quarta-feira, 11 de janeiro de 2023

A ALEGRIA PERFEITA


Numa tarde de inverno, Frei Francisco voltava de Perugia para Santa Maria degli Angioli, na companhia de Frei León. O tempo estava ruim: a neve cobria as encostas da montanha. Caía na planície uma chuva pesada e gélida, com rajadas de vento em furiosa violência. As trilhas estavam desertas e lamacentas.

Os dois frades, com os capuzes na cabeça e as túnicas molhadas coladas ao corpo, caminhavam silenciosamente um atrás do outro, atentos onde colocar os pés descalços para não escorregar. De repente, como se desse voz a uma meditação interior, o santo começou a dizer ao companheiro que estava alguns passos à sua frente:

- Frei León, mesmo que os frades menores tenham dado ao mundo um grande exemplo de santidade, ainda assim isso não é a alegria perfeita.

Frei León não respondeu nada. Ele continuava o seu caminho, olhando para cima de vez em quando. Santa Maria degli Angioli ainda estava longe! Passado algum tempo, o santo, quebrando novamente o silêncio, exclamou: 
- Frei León, ainda que os frades menores pudessem dar vista aos cegos, curar os aleijados, fazer ouvir aos surdos, dar fala aos mudos, expulsar os demônios e até ressuscitar os mortos, essa ainda não é a alegria perfeita.

Percorrida depois mais uma longa distância, Francisco tornou a dizer:

- Frei León, se um frade menor soubesse falar todas as línguas, se conhecesse todas as ciências, se conhecesse todas as escrituras, se pudesse prever o futuro e ler o segredo de consciências, ainda assim também nisso não há alegria perfeita.

Frei León parecia não prestar atenção às palavras do santo. No entanto, ponderava o que ouvia em seu coração, tentando entender o significado daquelas palavras. Enquanto isso, a chuva continuava a cair, encharcando os dois frades até os ossos e o vento frio castigava implacavelmente as pernas desnudas dos dois frades.

Ainda assim, passadas algumas centenas de metros, Francisco continuou a sua ladainha:

- Frei León, ovelha de Deus, ainda que os frades menores pudessem falar com os anjos, se conhecessem os mistérios das estrelas, se lhes fossem revelados todos os tesouros da terra e os poderes dos pássaros, dos peixes, dos animais, homens, árvores, pedras e águas, eu vos digo e repito que esta também ainda não é a alegria perfeita.

Cerca de dois quilômetros depois, tomado de maior entusiasmo e com voz mais alta, quase gritando, acentuou:

- Frei León, também se o frade menor pudesse pregar tão bem e até converter todos os fiéis em nome de Jesus Cristo, também nisso não haveria a alegria perfeita.

Frei León finalmente saiu do seu silêncio e perguntou humildemente:

- E então, padre, eu te imploro em nome de Deus que me diga então onde está a alegria perfeita.

E São Francisco lhe respondeu assim:

- Uma vez chegados a Santa Maria degli Angioli, encharcados de chuva, tremendo de frio, lamacentos até os olhos e atormentados pela fome... se batermos na porta e o porteiro, olhando com raiva pelo buraco nos ver e começar a gritar: 'Fora, criminosos e mentirosos, vocês são ladrões que procuram roubar a esmola dos pobres'; e se suportarmos pacientemente todos esses insultos, Frei León, saiba que nisso está a alegria perfeita.

E se nós, oprimidos pela fome e pela noite, tremendo de frio, batermos à porta e batermos cada vez mais alto e, chorando, suplicarmos ao porteiro que nos deixe entrar pelo amor de Deus e ele, saindo com uma clava nas mãos, nos agarrar pelo capuz e nos atirar ao chão, arrastando-nos na neve, e nos bater sem dó e nem piedade e continuar a nos insultar e a nos maldizer e bem... se suportarmos todas estas coisas com paciência e alegria, pensando nos sofrimentos de Jesus Crucificado, meu bom Frei León, saiba que nisto, e somente nisto, está a alegria perfeita.

E agora, Frei León, concluindo toda essa nossa conversação... Não podemos negar a nós mesmos as graças e as belas qualidades que possuímos. São estes dons de Deus que, uma vez que nos tenha dado, pode também tirá-los de nós. Só uma coisa podemos realmente nos orgulhar por ser totalmente nossa: 'aceitar com amor os sofrimentos, as injúrias e as dificuldades da vida'. Assim damos verdadeira glória a Deus e os nossos corações se alegrarão na expectativa da recompensa eterna.

(Excerto da obra 'Florecillas de São Francisco de Assis' - Florecilla VIII, com adaptações)

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