nosso coração nunca se farta, porque o bem infinito não tem limites.' (São Gregório de Nissa). 

GALERIA DE ARTE SACRA (IV): CATACUMBAS CRISTÃS

(O Bom Pastor, mausoléu de Galla Placidia, Ravena, Itália, início do século V d.C.)

 (Jonas sendo atirado ao mar, catacumbas de Marcelino e S. Pedro, Roma, século IV)

   (Outra figura do Bom Pastor, locação desconhecida)

  (Cristo com barba, 380 d.C.)

 (Nossa Senhora e o Menino Jesus, locação desconhecida)

sexta-feira, 8 de março de 2013

POEMAS PARA REZAR (IX)


NO TE RINDAS (NÃO TE RENDAS)

(Mário Benedetti, poeta uruguaio, 1920 - 2009)

No te rindas,
aún estás a tiempo
De alcanzar y comenzar de nuevo,
Aceptar tus sombras,
Enterrar tus miedos,
Liberar el lastre,
Retomar el vuelo.

Não te rendas, 
ainda tens tempo
de conseguir e começar de novo.
Aceitar tuas sombras
enterrar teus medos,
libertar o lastro
retomar o voo.

No te rindas que la vida es eso,
Continuar el viaje,
Perseguir tus sueños,
Destrabar el tiempo,
Correr los escombros,
Y destapar el cielo.

Não te rendas, que a vida é isso,
continuar a viagem,
perseguir teus sonhos,
destravar o tempo,
Remover os escombros,
e desvelar o céu.

No te rindas, por favor no cedas,
Aunque el frío queme,
Aunque el miedo muerda,
Aunque el sol se esconda,
Y se calle el viento,
Aún hay fuego en tu alma
Aún hay vida en tus sueños.

Não te rendas, por favor não cedas,
mesmo que o frio queime,
mesmo que o medo morda,
mesmo que o sol se esconda,
e se cale o vento,
ainda há fogo em tua alma
ainda há vida em teus sonhos.

Porque la vida es tuya y tuyo
también el deseo
Porque lo has querido
y porque te quiero
Porque existe el vino y el amor,
es cierto.
Porque no hay heridas
que no cure el tiempo.

Porque a vida é tua e teu 
também o desejo.
Porque o tens querido
e porque te quero.
Porque existe o vinho e o amor,
 é certo.
Porque não há feridas
 que o tempo não cure.

Abrir las puertas,
Quitar los cerrojos,
Abandonar las murallas
que te protegieron,
Vivir la vida y aceptar el reto,
Recuperar la risa,
Ensayar un canto,
Bajar la guardia
y extender las manos
Desplegar las alas
E intentar de nuevo,
Celebrar la vida y retomar los cielos.

Abrir as portas,
Remover os ferrolhos,
Abandonar as muralhas
que te protegeram,
viver a vida e aceitar o desafio
recuperar o riso,
ensaiar uma canção
baixar a guarda 
e estender as mãos,
distender as asas
e tentar de novo,
Celebrar a vida e retomar os céus.

No te rindas, por favor no cedas,
Aunque el frío queme,
Aunque el miedo muerda,
Aunque el sol se ponga
y se calle el viento,
Aún hay fuego en tu alma,
Aún hay vida en tus sueños

Não te rendas, por favor não cedas,
mesmo que o frio queime,
mesmo que o medo morda,
mesmo que o sol se esconda,
e se cale o vento,
ainda há fogo em tua alma
ainda há vida em teus sonhos.

Porque cada día
es un comienzo nuevo,
Porque esta es la hora
y el mejor momento.
Porque no estás solo,
porque yo te quiero..

Porque cada dia
 é um novo começo,
porque esta é a hora
e o melhor momento.
 Porque não estás só, 
porque eu te quero...

quarta-feira, 6 de março de 2013

TUAS PALAVRAS...

Quantas palavras nasceram hoje do teu juízo? Sim, elas nasceram, como filhas sibilantes, como medida das tuas ideias, como frutos dos teus pensamentos e vontades. Elas foram empurradas em meio a golfadas de ar, ressoaram pelas tuas cordas vocais em frêmitos e resmungos, ecoaram pelo palato e pela tua boca aberta e cavernosa, assumiram som e voz, ficaram livres, e forjaram nos soluços de tua fala os ecos estentóricos de uma memória eterna. Tuas palavras...

Tuas palavras... uma vez ditas, benditas ou malditas para sempre. Marcadas a ferro e fogo na tua alma generosa ou temerária. Transparentes como a mais preciosa gema ou pesadas como chumbo, jubilosas por uma santa alegria ou revestidas da mais negra das mortalhas, suaves como uma brisa vespertina ou brutais como um incêndio descontrolado, frágeis como o sopro dos sussurros ou violentas como os turbilhões dos desgraçados. Tuas palavras...

Tuas palavras... depositadas no recôndito dos corações ou lançadas sem valor aos ventos. Sementes de candura e mansidão ou joio de penúria e desespero. Brotadas no silêncio e na quietude do conselho e da gratidão ou forjadas pelos impropérios e pela maldição.Tangidas pelo amor inquebrantável da verdade ou vergadas pelo ódio intumescido do rancor. Palavras livres dos sonhos, dos encontros e despedidas, de conforto e solidariedade ou palavras libertinas dos instintos, da maldade e mesquinhez humana, de desdém ou de revolta. Nascidas para a oração. Desfalecidas para a dor. Tuas palavras...

Tuas palavras... nascidas de tantas formas e condições, serão os últimos vestígios de tua vida humana,  impregnadas como fogo em tua alma agora nua e solitária. E elas serão a voz de tua justificação ou de tua condenação. Neste dia, do teu juízo particular, tuas palavras, que não serão mais tuas, é que falarão por ti, em todos os tons, com todas as nuances, em todas as línguas. Elas serão como um hino de glória a Deus ao sustentarem a tua alma generosa; elas serão como um grito de maldição eterna ao sufocarem de pavor a tua alma ensandecida. Porque 'no dia do juízo os homens prestarão contas de toda palavra vã que tiverem proferido' (Mt, 12, 36). Que palavras foram as tuas palavras hoje?

AS SETE TRISTEZAS E ALEGRIAS DE SÃO JOSÉ

1) Ó Esposo puríssimo de Maria Santíssima, glorioso São José, assim, como foi grande a amargura de vosso coração na perplexidade de abandonardes a vossa castíssima Esposa, assim foi indizível a vossa alegria quando pelo Anjo vos foi revelado o soberano mistério da Encarnação. Por esta tristeza e por esta alegria, vos pedimos a graça de consolardes agora e nas extremas dores, a nossa alma, com a alegria de uma vida justa e de uma santa morte, semelhante à vossa, assistidos por Jesus e por Maria.
Pai Nosso, Ave Maria e Glória.

2) Ó felicíssimo Patriarca, glorioso São José, que fostes escolhido para ser o Pai adotivo do Verbo emanado, a tristeza que sentistes ao ver nascer em tanta pobreza o Deus menino, se vos mudou em júbilo celeste ao ouvirdes a Angélica harmonia e ao contemplardes a glória daquela brilhantíssima noite. Por esta tristeza e por esta alegria, vos suplicamos a graça de nos alcançardes que, depois da jornada desta vida, passemos a ouvir os angélicos louvores e a gozar os resplendores de glória celeste.
Pai Nosso, Ave Maria e Glória.

3) Ó obedientíssimo executor das divinas Leis, glorioso São José, o sangue preciosíssimo que na Circuncisão derramou o Redentor-Menino vos transpassou o coração, mas o nome de Jesus vo-lo reanimou, enchendo-o de contentamento. Por esta tristeza e por esta alegria, alcançai-nos viver sem pecado, a fim de expirar cheios de júbilo com o nome de Jesus no coração e na boca.
Pai Nosso, Ave Maria e Glória.

4) Ó fidelíssimo Santo, que tivestes parte nos mistérios de nossa Redenção, glorioso São José, se a profecia de Simeão a respeito do que Jesus e Maria teriam de padecer, vos causou mortal angústia, também vos encheu de suma alegria pela salvação e gloriosa ressurreição que, igualmente, predisse teria de resultar para inumeráveis almas. Por esta tristeza e por esta alegria, obtende-nos que sejamos do número daqueles que, pelos méritos de Jesus e pela intercessão da SS. Virgem, sua Mãe, têm de ressuscitar gloriosamente.
Pai Nosso, Ave Maria, Glória.

5) Ó vigilantíssimo custódio, íntimo familiar do Filho de Deus encarnado, glorioso São José, quanto sofrestes para alimentar e servir o Filho do Altíssimo, particularmente na fuga com Ele para o Egito. Mas, qual não foi também vossa alegria o por terdes sempre convosco o mesmo Deus e por verdes cair por terra os ídolos egípcios. Por esta tristeza e por esta alegria, alcançai-nos que, afastando para longe de nós o infernal tirano, especialmente, com a fuga das ocasiões perigosas, sejam extirpados do nosso coração todos os idílios de afetos terrenos e que, inteiramente dedicados ao serviço de Jesus e de Maria, para eles somente vivamos e, na alegria do seu amor, expiremos.
Pai Nosso, Ave Maria e Glória.

6) Ó anjo da terra, glorioso São José, que cheio de pasmo vistes o Rei do Céu submisso a vossos mandados, se a vossa consolação, ao reconduzi-lo do Egito, foi turbada pelo temor de Arquelau, contudo, sossegado pelo Anjo, permanecestesalegre em Nazaré com Jesus e Maria. Por esta tristeza e por esta alegria, alcançai-nos a graça de desterrar do nosso coração todo temor nocivo, de gozar a paz da consciência, de viver seguros com Jesus e Maria e também de morrer assistidos por eles.
Pai Nosso, Ave Maria, Glória.

7) Ó exemplar de toda santidade, glorioso São José, que perdeste, sem culpa vossa, o Menino Jesus, e com grande angústia houvestes de procurá-lo por três dias até que, com sumo júbilo, gozastes do que era vossa vida, achando-o no Templo entre os doutores. Por esta tristeza e por esta alegria, vos suplicamos, com o coração nos lábios, que interponhais o vosso valimento para que nunca se suceda perder a Jesus por culpa grave; mas, se por desgraça o perdermos, com tão grande dor o procuremos que o achemos favorável, especialmente em nossa morte, para passarmos a gozá-la no céu e lá cantarmos convosco suas divinas misericórdias.Pai Nosso, Ave Maria e Glória.Rogai por nós, Santíssimo José. Para que sejamos dignos das promessas de Cristo. Oremos: Ó Deus, que por Vossa inefável Providência Vos dignastes escolher o bem-aventurado São José para Esposo de Nossa Mãe Santíssima, concedei-nos que aquele mesmo que na terra veneramos como protetor, mereçamos tê-lo no céu por nosso intercessor. Vós que viveis e reinais por todos os séculos dos séculos. Assim seja.

ORAÇÃO A SÃO JOSÉ PELA FAMÍLIA - Grande Santo, a quem Deus confiou o cuidado da mais santa família que jamais houve, sede vós, vo-lo pedimos, o pai e protetor da nossa, e impetrai-nos a graça de vivermos e morremos no amor de Jesus, de Maria e do Vosso. Glória ao Pai, ao Filho e ao Espírito Santo, como era no princípio, agora e sempre. Amém. 
Pai Nosso e Ave Maria.

ORAÇÃO PELOS AGONIZANTES – São José, Pai adotivo de Jesus Cristo e verdadeiro esposo da Virgem Maria, rogai por nós e pelos agonizantes deste dia (ou desta noite). V: São José, padroeiro dos agonizantes.R: Rogai por nós.

LEMBRAI-VOS, ó puríssimo Esposo de Maria Virgem, ó meu doce protetor, São José, que jamais se ouviu dizer que alguém tivesse invocado a vossa proteção, implorado vosso socorro e não fosse por vós consolado e atendido. Com esta confiança venho à vossa presença e a vós fervorosamente me recomendo. Não desprezeis a minha súplica ó Pai adotivo do Redentor, mas dignai-vos acolhê-la piedosamente. Assim seja.

terça-feira, 5 de março de 2013

21 PASSOS DA CONFISSÃO

1. A confissão é um sacramento de misericórdia; devemos por isso aproximar-nos dela com uma piedosa alegria e inteira confiança. São Francisco de Sales ensina-nos que para os que se confessam (periodicamente), basta um quarto de hora de exame de consciência, e pede menos para o ato de contrição. Muito menos tempo ainda basta aos que se confessam mais a miúdo.

2. Se vos acontece esquecerdes algumas faltas leves, nem por isso deixam de ser perdoadas. Reparai numa judiciosa observação de nosso santo: 'Não devemos inquietar-nos quando nós não lembramos as faltas, para as confessarmos; porque não é crível que uma alma que faz muitas vezes o exame da sua consciência, o não faça de modo que se lembre das suas faltas graves. Não devemos ser tão delicados que queiramos confessar tantas imperfeições pequenas, tantas faltas leves: um ato de humildade interior, um suspiro basta para apagar'. Não digais que tendes pecados ocultos que não confessais. Isso é um artifício do demônio para vos inquietar. Recordai-vos ainda de que a relação minuciosa das vossas faltas não é o que as perdoa, assim como uma enumeração exata das dívidas não apaga nada ao credor.

3. Tende a certeza que quanto mais examinardes, menos encontrareis. Além disso, um exame prolongado fatiga o espírito e entorpece o coração.

4. A instrução seguinte de São Francisco de Sales será, pois de uma grande importância prática: 
'Quando não virdes claramente que destes alguma espécie de consentimento aos acessos da cólera ou de qualquer outra tentação, deveis dizê-lo ao vosso diretor espiritual, a fim de serdes instruídos como haveis de proceder; mas não o deveis dizer: acuso-me de ter tido durante dois dias grandes movimentos de cólera, mas não consenti neles, dizeis virtudes em vez de dizerdes defeitos. Estando em dúvida se cometestes alguma falta, deveis examinar seriamente se essa dúvida tem fundamento, e depois falar dela com simplicidade. No caso contrário deveis calar-vos, ainda que sintais por isso um pesar'.

5. Também o santo não quer que façamos certas acusações gerais, que muitas pessoas fazem por costume, e a que ele chama supérfluas. Por exemplo: de não ter amado a Deus e ao próximo quanto era do nosso dever; de não ter rezado as orações ou de não ter recebido os sacramentos com o respeito conveniente e coisas semelhantes; porque, acrescenta ele, todos os santos do paraíso e todos os homens do mundo podiam dizer o mesmo, se se confessassem.

6. Tende sempre presente ao espírito este aviso tão útil de São Francisco de Sales: 'Não somos obrigados a confessar os pecados veniais: mas quando os confessamos, devemos ter a resolução de emendar-nos deles: aliás, seria um abuso dá-los por matéria da confissão sacramental'.

7. Depois da confissão fica tranqüilo. É absolutamente proibido deixar-vos vencer de temores a respeito do exame de consciência, da contrição ou de qualquer outra coisa que seja. Estes temores são artifícios do vosso inimigo, que deseja tornar-vos amargo um sacramento de consolação e de amor.

8. Devemos arrepender-nos dos nossos pecados, mas não perturbar-nos por causa deles; o arrependimento é feito por amor de Deus; a perturbação, do amor próprio. No mesmo ato de sincero arrependimento devemos dar graças a Deus de que, pela Sua misericórdia, não procedemos pior. Prometei-Lhe depois sincera emenda, não confiando senão na Sua bondade. Ainda que caísses cem vezes por dia, deveis sempre esperar e prometer séria emenda. Num instante Deus pode transformar as pedras em verdadeiros filhos de Abraão, isto é, em grandes santos. Assim o fará se constantemente confiardes n'Ele.

9. A dor dos pecados consiste numa determinação da vontade que detesta as faltas passadas e não quer cometê-las para o futuro. Para a verdadeira contrição não são precisas lágrimas, nem suspiros, nem emoções sensíveis: podemos até ter nosso coração contrito santo e justificante no meio da maior aridez, que nos parecerá ser insensibilidade. Não vos deixeis vencer por nenhum temor a este respeito.

10. Não façais nunca esforço algum para excitardes em vós a contrição; este esforço perturba e fatiga a alma sem lhe dar o que procura. Pelo contrário, estabelecei no vosso coração uma profunda paz, e dizei amorosamente ao vosso Deus que desejareis não O ter ofendido, e que com o Seu auxílio não quereis ofendê-lO mais para o futuro: eis a contrição. Ela é um efeito do amor, e o amor procede sempre com tranquilidade.

11. São Francisco de Sales diz que o ato de contrição se faz em um instante com dois rápidos olhares. Um sobre nós com o detestar do pecado, outro sobre Deus com a promessa de nos emendarmos na esperança do Seu socorro. Um dos penitentes mais contritos foi David: e a sua contrição encerrou-se nesta palavra: Pequei, pecavi; e com esta só palavra se justificou.

12. Dizeis que quereis ter a contrição; mas que não podeis tê-la. São Francisco de Sales responde-vos: 'É poder muito, muito poder querer. O desejo da contrição prova que há contrição. O fogo que está debaixo da cinza não se sente não se vê, e, contudo existe'. O desejo de sentir a contrição nasce muitas vezes de uma complacência interesseira da nossa parte, que não satisfeita de contentar a Deus, queria também contentar-se a si; e na sua sensibilidade pessoal ter a certeza do seu estado de graça e da sua virtude.

13. Deus não vos faz conhecer a vossa contrição para vos alcançar o mérito da obediência, a qual vos impõe o dever de ficardes em paz. Acredite, pois, humildemente, obedecei desafogadamente, e obtereis uma dupla coroa. Muitas vezes os santos mais elevados julgavam não ter contrição nem amor, mas no meio das suas trevas seguiram a luz da obediência com uma heroica submissão.

14. Não julgueis que não tendes contrição ou que vos confessais mal, porque tornais a cair em faltas. É preciso fazer distinção entre as faltas: devemos corrigir-nos com vigor das que nascem de uma vontade depravada que ama o pecador, quer o pecado e deseja perseverar no pecado; mas as faltas que nascem da surpresa, da fraqueza, da fragilidade, nos acompanharão em parte até a morte. 'Será muito, diz o nosso santo, poderemos nos curar de certos defeitos um quarto de hora antes de morrermos'. E em outra parte: 'Devemos suportar não só as fraquezas do próximo, mas também as nossas, e ter paciência à vista das nossas imperfeições'. Procuramos emendar-nos com paz e sem ansiedade, porque não podemos ser anjos antes do tempo.

15. Nas vossas confissões acrescentai em geral alguma falta da vossa vida passada, de que experimentais uma dor particular. Dizei por exemplo: confesso-me dos pecados de impureza, de ódio ou de vingança da vida passada. Deste modo a matéria necessária para o sacramento será muito mais certa.

16. Repeli os temores de terdes omitido pecados nas vossas confissões gerais ou particulares, ou de não os terdes declarado como deveis: 'A Igreja, que é o intérprete da vontade de Nosso Senhor Jesus Cristo, pede a integridade sacramental e não a integridade material. A primeira consiste na confissão dos pecados lembrados depois de um exame razoável, e proporcionado ao estado atual da nossa alma. A integridade material consiste na declaração material de todos os pecados que cometemos, do seu número, das suas circunstâncias sem omitir nenhuma. A Igreja pede a primeira integridade, porque não exige a segunda, sabendo muito bem que no nosso exame nos poderá escapar alguma coisa ou sobre o número ou sobre as circunstâncias. Em suma: ela não pede aos fiéis senão uma confissão humilde e sincera de tudo o que lhes vem à lembrança depois de um exame conveniente, persuadida de que a boa vontade dos penitentes supre então a falta involuntária da sua memória' É o pensamento do teólogo Jamin.

17. Tendes satisfeito abundantemente à integridade sacramental; repeli, pois todas as apreensões e dúvidas como verdadeiras tentações.

18. Lembrai-vos ainda de que se vos parecer que não tendes tido com o vosso exame o cuidado conveniente, o confessor prudente supre esta falta pelas suas interrogações; e se ele não faz nenhuma é porque tem o conhecimento necessário da qualidade dos vossos pecados e do estado da vossa alma, que é o fim, da acusação sacramental.

19. Daí vem o erro dos que querem repetir as suas confissões gerais com o medo de não terem tido as disposições suficientes no seu exame ou na sua contrição; daí a censurável facilidade dos confessores que se prestam a isso. Se devêssemos dar ouvidos a semelhantes apreensões, seria preciso passar a vida inteira a renovar as confissões gerais, porque os mesmos receios se podem apresentar sempre, ainda nos maiores santos; e assim a confissão se transformará em verdadeiro cavalete, em tortura da alma; ora, isto é uma proposição herética, fulminada pelo Concilio de Trento.

20. A doutrina de todos os santos e de todos os teólogos esclarecidos é que, depois de ter feito a vossa confissão geral com sinceridade de coração e desejo de vos emendardes, deveis ficar tranqüilo e não repetir de modo algum. Aquele que obra de outra sorte traz a memória o que devia esquecer e perturba o espírito em vez de sossegá-lo. Tanto mais que como diz São Filipe Nery: 'Quanto mais se varre, mais pó se levanta'.

21. Para chegardes a tranquilizar a vossa alma, achareis um poderoso socorro neste sentimento universal dos santos, de que o temor do pecado deixa de ser salutar quando é excessivo.

(Excertos da Obra 'Maria falando ao Coração das Donzelas', do Abade A. Bayle)